Valéria Campos Cavalcante
Título da dissertação: LEITURA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM ESTUDO DE EVENTOS E PRÁTICAS DE LETRAMENTO EM SALAS DE AULA DO 1º SEGMENTO.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA
LEITURA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM
ESTUDO DE EVENTOS E PRÁTICAS DE LETRAMENTO
EM SALAS DE AULA DO 1º SEGMENTO
VALÉRIA CAMPOS CAVALCANTE
Maceió
2009
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA
LEITURA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM
ESTUDO DE EVENTOS E PRÁTICAS DE LETRAMENTO
EM SALAS DE AULA DO 1º SEGMENTO
VALÉRIA CAMPOS CAVALCANTE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Educação Brasileira da Universidade Federal de Alagoas
(UFAL), como requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Educação. Linha de pesquisa: Educação e
Linguagem. Área de concentração: Educação de Jovens e
Adultos.
Orientadora: Profª. Drª. Marinaide Lima de Queiroz Freitas
Maceió
2009
.
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecária Responsável: Helena Cristina Pimentel do Vale
C376l
Cavalcante, Valéria Campos.
Leitura na educação de jovens e adultos : um estudo de eventos e práticas de
letramento em salas de aula do 1º segmento / Valéria Campos Cavalcante, 2009.
191 f. :il.
Orientadora: Maria Auxiliadora da Silva Cavalcante.
Dissertação (mestrado em Educação Brasileira) – Universidade Federal de
Alagoas. Centro de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação
Brasileira. Maceió, 2009.
Bibliografia: f. 147-154.
Apêndices: f. 155-191.
1. Educação de jovens e adultos. 2. Alfabetização. 3. Leitura. 4. Letramento.
I. Título.
CDU: 374.7
3
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus.
Aos meus pais Audálio e Cléia ( In memorian). Por todo amor e carinho.
Ao meu filho Julio Cesar e meu marido Antenor, pela paciência de minhas ausências.
À Profª. Drª. Marinaide Lima de Queiroz Freitas que acreditou em mim e em meu
trabalho. Os meus votos de eterna gratidão.
À Profª. Drª. Maria Inez Matoso Silveira, por ter me incentivado desde o início para
a elaboração deste trabalho.
À Profª. Drª. Maria Francisca Oliveira Santos, pela contribuição neste trabalho.
À Profª. Drª. Edna Castro, pela contribuição neste trabalho.
Aos colegas de Mestrado em Educação da UFAL.
Às minhas amigas pelas palavras de incentivo, em especial: Irani, Patrícia, Dayse,
Cininha, Belinha, Karlinha, Nilzete.
Em especial aos queridos alunos da Educação de Jovens e Adultos da Escola
Balthazar de Mendonça.
5
Não podemos chamar o povo para receber instruções, postulados, receitas, ameaças,
repreensões e punições, mas para participar coletivamente da construção de um saber.
(FREIRE, 2001, p.23)
6
QUADROS
Quadro 1 ................................................................................................................... 96
Quadro 2 ................................................................................................................. 100
Quadro 3 ................................................................................................................ 106
Quadro 4 ................................................................................................................ 110
Quadro 5 ................................................................................................................ 115
Quadro 6 ............................................................................................................... 118
Quadro 7 ............................................................................................................... 120
Quadro 8 ................................................................................................................ 121
Quadro 9 ............................................................................................................... 123
Quadro 10 ............................................................................................................. 123
Quadro 11 ............................................................................................................. 125
Quadro 12 ............................................................................................................. 128
Quadro 13 ............................................................................................................. 130
Quadro 14 ............................................................................................................ 134
Quadro 15 ............................................................................................................. 135
7
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
Para caracterizar a organização de tomadas de turnos dos participantes da pesquisa
utilizamos a lista de sinais, signos e abreviaturas1 abaixo descritas:
1.
Citações literais, e reproduções de discursos diretos de textos durante a
gravação ................................................................................................................. “ ”
2.
Comentários do transcritor ...........................................................: (comentários)
3.
Desvios temáticos e/ou comentários que quebram a sequência temática do
discurso ......................................................................................................................: 4.
Dúvidas, incompreensões de palavras e segmentos ....................................... ( )
5.
Ênfases ou acentos fortes e/ou entonações enfáticas ................... MAIÚSCULA
6.
Exclamações ...................................................................................................... !
7.
Fáticos .....................................................: ah, ahã, eh, ehn, ih, oh, uhn, tá, mhn.
8.
Hipóteses do que se ouviu, suposições .............................................: (hipóteses)
9.
Indicações de que as falas foram tomadas ou interrompidas em determinados
pontos .....................................................................................................................: ( )
10.
Interrogações ....................................................................................................: ?
11.
Números ...........................................................................................: por extenso
Adaptações feitas a partir de KOCH, Ingedore, V. Villaça. A inter-ação pela linguagem. São Paulo: Contexto,
1992, p. 73-4.
8
12. Quaisquer pausas, tais como: ponto e vírgula, vírgula, dois pontos, e ponto
final .........................................................................................................................: ....
13.
Repetições .......................................................: reduplicações de letra ou sílaba.
14.
Truncamentos bruscos .......................................................................................: /
15.
Silabações ......................................................................................................: __-
16.
Sobreposição de vozes .................................................................................: (sv)
17.
Entonação enfática ............................................................................. Maiúscula.
18.
Textos lidos ............................................................................................. negrito.
19.
Professora 1 .................................................................................................... F1.
20.
Professora 2 .................................................................................................... F2.
21.
alunos ..... são identificados pela inicial maiúscula do nome, quando há diálogo
22. Alunos .......................................................................... quando tomam o turno
são identificados pela letra A (maiúscula) mais a numeração de acordo com o turno
23.
Pesquisador do grupo focal ........................................................................... pes.
24.
Alunos no grupo focal ............................................................................... grupo.
9
RESUMO
CAVALCANTE, Valéria Campos. Leitura na educação de jovens e adultos: um estudo de
eventos e práticas de letramento em salas de aula do 1º segmento. Maceió, 2009. 165p.
Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, Centro de
Educação, Universidade Federal de Alagoas.
Este trabalho é o resultado de uma pesquisa que teve como foco os eventos e práticas de
letramento, realizados em aulas de leitura. Os sujeitos investigados são pessoas que possuem
conhecimentos adquiridos na vida cotidiana, através das experiências com familiares,
comunidade, mundo do trabalho, e com múltiplas entradas e saídas da escola. A investigação
objetivou analisar os eventos e práticas de letramento, ocorridos nas aulas de leitura nas
turmas de pós-alfabetização do I Segmento do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e
Adultos (EJA), numa escola pública municipal, situada na periferia urbana de Maceió. A
natureza da pesquisa configura-se como qualitativo-interpretativa, baseada em estudo de caso.
Alguns autores que contribuíram para esta pesquisa foram: Beisiegel (1974), Fávero (1984),
Freire (1977, 2001, 2003, 2005), Freitas, M. (2007), Koch (2002), Koch e Elias (2006),
Kleiman (1989), Marcuschi (2001, 2002, 2005), Ribeiro (2002, 2003), Silva (1999), Silveira
(2005, 2006), Soares (1998, 2002, 2003, 2004), entre outros. Os resultados de nossa análise
indicam que na escola pesquisada, sobretudo no I Segmento da EJA, não se compreende a
importância da leitura para a ampliação do letramento dos sujeitos, uma vez que esta
permanece ocupando um lugar secundário nos projetos pedagógicos e, consequentemente, na
prática de sala de aula. Analisando as práticas das professoras ficou explícito que ambas
apresentaram diversas dificuldades no trato com a leitura e letramento dos educandos. Essas
professoras, não possuem a formação específica para atuar na EJA, bem como, desconhecem
os fundamentos linguísticos, necessários às atividades para trabalharem a leitura. Sendo
assim, agem muitas vezes baseadas na intuição, ou transplantam para a modalidade práticas
pedagógicas que vivenciaram em seu período de escolarização. Com este trabalho esperamos
provocar um repensar na formação inicial e continuada dos docentes que atuam na EJA, que
não adquiriram conceitos específicos referentes ao ensino de leitura.
Palavras-chave: Educação de jovens e adultos, alfabetização, leitura, letramento
10
RESUMEN
CAVALCANTE, Valéria Campos. Leitura na educação de jovens e adultos: um estudo de
eventos e práticas de letramento em salas de aula do 1º segmento. Maceió, 2009. 191p.
Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, Centro de
Educação, Universidade Federal de Alagoas.
Este trabajo es el resultado de una investigación que tuvo como foco los eventos y prácticas
de letramento, realizados en aulas de lectura. Los sujetos investigados son personas que
poseen conocimientos adquiridos en la vida cotidiana, a través de las experiencias con
familiares, comunidad, mundo del trabajo, y con múltiples entradas y salidas de la escuela. La
investigación objetivou analizar los eventos y prácticas de letramento, ocurridos en las aulas
de lectura en las turmas de polvos-alfabetização del I Segmento de la Enseñanza Fundamental
de la Educación de Jóvenes y Adultos (EJA), en una escuela pública municipal, situada en la
periferia urbana de Maceió. La naturaleza de la investigación configura-se como qualitativointerpretativa, basada en estudio de caso. Algunos autores que contribuyeron para esa
investigación fueron: Beisiegel (1974), Fávero (1984), Freire (1977, 2001, 2003, 2005),
Freitas, M. (2007), Koch (2002), Koch e Elias (2006), Kleiman (1989), Marcuschi (2001,
2002, 2005), Ribeiro (2002, 2003), Silva (1999), Silveira (2005, 2006), Soares (1998, 2002,
2003, 2004), entre otros. Los resultados de nuestra analice indican que en la escuela
investigada, sobre todo en el I Segmento de la EJA, no se comprende la importancia de la
lectura para la ampliación del letramento de los sujetos, una vez que esta permanece ocupando
un lugar secundario en los proyectos pedagógicos y consecuentemente en la práctica de sala
de aula. Analizando las prácticas de las profesoras quedó explícito que ambas presentaron
diversas dificultades en el trato con la lectura y letramento de los educandos. Esas profesoras,
no poseen una formación específica para tutear en la EJA, así como, desconocen los
fundamentos linguísticos, necesarios las actividades para trabajar lectura. Siendo así, actúan
muchas veces basadas en la intuição, o trasplantan para la modalidad prácticas pedagógicas
que vivenciaram en su periodo de escolarizacion. Con este trabajo esperamos que
provoquemos un repensar en la formación inicial y continuada de los docentes que tutéan en
la EJA, que no adquirieron, conceptos específicos referentes a la enseñanza de lectura.
Palavras-clave: Educação de jovens e adultos, alfabetização, leitura, letramento
11
SUMÁRIO
Quadros ................................................................................................. vi
Lista de siglas e abreviaturas ............................................................. vii
Resumo .................................................................................................. ix
Resumen ................................................................................................. x
Introdução ............................................................................................ 13
Capítulo 1 – Histórico dos materiais de leitura utilizados na EJA ..18
1.1 Os primeiros materiais didáticos da EJA e o ensino de leitura ....... 19
1.2 Os livros didáticos da EJA no início do século XXI ....................... 32
1.3 Contribuições freireanas para o ensino de leitura na
EJA – Freire (1977, 2001, 2003, 2005) ........................................... 35
Capítulo 2 – Leitura: bases teóricas .................................................. 38
2.1 Contribuições da concepção interacionista de leitura
leitor-texto-leitor – Koch (2002), Koch e Elias (2006),
Kleiman (1989) ............................................................................... 42
2.2 Contribuições dos conceitos de letramento para o ensino de
leitura na EJA – Soares (1998, 2003, 2004), Queiroz (2004)
Marcuschi (2001, 2002).................................................................... 46
2.3 Contribuições dos modelos de leitura – Goodman (1987),
Silveira (2005) e Kato (1999) .......................................................... 52
2.3.1 Modelos de leitura ascendente – bottom-up – Gough (1972) ... 55
2.3.2 Modelos de leitura descendente – top-down,
ênfase nas estratégias de leitura – Goodman (1987)
e Frank Smith (1989) ..................................................................... 58
12
2.3.3 Modelo de processamento automático – modelo de
LAaberge e Samuels (1984) ........................................................ 62
2.3.4 Modelos interativos de leitura – Rumelhart (1974),
Stanovich (1977) .......................................................................... 65
Capítulo 3 – O universo da pesquisa ................................................. 68
3.1 Metodologia da investigação ........................................................... 68
3.2 Instrumentos/técnicas da pesquisa .................................................. 71
3.3 Caracterização da escola ................................................................. 74
3.4 Sujeitos da pesquisa ........................................................................ 78
3.4.1 Educandos/leitores enquanto usuários da língua ....................... 78
3.4.2 Educandos, aspectos sócio-econômicos .................................... 79
3.4.3 Professoras pesquisadas ............................................................ 82
Capítulo 4 – Eventos e práticas de letramento nas aulas de
leitura da educação de jovens e adultos – EJA ................................. 86
4.1 As aulas de leitura: o cenário da investigação ................................. 91
4.2 Das temáticas ................................................................................... 95
4.3 A escuta de textos proferidos pelas professoras: uma antiga
tradição que sobrevive nas salas de aula da EJA ........................... 104
4.3.1 As leituras realizadas nas aulas da Professora F1 ................... 105
4.3.2 As leituras realizadas nas aulas da Professora F2 ................... 109
4.4 O apagamento dos aspectos linguísticos dos gêneros textuais ...... 114
Considerações finais .......................................................................... 142
Referências bibliográficas ................................................................. 148
Apêndices ........................................................................................... 156
13
INTRODUÇÃO
É importante ressaltar que neste início de século XXI no Brasil, crescem
significativamente as apresentações de trabalhos em congressos e seminários com temáticas
que envolvem a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em levantamento sobre pesquisa em
Educação de Jovens e Adultos nos períodos de 1970 a 1980, Ribeiro (2001) mostra-nos que,
em relação à linguística, os trabalhos encontrados focalizavam a discussão de problemas da
estigmatização das variantes linguísticas populares e o papel da escola como unificador da
“variedade padrão” e outros que aproximam os postulados de Emília Ferreiro aos de Paulo
Freire na discussão e proposição das metodologias.
Segundo Haddad et alii (2000), de 1986 a 1998, os trabalhos elaborados na área de
Educação de Jovens e Adultos foram constituídos de artigos publicados em periódicos,
números especiais de periódicos, dissertações e teses defendidas no Brasil, sendo que as duas
últimas ficaram apenas com 9,5% da elaboração do conhecimento nessa área.
Haddad et alii (2000, p. 11) afirmam que, à época, as abordagens dominantes foram
no campo da Sociologia, da Política e da Filosofia da Educação que, juntas, oferecem
fundamentos para mais da metade das teses e dissertações existentes, prevalecendo as
pesquisas sobre agentes, concepções, práticas e metodologias.
No tocante aos aspectos específicos sobre o ensino de leitura nas aulas da EJA, há
uma escassez de investigações. Em levantamento preliminar que realizamos em anais da
Associação Nacional de Pesquisa em Pós-Graduação em Educação no período de 2003 a
2007, especificamente no Grupo de Trabalho nº 18 – em que se reúnem os pesquisadores da
Educação de Pessoas Jovens e Adultos, os trabalhos voltados para a área de leitura quase
14
inexistem, sendo encontrados apenas dois trabalhos que enfatizam aspectos referentes à
leitura nas salas de aula da EJA.
Observa-se, diante do acima exposto, que existe uma escassez em investigações, na
área da EJA, voltadas para a leitura e seu ensino. Nesse sentido este trabalho tem um caráter
inovador, uma vez que está focado nas aulas de língua materna, especificamente com o olhar
voltado para as práticas e os eventos de letramentos que os educandos da EJA estão tendo
acesso nas aulas de leitura.
Quando nos referimos a práticas de letramento as entendemos como: ações dos
sujeitos em situações que envolvem a utilização da escrita. Essas práticas são impregnadas de
valores, atitudes, sentimentos e relações sociais. No tocante a eventos de letramento são:
atividades em que a língua escrita é parte integrante da natureza das interações entre os
participantes.
Essas duas categorias foram escolhidas por compreendermos e concordarmos com
Kleiman (2004), quando aponta a concepção de leitura, em um sentido mais atual como
prática social, que na linguística aplicada, é subsidiada teoricamente pelos estudos do
letramento. Nessa perspectiva, os usos da leitura estão ligados à situação e às histórias dos
participantes leitores. Dentro deste contexto, leitores experientes/letrados, sãos aqueles que
não apenas decifram códigos, mas que conhecem as funções sociais dos textos (KLEIMAN,
op. cit., p. 14).
Os educandos da EJA são pessoas que se envolvem em diversos eventos e práticas de
letramento a partir dos acontecimentos da vida cotidiana, através das experiências com
familiares, comunidade, mundo do trabalho, e em saídas e entradas da escola. Sendo assim,
essas experiências anteriores e os conhecimentos prévios desses alunos não podem ser
simplesmente apagados ao chegarem à escola.
15
A partir desses pressupostos, nosso tema assim se definiu: Leitura na educação de
jovens e adultos: um estudo de eventos e práticas de letramento em salas de aula do 1º
segmento. Tendo como objetivo geral analisar os eventos e práticas de leitura, ocorridos nas
aulas das turmas de pós-alfabetização da EJA, das escolas públicas da Secretaria Municipal de
Educação de Maceió (SEMED).
Contribuíram para a fundamentação desta investigação no campo da linguística,
pesquisadores como: Bajard (1994, 2007), Bagno (2006), Batista e Rojo (2003), Koch (2002),
Koch e Elias (2006), Kleiman (1989), Marcuschi (2001, 2002, 2005), Ribeiro (2002, 2003),
Silva (1999), Silveira (2005, 2006), Soares (1998, 2002, 2003, 2004), entre outros. No tocante
à EJA nos apoiamos em: Barros (2005), Beisiegel (1974), Fávero (1984), Freire (1977, 2001,
2003, 2005), Freitas, M. (2007), Moura (2001, 2005, 2007, 2008), entre outros.
Apesar de reconhecermos que a responsabilidade em formar leitores experientes não
deva ser atribuída apenas às instituições escolares e aos professores, levamos em consideração
que a maioria de nossos educandos, por falta de recursos seus e de suas famílias só têm
convívio mais prolongado com portadores de textos nas escolas.
Considerando este fato, a ênfase no ensino de leitura nos indicará como nossos
educandos da EJA, do primeiro segmento do Ensino Fundamental, estão tendo oportunidades
significativas de acesso à leitura no espaço de sala de aula; sendo assim, nosso objeto de
estudo centrou-se em observações de aulas de língua materna.
A investigação tem como eixo condutor a seguinte problematização: Até que
ponto os eventos e práticas de leitura, ocorridos nas aulas das turmas de pósalfabetização em EJA, permitem aos(às) alunos(as) tornarem-se leitores(as) experientes?
Essa problematização desdobra-se nas seguintes questões:
16
Os eventos de letramento proporcionados aos sujeitos, nas aulas de leitura,
estão vinculados aos contextos sócio-culturais que ocorrem fora do contexto escolar?
O ensino de leitura está ocupando um lugar privilegiado nas salas de aula da
terceira fase da EJA, ou aparece como coadjuvante, no processo escolar?
O professor da EJA agencia, nas aulas de leitura, práticas de letramentos
significativas que auxiliem os educandos a tornarem-se leitores proficientes?
O professor da EJA trabalha os gêneros textuais em sala considerando suas
funções e os aspectos comunicativos e interacionais, ou limita-se a utilizá-los como suportes
para realização de atividades?
A escola pesquisada2 situa-se na periferia urbana de Maceió e foi escolhida por
conter grande quantidade de turmas de EJA do primeiro segmento, bem como, pela sua
importância histórica, enquanto formadora de trabalhadores no bairro onde está inserida.
Os dados do nosso estudo foram colhidos em duas turmas de pós-alfabetização, nas
quais atuam duas professoras da 3ª3 fase do Primeiro Segmento de Ensino Fundamental4 da
EJA5, pertencentes ao quadro docente da Secretaria Municipal de Educação (SEMED). Os
critérios para a escolha das professoras foram:
2
•
Possuir vínculo efetivo com a SEMED, por meio de concurso público;
•
Atuar na EJA há mais de três anos;
A referida instituição é uma escola pública do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação de
Maceió (SEMED). Para manter o anonimato decidimos dar-lhe o nome fictício de Escola Safira.
3
A escolha da 3ª fase deve-se ao fato de acreditarmos que os educandos da EJA ao atingirem este nível de
escolarização já tenham desenvolvido boa parte das estratégias de leitura, ou estejam aptos a desenvolvê-las.
4
A terceira fase do primeiro segmento da EJA corresponde ao 5º ano do ensino fundamental. A EJA, nas escolas
da Rede Municipal de Educação é ofertada em três segmentos: 1º, 2º e 3º, o primeiro segmento corresponde a
uma formação básica do 1º ao 5º ano, o segundo corresponde do 6º ao 9º ano e o terceiro corresponde ao ensino
médio.
5
Em nossa pesquisa estabelecemos critérios de seleção dos/as profissionais que atuam na EJA, após a análise
foram selecionadas duas professoras que atenderam a todos pré-requisitos.
17
•
Ser regente em turma de 3ª fase.
A metodologia utilizada configura-se como qualitativo-interpretativa, baseada em
estudo de caso. A opção por esse tipo de pesquisa deu-se por que trabalhamos com dados
retirados do contexto real, no caso específico as aulas de leitura de duas professoras de uma
escola pública municipal, situada na cidade Maceió.
Para melhor explicitação, esta dissertação compõe-se de quatro capítulos:
No primeiro capítulo, apresentaremos o histórico dos materiais didáticos mais
utilizados como suporte de leitura para a referida modalidade, bem como, as contribuições
desses materiais para a ampliação do letramento dos educandos.
No segundo capítulo, explicitaremos a abordagem teórica que sustenta nossa análise,
dando enfoque aos estudos sobre letramento, as concepções e modelos de leitura.
No capítulo seguinte discorreremos sobre o percurso metodológico de nossa
pesquisa, descrevendo os cenários, os sujeitos envolvidos no estudo, os instrumentos e os
procedimentos utilizados.
No quarto capítulo, analisaremos os dados coletados, e discutimos os fatores
subjacentes aos eventos e práticas de letramento e leitura desenvolvidas nas turmas
observadas. Em nossas considerações finais traremos a síntese acerca das reflexões realizadas
ao longo de nossa investigação.
Finalmente esperamos que este trabalho provoque um repensar na formação inicial e
continuada dos docentes que atuam na EJA, que não adquiriram, conceitos específicos
referentes ao ensino de leitura.
18
CAPÍTULO I – HISTÓRICO DOS MATERIAIS DIDÁTICOS DE
LEITURA NA EJA
Neste capítulo abordamos o histórico dos livros didáticos de língua portuguesa da
Educação de Adultos6(EDA) e Educação de Jovens e Adultos (EJA), fazemos a articulação
com o ensino da leitura. Discorremos sobre os primeiros materiais didáticos que foram
produzidos e utilizados direta ou indiretamente para a referida modalidade, até chegarmos aos
livros didáticos (LD) atuais que estão sendo utilizados nas salas de aula da EJA, sobretudo em
Alagoas.
Inicialmente fazemos a distinção entre livro didático e material didático. Entendemos
que materiais didáticos sempre existiram desde a criação das instituições próprias para
instrução, pode-se dizer, de forma variada que contribuem para o processo de ensinoaprendizagem. Podem ser caracterizados como textos ou conjunto de textos utilizados em
sala, livros, além dos diversos materiais empregados no espaço escolar para fins de
aprendizagem.
Os livros didáticos/escolares, segundo Batista e Rojo (2003), podem ser classificados
em quatro tipos: os manuais ou livros didáticos, obras produzidas para orientar no ensino de
alguma disciplina, por meio da apresentação de um conjunto extenso de conteúdos do
currículo, seguindo uma progressão, sobre forma de atividades ou lições, organizados de
forma que podem ser utilizados tanto coletivamente, em sala, como individualmente, em casa;
os livros paradidáticos, que são obras complementares que aprofundam, resumem,
intensificam os conteúdos específicos do currículo de uma determinada disciplina, voltando6
Até meados dos 1980, trata-se da Educação de Adultos, a partir desta data começaremos a denominá-la como
Educação de Jovens e Adultos.
19
se mais particularmente para a formação do leitor; os livros de referência – dicionário, atlas e
gramáticas que apóiam a aprendizagem e as edições escolares de clássicos – compostas por
edições de obras clássicas.
Esses livros didáticos surgiram à medida que a escola pública ampliou o atendimento
à camada popular sem, no entanto, estruturar-se. Paralelamente a este acontecimento ocorre a
precariedade no fazer docente, além do aumento na carga horária dos professores. Com essa
nova realidade, surge a necessidade de elaborar um material pedagógico que subsidiasse o
trabalho do professor, bem como, auxiliasse os educandos a elevar o grau do que
denominamos, a partir dos anos de 1990, de letramento, principalmente dos alunos da EJA,
pertencentes às classes menos privilegiadas, que não possuem condições de adquirir livros
fora da escola.
Levando em considerações essas questões, optamos neste capítulo, por explorar três
aspectos: a) Os primeiros materiais didáticos da EJA e o ensino de leitura; b) Os livros
didáticos da EJA no início de século XXI e c) As contribuições freireanas para o ensino de
leitura na EJA.
1.1 Os primeiros materiais didáticos da EJA e o ensino de leitura
A primeira referência sobre material didático para EJA que encontramos em nossa
pesquisa documental nos indica o trabalho dos jesuítas no Brasil colônia. Para consolidar o
projeto de “catequese”, esses religiosos iniciaram a produção de diversos materiais inscritos
na língua dos indígenas como: gramática da língua Tupi-Guarani e os catecismos de
doutrinas. Segundo Galvão e Soares (2004, p. 29): “A primeira dessas gramáticas foi escrita
20
por José de Anchieta e, embora só tenha sido publicada em 1595, há indícios de que pelo
menos desde 1556 já circulasse em forma de manuscrito”.
Esses materiais possibilitavam lograr êxito em dois aspectos. O primeiro, dominar a
língua dos indígenas para facilitar a colonização e, num segundo plano, garantir a perpetuação
da tradição religiosa. Com essa prática, o Tupi-guarani – língua materna, foi amplamente
usada nas comunicações no país durante o período colonial, não só entre os religiosos e os
nativos; mesmo os descendentes de portugueses moradores da colônia optavam pela língua
indígena, consequentemente, o uso do tupi chegou a superar a língua portuguesa.
Após essa fase, “houve um período de nossa história em que no Brasil silenciou-se
no que diz respeito à EDA”, até o século seguinte, quando em 1834, como consequência do
Ato Adicional, a instrução primária e secundária do país passou a ser responsabilidade das
províncias; no entanto, pouquíssimas províncias conseguiram estruturar e instituir uma
política para a educação popular, principalmente, no que diz respeito à educação de adultos.
Segundo Lajolo & Zilberman (2003), as poucas escolas existentes nas províncias
indicam um ensino e prática da leitura realizados através da Bíblia ou com documentos de
cartório e cartas, em sua maioria escritos à mão. Até meados do século XIX, no Brasil, os
livros eram praticamente inexistentes nas escolas, a quantidade existente no país era limitada
e insuficiente. Os poucos que havia pertenciam às famílias abastadas, e grande parte dos
livros se resumia a produções europeias e algumas traduções. Somente após a implantação da
Imprensa Régia que o Brasil iniciou a impressão de livros.
Entre esses livros, no tocante à leitura, estavam a gramática portuguesa mais
antiga e as cartinhas elaboradas por João de Barros (1496-1571), publicadas em 1540. “O
termo cartinha, assim como cartilha, utilizados como diminutivo de carta no sentido de
esquema, mapa e orientação” (CAGLIARI, 2004, p. 22).
21
Num contexto geral de educação no Brasil, nessa época, uma minúscula elite
intelectual, um círculo de letrados elitistas e conservadores decidiam sobre a educação voltada
para a população brasileira constituída de homens, mulheres e crianças pobres, pardos e
negros recém-libertados, destituídos de educação formal.
Essa perspectiva de educação brasileira prevaleceu sem alteração até o final do
século XIX e início do XX, centrada na figura de um/a professor/a autoritário/a e opressoro/a.
Essa pessoa que em muitos casos abusava de sua posição, como podemos observar nos
depoimentos de Cora Coralina, entre outros autores, expostos em Lajolo e Zilberman7 (2003,
p. 161):
A gente chegava “ – Bença Mestra”
Sentava em bancos compridos,
Escorridos, sem encosto.
Lia alto lições de rotina:
O velho abecedário.
Lição salteada.
Aprendia a soletrar.
Leitura alta.
Soletrava-se
Cobria-se o debuxo.
Dava-se a lição.
Tinha dia certo de argumento
7
CORALINA, Cora . Poemas dos becos de Goiás e estórias mais. 6. ed. São Paulo: Global, 1984.
22
Com palmatória pedagógica em cena
Analisando o depoimento acima podemos afirmar que o ensino de leitura nas escolas
acontecia predominantemente em voz alta, a alfabetização baseava-se na “soletração” e lições
tomadas a partir de uma cartilha, ou abecedário, neste sentido Bajard (1994, p. 32), nos
esclarece:
Neste modelo a aprendizagem de leitura está, portanto, completamente
traçada. É preciso aprender a transformar signos escritos em signos orais,
memorizar a forma oral obtida, repetir inúmeras vezes o texto para exprimir
seu sentido [...] os métodos da leitura são baseados em abecedários que
oferecem as chaves da correspondência entre a escrita e o oral.
Esta foi e ainda é uma prática de leitura muito difundida nas escolas no nosso país.
Para os adeptos dessa forma de se ensinar leitura o procedimento é simples, basta vocalizar
um texto, uma frase, transformando o escrito em oral e vice-versa, fazendo a correspondência
entre letras e sons. O sentido dos enunciados nesta concepção de leitura pouco importa.
Seguindo essa tendência, para o público adulto algumas informações sobre materiais
copiados ou traduzidos que tivemos acesso nos apontam para as cartas do ABC, ou cartilhas
do ABC, material que apesar de ter sido criticado, desde o final do século XIX, foi utilizado
amplamente no Brasil, até a segunda metade do século XX.
Uma das cartas mais utilizadas no país para a Educação de Adultos, segundo Galvão
e Soares (2004, p. 30) foi “a carta do ABC da autoria de Laudelino Rocha que iniciava
apresentando as letras do alfabeto, aos poucos avançava para as famílias silábicas. As últimas
lições da carta continham pequenas frases moralizantes que deviam ser lidas e decoradas
pelos alunos, para que fossem recitadas para o professor. Sem deixar de destacar o conteúdo
23
infantilizado, para uma demanda adulta. Fato esse, desde daquela época, provocador de
evasão.
Essas cartilhas foram responsáveis por alfabetizar boa parte da população brasileira,
nesta época. Com o passar dos tempos, elas se proliferaram, difundindo um modelo de leitura
que fundamentou metodologias tradicionais. Esse material se popularizou de tal forma que se
transformou em um bem de consumo, sendo vendido por muito tempo em lojas e
supermercados, como nos indica Caligliari (2004).
Havia um universo de leitura bastante restrito, já que o acesso a gibis, cordéis e
outros meios impressos não eram autorizados pela escola. Esse tipo de material limitava o
ensino de leitura a uma técnica de decifração de elementos gráficos e sonoros (fonemas,
letras, sílabas, palavras). Portanto, traz a perspectiva de que, para aprender a ler, o aprendiz
necessita transformar o signo escrito em signo oral para conseguir a compreensão, ou seja, o
oral é utilizado como mediador da compreensão.
Nas primeiras décadas do século XX, o país passa por um processo de urbanização e
industrialização, neste contexto surgem as primeiras grandes editoras brasileiras,
multiplicando-se as tipografias, o que favoreceu a publicação de autores nacionais e a
possibilidade de consolidação de uma literatura brasileira, embora a entrada de livros
estrangeiros ainda fosse frequente.
Apesar dessa evolução, devido às dificuldades educacionais do país, poucos eram os
cidadãos do povo que conseguiam ler sem dificuldade um texto, uma vez que os índices de
analfabetismo permaneciam alarmantes: mais de 80% da população era analfabeta. Isso
significava que, de cada dez brasileiros, só dois conseguiam ler uma carta, um jornal, um
documento, ou pegar um bonde sem precisar de alguém (GALVÃO, 2001).
24
A partir dessa realidade, começaram a aparecer mobilizações em diversas esferas da
sociedade, em vários Estados, em torno da “erradicação” do analfabetismo de adultos. No
âmbito internacional, surgiu a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO), que incentivou a realização de programas nacionais que contemplassem a
Educação de Adultos.
A criação da UNESCO aliada à mobilização dos Estados obrigou os políticos e
formuladores de políticas a reconhecer que, para integrar-se aos países desenvolvidos, o
Brasil deveria apresentar uma considerável melhoria no desempenho do sistema educacional e
nos resultados educacionais do cidadão brasileiro.
Neste contexto, algumas ações educacionais se efetivaram a partir da necessidade de
qualificação de mão-de-obra; a discussão sobre a EDA vem à tona, e em 1932, foi criado o
Ministério de Educação e Saúde. “A Constituição de 1934 consolida o dever do Estado em
relação ao ensino primário, integral, gratuito e de frequência obrigatória, extensiva, inclusive,
aos adultos” (FÁVERO, 2005, p. 141).
E nessa perspectiva, no final da década de 1930 e início da década de 1940, iniciam
em âmbito oficial, ações educacionais que fortaleceram a Educação de Adultos entre elas: a
criação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), incentivando e
realizando estudos na área, bem como, a regulamentação do Fundo Nacional do Ensino
Primário (FNEP) que, no seu item 2 do artigo 4º, estabeleceu que 25% do auxílio federal
fosse aplicado na educação primária de adolescentes e adultos analfabetos, fato que estimulou
a criação de um plano geral de ensino supletivo.
Com o fim do Estado Novo (1945), se restabelecem as eleições diretas, surge assim
uma enorme demanda por eleitores. Nesse contexto, em 30 de janeiro de 1947, o Ministério
de Educação e Saúde autoriza o Departamento Nacional de Educação a criar e baixar normas
25
que regessem um novo órgão: o Serviço de Educação de Adultos (SEA). Logo após sua
implantação os trabalhos voltados para a EDA começaram a se desenvolver rapidamente.
No mesmo ano de 1947, foi lançada a primeira Campanha da Educação de
Adolescentes e Adultos (CEAA)8 do Brasil em âmbito nacional, visando alfabetizar a
população. Houve a produção de diversos tipos de materiais pedagógicos: cartilhas, folhetos
diversos, sobre noções de saúde, higiene e conservação de alimentos. Com relação à leitura,
foram elaborados dois guias de leitura que tinham como metodologia o uso do sistema
silábico de alfabetização, nas últimas lições havia pequenas frases e textos de conteúdo moral
e com informações sobre higiene, saúde e técnicas de trabalho.
Estes dois guias de leitura traziam o mesmo método caracterizado pelas cartilhas, ou
seja, um modelo sintético, por partir do fonema para os textos, ou seja, apoiando-se em
realidades desprovidas de significado para o educando, principalmente para o adulto, mas que
mecanicamente fazia-o chegar a uma unidade mais inteligível que seria a palavra.
O Serviço de Educação de Adultos (SEA) publicou outros materiais que seguiram as
mesmas características. Segundo Beisieguel (1974, p. 105) “Esses materiais foram
importantes para o público adulto, porém o enfoque dado era as ciências sociais, tinham um
objetivo mais instrucional, no tocante ao ensino da língua não houve aprofundamento”.
Em julho de 1958, foi realizado no Rio de Janeiro o 2º Congresso Nacional de
Adultos, e a importância deste evento deve-se, sobretudo, às propostas freireanas para a
educação de adultos. Neste evento apareceu nacionalmente a figura de Paulo Freire que
também estava engajado na CEAA.
No tocante às suas reflexões sobre a prática da leitura, Freire (1977, 2001), em nosso
entendimento, deixa explicito ser a leitura um fenômeno sóciopolítico, já que tem por
8
Em 1947 o ensino só era obrigatório para o público de 07 a 11 anos, ficando o adolescente como
responsabilidade da Educação de Adultos.
26
finalidade a transformação social. Sendo assim, para o autor o ideal seria ressignificar o
processo de aprender a ler, pois a leitura só teria significado quando guiada por objetivos,
mediada por problematizações, conhecimentos e necessidades daqueles que se envolvem na
atividade.
No final da década de 1950, inicia no país a solidificação dos movimentos de
educação e cultura popular9. Esses movimentos surgem em vários lugares do Brasil; mas, foi
no Nordeste onde mais se consolidaram. Sendo oriundos da organização da sociedade civil, e
inspirados nas ideias freireanas buscavam a conscientização, a participação e a transformação
social.
Neste contexto, surgem as críticas aos materiais produzidos para a educação de
adultos, principalmente, as cartilhas que traziam dois problemas fundamentais: primeiro,
porque tentavam domesticar os educandos, segundo porque não estavam baseadas na
realidade dos sujeitos adultos. Desta forma, desrespeitavam os alunos, trazendo uma
concepção em que o conhecimento deveria ser passado de maneira que os alunos recebessem
passivamente o conteúdo sem questionar.
A partir de então, os movimentos de educação e cultura popular iniciam a produção
de seus próprios materiais. O pioneiro foi o MCP, que elaborou o primeiro Livro de Leituras
para Adultos, um livro pensado especificamente para os adultos trabalhadores do Nordeste,
com ênfase em palavras do cotidiano nordestino, nas frases para leitura e nos textos
provocadores de consciência política. Esse livro foi utilizado não só em Pernambuco, mas em
vários outros estados que o tomavam como referência, realizando pequenas adaptações.
A exemplo, no meio urbano, citamos a Campanha De Pé no Chão também se
Aprende a Ler em Natal - RN. Um material seguindo este mesmo estilo foi elaborado em Belo
9
Entre eles estavam: Movimento de Cultura Popular (MCP), Centros Populares de Cultura (CPC) e Movimento
de Educação de Base (MEB).
27
Horizonte, denominado Uma família operária, manual para a alfabetização de adultos e
adolescentes e a Campanha de Educação de Popular da Paraíba, que elaborou um livro de
leituras e exercícios denominado Força e Trabalho.
Para o meio rural a maior contribuição veio do MEB, que em 1962, elaborou seus
próprios materiais didáticos que tiveram grande repercussão pelo seu caráter político e
conscientizador para atender ao público do Nordeste. Foram produzidos dois livros de
“leituras” para os adultos: o primeiro – Saber para Viver e o segundo – Viver é Lutar.
Esses livros e materiais produzidos dentro, ou a partir, dos movimentos sociais foram
extremamente importantes para a EAD, uma vez que houve o rompimento com as
metodologias de alfabetização para adultos vigentes no país, baseadas nos métodos sintéticos,
que partiam das unidades menores para as maiores, empregados na silabação.
À época, a elaboração de materiais tendo como base os princípios freireanos, apesar
de ainda conter uma concepção estruturalista, na modalidade de EDA, foi considerada
inovadora. No entanto, o avanço foi mais metodológico que linguístico, tendo como ponto de
partida, uma unidade significativa: a palavra geradora.
Apesar de tantos avanços já ocorridos na produção de materiais para EDA no campo
dos movimentos sociais, até o início da década de 1960, em âmbito oficial, houve retrocesso
com o lançamento da Cartilha ABC, segundo Fávero (1984, p. 298): “o pior material
didático já produzido para a alfabetização no Brasil”.
Estava de volta o método silábico de alfabetização, pseudotextos, bem como, uma
alta frequência de atividades de cópias, traduzindo um modelo de ensino transmissivo, ou
seja, um material com um conteúdo inadequado para o público adulto, mesmo com todas
essas deficiências, esse material foi distribuído por todo país. Entretanto, esta cartilha pouco
foi utilizada.
28
A partir de 1964, o país encontra-se sob o controle da Ditadura Militar. Neste
período, a alfabetização de adultos, além de ser vislumbrada como primordial na preparação
de mão-de-obra minimamente preparada para atender às necessidades do modelo econômico
vigente, passa a ser utilizada como estratégia de despolitização, de suavização das tensões
sociais.
Neste contexto, em 1967, surge mais uma campanha: o Movimento Brasileiro de
Alfabetização (MOBRAL) que no campo linguístico, segundo Freitas, M. (2007), no que diz
respeito ao ensino da língua materna houve regressão, já que as práticas desenvolvidas
durante o projeto tinham como um dos principais objetivos a escrita do nome para aquisição
do título eleitoral.
A concepção de leitura utilizada no material didático do MOBRAL baseava-se na
psicologia Associacionista, na qual ler é sonorizar a escrita. Para tanto, o aprendiz necessitava
transformar sinais gráficos em sinais sonoros, decodificando cada palavra escrita, mesmo
aquelas que não têm significado reconhecido. As palavras deveriam ser soletradas pelos
alunos até que se conseguisse decorar, havia sequências de frases impressas em cartazes e
pequenos textos que deviam ser lidos em voz alta, por todos os alunos em sala, para
posteriormente repeti-los para a professora.
Nessa perspectiva, ler era somente adquirir a competência técnica para decodificar o
código da língua escrita e escrever era codificar a língua escrita. Ler e escrever eram
processos técnicos. A teoria da comunicação vigente que também dava suporte a essa visão da
linguagem destacava o papel do emissor como um codificador e o papel do receptor como o
de um decodificador, sem grande preocupação com o conteúdo veiculado. Proliferaram-se
livretos para leitura seguindo essa concepção.
A ideia era a produção de materiais didáticos para reforçar uma política de
enaltecimento das características e da identidade nacional, transmitindo uma visão de país em
29
processo de modernização. Nesse sentido, os valores da sociedade impregnavam esses livros
que possuíam diversas características em comum, pautados na ideia de civismo, com uma
missão formadora e patriótica para os sujeitos adultos.
Esses livros foram importantes para a EJA, mas a leitura aparecia apenas como
pretexto, pois o foco não era a aula de Língua Portuguesa, mas sim ensinar um tom de
civismo e moralismo: valores que todo bom cidadão deveria ter como: honestidade, bondade,
respeito aos mais velhos, cumprir os deveres, caráter reto, obediência aos preceitos cristãos,
caridade, dedicação ao trabalho e à família, entre outros.
Como podemos avaliar, a leitura nesta fase era utilizada na EDA como veículo de
aculturação e disseminação da cultura dominante; percebe-se que até este momento, não se
havia avançado muito no tocante ao ensino de leitura nos projetos formais de educação para
esse público. Muitos textos utilizados nas aulas de leitura ofereciam apenas ensinamentos
morais do cotidiano, desrespeitando a realidade e a cultura dos sujeitos.
Em meados da década de 1970 foram criados os Centros de Estudos Supletivos
CES), projeto elaborado pelo Departamento de Ensino Supletivo (DSU), uma grande
iniciativa em âmbito nacional. Eram dirigidos ao público que já estava inserido no mercado de
trabalho, mas que havia concluído apenas as quatro primeiras séries do primeiro grau e que
não dispunha de tempo para frequentar a escola em horário fixo.
Dessa maneira, os centros possibilitariam a educação a distancia, baseada em
módulos, e para cada módulo fora elaborado um fascículo com os textos que seriam
estudados pelos alunos, por meio de uma leitura mecânica e ideologicamente marcada.
No período da redemocratização, mais precisamente entre 1978 e 1985, houve
avanços na Educação de Jovens e Adultos. A promulgação da Constituição de 1988 trouxe
para a modalidade uma nova institucionalização, sobretudo nos municípios do Sul e Sudeste
30
retoma-se a concepção freireana. Com esta perspectiva, o município de Porto Alegre publica
os Cadernos do Trabalhador que para Fávero (2007) foi um dos melhores materiais didáticos
para atender ao público da EJA.
No final da década de 1990, por solicitação do MEC, a organização nãogovernamental Ação Educativa lançou a Proposta Curricular – 1º Segmento e 2ª segmento da
EJA, com conteúdos organizados em três áreas do conhecimento: Língua Portuguesa,
Matemática e Estudos da Sociedade e da Natureza.
Logo após o lançamento da proposta curricular para EJA, foi publicada a coleção de
livros didáticos Viver, Aprender. No que se refere à Língua Portuguesa, especificando a área
de leitura, a referida coleção traz uma gama de textos bem diversificados, com temáticas bem
interessantes para a modalidade, distribuídos por eixos temáticos, nos três volumes da
coleção. Entretanto, o foco ainda está centrado nas ciências sociais, consequentemente, o
ensino de língua portuguesa não é priorizado.
Segue-se a esse material uma coleção de livros didáticos lançada em 2001, em
Pernambuco, pelo Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação de Jovens e Adultos e
em Educação Popular (NUPEP), essa Coleção de LD para EJA foi baseada em experiências
do NUPEP com o público da EJA.
Apesar dessa coleção ter sido desenvolvida por um grupo que tem amplo
conhecimento e experiências com os sujeitos da EJA, percebemos que a proposta deste
material em relação ao ensino de língua portuguesa, mais especificamente à leitura, também
ainda é limitada, uma vez que são utilizados muitos textos desconectados da realidade dos
alunos. Outro ponto frágil nesta coleção é que percebemos haver pouquíssima diversificação
textual, essa falta de diversificação textual gerou muitas implicações que comprometem a
prática de leitura.
31
Em 2007, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
(SECAD) e a Fundação Interuniversitária de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho
(UNITRABALHO) estabeleceram um convênio, através de recursos do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE), para elaboração de um material específico para EJA
que trouxesse como temática principal o trabalho, sendo assim, neste mesmo ano foi lançada a
Coleção Cadernos de EJA.
Observamos que neste início de século XXI há um avanço significativo no tocante à
disponibilidade de livros didáticos para EJA o que, entretanto, não garante a qualidade, pois,
no trato com a leitura, esses livros didáticos deixam a desejar, uma vez que o foco principal,
ainda hoje, é a utilização da leitura para trabalhar as diversas disciplinas.
Outro aspecto importante a ser considerado é o pequeno volume de leitura que esses
materiais trazem, além do reduzido número de textos, eles não são para serem lidos e
apreciados e sim para se realizarem tarefas, na maioria delas de cunho gramatical. Assim
sendo, acabam transformando o que deveria ser uma leitura intuitiva, pessoal, prazerosa, livre,
em uma atividade didática compulsória, impessoal e utilitária.
A consequência da má qualidade dos livros didáticos aliada a outras questões da
educação pública estão expostas nos índices negativos em relação ao nível de leitura. Por isso,
se constata um índice tão elevado de pessoas jovens e adultas que até conseguem ler e
escrever de forma rudimentar, mas que são incapazes de utilizar de maneira produtiva esses
conhecimentos.
No tocante aos gêneros textuais apresentados nesses livros didáticos, percebe-se que,
na maioria das vezes, são utilizados apenas como pretexto para levar os alunos a discutirem
conteúdos gramaticais e ortográficos, deixando de lado o valor literário que, prioritariamente,
alguns textos possuem.
32
Todas essas deficiências associadas atrapalham a ampliação da proficiência leitora
dos alunos e, consequentemente, não contribuem para a ampliação dos letramentos dos
educandos.
1.2 Os livros didáticos da EJA no início do século XXI
Neste início de século XXI, em muitos locais do país, a EJA ainda acontece a partir
de um atendimento frágil e insuficiente apoiado em projetos federais, contribuindo para a
descontinuidade nas ações da EJA, uma vez que a maioria dos projetos aparece sob a forma
de campanhas e programas aligeirados e improvisados.
Apesar dos dados oficiais mostrarem que o nível de analfabetismo do país entre os
jovens e adultos está em queda, no que tange à capacidade leitora, os dados do Índice
Nacional de Alfabetismo Funcional (INAF) mostram-nos que ainda prevalece um baixo nível
de leitura desses sujeitos, revelando que há uma divisão deste percentual em três grupos bem
distintos, no que diz respeito à capacidade leitora dos sujeitos alfabetizados, ou semialfabetizados, havendo, portanto, sujeitos com diferentes níveis de leitura e de letramento.
Segundo Soares (2003), 30% são denominados letrados em nível 1 – aqueles que
“ultrapassaram o analfabetismo”, sendo minimamente alfabetizados e letrados. Eles
conseguem apenas localizar, em suas leituras, informações simples e explícitas no texto; 38%
possuem um letramento em nível 2 – esses sujeitos dominam o mínimo das práticas letradas.
São os que localizam uma informação no texto a partir de pequenas inferências; os 25%
restantes são os alfabetizados que possuem um letramento em nível 3. Estas pessoas sentem
pouca ou nenhuma dificuldade em relação à leitura, realizam suas leituras comparando
33
informações, realizando inferências a partir das pistas deixadas no texto e identificando
fontes.
Observamos que apenas a minoria da população adulta do país 25%, conseguiram
atingir o nível de letramento 3. Desta maneira, as dificuldades de leitura e interpretação, da
grande maioria dos adultos brasileiros (68%), os impedem de exercer funções mais elevadas
no mercado de trabalho.
Nesse contexto, para esses sujeitos a escola aparece como principal agenciadora de
letramentos. Assim sendo, cabe à escola, promover, de forma significativa, o acesso a vários
gêneros textuais, para que esses sujeitos possam ampliar os seus níveis de leitura. Marcuschi
(2002, p. 19), afirma, a respeito da importância dos gêneros textuais:
Os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados à
vida cultural e social. Fruto de trabalho coletivo, os gêneros contribuem para
ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. São entidades
sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer
situação comunicativa.
Devido à sua importância, os gêneros textuais devem ser discutidos, analisados e
produzidos nas salas de aula, principalmente na EJA. Essa transformação garantiria uma
melhoria no ensino de língua portuguesa, referente ao desenvolvimento das competências de
leitura. Isso só será obtido através da utilização de livros didáticos que garantam que as
práticas de leitura desenvolvidas no espaço escolar estejam o mais próximo possível das
realizadas fora dele.
Para tanto, é necessário que os livros didáticos da EJA insiram o máximo de gêneros
textuais possíveis dos domínios discursivos que circulam na sociedade, já que, a intenção
primordial do ensino de língua portuguesa é auxiliar os educandos na apropriação tanto da
leitura, como da escrita, para poderem ser inclusos em nossa sociedade excludente e injusta.
34
Da mesma maneira, os livros adotados na EJA devem trazer como foco primordial,
não só a diversificação dos gêneros textuais, mas, acima de tudo, a função social dos gêneros
dentro das esferas comunicativas nas quais eles circulam. Desse modo, as atividades de leitura
nas salas de aula estarão contemplando um contexto muito maior que o escolar, em qual o
indivíduo já está inserido antes de chegar à escola.
Enfim, devemos afirmar que a formação de um leitor experiente e letrado depende de
vários fatores e que os atuais livros didáticos sozinhos não dão conta dessa responsabilidade.
Entretanto, evidenciamos que esses manuais didáticos da EJA necessitam ser de melhor
qualidade para auxiliar a leitura dos educandos, desta maneira a leitura deve ter um papel de
destaque, para que não seja utilizada apenas como pretexto para ensinar as outras disciplinas.
Como não há políticas públicas específicas que garantam aos adultos e jovens de
baixa renda disponibilidade e acesso a materiais de leitura fora do espaço escolar,
necessitamos ao menos garantir dentro das instituições escolares, das quais fazemos parte, um
processo que ultrapasse a visão de apenas ensinar a ler e escrever. Ou seja, um ensino de
leitura que agregue o letramento nas suas duas dimensões: individual e social, a aprendizagem
do código e o seu uso nas práticas de leitura e escrita exigidas pela sociedade.
A preocupação com os livros didáticos da EJA deve-se ao fato de reconhecê-los
como uma das principais ferramentas de letramento nas escolas públicas do país, pois
dificilmente há uma escola que não os tenha adotado. Atrelado a isso, para o público da EJA,
devido a questões socioeconômicas, os livros são os únicos materiais de leitura que os alunos
têm acesso, conforme dissemos anteriormente, eles cumprem uma função social relevante na
disseminação de conhecimentos e de saber letrado. Embora já haja tentativa neste sentido,
linguisticamente ainda há lacunas significativas.
35
1.3 Contribuições freireanas para o ensino de leitura na EJA – Freire (1977,
2001, 2003, 2005)
Como já anunciamos neste trabalho, na década de 1960, Freire, mesmo não sendo
linguista se opôs às propostas de leitura que as cartilhas traziam, não condenando o material
didático, mas as frases desconexas existentes, que, segundo ele, constituíam-se a partir de
pseudotextos infantilizados e descontextualizados da realidade dos adultos. Segundo o
educador (1977, p. 14):
Em geral, tanto as palavras quanto os textos das cartilhas nada têm que ver
com a experiência existencial dos alfabetizandos, e quando o têm, se esgota
esta relação ao ser expressada de maneira paternalista, do que resulta serem
tratados os adultos de uma forma que não ousamos sequer chamar de
infantil.
Sendo assim, esse educador foi um dos pioneiros em criticar a alfabetização
mecânica sem reflexão. Ao romper com essa concepção de alfabetização, Freire propôs uma
educação de base dialógica10 na qual os educandos são reconhecidos como ativos,
participantes e construtores de novos conhecimentos.
Nessa perspectiva de educação dialógica, a leitura é compreendida como uma
atividade extremamente importante no processo formativo dos cidadãos, indo muito além de
apenas decodificar letras e palavras. Porque a compreensão de um texto é um processo que se
dá a partir da utilização do conhecimento prévio – o leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o
seu conhecimento adquirido ao longo de sua vida.
10
Para Freire, o educador dialógico, problematizador, compreende que a educação não é uma doação ou
imposição, mas uma devolução sistematizada dos conhecimentos que seus educandos lhes entregam de forma
desorganizada (FREIRE, 2005).
36
Nesse sentido, Freire (op. cit.), já se preocupava, à época, com o letramento dos
educandos, mesmo sem defini-lo, propunha uma alfabetização transformadora atrelada à
realidade social. Isso é ratificado por Kleiman (1995), quando reconhece que Freire propôs
uma possibilidade de alfabetização em que o sujeito alfabetizado tornava-se capaz de usar a
leitura e a escrita como forma de transformar a realidade.
Para Freire (1977), o ideal seria que as aulas de leitura possibilitassem aos
alunos/leitores assumirem um papel ativo e reflexivo no seu processo, ou seja, uma noção de
leitura como interação11. Com essa visão, Freire já apontava para a possibilidade de um
trabalho de leitura baseada em textos significativos para os alunos, inaugurando, portanto, um
ensino de leitura numa perspectiva interacionista.
Partindo dos princípios freireanos, as práticas de leitura na escola devem elevar a
condição de leitor passivo, para uma condição de sujeito ativo que atribui significados aos
diferentes textos que lêem. Segundo Freire (1977), em relação à leitura deve-se trabalhar com
temas que correspondam à realidade dos sujeitos alunos, partindo de situações-problema.
Nessa perspectiva, os textos utilizados em salas de aula devem ser significativos,
escolhidos a partir da realidade e das necessidades dos educandos, e que estejam conectados
aos usos sociais que os sujeitos fazem da leitura e da escrita, pois:
[…] somente a alfabetização que, fundando-se na prática social dos
alfabetizadores, associa a aprendizagem da leitura e da escrita, como um ato
criador, ao exercício da compreensão crítica daquela prática […] oferece
uma contribuição a este processo (FREIRE, 1977, p. 55).
Por isso, é importante que os professores conheçam o perfil de seus alunos, para que
possam provocar no ensino de leitura as motivações e interesses da turma, principalmente, na
11
Apesar de Freire não ter citado Bakhtin, tomamos como referência a definição de interação a partir de Bakhtin
(1997), quando ele afirma que a interação acontece entre os sujeitos, na relação entre “eu” e o “outro”, mediados
pelo signo verbal.
37
EJA, onde há uma significativa diversidade cultural e de interesses, dentro de uma mesma
sala, pois as turmas são heterogêneas, com alunos de faixas etárias e culturas diferentes que
devem ser respeitadas. Conhecendo essa diversidade cultural nas turmas da EJA, o educador
necessita de uma prática pedagógica de leitura interdisciplinar, sem preconceitos, que valorize
todos os gêneros textuais que circulam na sociedade.
Dessa forma, a escola estará contribuindo para transformar a sociedade,
possibilitando uma educação libertadora e problematizadora que valorize o meio social do
qual eles fazem parte (comunidade) e o saber popular do aluno, revelando as mazelas do
mundo, fazendo uma leitura crítica, ou seja, propondo possíveis soluções para as suas
dificuldades profissionais e para os problemas sociais.
O maior legado de Paulo Freire para o ensino de leitura na EJA, foi nos possibilitar
vislumbrar uma educação que promova um tipo de leitor que não se adapte ou se ajuste
inocentemente à realidade que está posta/imposta. Mas que, pelas práticas de leitura, participe
ativamente da transformação social, sempre numa perspectiva de letramento, na qual os
educandos sejam estimulados a criar expectativas de leitura, antecipar sentidos, mudar,
transformar, adaptar e enriquecer o seu conhecimento prévio.
No entanto, em decorrência da lacuna que persiste na formação dos professores da
EJA em Alagoas, tanto nas teorias sobre leitura como nas contribuições freireanas, muitos
professores não conseguem auxiliar os educandos a desenvolverem essas habilidades em
leitura. No próximo capítulo, explicitamos os conceitos e teorias sobre leitura que
fundamentam nossa pesquisa.
38
CAPÍTULO 02 – LEITURA: BASES TEÓRICAS
Neste capítulo, apresentamos a fundamentação teórica sobre leitura de nosso trabalho
e optamos por comentar as teorias sobre leitura que mais influenciam as práticas dos
professores da EJA. Antes, porém, abordamos a escrita, pois entendemos que não há como
separar essas duas habilidades, uma vez que se desenvolvem de forma integrada.
A escrita surge nas sociedades primitivas com a finalidade de comunicar, porém,
com a evolução da humanidade, o domínio dessa habilidade passou a representar detenção de
poder e desenvolvimento. Atualmente, neste início de século XXI, para as culturas letradas a
escrita assume lugar privilegiado, pois os textos permeiam quase todas as atividades, sendo a
maioria das interações sociais e as atividades produtivas realizadas através da escrita.
Para uma sociedade centrada na escrita, como a brasileira, dominar as habilidades de
leitura e escrita é fator indispensável para que os sujeitos participem de forma efetiva das
atividades econômicas e sociais, observa (SILVEIRA, 2005).
Neste contexto, a palavra escrita assume sentidos distintos de acordo com a esfera
social em que ela é utilizada, no entanto, em muitas escolas brasileiras a palavra escrita
aparece, predominantemente, como um único fim e objetivo: o ensino-aprendizado de
conteúdos.
Inferimos que esse seja um dos principais motivos que contribuem para o Brasil
possuir um dos maiores índices de analfabetismo funcional, conforme atestam as pesquisas
realizadas por Soares (1998, 2004), Kleiman (1999), Ribeiro (2003), dentre outros.
39
Ao realizar o recorte sobre a leitura, que é nosso foco de investigação, observa-se
que esses sujeitos apontados nas pesquisas não podem ser considerados como leitores
experientes, já que não fazem uso da leitura e da escrita com freqüência. Segundo o Indicador
Nacional de Analfabetismo (INAF) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
as maiores dificuldades desses sujeitos são as atividades de compreensão leitora.
Mesmo existindo, de certa maneira, um forte discurso em âmbito oficial para se
formar leitores, percebe-se que os projetos federais surgem tentando, sem sucesso, incentivar
o hábito da leitura nas escolas. Essas ações são específicas para o público infantil, já que para
os jovens e adultos analfabetos e semi-alfabetizados do país não há projetos nesse sentido.
Nesses programas oficiais, substituem-se políticas públicas de leitura por iniciativas
quase sempre fragmentadas que não priorizam a formação específica para os educadores que
estão atuando no Ensino Fundamental. Desta forma, enfatiza-se apenas a necessidade das
escolas incentivarem o gosto pelo ato de ler. Sendo assim, Intensificam-se ações para se
despertar o prazer pela leitura, como por exemplo: em 1992 o Programa Nacional de
Incentivo a Leitura (PROLER), a Leitura para todos (2003), e a Literatura em minha casa
(2004), entre outros.
No entanto, não há uma definição sobre que tipo de leitor se pretende formar nas
escolas. Sendo assim, não se reflete sobre os aspectos referentes aos eventos e práticas de
letramento que estão ocorrendo nas salas de aula, da mesma forma, não se enfatizam a
importância dos professores conhecerem as teorias sobre o processamento de leitura.
Reconhecemos que são muitos os agravantes para esta situação, e percebemos que
um dos fatores primordiais é a conceitualização equivocada, ou mesmo o desconhecimento
das concepções de leitura por parte dos educadores. Para Solé (1998, p. 90), “[...] é a
concepção que o professor tem sobre a leitura, o que fará com que ele projete determinadas
40
experiências educativas com relação a ela. Essa lacuna permanece há séculos na formação dos
professores”.
Constatada a ineficiência das escolas públicas em formar cidadãos que compreendam
e interpretem os textos lidos, a partir de meados da década de 1980, no Brasil foram se
intensificando discussões e pesquisas sobre letramento(s) e suas contribuições para o ensino,
chegando essas contribuições à EJA, a partir do final de 1990. Letramento é entendido como a
condição de pessoas ou de grupos sociais de sociedades letradas, que exercem efetivamente as
práticas sociais de leitura e de escrita, participando efetivamente de eventos de letramento
(SOARES, 2003).
O termo letramento chegou ao Brasil através de especialistas das áreas de Educação e
das Ciências Linguísticas, respondendo a uma nova necessidade social, uma vez que não
bastava distinguir o alfabetizado, “aquele que aprendeu a ler e escrever”, do analfabeto,
“aquele que não pode exercer em toda sua plenitude os seus direitos de cidadão”. Era
necessário nomear a condição daquele que sabia ler e escrever e, ainda assim, não fazia uso da
leitura e da escrita (SOARES, 1998, p. 18).
Enquanto educadora da Educação de Jovens e Adultos, acreditamos e defendemos a
perspectiva de Letramento no ensino de leitura para esses sujeitos que, mesmo não tendo
posse das habilidades de leitura e escrita, ao chegarem às escolas, possuem níveis
diferenciados de letramento (que enfocaremos ainda neste capítulo), dependendo dos eventos
e práticas de letramentos vivenciados anteriormente em suas vidas, no seu cotidiano, nas
experiências familiares, em seus trabalhos, e ou através da mídia televisiva.
Analisando o perfil dos sujeitos que frequentam as turmas da EJA da escola
investigada, podemos afirmar que eles têm contato em seu cotidiano com diversos gêneros
textuais nas mais diversas situações de leitura e escrita. Isto é, em decorrência de sua vida
social e profissional envolvem-se em diversas práticas e eventos de letramento: ler um rótulo,
41
ler revistas, jornais, bulas de remédios, receitas de bolos, outdoors nas ruas, pagar contas,
escrever bilhetes, mandar mensagens no celular, entre outras situações que fazem parte do
cotidiano do indivíduo.
Apesar do contato com diversos gêneros textuais fora da escola, a maioria dos
educandos da EJA da escola Safira, demonstra não dominar a habilidade de leitura, sendo
assim, essas pessoas têm uma participação social limitada, uma vez que dependem de outrem
para realizar atividades cotidianas. Mesmo assim, não são impedidas de vivenciarem práticas
e eventos de letramento.
No tocante à experiência com leitura, essas pessoas conseguem apenas utilizar as
estratégias de leitura mais rudimentares como, por exemplo, a interpretação de imagens.
Mesmo a grande maioria já tendo frequentado ou participado de vários programas/projetos de
alfabetização12 não consegue se tornar leitores experientes e maduros, como visto
anteriormente.
Avaliando esse contexto, percebemos a necessidade de aprofundarmos as
investigações a respeito dos eventos e práticas de letramento que estão ocorrendo nas aulas de
leitura das turmas da EJA. Mesmo enfocando em nossa análise os eventos e práticas de
Letramento nas aulas de leitura da EJA, reconhecemos que houve outras contribuições
significativas para área, no tocante à leitura que explicitaremos a seguir.
Como já anunciamos no início deste capítulo, enfatizamos as principais teorias sobre
leitura que mais fundamentaram/fundamentam a prática dos educadores da EJA, analisando,
portanto, as contribuições e ou implicações dessas concepções para o ensino de leitura na
referida modalidade.
12
Podemos citar os mais atuais: o Programa Alfabetização Solidária (ALFASOL) de 1996, conhecido
atualmente como ALFASOL, e o Programa Brasil Alfabetizado, a partir de 2003, até os dias atuais (2008).
42
2.1 Contribuições da concepção interacionista de leitura leitor-texto-leitor –
Koch (2002), Koch e Elias (2006), Kleiman (1989)
No Brasil há muitos pesquisadores e estudiosos da área de leitura que defendem a
aplicação das propostas interacionistas de leitura leitor-texto-leitor, nas salas de aula, entre
eles estão Koch e Elias (2006), Kleiman (1989), entre outros.
Segundo Koch (2002), com os avanços dos estudos da linguística textual, o texto
deixa de ser entendido como uma estrutura acabada. Passa a ser concebido como resultado
parcial da atividade comunicativa humana; que compreende processos, operações e estratégias
que são colocados em ação em situações concretas de interação social.
Koch (op. cit, p. 13) defende a posição de que:
a produção textual é uma atividade verbal, a serviço de fins sociais
e, portanto, inserida em contextos mais complexos de atividades.
• Trata-se de uma atividade consciente, criativa, que
compreende o desenvolvimento de estratégias concretas de ação e a escolha
de meios adequados à realização dos objetivos; isto é, trata-se de uma
atividade intencional que o falante, de conformidade com as condições sob
as quais o texto é produzido, empreende, tentando dar a entender seus
propósitos ao destinatário através da manifestação verbal;
• é uma atividade interacional, visto que os interactantes, de
maneiras diversas, se acham envolvidos na atividade de produção textual.
Os textos são considerados como consequência da atividade verbal de indivíduos
socialmente atuantes. Desta forma, a concepção aqui explicitada postula que o sentido não
está no texto, mas se constrói a partir dele, no curso de uma interação.
Para os autores/pesquisadores que seguem essa concepção, o ato de ler é concebido
enquanto processo que ocorre através da interação entre o leitor e o autor, dependendo de
43
ambos para a construção dos sentidos, pois, nesta concepção o autor no ato da produção de
seus textos deixa pistas linguísticas que são recuperadas pelos leitores/aprendizes. Nessa
hipótese, quando um leitor depara-se com um texto observa os elementos que o compõem,
ativando imediatamente os conhecimentos prévios, ideologias, pontos de vista a respeito do
tema do que está sendo lido.
Nessa concepção, a leitura processa-se a partir das informações presentes no texto e
dos conhecimentos prévios dos leitores.
Segundo Koch e Elias (2006, p. 11):
•
A leitura é uma atividade na qual se leva em conta as experiências e os
conhecimentos do leitor;
•
A leitura de um texto exige do leitor bem mais que o conhecimento do código
linguístico, uma vez que o texto não é simples produto da codificação de um emissor a ser
decodificado por um receptor passivo.
Assim, a leitura passa a ser compreendida como um processo ativo de construção de
sentidos, necessitando da interação entre leitor e autor, tendo como veículo o texto. Sobre o
assunto Kleiman (1989, p. 30) afirma que há muitos autores produzindo reflexões e propostas
que descrevem e utilizam a interação de níveis de conhecimentos necessários à compreensão.
São eles: conhecimento linguístico – discursivo e compreensão (MANDLER e JOHNSON,
1997, KINTSCH, 1978, MORGAN e GREEN, 1980); conhecimento de mundo e
compreensão (SPIRO, 1975, RUMELHART, 198013).
13
MANDLER, J. M. & JOHSON, N. S. Remembrance of things parsed: story structure and recall. Cognitive
psychology, 9, 111-151, 1977. MORGAN, J. L & GREEN, G. Pragmatics and reading comprehension. In:
SPIRO, et alii. (orgs). Theorical issues in reading comprehension. New Jersey: Lawrence Earlbaum Asso,
1980. KINTSCH, W. Comprehension and memory of text. In: ESTES, W. K, (org.). Linguistic functions in
cognitive theory. New Jersey: Lawrence Earlbaum Asso, 1978. RUMELHART, D. E. Schemata: the building
blocks of cognotion. In: SPIRO, et alii. (orgs.). Theorical issues in reading comprehension. New Jersey:
Lawrence Earlbaum Asso, 1980. SPIRO, R. J. Inferential reconstructions in memory for connected
discourse. Technical Report 2, Urbana, III, Center for the Study of Reading, 1975.
44
Segundo Koch & Elias (op. cit., p. 12):
Diferentemente das concepções anteriores, na concepção interacional
(dialógica) da língua, os sujeitos são vistos como atores/construtores sociais,
sujeitos ativos que – dialogicamente – se constroem e são construídos no
texto, considerando o próprio lugar da interação e da constituição dos
interlocutores.
Avaliando a afirmação das autoras, percebe-se que a leitura passa a ser vista como
um processo ativo de construção, pois os estudos interacionistas de leitura reconhecem que as
dificuldades encontradas em relação à compreensão de um texto estão relacionadas não só às
dificuldades de decodificar as unidades linguísticas por parte dos leitores, mas sobretudo, com
a falta de conhecimentos prévios dos sujeitos no ato de ler.
Essa abordagem enfatiza que os autores deixam as marcas de intencionalidade nos
textos produzidos, através das pistas linguísticas, cabendo ao leitor recuperar a intenção do
autor, reconstruindo os sentidos a partir de seus conhecimentos de mundo. Dessa forma, o
leitor deixa de ser um “depósito” de informações contidas no texto e passa a ser um co-autor
do material que está lendo.
Podemos afirmar que a compreensão do texto, neste processo, depende
principalmente do propósito do leitor. Este afirmação nos reporta a Bakhtin (2006, p. 45),
quando ele afirma que:
Todo signo resulta de um consenso entre indivíduos socialmente organizados
no decorrer do processo de interação. Razão pela qual as formas do signo
são condicionadas tanto pela organização de tais indivíduos como pelas
condições em que a interação acontece.
Os professores que adotam esse modelo de leitura acreditam que existem diferentes
formas de leitura para diversas situações da vida, nesse sentido, conforme nos lembra Silveira
45
(2006), compartilhando das ideias de Solé (1998): existe a leitura para deleite (gêneros
literários, anedotas, crônicas, etc.); a leitura para trabalho (gêneros profissionais –
relatórios, manuais de instruções, etc.) a leitura para estudo (gêneros didáticos – exposições,
dissertações, ensaios, etc.); a leitura para auto-ajuda (parábolas, fábulas, pensamentos, etc.) e
algumas outras funções sociais que a leitura assume na sociedade.
Sendo assim, todos os gêneros textuais devem ser prestigiados nas salas de aula da
EJA. Com relação a esse tema, Bakhtin (2006, p. 285), se coloca da seguinte maneira:
Quanto melhor dominamos os gêneros tanto mais livremente os
empregamos, tanto mais plena e nitidamente descobrimos neles a nossa
individualidade (onde isso é possível e necessário), refletimos de modo mais
flexível e sutil a situação singular da comunicação; em suma, realizamos de
modo mais acabado o nosso livre projeto de discursos.
Concordamos com Bakhtin, e afirmamos que a escola necessita preparar seus jovens
e adultos para a prática de uma leitura que seja feita com o objetivo de se construir o sentido
do texto que se lê e não apenas de decodificá-lo, mesmo porque os gêneros que circulam na
sociedade são cheios de intencionalidade. Portanto, marcados ideologicamente, e essa marcas
ideológicas não devem ser ignoradas, ou disfarçadas pelos professores, mas ao contrário
devem ser apresentadas aos alunos para que se possa refletir a respeito do funcionamento
ideológico dos discursos.
Finalmente, acreditamos que a maior contribuição da linguística textual para o ensino
de língua portuguesa é que ela oferece ao professor um instrumental teórico e prático
adequado para o desenvolvimento da competência textual dos alunos, tornando-os, assim,
aptos a interagir socialmente, por meio de textos, dos mais variados gêneros, nas mais
diversas situações de interação social.
46
Com essas contribuições, os professores de português poderão priorizar, em suas
aulas, atividades de leitura e produção de texto, deixando de lado, enfim, o ensino da
gramática com frases soltas e descontextualizadas. Agindo assim, esses professores estarão
possibilitando aos alunos: a) refletirem sobre o funcionamento da língua nas diversas
situações de interação verbal; b) utilizarem os recursos que a língua lhes oferece, para
compreensão e adequação dos textos a diversas situações cotidianas necessárias.
Entretanto, isso só será possível quando os professores da EJA tiverem acesso a essas
discussões atualizadas sobre leitura, para que possam compreender a leitura enquanto
processo de interação de diversos níveis de conhecimento, como o conhecimento linguístico,
o textual, o conhecimento de mundo. E, que esses conhecimentos auxiliem na elaboração de
uma proposta de leitura que valorize os aprendizes/leitores como sujeitos portadores de
conhecimentos, capazes de dialogarem com os autores e negociar significados.
2.2 Contribuições dos conceitos de letramento para o ensino de leitura na EJA –
Soares (1998, 2003, 2004), Queiroz (2004), Marcuschi (2001, 2002)
Durante muito tempo a palavra alfabetização foi suficiente para designar a
aprendizagem inicial da língua escrita: “[...] processo de ensinar e/ou aprender a ler e escrever
e, alfabetizado era aquele que aprendia a ler e escrever” (SOARES, 2003, p. 90).
Esse conceito de alfabetização vem sofrendo inúmeras alterações ao longo da
história, à medida que o analfabetismo vem sendo questionado à proporção que a sociedade
tornou-se cada vez mais grafocêntrica, e exige dos seus sujeitos uma multiplicação e
diversificação de interações sociais e usos e funções da escrita. Por isso, apenas saber ler e
47
escrever revelou-se insuficiente, uma vez que as demandas da sociedade exigiram níveis
diferentes de leitura e escrita, em várias situações comunicativas.
O novo quadro explicita a necessidade de se construir um conceito de alfabetização
bem mais abrangente, ou seja, a necessidade mais urgente no quadro educacional do país,
neste início de século XXI, é reconhecermos que o processo de aquisição da língua escrita
está fortemente ligado a uma condição cognitiva e cultural dos sujeitos. A urgência então é
fazer com os educandos/leitores aprendizes, principalmente os da EJA das escolas públicas,
desenvolvam habilidades de leitura e escrita para que se insiram criticamente na sociedade.
A partir dessa nova realidade abre-se o espaço para o surgimento de alguns termos:
letrado e letramento. A palavra Letramento vem da língua inglesa literacy que tem origem
na palavra latina littera, que significa letra. Por sua vez, cy, é um sufixo que indica
qualidade, condição, estado. Assim, littera + cy, literacy, é a condição de ser letrado.
Letrado, em português, segundo o Dicionário Essencial da Língua Portuguesa de
Luiz Antônio Sacconi (2001, p. 557), significa: “aquele que tem uma sólida cultura,
principalmente literária, versada em letras”; já o termo iletrado, é utilizado para designar uma
“pessoa que não domina nem leitura nem escrita que não possui conhecimentos literários, é
analfabeta ou quase analfabeta”.
Discordamos desta definição, pois acreditamos que os analfabetos também podem ter
certo nível de letramento, na medida em que, não tendo adquirido a tecnologia da escrita,
utilizam-se de quem tem para fazer uso da leitura e da escrita, ou mesmo utilizam estratégias
visuais (números, letras, cores) e outros recursos para conseguir comunicar-se no mundo
letrado, porém com algumas restrições, como foi dito anteriormente.
Optamos pela definição de Soares (1998), quando afirma que Letramento é muito
mais do que alfabetização, é o estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever,
48
mas cultiva e exerce as práticas sociais que usam a escrita. Letrado, então, é o indivíduo que
vive em estado de letramento, envolve-se em práticas sociais respondendo adequadamente às
demandas sociais de leitura e de escrita.
Segundo Freitas, M. (2007, p. 100): [...] o letramento envolve dois processos
fundamentais diferentes: ler e escrever. Processos esses que, apesar de complementares são
diferentes e heterogêneos, representando um conjunto de habilidades linguísticas e
psicológicas. Que acontecem de forma contínua, podendo durar boa parte de nossa vida, além
de ser condição importante para o exercício pleno da cidadania; portanto, estamos sempre
melhorando nosso grau de letramento.
Como podemos observar a definição de Marcuschi aproxima-se da de Freitas, M.
pois ambos defendem a hipótese de que não existe pessoa iletrada, pois mesmo aqueles que
não conseguem fazer uso formal da escrita e da leitura sozinhos, possuem níveis de
letramento, uma vez que estão envolvidos em eventos e práticas de letramento são
considerados letrados.
Para definir eventos e práticas de letramento recorremos à seguinte definição:
Prática de letramento – padrões culturais de uso da leitura e da escrita em
uma situação particular, isto é, as pessoas trazem seu conhecimento cultural
para uma atividade de leitura e escrita, definindo os caminhos para utilizar o
texto escrito em eventos de letramento.
Eventos de letramento – os eventos, por sua vez, são as atividades
particulares nas quais o texto escrito tem um papel. Essas atividades podem
ter certa regularidade (BARTON, 1994, p. 3714).
Especificamente sobre os educandos frequentadores da EJA da escola investigada,
percebemos que eles quase sempre possuem um nível/grau elementar de letramento,
necessitando, portanto, de se apropriarem completamente das habilidades que envolvam a
14
Citado em Jung (2007). BARTON, D. Literacy – an introduction to the ecology of written language. Oxford:
Blackwell, 1994.
49
leitura e a escrita para elevarem seus níveis de letramento. E possam, consequentemente,
ocuparem melhores posições na atual sociedade grafocêntrica, superando, portanto, as
condições de marginalidade em que vivem.
Para definir níveis de letramento, nesta pesquisa, tomamos por base a caracterização
do INAF, considerando as habilidades de leitura dos sujeitos para inserção na sociedade, mais
especificamente no mundo do trabalho:
o
Nível 1 – alfabetismo rudimentar – aqueles que “ultrapassaram o
analfabetismo”, sendo minimamente alfabetizados e letrados, eles conseguem apenas
localizar, em suas leituras, informações simples e explícitas no texto;
o
Nível 2 – alfabetismo básico – sujeitos que dominam o mínimo das práticas
letradas que são os que localizam uma informação no texto a partir de inferências simples;
como por exemplo ler bula de remédio,
o
Nível 3 – alfabetismo pleno – pessoas que sentem pouca ou nenhuma
dificuldade em relação à leitura, realizam suas leituras comparando informações, realizando
inferências a partir das pistas deixadas no texto e identificando fontes.
Analisando os níveis apontados percebemos que o ideal seria que nossos educandos
alcançassem o nível pleno de letramento. Sendo assim, as escolas necessitam ser espaços
privilegiados, onde se reconheçam e se reflita sobre as múltiplas experiências culturais
trazidas pelos sujeitos que as frequentam.
Especificamente, na área de língua portuguesa, deve-se trabalhar em sala de aula
com a diversidade textual que os educandos se deparam, ou possam a vir se deparar nos
diversos ambientem que circulam. Esses gêneros textuais devem ser adquiridos,
principalmente, no cotidiano dos próprios alunos, para posteriormente serem negociados em
eventos e práticas de letramentos em sala de aula.
50
Mesmo essa necessidade sendo anunciada há algum tempo por vários autores tais
como: Bezerra (2002), Marcuschi (2002), Santos (2004), entre outros, as pesquisas apontam
que as práticas de letramento propostas nas turmas da modalidade, com raras exceções, estão
completamente distanciadas das práticas de leitura e escritas vividas no cotidiano dos
educandos, conforme afirma Soares (2003, p. 107) “De certa forma, a escola autonomiza as
atividades de leitura e escrita em relação a suas circunstâncias e usos sociais, criando seus
próprios e peculiares eventos e práticas de letramento”, este é o chamado letramento escolar.
Sendo assim, as práticas de leitura e escrita exercidas no contexto escolar
apresentam-se, na maioria das vezes, desvinculadas dos contextos sócio-culturais reais, ou
seja, há um paradoxo entre as práticas e eventos de letramento que ocorrem dentro e fora da
escola. Uma vez que saber ler e escrever uma centena de palavras e frases não capacita o
indivíduo para a leitura do jornal, de um documento, etc. Daí a necessidade de se letrar os
sujeitos envolvidos no processo de aprendizagem. A respeito do tema, Freitas, M. (2007, p.
98) afirma que: “[...] uma saída apontada pela linguística e pela educação é a perspectiva de se
alfabetizar letrando, já que cada vez mais se exigem níveis mais elevados de conhecimento
em relação à leitura e à escrita”.
Cabe aqui a distinção entre esses dois termos: alfabetizar e letrar que muitas vezes
são considerados sinônimos, para tanto recorremos a Soares (2003, p. 90):
Porque alfabetização e letramento são conceitos frequentemente confundidos
ou sobrepostos, é importante distingui-los, ao mesmo tempo que é
importante também aproximá-los: a distinção é necessária porque a
introdução, no campo da educação, do conceito de letramento tem ameaçado
perigosamente a especificidade do processo de alfabetização; por outro lado,
a aproximação é necessária porque não só o processo de alfabetização,
embora distinto e específico, altera-se e reconfigura-se no quadro do
conceito de letramento, como também este é dependente daquele.
51
Observamos que a autora traz conceitos diferentes para as duas palavras, porém
chama atenção para a dependência de ambos. Seguindo essa concepção, o ideal seria
alfabetizar letrando. Isto significa ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da
leitura e da escrita, possibilitando ao aluno tornar-se alfabetizado e letrado.
O foco do letramento, como dimensão complementar e indissociável da
alfabetização, deve-se privilegiar aspectos relativos à inserção e à participação dos alunos na
cultura escrita, abrangendo capacidades de uso do sistema de escrita e da leitura. Dessa
maneira, alfabetizar-se é muito mais do que apenas aprender a decodificar; aprender a ler e
escrever significa assumir um papel ativo diante dos gêneros textuais, interagindo com os
textos de forma dinâmica, prazerosa e consciente.
Com esta nova proposta os educadores são vistos como agentes de letramento
capazes de articularem ações coletivas nas instituições em prol da comunidade escolar. Por
isso, acreditamos que nós, educadores da EJA, necessitamos viabilizar a participação de
nossos educandos em eventos de letramento que estejam totalmente conectados com a
realidade e ao seu cotidiano, propondo uma prática de leitura, dentro da escola, que
proporcione situações de uso reflexivas sobre o caráter ideológico da leitura.
Sendo assim, os educandos da EJA devem ser expostos a textos que não os
infantilize, mas que ao contrário, os permitam entender o contexto social no qual estão
inseridos, avaliando e participando em seus aspectos políticos, econômicos e culturais,
produzindo novos conceitos a partir de seus conhecimentos prévios. Nessa concepção, a
leitura tem como fim a superação de uma consciência ingênua, na busca de uma consciência
crítica.
Não podemos afirmar que o letramento por si só garanta ao aluno a inclusão social,
mas a falta de letramento determina a exclusão social, já que, o sujeito que possui um alto
nível de letramento é socialmente mais participante, pois ele passa a ter outra condição
52
cultural que se reflete em sua vida social. Esse indivíduo não muda de classe social, porém
seu modo de viver e enxergar a realidade muda e, consequentemente, sua vida é transformada,
bem como a relação com os outros e com a comunidade da qual ele faz parte.
De acordo com o que já explicitamos anteriormente, percebemos a necessidade de
investigar e analisar as práticas e os eventos de letramento desenvolvidos no âmbito escolar,
mais especificamente, nas aulas de leitura das turmas da educação de jovens e adultos das
escolas públicas municipais.
A escolha do tema foi influenciada pela crença de que a escola pública, neste início
de século XXI, aparece entre a família, a rua, o trabalho, a associação, o sindicato, dentre
outras, como a principal agenciadora de letramento para crianças, jovens e adultos. Sobretudo,
das classes populares, recaindo sobre os professores a responsabilidade em desenvolver na
escola o letramento dos educandos.
Reafirmamos a relevância de observarmos se as práticas e os eventos de letramento
nas escolas, principalmente na EJA, estão conectadas ao contexto social dos sujeitos,
possibilitando
oportunidades
para
que
os
sujeitos/estudantes
tornem-se
leitores
experientes/letrados.
2.3 Contribuições dos modelos de leitura – Goodman (1987), Silveira (2005) e
Kato (1999)
Muitos professores da EJA desconhecem os modelos de leitura que poderiam auxiliálos em suas práticas pedagógicas de leitura. Percebendo essa lacuna na formação do professor,
tentamos explicitar neste trabalho os modelos de leitura que mais contribuíram teoricamente
para o entendimento desse processo cognitivo.
53
Os estudos sobre os aspectos cognitivos de leitura têm pouco mais de 100 anos. O
primeiro pesquisador que levantou essa questão foi Huey que, no início do século XX (1908),
reconheceu a leitura como um processo de busca de significado construtivo. Goodman15 ao
falar sobre Huey diz que:
Seu trabalho influenciou o pensamento acerca da leitura no primeiro quartel
do presente século, mas deixou de ser considerado na medida em que a
atenção se desviou para o desenvolvimento de uma tecnologia da leitura
centrada no leitor principiante.
Já a tentativa de se construir modelos que descrevam o processo de leitura tem
apenas 40 anos. Segundo Silveira (2005), uma das poucas publicações nessa perspectiva
ocorreu em 1953, por Jack Holmes, The subtrat-factor theory of reading, obra que, apesar de
ser controvertida, marcou época.
Os modelos de leitura posteriores a esse período, influenciados pelo behaviorismo,
tentaram descrever a leitura em termos de estímulos/respostas, nos quais os estímulos eram
as palavras impressas e as respostas o reconhecimento das palavras. Por isso, o ato de ler era
reduzido a uma simples passagem de estímulos auditivos para estímulos visuais, por isso não
se dava muita atenção ao processo mental envolvido no ato de ler.
Este reflexo da concepção behaviorista nos estudos de linguagem, principalmente na
leitura, fez com que muitos professores-alfabetizadores acreditassem (e acreditem até hoje)
que a língua escrita é mera transcrição da fala. Após a década de 1960, sob a influência da
psicologia cognitiva e da teoria gerativista de Chomsky, houve maior interesse pelos aspectos
cognitivos do ato de ler. Portanto, os modelos de leitura voltaram a enfatizar os processos
ocorridos na mente do leitor. Segundo Silveira (2005) nessa perspectiva, a maioria dos
15
Citado em Silveira 2005.
54
modelos de leitura, do ponto de vista do processamento mental, fundamenta-se em: a) um
processamento ascendente, também chamado de nível inferior, baixo (bottom-up); e em b)
processamento descendente (top-down).
a. Processamento ascendente – bottom-up – uma atividade mental na qual o leitor
identifica as informações visuais (a informação gráfica – palavra ou grupo de palavras) para
depois de analisar essa informação, integrá-la à totalidade da fala e finalmente chegar ao
significado e à compreensão.
Neste modelo o ato de ler representa um processo de identificação de letra por letra
da esquerda para direita, o que implica numa dupla decodificação de letra em som e som
significado. Assim, “ler seria apenas perceber a informação explícita no texto” (Kato, 1999, p.
22). Os autores que mais defenderam essa visão foram Gough e Ruddell.
b. Processamento descendente – top-down, – é quando o leitor atribui significado
ao que lê partindo do seu conhecimento prévio, ou seja, quando o conteúdo do texto lhe é
familiar.
Os teóricos que defendem o processamento descendente, top-down, seguem a linha
dos estudos construtivistas. Entre esses estudiosos podemos citar Goodmam (1987) e Smith
(1989). Para esses autores a leitura é concebida como um processo psicolinguístico complexo,
no qual o leitor constrói os sentidos do texto a partir de seu conhecimento prévio e das
formulações de hipóteses mentais. Este modelo de leitura trouxe grandes contribuições para o
ensino de leitura nas escolas, pois enfatizam que o ato de ler é um processo que depende do
leitor.
Nestes modelos psicolinguísticos, focalizam-se a relação leitor/texto. O leitor usa os
seus pré-conhecimentos para compreender os textos. A aprendizagem passa a ser o resultado
da interação entre o ambiente e as estruturas cognitivas que o aprendiz já possui.
55
No entanto, esse conceito de leitura fundamentado em aspectos cognitivos, centra-se
exclusivamente no leitor, que tem a função de dar significado ao texto por antecipar os
elementos textuais que se seguirão ao longo da leitura, como um jogo de adivinhação.
Portanto, nesta concepção o professor não apresenta aos alunos o processo de leitura,
pois se acredita que ele ocorre de forma inconsciente na mente do leitor, e essa falta de
interferência do professor pode limitar a proficiência leitora dos educandos, pois o leitor
imaturo em algumas situações faz uso excessivo de estratégias sintéticas, ou faz uso de
adivinhações não autorizadas pelo texto (KATO, 1999).
Em decorrência dos dois modelos anteriores, surge posteriormente, uma concepção
em que a leitura é realizada a partir de dois movimentos, o ascendente e o descendente
simultaneamente, ou seja, há uma integração entre os textos lidos e o conhecimento de mundo
do leitor.
Estas reflexões trouxeram contribuições significativas para o ensino de leitura, pois
nos indica que as maiores dificuldades encontradas em relação à compreensão de um texto
estão relacionadas não apenas à dificuldade em decodificar as unidades linguísticas, mas
acima de tudo, à falta de esquemas prévios de conhecimento por parte do leitor.
Apresentamos, em seguida, de forma sucinta os modelos de leitura que mais
contribuíram para as práticas escolares, utilizamos como fundamentação teórica para essa
pesquisa: Silveira (2005), Kleiman (1989), Kato (1999), Koch e Elias (2006), entre outros.
2.3.1 Modelos de leitura ascendente – bottom-up – Gough (1972)
Gough lança, em 1972, um modelo que prioriza os processamentos de baixo para
cima, ou seja, ascendentes, bottom-up. Esse modelo causou polêmica, já que reafirma os
56
conceitos mecanicistas: a decodificação no ato da leitura. Neste modelo, todas as letras são
consideradas individualmente até o leitor identificar a palavra e daí chegar ao significado.
Seguindo essa perspectiva, a teoria de Gough contraria as duas anteriores, a de Goodman e a
de Smith.
Baseados na visão estruturalista da língua, alguns teóricos, entre eles Gough (1972)
conceitua a leitura como um processo apenas de decodificação sonora de unidades
linguísticas. Nesta perspectiva, a leitura é reconhecida como um ato mecânico sem reflexão.
Os modelos de leitura embasados nesta concepção atribuem ao aprendiz/leitor uma função
passiva no ato de ler.
Esses fundamentos embasaram durante décadas as práticas de leitura tradicionais,
principalmente na EJA. Os que seguem este modelo de leitura acreditam que o leitor atingirá
a compreensão a partir da soma das partes e para atinge o sentido do texto.
Percebe-se que, para este modelo, há apenas uma única possibilidade de leitura que
nos remete a uma concepção de linguagem acabada que Geraldi (1997) denomina de
linguagem como instrumento de comunicação. Gough (op. cit.) considera o leitor como um
decodificador que trabalha com todas as informações visuais. Para ele, o leitor não é um
adivinhador, ele caminha pela sentença, letra por letra, palavra por palavra. O autor chama
atenção para o movimento do olho, durante o ato da leitura, o chamado movimento sacádico.
Segundo ele, esse movimento não é propriamente linear, já que o olho faz fixações, regressões
e varreduras para frente e para traz.
Segundo Silveira (2005), devido à sua artificialidade, esse modelo dificulta a sua
aplicabilidade na instrução. Noutras palavras, não se ensinam essas habilidades; a intervenção
do professor se dá no sentido de expor o aluno às experiências de leitura.
57
Nesta perspectiva de leitura, o foco é atribuído ao texto, concebendo a língua como
estrutura, sistema, código, cabendo ao leitor identificar, reconhecer, pelo exercício da
decodificação, os sentidos que estão expressos no texto. Se ler é decodificar, basta que leitor
conheça o código para chegar à evidência dos sentidos. Segundo Koch e Elias (2006, p. 10):
À concepção de língua como estrutura corresponde a de sujeito determinado,
‘assujeitado’ pelo sistema, caracterizado por uma espécie de ‘não
consciência’. [...]. O texto é visto como simples produto da decodificação de
um emissor a ser decodificado pelo leitor/ouvinte.
Como podemos perceber, a função do leitor neste contexto seria irrelevante,
portanto, a história dos sujeitos, suas histórias de leituras, seus conhecimentos de mundo são
desconsiderados. Os professores que se baseiam neste modelo priorizam apenas atividades
com perguntas factuais, em que as respostas desejadas são encontradas em determinados
períodos do texto, sem que seja necessária a reflexão e a leitura mais atenciosa por parte desse
leitor.
Também é inerente a essa concepção o ensino descritivo/normativo da gramática
como condição para a formação de leitores e produtores de texto mais competentes.
Criticando essa forma de educar, Freire (1977, p. 24), afirma que:
O aprendizado da leitura e da escrita, por isso mesmo, não terá significado
real se faz através da repetição puramente mecânica de sílabas. Este
aprendizado só é válido quando, simultaneamente com o domínio do
mecanismo da formação vocabular, o educando vai percebendo o profundo
sentido da linguagem.
Avaliamos, assim, que as atividades elaboradas dessa maneira não permitem que o
aluno reflita sobre a temática do texto, e as respostas apenas decodificadas não favorecem
situações de aprendizagens significativas já que não proporcionam um trabalho cognitivo de
confronto entre os conhecimentos novos e os conhecimentos prévios que o leitor já possui.
58
Portanto, não auxiliam os sujeitos na ampliação de suas estratégias de leitura, e,
consequentemente, não ampliam os níveis de letramentos dos educandos.
Enfim, afirmamos que, nesta visão, o ato de ler possui um caráter meramente técnico,
desconsidera-se, portanto, o seu caráter sócio-histórico. Agindo dessa maneira, a escola
impede a interpretação do aluno e estabelece como únicos intérpretes da língua o professor e,
ou, o autor do texto. Os professores que adotaram/adotam, ainda em pleno século XXI, este
modelo de leitura calcado na decifração do código, acreditam que seus educandos são sujeitos
passivos, que não têm habilidade de produzir seu próprio conhecimento, portanto, são tabulas
rasas, “meros depósitos” que necessitam serem enchidos.
Por conseguinte, após décadas de aplicação de modelos que se baseiam no
processamento ascendente (bottom-up), nas escolas brasileiras, principalmente na EJA,
percebe-se que os educandos não conseguem avançar do nível de analfabetismo funcional,
conforme anunciado anteriormente. O seja, a educação do país “produziu” durante séculos e
ainda continua “produzindo” apenas leitores passivos que não conseguem abranger o sentido
total daquilo que leem. Esta passividade é fruto de imposição de uma leitura com um sentido
único, que privilegia ou o autor dos textos ou o professor que serve como tradutor.
2.3.2 Modelos de leitura descendente – top-down, ênfase nas estratégias de
leitura – Goodman (1987) e Frank Smith (1989)
O modelo de Goodmam, baseado no processamento descendente (top-down),
revolucionou os conceitos mecanicistas vigentes na época (meados de século XX), sobre
leitura, em que ler representava decodificação de palavras. Assim, o leitor trabalhava com um
texto de um modo rígido – palavra-a-palavra, a informação era decifrada de forma automática
59
– do material impresso para a compreensão auditiva, a fim de construir um significado para o
texto.
O mérito deste modelo foi trazer para a leitura a importância da participação do leitor
que tem de usar o seu conhecimento linguístico e experiência para formular e verificar suas
hipóteses, pois considera a leitura uma atividade preditiva, segundo o autor, “A leitura é uma
conduta inteligente e o cérebro é o centro da atividade humana e do processamento da
informação” (GOODMAN, 1987, p. 12). Para construir seu modelo, o autor realizou
experimentos em leitura oral com criança16, trabalhando durante vários anos acumulando
dados.
Após seus estudos Goodman (op. cit) caracterizou o processo de leitura da seguinte
forma:
A leitura é um jogo psicolinguístico de adivinhações. Ela envolve uma
interação entre o pensamento e a linguagem. A leitura eficiente não resulta
de uma percepção exata e da identificação de todos os elementos, mas da
habilidade de selecionar poucas, porém produtivas pistas necessárias para
dar solução correta à adivinhação desde a primeira tentativa. A habilidade de
antecipar o que ainda não foi lido é vital na leitura.
Entendemos que, para Goodman, a leitura representa um processo psicolinguístico
em que o leitor atinge o sentido do texto a partir de seu conhecimento de mundo e da criação
de hipóteses. Uma das características mais significativas desse modelo é a importância
atribuída ao papel da predição na leitura. Para o autor, a capacidade do ser humano predizer
pautas da linguagem é tão intensa que aquilo que acreditamos ver é, em sua maior parte, o que
esperamos ver.
Este conceito sobre leitura baseia-se em aspectos cognitivos, portanto, centralizando
o foco do processo de leitura no leitor que tem a função de dar significado ao texto por
16
Como não há experiências com adultos tomamos esses estudos como referência.
60
antecipar os elementos textuais que se seguirão ao longo da leitura, como um jogo de
adivinhação.
Foi este modelo de leitura que trouxe a noção das estratégias utilizadas pelos leitores
para a compreensão dos textos lidos. As estratégias de leitura são abordadas de maneira
privilegiada nos modelos psicolinguísticos de Goodman e de Smith, de acordo com Goodman
(1987)17, as principais estratégias de leitura são:
Predição, que é a capacidade do leitor antecipar-se ao texto à medida que
vai processando a sua compreensão; a seleção, ou seja, a habilidade de
selecionar apenas os índices que são relevantes à sua compreensão, a
inferência, através da qual o leitor completa a informação, utilizando a sua
competência linguística, o seu conhecimento conceptual e os esquemas que
estão em sua mente, a confirmação, que é utilizada para verificar se as
predições estão certas ou precisam ser reformuladas e, finalmente, a
correção, ou seja, uma vez não confirmada a predição, o leitor levanta
outras hipóteses e busca pistas, sempre na tentativa de encontrar sentido no
que lê.
Essas estratégias de leitura, no entanto, são utilizadas apenas por leitores
proficientes/maduros que conseguem utilizá-las adequadamente em qualquer situação de
leitura, enquanto que os imaturos focalizam a leitura como um processo de decodificação, e
não como um processo de busca de significado.
Devido à sua importância, percebemos que faz-se necessário que as instituições
escolares proporcionem aos aprendizes um ambiente propício para o desenvolvimento das
estratégias de leitura, com estruturas físicas e materiais adequadas. Nessa perspectiva,
entende-se por um ambiente adequado aquele que se caracteriza como um espaço estimulador,
com acesso e iluminação adequados, muitos gêneros textuais disponíveis para leitura, entre
outros. Esses aspectos contribuirão para uma prática de leitura prazerosa, uma vez que esse
leitor se sentirá emocionalmente preparado para o desenvolvimento das estratégias de leitura.
17
Citado em Silveira (2005).
61
Seguindo uma linha construtivista, nesta concepção o professor aparece como
facilitador no momento da leitura. Os seguidores deste modelo acreditam que os alunos
descobrem os significados, os sentidos do que lê, a partir de seu conhecimento e da
subjetividade, sendo assim, o educador nesta perspectiva necessita dar uma ênfase primordial
às estratégias de compreensão.
Nessa mesma vertente psicolinguística, Frank Smith, formula um modelo de leitura
que centra os estudos na descrição dos processos cognitivos e linguísticos que são inerentes
ao ato de ler. Este teórico, também, muito se preocupava com a questão relativa ao ensino de
leitura. Um dos pontos em comum dos estudos de Smith e Goodman é que ambos enfatizam o
papel do conhecimento prévio como fator fundamental para a compreensão na leitura,
valorizando, assim, os processamentos de cima para baixo, ou seja, descendentes, top-down.
Smith (1989) enfatiza a importância de se trabalhar em sala de aula com materiais
que estejam conectados à realidade dos educandos, para que eles possam ativar os
conhecimentos prévios sobre o assunto, devendo haver também sempre uma discussão prévia
antes das leituras. Segundo o autor, as pessoas só conseguem aprender a ler se os materiais e
as atividades que forem ofertadas a eles façam sentidos. Para Smith citado por (SILVEIRA,
2005), esperar que as pessoas aprendam através de textos que não lhes sejam significativos é
o método mais fácil de tornar a leitura impossível.
Outra grande contribuição dos modelos de psicolinguística para a renovação do
ensino da leitura foi o conceito sobre a “Visão de Túnel”. Fato que ocorre quando o leitor não
consegue extrair sentido daquilo que lê, isso pode ocorrer por conta do nervosismo e da
ansiedade, ou quando o leitor não tem conhecimento prévio para compreender o que lê.
Enfim, gostaríamos de reafirmar a importância dos modelos de Smith e Goodman
para as práticas escolares, pois a leitura que antes era vista apenas como ato de codificação e
decodificação passa a ser interpretada também como um processo ativo, considerando os
62
leitores como capazes de raciocinar e extrair sentidos dos textos a que são submetidos a partir
de seus conhecimentos prévios. Sendo assim, nessa perspectiva, o aprendiz deixa de ser visto
como um recipiente passivo de estímulos do ambiente, passando a assumir um papel
fundamental no processo de leitura, uma vez que tem que usar todo o seu conhecimento
linguístico e experiências para formular e verificar suas hipóteses.
2.3.3 Modelo de processamento automático – modelo de LAaberge e Samuels
(1984)
Na década de 1970, LAaBerge e Samuels formulam um modelo de leitura complexo
que aborda o processamento de informação do ato de ler, reforçando assim as pesquisas
anteriores com essa mesma vertente. Segundo Kleiman (1989), os autores do modelo
postulam três estágios pelos quais a aprendizagem perceptual passa, a fim de que o
processamento venha a se tornar automático:
1º Estágio – O leitor busca nos estímulos visuais os traços distintivos.
2º Estágio – Nesse estágio se faz necessária a maior atenção do aprendiz, pois é nesta
fase que o mesmo constrói um código de letras baseado na organização dos traços relevantes.
3º Estágio – Momento em que a organização dos traços relevantes se torna
automática, ou seja, o sujeito alcança o estágio de unificação – scanning.
Segundo Silveira (2005), o modelo tem sofrido várias complementações, porém,
existem cinco componentes básicos neste modelo, são eles:
•
A memória visual (MV)
•
A memória fonológica (MF)
63
•
A memória semântica (MS)
•
A memória episódica (ME)
•
A atenção (A)
•
A memória visual
Na memória visual é onde ocorre o processamento da informação impressa. A prática
e a habilidade do leitor podem determinar a extensão da unidade visual a ser processada. Na
percepção visual, o leitor inexperiente se esforça várias vezes discriminando os traços
peculiares das letras, até construir um código de letra, já o leitor maduro não vê mais letras
isoladas e sim blocos, que são as palavras.
•
Memória fonológica
A memória fonológica fornece uma mediação entre a memória visual e a memória
semântica. Os autores admitem que quando uma unidade visual é recodificada numa unidade
fonológica, essa informação fonológica é passada à memória semântica, onde é processada
para obter o significado.
Apesar dessa questão da mediação fonológica ser controvertida parece haver um
consenso entre os autores de que todos os leitores recorrem à recodificação. Os leitores nos
estágios iniciais do aprendizado da leitura, bem como os leitores maduros quando se deparam
com uma passagem difícil de um texto, também recorrem a esse recurso.
64
•
Memória semântica
A memória semântica envolve a experiência de mundo do leitor, é nela que estão
armazenados os nossos conhecimentos. Outros estudiosos chamam-na de memória a longo
prazo, informação não-visual ou conhecimento prévio.
•
Memória episódica
Essa memória está diretamente ligada à lembrança de eventos específicos. São
lembranças de pessoas, objetos, espaço e tempo, no entanto a memória episódica só é
importante no aprendizado de leitura de iniciantes, e não para leitura fluente.
•
A atenção
O ponto fundamental deste modelo é a atenção. Para Samuels e Kamil (1984), a
atenção é essencial para a obtenção do significado do texto durante o ato de ler. Existem duas
tarefas em que a atenção é utilizada: na decodificação e na compreensão. Segundo os autores,
a compreensão exige sempre atenção, já na decodificação pode haver mais ou menos atenção.
Segundo Silveira (2005, p. 33):
A mudança da atenção no leitor maduro, só vai ocorrer esporadicamente,
quando, por exemplo, forem encontradas no texto palavras não-familiares ao
leitor, quando houver falhas na impressão ou quando o texto estiver escrito
com um tipo de letra incomum. Nesse momento, ocorre uma
65
desautomatização do processo de decodificação, exigindo do leitor uma
quantidade adicional de atenção para essa tarefa.
Desta forma, com a prática constante de leitura, o leitor maduro passa quase a não
usar atenção na decodificação, pode-se dizer então que esse leitor já consegue automatizar o
processo da decodificação. Ele realiza nesse nível as duas tarefas ao mesmo tempo: a
decodificação e a compreensão.
2.3.4 Modelos interativos de leitura – Rumelhart (1974), Stanovich (1977)
Os modelos interativos de leitura enfatizam que, no ato de ler, os leitores utilizam os
dois movimentos, o ascendente e descendente simultaneamente. Ou seja, para o autor há uma
integração entre a informação encontrada no texto e no conhecimento prévio do leitor.
Assim, essa vertente defende o pressuposto de que um leitor imaturo que ainda
utiliza muito do processamento (bottom-up), para reconhecer as letras, pode, ao mesmo
tempo, quando conhecedor do assunto do texto, fazer uso dos processamentos descendentes
(ou top-down) para compensar essa deficiência.
O inverso também ocorre quando um leitor proficiente se depara com um texto que
possui um assunto que não domina. Nessas circunstâncias, ele apela para os processos
ascendentes, bottom-up para conseguir compreender o texto. Isso implica que, os dois
processos são utilizados tanto pelo leitor maduro quanto pelo leitor imaturo, dependendo da
circunstância.
Nestes modelos interativos, as várias fontes influenciam umas às outras, para
processar a interpretação definitiva do texto, ou seja, os processos mais altos, conhecimento
66
sintático e semântico, têm influência sobre os processos mais baixos, conhecimento lexical e
conhecimento ortográfico, na tarefa da compreensão. Segundo Silveira (2005) os principais
componentes dos modelos interativos (RUMELHART) são:
•
a fonte de informação visual;
•
o sintetizador de padrões;
•
o conhecimento sintático;
•
o conhecimento semântico;
•
o conhecimento ortográfico;
•
o conhecimento lexical.
Notamos que esse modelo interativo de Rumelhart se aproxima muito da forma como
o
cérebro
humano
trabalha,
pois
pressupõe
vários
processamentos
trabalhando
interativamente. Neste modelo interativo os processos mais altos, conhecimentos sintático e
semântico, têm influência sobre os processos mais baixos, conhecimento lexical e
conhecimento ortográfico, na tarefa da compreensão.
A partir do que foi exposto neste capítulo, podemos afirmar que todos esses modelos
trouxeram grandes contribuições para o ensino de leitura, pois a partir desses estudos
percebemos que há uma relação direta entre o sujeito, leitor e texto. Da mesma forma,
baseados nos conhecimentos sobre os processos cognitivos, deduzimos que existe relação
entre a linguagem escrita e a compreensão, entre a memória e as inferências.
Os modelos de leitura demonstraram que a compreensão ocorre quando os leitores
conseguem decodificar sinais gráficos e usar o conhecimento armazenado na memória, sendo
capazes, assim, de interagir com o escritor e com os textos.
67
Enfim, gostaríamos de afirmar que os modelos de leitura podem auxiliar o professor
a perceber que a decodificação não é suficiente no processo de leitura, mas é uma etapa
essencial e deve ser dominada logo no início da escolarização. Em outras palavras, afirmamos
que a fase da decodificação é extremamente importante para os leitores na fase inicial da
aquisição da leitura.
A partir da compreensão desses modelos, os professores poderão perceber que os
educandos/leitores no processo de aquisição de leitura passam por vários estágios até
assumirem um comportamento de leitor maduro e experiente. Nas perspectivas mais atuais
dos modelos de leitura, principalmente no modelo interativo, a aprendizagem é compreendida
como uma interação entre o ambiente e as estruturas cognitivas que o aprendiz já possui.
Dessa forma, não negamos as contribuições sobre leitura expressas neste capítulo
que servirão de pano de fundo para a análise do corpus, sobretudo, as relativas ao letramento
e à leitura como interação. No próximo capítulo, expomos o percurso metodológico da
pesquisa no qual situamos: os sujeitos da pesquisa, a caracterização da escola observada e
outros dados relevantes desta investigação.
68
CAPÍTULO 3 – O UNIVERSO DA PESQUISA
Este capítulo tem como objetivo apresentar o percurso metodológico de nossa
pesquisa, explicitando os cenários, os sujeitos envolvidos no estudo, os instrumentos e os
procedimentos utilizados. Conforme anunciamos na introdução, o interesse deste trabalho está
centrado nas aulas de língua materna, especificamente com o olhar voltado para as práticas de
leitura que estão sendo utilizadas nas salas de aulas da Educação de Jovens e Adultos.
O corpora de nosso trabalho foi retirado do contexto real, a partir de duas fontes: a)
falas dos alunos da escola observada no grupo focal, b) as aulas de leitura observadas e seus
desdobramentos, sendo a análise detalhada sobre as observações realizadas nas aulas de
leitura, conforme mencionamos anteriormente.
3.1 Metodologia da investigação
Para a realização deste trabalho, utilizamos o método de pesquisa qualitativointerpretativo, baseado em estudo de caso. A opção por esse tipo de pesquisa dá-se porque
trabalhamos com dados retirados do contexto real, no caso específico, as aulas de leitura de
duas professoras de uma escola pública municipal, situada na cidade Maceió. Entendemos que
esse enfoque tem a finalidade de não constituir-se em previsão nem em controle, mas visa a
compreensão dos fenômenos e a formação dos que participam neles para que sua atuação seja
mais reflexiva, rica e eficaz.
69
A escolha do estudo de caso deu-se porque esta abordagem tem seus contornos
claramente definidos no desenrolar do estudo, pois mesmo sendo similar a outros é, ao mesmo
tempo, singular, pois incide naquilo que ele tem de interesse próprio e particular (ANDRÉ &
LUDKE, 1986). Evidentemente, seus resultados são limitados, em termos de possibilidade de
generalizações, mas permitem a riqueza de aprofundamento do que vem a ser apurado. O
estudo de caso, explicitado nesta pesquisa localizou-se em duas salas de aula de pósalfabetização de jovens e adultos de uma escola pública municipal situada na periferia urbana
de Maceió.
O conceito de sala de aula no qual acreditamos assemelha-se ao de Nunes-Macedo
(2004, p. 18) quando ela afirma que é:
‘comunidade culturalmente constituída’ por meio da participação de
diferentes sujeitos que assumem diferentes papéis no processo de ensinoaprendizagem. Nessa perspectiva, a aprendizagem é definida
situacionalmente por meio das formas em que professores e alunos
constroem os padrões e práticas da vida de cada sala de aula.
Acreditando nessa afirmativa, esta pesquisa tem como eixo norteador a seguinte
problematização: até que ponto os eventos e práticas de leitura, ocorridos nas aulas das
turmas de pós-alfabetização em EJA, permitem os(as) alunos(as) tornarem-se
leitores(as) experientes/maduros?
Nesse sentido, compreendemos que a pesquisa qualitativa é relevante porque em
termos metodológicos é ela que nos possibilitará um olhar reflexivo e flexível sobre as
70
práticas de leitura que estão ocorrendo nas salas de aula das 3ª fases18 do primeiro segmento
da EJA19.
Com essa metodologia foi possível interpretarmos a realidade, avaliando de que
forma as práticas dos/as professores/as da EJA, nas aulas de leitura, estão auxiliando os
educandos a tornarem-se leitores proficientes. A relevância do tema dá-se pela contribuição
que esta temática trará para a formação inicial e continuada dos professores da EJA.
Levantamos as seguintes hipóteses como norteadoras deste trabalho:
Os eventos de letramento proporcionados aos sujeitos, nas aulas de leitura,
estão vinculados aos contextos sócio-culturais que ocorrem fora do contexto escolar;
O ensino de leitura está ocupando um lugar privilegiado nas salas de aula da
terceira fase da EJA, ou aparece como coadjuvante, no processo escolar;
O professor da EJA agencia, nas aulas de leitura, práticas de letramentos
significativas que auxiliem os educandos a tornarem-se leitores proficientes;
O professor da EJA trabalha os gêneros textuais em sala considerando suas
funções e os aspectos comunicativos e interacionais, ou limita-se a utilizá-los como suportes
para realização de atividades.
18
vide nota 3.
A terceira fase do primeiro segmento da EJA corresponde ao 5º ano do ensino fundamental. A EJA, nas
escolas da Rede Municipal de Educação é ofertada em três segmentos: 1º, 2º 3º. O primeiro segmento
corresponde a uma formação básica do 1º ao 5º ano.
19
71
A escolha por aulas de leitura do sistema educacional público é decorrente de uma
curiosidade epistemológica, ou seja, deu-se porque como professora da EJA da rede pública,
sempre me inquietaram as dificuldades constantes, minhas e de outras professoras do primeiro
segmento da EJA, em auxiliar os educandos a tornarem-se leitores proficientes.
Mesmo acreditando que o letramento ocorre em diversos lugares, gostaríamos de
reafirmar que a maioria de nossos educandos, por falta de recursos seus e de suas famílias, só
têm convívio mais prolongado com portadores de textos nas escolas. Levando em
consideração esse pressuposto, a ênfase no ensino de leitura nos indicará como nossos
educandos da EJA, do primeiro segmento do Ensino Fundamental da EJA, estão tendo
oportunidades significativas de acesso à leitura no espaço de sala de aula. Dessa maneira, o
nosso objeto de estudo centrou-se em observações de aulas de língua materna
3.2 Instrumentos/técnicas da pesquisa
Os dados desta pesquisa foram colhidos no segundo semestre de 2007 e entre o
primeiro e segundo semestres de 2008, envolvendo duas professoras da 3ª fase da EJA20,
pertencentes ao quadro docente da Secretaria Municipal de Educação de Maceió (SEMED).
As educadoras estão sendo identificadas, neste trabalho como: F1 e F2, para manter o
anonimato preservando os sujeitos envolvidos na pesquisa. Os critérios para a escolha das
professoras foram:
Possuir vínculo efetivo com a SEMED, por meio de concurso público;
•
20
Atuar na EJA por mais de três anos;
Em nossa pesquisa estabelecemos critérios de seleção dos/as profissionais que atuam na EJA. Após a análise
foram selecionadas duas professoras que atenderam a todos os pré-requisitos.
72
•
Ser regente em turma de 3ª fase.
Para a realização da referida pesquisa observamos aulas de Língua Portuguesa.
Foram ao todo 20 aulas observadas (10 aulas em cada turma), nas quais pelo planejamento
das profissionais as aulas de língua materna teriam como enfoque o ensino de leitura.
A escola pesquisada foi escolhida por dois motivos: a) conter grande quantidade de
turmas de EJA do primeiro segmento – são ao todo oito turmas, b) por sua importância
histórica enquanto formadora de trabalhadores no bairro onde está localizada. A referida
instituição é uma escola pública do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação
de Maceió (SEMED). Para manter o anonimato decidimos dar-lhe o nome fictício de Escola
Safira21.
Para o levantamento dos dados e posterior análise recorremos às seguintes
técnicas/instrumentos:
•
Levantamento bibliográfico a respeito dos conceitos e teorias sobre leitura
e letramento; da mesma maneira, recorremos à análise bibliográfica sobre materiais e livros
didáticos mais utilizados na referida modalidade. Os textos pesquisados nos permitiram
retratar o histórico dos livros didáticos e materiais didáticos e língua portuguesa que foram
produzidos e utilizados direta, ou indiretamente na EJA. Essa técnica nos possibilitou analisar
materiais como: artigos científicos e livros elaborados especificamente sobre o tema. Moreira
e Caleffe (1996, p. 20), afirmam que o objetivo primordial dessa técnica é: “colocar o
pesquisador em contato direto com tudo o que já foi produzido na área em questão”;
21
Nessa instituição, atuo como coordenadora pedagógica e leciono a disciplina Educação e Trabalho no 2º
segmento da Educação de Jovens e Adultos (EJA), no horário noturno.
73
•
Diário de bordo das aulas de Língua Portuguesa da EJA, cuja técnica nos
possibilitou realizar os recortes dos trechos para análise do nosso objeto de estudo. Para
melhor avaliação dos eventos e práticas de letramento ocorridos nas aulas de leitura
recorremos à gravação das aulas.
•
Entrevista semi-estruturada aplicada às professoras, essas entrevistas nos
auxiliaram a definir o perfil das educadoras. A escolha desse tipo de entrevista deve-se ao fato
de preferirmos uma atmosfera na qual o entrevistado não se sinta pressionado ao responder
aos questionamentos levantados, possibilitando, assim, um diálogo no qual o sujeito
investigado se coloque de forma espontânea. Segundo Moreira e Caleffe (2006, p. 168), com
esta técnica: “O pesquisador pode elaborar uma lista de perguntas ou tópicos que deseja
explorar, mas deve estar preparado para que os entrevistados falem à vontade”.
•
Análise documental, baseada no Projeto Político-Pedagógico da Escola
(PPP), sobre o perfil da instituição e o histórico do bairro. Este material foi utilizado para
elaborarmos a caracterização do bairro e da escola pesquisada. A análise documental
assemelha-se à bibliográfica diferindo, apenas, na natureza das fontes, uma vez que, na
documental, a fonte utilizada são restritamente documentos. Com a análise documental o
pesquisador pode buscar informações factuais nos documentos a partir de questões ou
hipóteses e interesses. Segundo Ludke e André (1986, p. 38):
São considerados documentos quaisquer materiais escritos que possam ser
usados como fonte de informação sobre o comportamento humano. [...]
Estes incluem desde leis e regulamentos, normas, pareceres, cartas, jornais,
revistas, discursos, roteiros de programas de rádio e televisão, até livros,
estatísticas e arquivos escolares.
•
Grupo focal, aplicado aos alunos das turmas observadas. Com esta técnica,
podemos avaliar a importância e a presença da leitura na vida desses sujeitos. Essa técnica é
74
derivada das diferentes formas de trabalho com grupos, e tem sido amplamente utilizada na
psicologia social. A respeito dessa técnica Gatti (2005, p. 7), afirma que:
Privilegia-se a seleção dos participantes seguindo alguns critérios –
conforme o problema em estudo –, desde que eles possuam algumas
características em comum e que os qualificam para a discussão da questão
que será o foco do trabalho interativo e da coleta do material
discursivo/expressivo.
•
Questionário aplicado às professoras – o uso de questionário nos auxiliou
na coleta de informações, no que diz respeito às características pessoais e de formação das
profissionais que estão atuando no primeiro segmento da EJA, na escola investigada.
3.3 Caracterização da escola
Para a caracterização da escola, objeto de nosso estudo, recorremos ao Projeto
Político-Pedagógico da escola, reelaborado no ano de 2008 que nos serviu como fonte
documental para elaborarmos a descrição que se segue.
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Safira oferece, nos turnos diurnos,
educação infantil, 1ª ao 5º ano do ensino fundamental22; no horário noturno, 1º e 2º segmentos
de jovens e adultos. Inicialmente a escola funcionava com a pré-escola (alfabetização) e de 1ª
a 4ª série nos três turnos. No ano de 1984, foram extintas as turmas de alfabetização,
funcionando apenas com as turmas de 1ª a 4ª série durante o diurno, sendo que em fevereiro
de 1994 passou a trabalhar com a Educação de Jovens e Adultos (EJA). A partir do ano de
2007 começou a oferecer o 2º segmento da EJA. Neste ano de 2009, segundo dados
22
A escola encontra-se no processo de implantação do ensino de 9 anos.
75
recolhidos nos arquivos da secretaria da escola investigada, são atendidos 1.440 alunos nos
três turnos.
No turno matutino – funcionam 11 turmas, sendo: três 1ª séries, três 2ª séries, duas 3ª
séries e três 4ª séries, no vespertino – oferecem-se duas turmas de 1ª série, duas de 2ª série,
três de 3ª série e três de 4ª série; no noturno, na Educação de Jovens e Adultos, são 11 turmas
distribuídas da seguinte maneira: 1º segmento – três turmas de 1ª fase, duas turmas de 2ª fase
e três turmas de 3ª fase, no 2º segmento – duas turmas de 4ª fase e uma de 5ª fase.
A escola possui 11 salas de aula, mais duas “salas de recursos” anexas à escola para
atender a pessoas portadoras de deficiência mental e visual. Pedagogicamente, a escola
funciona em precárias condições físicas e humanas, havendo limitação de espaços e pessoal
especializado para os atendimentos, principalmente, os psicológicos e psicopedagógicos.
No tocante à leitura não há espaço específico para realização dessa prática fora das
salas de aula, uma vez que a sala de leitura que funcionava precariamente, a partir de 2008,
foi desativada para que fosse instalado um laboratório de informática. O acervo de livros que
estava neste local fora amontoado em uma sala de recurso que funciona anexa à escola. Esse
espaço é inseguro, pouco iluminado, sem ventilação e comporta no máximo quinze alunos.
Diante dessa improvisação, os professores não se sentem motivados a levarem os alunos até
lá.
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Safira situa-se na periferia urbana no
município de Maceió, em um dos bairros mais populosos e violentos da capital alagoana, o
Jacintinho. Esse nome foi uma homenagem ao Sr. Jacinto Athayde, descendente de
portugueses, ex-proprietário de um imenso sítio com predominância de Mata Atlântica, que
arrendava às famílias pobres, vindas do interior do Estado, pequenos pedaços de terras.
76
Aos poucos, essas pessoas iniciaram a construção de pequenas casas nos arredores de
seu casarão, entre o bairro do Poço e a Ladeira da Pedra, atualmente mais conhecida pelos
habitantes do bairro como Ladeira do Canal Cinco, por sediar a emissora de televisão – TV
Alagoas, afiliada ao Sistema Brasileiro de Televisão (SBT). E em troca da sua acolhida, essas
pessoas prestavam serviços ao mesmo. Na década de 1950, atraídos pelas possibilidades de
emprego na capital, foi-se intensificando a chegada de novos moradores que se instalavam
desordenadamente no novo bairro, que surgia então com o nome de Jacintinho.
Neste início de século XXI, o bairro ainda se encontra carente de conservação e
investimento do poder público. Esse é um dos fatores que contribuem para a existência de 15
favelas/grotas e uma ‘’cidade de lona’’, o que gera problemas graves como falta de
saneamento básico, reduzido número de ônibus, coleta deficiente de lixo nas áreas das grotas,
grande número de meninos(as) de rua e uso de drogas.
O bairro permanece, há décadas, sem investimento em todos os aspectos. Só há um
posto de saúde para atender a toda comunidade, faltam espaços culturais e de lazer. Situado na
parte alta da cidade, por causa de seu relevo acidentado, apresenta várias grotas23. São assim
denominadas de grotas: do Cigano, do Arroz, do Seu Artur, do Rafael, da Bananeira, do
Moreira, do Frei Damião, da Aldeia do Índio, das Piabas, do Alto do Boi e os conjuntos
habitacionais: Castelo Branco II24 (COHAB), Mutirão e José da Silva Peixoto. Em muitos
desses locais, não há energia elétrica, água encanada, lugar para depositar o lixo e os dejetos;
em algumas localidades não há telefones públicos (orelhões).25
23
O termo grota é utilizado no Estado de Alagoas, principalmente em Maceió, para caracterizar um processo de
ocupação desordenada, resultando em favelização, que ocorreu em locais com relevo acidentado, vales
profundos produzidos em montanhas, causados por enchentes.
24
Construído pela então Companhia de Habitação (COHAB). Órgão responsável nas décadas de 1970 e 1980, no
Estado de Alagoas pela construção de casas populares.
25
Essa realidade pôde ser observada in loco em uma pesquisa de campo, para realização da reelaboração
curricular, baseada em Rede Temática, realizada pelo corpo docente da escola em 2007, que tinha o objetivo de
coletar falas de pessoas da comunidade escolar.
77
Outro fator agravado pelo descaso dos governantes com o bairro, diz respeito à falta
de segurança pública, havendo registros de altos índices de violência. São cometidos vários
tipos de delitos: furtos, assaltos, roubos, arrombamentos, porte e consumo de drogas,
homicídios, porte ilegal de armas, desordem, entre outros.
Existe no bairro uma forte influência das instituições religiosas. Há a predominância
das igrejas evangélicas, mas a comunidade possui templos de diversas religiões, tais como:
Assembleia de Deus, Maranata, Testemunhas de Jeová, Quadrangular, Batista. E algumas
igrejas católicas como a Comunidade de Santa Isabel e Nossa Senhora das Dores, além de
terreiros de Candomblé. Isso faz com que tenhamos no bairro e também nas escolas uma
enorme diversidade cultural.
Sob o aspecto econômico, o bairro possui uma área de grande comércio com muitas
lojas, supermercados, bombonieres e o tradicional mercado público municipal que funciona
todos os dias da semana, correios, casas lotéricas, delegacias, várias escolas, um canal de
televisão e duas emissoras de rádio. Da mesma maneira, percebe-se uma forte influência do
trabalho informal, por haver significativa quantidade de trabalhadores que não conseguem
ingressar no mercado formal. Assim, a informalidade representa o sustentáculo de muitas
famílias da comunidade.
Outra opção de empregabilidade para os jovens e adultos é a ocupação em subempregos, todos com relações não-contratuais e muitas vezes de base familiar. Desta forma,
em Alagoas, segue-se a perspectiva que tem sido fortemente ampliada no Brasil, de
flexibilidade da remuneração do trabalho, como afirma Tavares (2004, p. 49): “A força da
economia informal nos tempos de crise residiria nos laços pessoais, e não nos salariais, que
unissem o pequeno patrão e sua mão-de-obra essencialmente familiar”.
Essas práticas de trabalho domiciliar são defendidas pelo discurso dominante
ressaltando o seu caráter autônomo, e tenta obscurecer a precarização do trabalho e a sua
78
exploração brutal, escravizando homens, mulheres, jovens e crianças que acabam sendo
impedidos de estudar para lutarem por sua sobrevivência.
3.4 Sujeitos da pesquisa
3.4.1 Educandos/leitores enquanto usuários da língua
Os Jovens e Adultos que frequentam as turmas da EJA, da escola investigada, são
pessoas que possuem conhecimentos adquiridos na vida cotidiana, através das experiências
com familiares, comunidade, mundo do trabalho, e em saídas e entradas da escola. Podem ser
caracterizados de acordo com a visão de Freire (2001), como pessoas que possuem uma
leitura de mundo que antecede a leitura da palavra. Entretanto, muitas vezes, as experiências
anteriores e os conhecimentos prévios desses alunos são simplesmente apagados ao chegarem
à escola.
Em geral, esses sujeitos voltam à escola reconhecendo que o aprendizado alcançado
anteriormente, de maneira formal ou informal, não lhes garantiu a independência e a inclusão
desejada numa sociedade competitiva e excludente. Observam, portanto, que seus níveis de
leitura e de escrita os colocam sempre em posição de desvantagens perante aqueles que
dominam essas habilidades. Sendo assim, apresentam o sentimento de incapacidade e
incompetência diante da aprendizagem. Entretanto, a escola finge não enxergar essa realidade
e tentam impor um currículo padrão, desrespeitando a diversidade em nome da
competitividade.
Em seus depoimentos, coletados no grupo focal, os educandos afirmam que o retorno
à escola deve-se à imposição do mercado de trabalho e, para outros, há o desejo de adquirir as
79
habilidades básicas de leitura e escrita. Segundo esses mesmos alunos, entre os adultos
prevalece a ansiedade em adquirir as habilidades de leitura para, sozinhos, realizarem a leitura
dos livros religiosos (a exemplo a Bíblia), conseguir “pegar” ônibus sem necessitar de ajuda
de outras pessoas, ler extratos bancários, ler receitas culinárias, enviar e receber mensagens no
celular.
Entre outros, para os jovens26 e adolescentes a necessidade mais urgente em relação à
aquisição da leitura é o desejo da elevação da escolaridade para o ingresso no mercado de
trabalho. Os jovens da EJA veem na escolarização, através da leitura, a possibilidade de
ascensão profissional e pessoal.
Assim, esses educandos que frequentam não só as turmas observadas, mas a escola
como um todo no horário noturno, demonstram grande interesse por diferentes práticas de
leitura. Muitos deles são oriundos de famílias analfabetas, por isso esperam que as instituições
lhes possibilitem a apropriação da leitura para usá-la no dia-a-dia ou no mundo trabalho,
exercendo melhor seus papéis na sociedade.
3.4.2 Educandos, aspectos sócio-econômicos
Para o levantamento dos dados sobre os educandos que estão frequentando as duas
turmas observadas, utilizamos como referência os perfis das turmas que nos foram cedidos
pelas professoras. Esses perfis foram elaborados a partir de depoimentos e produções textuais
coletados em sala.
26
Nesse sentido o Governo Federal, implantou o Projovem em 2006, tentando atrelar a escolarização à iniciação
profissional. A partir de 2008, o Projovem ampliou o atendimento ao adolescente, ao jovem e às pessoas do
campo, denominado de Projovem adolescente, Projovem urbano e o Projovem do campo.
80
Os/as alunos/as que estão frequentando essas duas turmas, objetos de nossa pesquisa,
são na maioria do gênero masculino – 60% homens e 40% mulheres, distribuídos da seguinte
forma no período da pesquisa:
•
Estavam frequentando a turma da professora F1 - 33 alunos, 20 homens e
13 mulheres (os dados foram recolhidos no segundo semestre de 2007);
•
Na turma da professora F2 estavam frequentando entre 08 e 15 alunos,
sendo 9 homens e 6 mulheres (dados coletados no primeiro e segundo semestres de 2008).
Esses sujeitos são, em grande maioria, vítimas da indiferença, do desemprego e do
descaso, socialmente estigmatizados e excluídos, e muitas vezes, vítimas ou envolvidos em
casos de violência. Na escola, como nos chama atenção Andrade (2004), de maneira geral são
tratados como uma massa de alunos, sem identidade, qualificados sob diferentes nomes:
repetentes, evadidos, defasados, relacionados diretamente ao chamado "fracasso escolar".
As turmas da EJA da escola Safira, como vimos no parágrafo anterior, são compostas
de adolescentes, jovens e adultos desempregados ou trabalhadores em situação informal,
idosos aposentados ou jovens e adultos que trabalham como: comerciários, donas de casa,
pedreiros e porteiros, ganhando um salário mínimo ou menos. São sujeitos oriundos da
periferia – são os “fugitivos da seca” que assola a zona rural. Acreditamos que isso se deva a
quase inexistência de políticas públicas que gerem empregos e rendas para a população do
Estado e do município, tanto na zona urbana como na rural.
Esses educandos e educandas se autodeclaram de cor branca e de religião católica.
Isso ocorre porque esses sujeitos não reconhecem suas diversidades culturais e sociais, pois
desde sempre a escola impôs um currículo único, no qual não é respeitada nem a diversidade
cultural, nem a realidade dos educandos, como Giroux (1988, p. 63, 64) nos alerta:
81
Suas peculiaridades, contradições e a qualidade do que é vivido ficam
dissolvidas sob a ideologia do controle e do gerenciamento. Em nome da
eficiência, os recursos e a riqueza das histórias de vida dos estudantes são
ignorados.
Grande parte desses educandos já frequentou escolas em horário diurno durante anos,
tendo uma história escolar marcada por múltiplas reprovações, o que faz com que cheguem à
EJA como alunos marcados pelo fracasso. Por conta da idade avançada, mais de 15 anos,
acabam sendo empurrados para a referida modalidade. Dessa maneira, podemos observar uma
enorme demanda de jovens com idade entre 15 e 18 anos frequentando o ensino noturno.
Alguns deles não se escolarizaram no tempo considerado devido por terem sido obrigados a
realizar trabalhos infantis/escravizados no período de infância.
A comunidade escolar constitui-se em grande parte de famílias que vivem próximas
à escola, cuja vida econômica é baixa, e muitas delas vivem abaixo da linha da pobreza.
Percebemos haver, nessa comunidade escolar, um conflito em relação às suas identidades
como moradores de uma “favela”. Da mesma maneira, não aceitam seus vizinhos, essa
afirmação é baseada nos relatos dos educandos e da comunidade que a escola faz parte27: “Eu
já fui assaltada, foi um maloquêro conhecido, em outros lugares os bandidos protegem as
pessoas, aqui não”.
A partir dessas afirmativas, inferimos que eles se sentem vítimas do alto índice de
discriminação e preconceito a que são submetidos quando estão fora da sua comunidade, já
que, muitas vezes, para conseguir empregos, realizar compras, entre outros; necessitam omitir
seus endereços. Essa difícil realidade faz com que os moradores dessa comunidade se
percebam excluídos e discriminados, pois a todo momento a sociedade, com seu poder,
auxiliada pela mídia, enfatiza a inferioridade de moradores de favelas ou grotas, afirmando
que eles são desocupados e perigosos.
27
Falas coletadas em pesquisa realizada na comunidade em 2007.
82
Negam a sua identidade de favelado, leia-se, excluído e marginal, mesmo sem
perceber, esses sujeitos estão incorporando e reproduzindo o discurso da ideologia dominante,
isso faz com que se mantenha “o status quo vigente”, como afirma Bakhtin (2006, p. 123).
Entretanto, esse processo ideológico não ocorre de forma explícita, ao contrário, acontece de
forma camuflada, penetra no discurso e vai aos poucos sendo disseminado na sociedade sem
resistência, quando percebemos já se tornou senso comum. Como constatamos nos
depoimentos dos alunos e da comunidade: “[...] É porque aqui só tem é bandido, a solução é
pegar pelo menos 80% desses bandido daqui e prendê tudinho”.
3.4.3 Professoras pesquisadas
Para a elaboração do perfil dos docentes da escola utilizamos como instrumento de
pesquisa a entrevista semi-estruturada aplicada às professoras pesquisadas. A escolha desse
tipo de entrevista deve-se ao fato de preferirmos uma atmosfera na qual o entrevistado não se
sinta pressionado ao responder aos questionamentos levantados, possibilitando, assim, um
diálogo no qual o sujeito investigado se coloque de forma espontânea, como já dissemos
anteriormente.
O quadro de professores da Escola Safira constitui-se de trinta e sete professores nos
três turnos, sendo onze no matutino, onze no vespertino e quinze no turno noturno que atuam
nos 1º e 2º segmentos da Educação de Jovens e Adultos. Especificando os docentes que atuam
na EJA, nos dois segmentos o quadro se define da seguinte forma:
1º segmento – nove professoras, todas efetivas, estão na faixa etária entre 28 e 40
anos, oito possuem pós-graduação (lato sensu), cinco são psicopedagogas, duas são
83
especialistas em educação infantil, e uma está terminando pós-graduação em psicopedagogia
(lato sensu);
2º segmento – são três homens e três mulheres, três professoras efetivas, dois
estagiários28 e um horista29, estão na faixa etária entre 24 e 40 anos. Com relação à formação
das professoras efetivas há: uma graduada em Educação Artística, uma graduada e pósgraduada (lato sensu) em letras, uma graduada em Letras e pós-graduada em Educação de
Jovens e Adultos (lato sensu). Os estagiários – um graduando em História do Brasil, um
graduando em Educação Física, e o horista de Matemática é graduado em Pedagogia.
Para a realização deste trabalho tomamos como referência duas turmas de 3ª fase do
primeiro segmento da EJA Portanto, descrevemos aqui apenas os perfis dessas educadoras.
Conforme já anunciamos, os critérios para a escolha das professoras foram:
•
Possuir vínculo efetivo com a SEMED, por meio de concurso público;
•
Atuar na EJA há mais de três anos;
•
Ser regente em turma de 3ª fase.
A formação inicial das duas professoras observadas é Pedagogia, e nenhuma das
duas cursou ou está cursando a disciplina eletiva Educação de Jovens e Adultos, ofertada pela
Universidade Federal de Alagoas. Da mesma forma, não são especialistas em Educação de
Jovens e Adultos.
Concluímos que atuar em EJA não foi a primeira opção dessas educadoras,
consequentemente, essas profissionais acabam transpondo para a EJA as práticas pedagógicas
28
Os estagiários são contratados temporariamente pela SEMED em convênios de um ano, podendo ser
prorrogado por igual período.
29
Os horistas são professores que atuam no horário diurno com vínculo efetivo com a SEMED, que tendo carga
horária disponível podem ser contratados para atuarem em horário noturno, por tempo indeterminado, até que se
convoquem professores efetivos para suprirem as vagas ocupadas por eles.
84
que infantilizam os educandos, uma vez que em suas formações iniciais e pós-graduações
apenas tiveram formação para lidar com o público infantil.
No tocante à leitura os/as educadores/as da EJA, da mesma maneira, não têm a
formação específica. Assim sendo, o ensino de leitura para essa modalidade não avançou
muito da forma como era realizada há alguns séculos: um conjunto mecânico e autossuficiente
de exercícios linguísticos, servindo apenas à decifração e reconhecimento de símbolos
gráficos.
Além da falta de preparo para atuarem na EJA, ao analisarmos os dados coletados em
nossas entrevistas e questionários detectamos que as professoras afirmaram que estão na
educação pública porque necessitavam de um vínculo efetivo que lhes possibilitasse a
aposentadoria, posteriormente. A professora F1 afirma que está especificamente na EJA por
se identificar com a proposta da referida modalidade, já a professora F2 afirma está na EJA
por gostar dos alunos e da escola.
Avaliamos que isso caracteriza um fazer docente sem grandes compromissos no
sistema público e não uma opção política que requer identificação, afinidades e dedicação. Ou
seja, para essas professoras estar na referida modalidade é apenas uma forma de tornar-se
funcionário público, o que lhes garante um vínculo empregatício estável e lhes possibilitará a
aposentadoria mais tranqüila –, o que pode não ocorrer em seus empregos privados.
Essa afirmação pode ser constatada ao avaliarmos a carga horária dessas professoras,
por exemplo, a professora F1 no horário vespertino atua como professora na Educação
Infantil em escola pública estadual e, no turno noturno se ocupa com a EJA. Já a professora
F2 tem seus três horários ocupados –, no matutino trabalha em uma escola publica estadual
com o público infantil, no vespertino atua em uma escola privada com adolescente e,
finalmente, no horário noturno está na EJA. Constatamos que a modalidade representa apenas
uma complementação salarial para aquelas professoras.
85
A partir dos dados coletados, confirmamos que a formação e as experiências de
leituras das professoras influenciam nas práticas de letramento desenvolvidas em sala. Sendo
assim, nossa análise baseou-se em vinte aulas observadas no contexto escolar, tomando como
objeto de estudo os eventos e práticas de letramento proporcionados nas aulas de leitura das
turmas da EJA.
No capítulo a seguir, analisamos os eventos de letramento que ocorrem nas salas de
aula de leitura da EJA, avaliando se as práticas das professoras pesquisadas auxiliam os
educandos a tornarem-se leitores experientes e letrados.
86
CAPÍTULO 4 – EVENTOS E PRÁTICAS DE LETRAMENTO
NAS AULAS DE LEITURA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Ao tratarmos de questões referentes à leitura, no Brasil, conforme já evidenciamos
neste trabalho, é importante reconhecermos a instituição escolar como principal agenciadora e
promotora para a aquisição dessa habilidade. Sobretudo, para a população de baixa renda e,
no caso específico deste trabalho, os jovens e adultos participantes do 1º Segmento da
Educação de Jovens e Adultos.
Especificando os educandos da escola pesquisada podemos notamos através do
grupo focal realizado com os alunos, que o letramento das turmas observadas é prejudicado
principalmente pela falta de poder aquisitivo, já que há muitos assalariados, donas de casa e
desempregados, que vivem exclusivamente de programas assistenciais do governo federal.
Neste sentido afirmam: “eu lia antigamente, hoje num leio mais não, pruquê não tenho
dinhêro pra comprá, mas gosto muito, o jornal é bom pruquê mostra as coisas que tão
acontecendo agora, na revista não as veze mostra umas coisa que já passou”.
Soares (1998) em seus estudos aponta que o letramento de grupos sociais estão,
especificamente, relacionados a suas condições sociais, culturais e econômicas. Isso
impossibilita a aquisição e o acesso a portadores de textos como: jornais, revistas, livros, entre
outros. Aliado a isso está o fato de não terem acesso a espaços de letramento comunitários,
como bibliotecas públicas, fora do ambiente escolar, que permitam o contato sistemático com
a cultura letrada.
Neste trabalho, usamos o conceito amplo de letramento, que diz respeito aos usos da
língua escrita não somente na escola, mas em todo lugar. Isso se justifica considerando que a
87
escrita está em todos os lados, fazendo parte da paisagem cotidiana (KLEIMAN, 2005). No
contexto da categoria letramento utilizaremos duas subcategorias: eventos e práticas de
letramento.
No tocante à prática de letramento escolar para os sujeitos da EJA deve-se considerar
o que acontece fora das paredes das salas de aula, em relação aos eventos vivenciados em seus
cotidianos. Quando do grupo focal com alunos da escola pesquisada os ouvimos sobre as
leituras que realizam no ambiente doméstico, bem como sobre livros que possuem. As falas
marcam a convivência com livros didáticos e, de forma limitada, o acesso a revistas:
[...] tenho sim, tenho muitas revistas em casa; (sv), tenho vários livros em
casa, principalmente de matemática, eu gosto muito de matemática (sv)...( ),
lá em casa tem um montão de livro assim.....aqueles professora... qui a iscola
deu o ano passado, era bem uns dez livros...(sv), eu só tenho os livro que e
eu meus filho ganharu na iscola, mas num tenho muito tempo pra lê in casa
só leio na iscola. ( ), eu leio, mais no final de semana, pego o livro e leio
(sv), eu lei cinco horas da manhã antes de sair pra trabalhá, enquanto a
mulhé faz o café, eu leio esse livro aqui (o aluno mostra o livro didático)
...().
Dentre essas falas, há uma bastante reveladora, que representa a realidade da maioria
dos trabalhadores-alunos da educação de jovens e adultos: “[...] num leio por que saio de casa
cedo, trabalho o dia todo ainda venho pra iscola, por isso só Tenho tempo aqui na iscola”.
Tomando as falas dos educandos como referência, inferimos que as instituições
escolares públicas brasileiras, desde há muito, assumiram a responsabilidade, quase que
exclusivamente em promover e garantir junto à população jovem e adulta do país,
oportunidades de aprendizagem significativa que elevem os letramentos dos sujeitos que as
frequentam.
88
No entanto, essa necessidade não está sendo suprida, sobretudo na Educação de
Jovens e Adultos, que ainda não se constitui em política pública de Estado, uma vez que ela
ainda é baseada em programas e projetos, que não vêm garantindo a continuidade dos estudos.
Nos municípios e estados onde a EJA é institucionalizada, tem havido a preocupação
com a continuidade dos estudos, o que é de fundamental importância, pois o letramento está
atrelado à escolarização. Nesse contexto, devemos ressaltar a relevância do professor da EJA
ser um leitor experiente, assíduo, uma vez que, grande parte dos educandos da modalidade,
não possuem, fora da escola, convivência com pessoas que tenham hábitos leitores, que
possam lhes servir de referência.
Nas observações, em salas de aula notamos que, para a efetivação de um ensino de
leitura bem sucedida, há uma dependência quase que exclusiva da figura do professor. Pois os
educandos da escola pesquisada sempre reafirmaram o vínculo criado com o professor,
quando se trata de exemplos positivos, como evidenciamos no grupo focal:
[...] aprendi a lê depois de grande, na iscola com as professora, [..] quando eu
via a professora lendo achava era bunitu [...] pruquê quando era pequeno
tinha que trabaiá, pruquê professora, no interior a gente trabaia desde
pequeno, é desde sete anos que eu trabaio, aí num dava tempo pra istudá.
Essas falas demonstram a influência das professoras da EJA como fator
determinante, não só na instituição do hábito da leitura, mas acima de tudo, como formadoras
de leitores. Ao ressaltar a importância de professores/as comprometidos/as com a leitura nas
escolas do país Silva (2002, p. 19), afirma que:
O professor é o intelectual que delimita todos os quadrantes do terreno da
leitura escolar. Sem sua presença atuante, sem seu trabalho competente, o
terreno dificilmente chegará a produzir o benefício que a sociedade espera e
deseja, ou seja, leitura e leitores assíduos e maduros.
89
Concordando com o autor reafirmamos a necessidade, principalmente nas turmas da
EJA, da presença de professores que sejam efetivamente comprometidos com a leitura,
servindo como agentes de letramento e agentes sociais dentro do espaço escolar. Mas para que
isso aconteça, os profissionais da educação deveriam ser acima de tudo leitores assíduos para
poderem estimular os educandos através de seus próprios exemplos.
Entretanto, na prática, a situação complica-se, uma vez que a realidade vem
mostrando que a maioria dos educadores não possui o hábito de leitura, ou seja, esses
profissionais não costumam ler fora do ambiente de trabalho.
Em Alagoas, essa realidade pode ser constatada através de trabalhos realizados por
alguns pesquisadores, como Brasileiro (2008) e Moura (2007) que atestam que a maioria dos
docentes do ensino fundamental, principalmente os da EJA, em muitos casos, são
considerados como “não-leitores”, ou seja, leem muito pouco, ou nada, em seu cotidiano.
Conhecendo essa realidade Britto (1998), denomina esse sujeito como um “leitor
interditado”. Interditado porque, apesar de possuir, em si, todas as habilidades escolares
necessárias para ser um leitor, limita-se em sua capacidade de romper com uma leitura restrita
às próprias atividades escolares.
Segundo Moura (2007), as leituras realizadas por esses sujeitos professores são
limitadas devido a sua sobrecarga de trabalho. Em sua maioria atuam nos três turnos e a
situação socioeconômica que não lhes possibilita a aquisição de suportes de leitura variados
como: revistas, jornais, livros, entre outros.
Reconhecendo essa limitação na formação dos/as professores/as da EJA, visamos,
neste capítulo, analisar de que forma as práticas de leitura construídas nas salas de aula da
modalidade, especificamente nas escolas públicas da Rede Municipal de Maceió, oportunizam
situações concretas/significativas de aprendizagem para os sujeitos que a freqüentam. Para
90
tanto, procuramos observar até que ponto os eventos e práticas de letramento que os
educandos da modalidade estão tendo acesso no espaço escolar, especificamente, nas
aulas de leitura, lhes possibilitam tornarem-se leitores experientes/maduros.
Segundo Kleiman (1989, p 13), “leitor proficiente, aqui compreendido como
experiente/maduro, é aquele que: lê rapidamente, mais ou menos 200 palavras por minuto se o
assunto lhe for familiar ou fácil [...] lê sem movimentos labiais, sem subvocalização”.
Nossa pesquisa centrou-se em observação realizada em duas turmas de terceiras fases
(pós-alfabetização) de uma escola pública do município de Maceió. Optamos por esta fase por
acreditarmos que o ensino de leitura na EJA não deva ser focalizado apenas nas primeiras
fases, como um produto de alfabetização. Mas que deve ser um processo priorizado por todos
os professores durante toda a vida escolar dos educandos.
Sendo assim, o conceito de leitura que fundamenta o nosso trabalho é o que
reconhece a leitura como processo, que se estende desde as habilidades de decodificar
palavras, até a capacidade de compreender textos escritos, conforme nos indica Soares (1998,
p. 69):
A leitura estende-se da habilidade de traduzir em sons sílabas sem sentido a
habilidades cognitivas e metacognitivas; inclui, dentre outras: a habilidade
de decodificar símbolos escritos; a habilidade de captar significados; a
capacidade de interpretar sequências de ideias ou eventos, analogias,
comparações, linguagem figurada, relações complexas, anáforas; e, ainda, a
habilidade de fazer previsões iniciais sobre o sentido do texto, de construir
significado combinando conhecimentos prévios e informação textual, de
monitorar a compreensão e modificar previsões iniciais quando necessário,
de refletir sobre o significado do que foi lido, tirando conclusões e fazendo
julgamento sobre o conteúdo.
Concordamos com a autora, e ressaltamos a importância dos/as professores/as da
EJA estimularem, principalmente em suas aulas de leitura, o desenvolvimento dessas
91
habilidades, através de técnicas de leitura e da utilização de diversos gêneros textuais em sala
de aula, e que estejam conectados às expectativas dos sujeitos trabalhadores.
Neste capítulo enfocamos: o cenário de investigação, as temáticas dos textos
utilizados em sala e a análise caracterizada como escuta de texto, no qual analisamos as
práticas de leitura e os respectivos eventos de letramento utilizados pelas professoras. Devido
à recorrência abrimos um subitem para enfatizarmos o apagamento dos aspectos linguísticos
dos gêneros textuais que ocorreu nas duas salas de aula.
4.1 As aulas de leitura: o cenário da investigação
O cenário da investigação da prática de leitura foram duas salas de aula de pósalfabetização, conforme já anunciamos, de uma escola pública municipal com todos os seus
elementos constitutivos. Concebemos esse espaço como um macroevento, no qual acontecem
micro-eventos de letramento. Ou seja, situações de interação face a face que são constituídas
principalmente pelas ações e reações de professores e alunos, quase sempre mediadas por
textos escritos. Dependendo da forma como esses eventos são organizados dentro da sala de
aula poderá ou não haver o desenvolvimento de várias habilidades linguísticas.
Antes de especificar as salas observadas, iniciamos este item explicitando as
condições objetivas que podem tornar ou não a escola um ambiente estimulador de leituras.
Observamos que a instituição não possui ao menos uma máquina copiadora que funcione,
pois desde 2007 a única existente está quebrada. Consequentemente, os/as professores/as têm
dificuldade na reprodução de gêneros que não estejam no livro didático.
Esse é um dos empecilhos que os/as professores/as encontram para levar para a sala
de aula uma maior variedade de gêneros textuais, permanecendo, na maioria das vezes, presos
92
ao livro didático adotado, ou assumindo os custos de reproduções. Em decorrência dessa falta
de recurso, surgem duas consequências: os alunos apenas escutam as leituras feitas pelas
professoras sem terem em mãos os textos, ou em outras ocasiões, os textos são transcritos na
lousa e copiados pelos alunos, o que deixa o tempo curricular ainda mais prejudicado, uma
vez que na escola pesquisada, as aulas iniciam às 19h30min, por atrasos de alunos e
professores, e terminam às 22h.
Outro empecilho é que não há um espaço específico para a realização da leitura fora
da sala de aula, pois até mesmo a sala “dita” de leitura, que até o ano de 2007 funcionava
precariamente e sem pessoal habilitado, foi desativada no ano de 2008. Conforme já dissemos
anteriormente, os poucos livros que restaram foram empilhados em uma das salas de recurso
que funciona anexa à escola.
Durante o período de observação sentimos que fora das salas de aula, a escola não
oferta atividades que envolvam leitura, mesmo porque o planejamento coletivo dos/as
professores/as do primeiro segmento está de certa forma comprometido com a limitada carga
horária dos docentes que em grande parte possuem apenas 20 horas-aula semanais. Desta
forma, para a realização de planejamentos e de outras atividades coletivas no horário noturno,
a escola necessita suspender as aulas.
A ausência de planejamento contínuo e permanente contribui para a escassez de
situações em que os alunos se envolvam em práticas e eventos de letramento fora das salas de
aula. Durante o período de nossa investigação houve apenas duas circunstâncias em que a
escola oportunizou eventos significativos extraclasse. Esses momentos foram duas palestras
oferecidas no pátio da escola, uma sobre trânsito e a outra sobre doenças sexualmente
transmissíveis.
Para a formação e leitura dos professores da EJA, a Secretaria Municipal de
Educação enviou no ano de 2005 um acervo técnico específico sobre a modalidade, contendo
93
as obras de Paulo Freire, entre outros autores que abordam temas como leitura, alfabetização,
letramento, que podem contribuir para a prática de leitura bem sucedida nas turmas da EJA.
Esse acervo, no entanto, fica na sala de coordenação um local mal iluminado e pouco visitado
pelos/as professores/as.
Nas salas de aula constatamos a ausência de estantes com livros. Além disso a
estrutura física está deteriorada, não há boa iluminação e nem ventilação adequada, pois a
escola possui uma rede elétrica antiga e que funciona precariamente. As carteiras são estreitas,
específicas para o público infantil.
Além da falta de estrutura, pedagogicamente os professores não participam de
formação continuada e de planejamento específico, nos quais essas dificuldades vivenciadas
poderiam ser discutidas e analisadas. Todos esses fatores se agregam impedindo que a
instituição oferte um ensino, principalmente em leitura, que atenda às necessidades atuais de
inserção social dos indivíduos que a estão freqüentando. Sendo assim, os eventos de
letramento que a instituição oferta aos educandos do noturno limitam-se quase que
exclusivamente aos que ocorrem em salas de aula.
Sobre o espaço físico das turmas pesquisadas observamos que as paredes
estavam/estão cobertas de trabalhos realizados pelos alunos que frequentam a escola nos
horários matutino e vespertino, e são direcionados predominantemente para o público infantil.
Nas duas turmas pesquisadas, em todas as aulas observadas, as carteiras estavam
dispostas de forma tradicional, enfileiradas uma atrás da outra, de maneira que os alunos
ficavam sentados enxergando a nuca dos companheiros, realizando as leituras
individualmente. Raramente os alunos eram requisitados a realizarem leituras coletivas, a
trabalharem em duplas, bem como leituras silenciosas, e prevaleceu a leitura em voz alta,
tanto das professoras como dos alunos.
94
Em determinados momentos as salas tornaram-se um grande auditório tendo as
professoras como oradoras. Freitas, A. (2007, p. 51) fazendo a releitura de Aristóteles (1999),
afirma que: “todo orador, para que seja possível persuadir mais facilmente o auditório
necessita dispor seus argumentos de forma clara, coerente e sequencial, sobre como ordenar
as matérias”.
Ao propor ou realizar as leituras as professoras se posicionavam, na maioria das
vezes, em pé, de frente para os alunos, ao lado do quadro branco. Em nenhuma das aulas
observadas houve organização diferenciada em sala como semicírculo. Sendo assim, os
alunos permaneciam sentados durante todas as aulas, levantando-se apenas para realizar algo
fora de sala. Dependendo da necessidade, a professora circulava por entre as carteiras,
enquanto os alunos realizavam as leituras ou respondiam às atividades solicitadas.
Se considerarmos que os jovens e adultos são sujeitos com significativas
experiências de vida e de conhecimentos que trazem para a sala de aula, a disposição que se
encontravam na sala de aula não estimulava o espaço gerador de diálogo e de interação com
seus pares. Ao contrário, isso seria possível de houvesse a disposição no formato dos Círculos
de Cultura freireanos.
Seguindo essa rotina, nas aulas da professora F1 nos momentos de leitura, muitos
alunos ocupavam lugares quase cativos com poucas mudanças. Assim sendo, os adultos na
frente representando quase sempre uma plateia atenta, enquanto os jovens, muitos deles
dispersos, preferiam ocupar os lugares no fundo da sala, onde se sentiam mais à vontade para
conversar. Registramos que as aulas dessa professora eram frequentadas por um número
variável de 20 a 25 alunos.
Já nas aulas da professora F2, havia sempre poucos alunos na sala de aula –, entre 08
e 15 alunos, que preferiam ocupar os lugares da frente da sala. Uma turma
95
predominantemente de adultos cansados, que depois de uma longa jornada de trabalho
necessitavam de um ambiente leitor prazeroso.
Nas atividades de leitura realizadas tanto pela professora F1, como pela professora
F2, não houve grande variedades de técnicas de leitura. Os textos que circulavam nas duas
salas serviam basicamente para atender aos seguintes propósitos: trabalhar opiniões e
reflexões acerca dos assuntos abordados nos textos (ciências sociais, naturais, etc.), trabalhar
questões gramaticais, e utilizar os textos para a discussão de temas relacionados às demais
disciplinas.
4.2 Das temáticas
PROFESSORA F1
Nas aulas observadas avaliamos que não houve a utilização em sala de aula de uma
grande variedade de gêneros textuais. Durante as dez aulas observadas da professora F1,
foram trabalhados:
•
6 textos informativos – um panfleto educativo, contendo informações sobre
trânsito com o título – Jovem: paz e amor no trânsito, editado pela prefeitura municipal de
Viçosa - AL; quatro textos do livro didático Viver, Aprender – Educação de Jovens e Adultos,
módulo 3, com os títulos: Cerco ao cigarro, A linguagem da propaganda, Manguezal em
extinção, A descrição; mais um texto retirado da Internet, em que havia explicações sobre a
literatura de cordel intitulado – Literatura de cordel.
96
•
1 fragmento de um texto descritivo – retirado do livro didático Viver, Aprender
– Educação de Jovens e Adultos, módulo 3; temática que versa sobre o gênero textual
Descrição;
•
1 propaganda intitulada – Propaganda de meia-calça que consta no livro
Viver, Aprender – Educação de Jovens e Adultos, módulo 3;
•
4 poesias – retiradas da Internet: Poesia no trânsito, A gente pode,
Aposentadoria de um brasileiro, Maria vai com as outras; mais uma poesia do livro
didático – O açúcar, e algumas poesias de cordel, apresentadas a partir dos próprios livretos.
Mesmo havendo um livro didático adotado pela Secretaria Municipal de Educação
para ser utilizado nas turmas de EJA, deduzimos que, para a elaboração de suas aulas, a
professora F1 pouco recorreu ao livro adotado. Preferiu utilizar frequentemente os textos
retirados da Internet que, pela ausência de reprodução na escola, em alguns momentos
transcrevia na lousa ou os lia em voz alta em suas aulas de leitura. Inferimos que havia, por
parte da professora, a intenção de trazer para a sala de aula, textos mais atualizados.
PROFESSORA F2
Nas aulas da professora F2 observamos que, assemelhando-se à prática da outra
investigada, não houve a utilização de uma grande variedade de gêneros textuais em suas
aulas de leitura, sendo utilizados para leitura apenas:
•
5 textos informativos – três textos retirados da Internet, foram eles: Doação de
órgãos, População indígena de Alagoas e Plantas medicinais, mais dois textos do livro
didático Viver, Aprender – Educação de Jovens e Adultos, módulo 2, com os títulos:
Tragédia brasileira e Violência contra a mulher.
97
•
1 biografia – retirada da Internet sobre o cantor Luiz Gonzaga;
•
2 músicas – Construção, de Chico Buarque e Asa Branca, Luiz Gonzaga.
•
1 conto popular – A mulher da capa preta;
•
1 poesia – retirada da Internet: Carolina (versão poesia da Mulher da capa
preta). E algumas poesias de cordel, apresentadas a partir dos próprios livretos.
Tomando como referência o quadro de gêneros textuais apresentados por Marcuschi
(2008, p. 194), percebemos que em ambas as práticas pedagógicas, houve pouca valorização
dos diversos gêneros textuais que circulam nas esferas sociais. Foram trabalhados apenas os
gêneros que circulam em três domínios discursivos, conforme as tabelas abaixo.
Gêneros textuais por domínios discursivos e modalidades
Quadro 1
DOMÍNIO DISCURSIVO
ESCRITA
Artigo científico, verbetes de enciclopédias, relatórios científicos,
notas de aula, nota de rodapé, diários de campo, teses, dissertações,
INSTRUCIONAL
monografias, artigos de divulgação científica, tabelas, mapas,
(científico, acadêmico e gráficos, resumos, textos informativos (grifo nosso), resenhas,
educacional)
comentários, biografias (grifo nosso), projetos, solicitação de bolsas,
cronograma de trabalho, autobiografias, memorial, curriculum,
diploma, prova de língua, prova de múltipla escolha, certificado de
proficiência, certificado de especialização, entre outros,
FICCIONAL
PUBLICITÁRIO
Épica – lírica – dramática, poemas (grifo nosso), diários, contos,
mito, peça de teatro, lenda, parlendas, fábulas, histórias em
quadrinhos, romances, contos, dramas, crônicas, roteiro de filmes,
música (grifo nosso).
Propagandas, publicidade (grifo nosso), anúncios, cartazes,
folhetos, logomarcas, avisos, outdoors, inscrições em muros e
banheiros, placas, endereço eletrônico, endereço da Internet.
98
FONTE: MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual – análise de gêneros e compreensão. São
Paulo: Parábola, 2008.
Desta forma, as possibilidades de eventos de letramentos em sala foram limitadas,
uma vez que se negou aos educandos o contato com a diversidade de gêneros textuais
oriundos das diversas situações e fatos sociais, mais próximos dos estudantes da EJA. Entre
eles estariam: bula de remédio, cartas, bilhetes, faturas de cartões de créditos, cheques,
receitas culinárias, contas de água, de luz, telegramas, classificados, listas telefônicas, entre
outros.
Essa postura das professoras vai de encontro ao que Queiroz et. alii. (2004), afirma
ao se referir aos conteúdos que devem ser utilizados na sala de aula desses alunos
trabalhadores, envolvidos nas mais diferentes atividades. Segundo a autora a seleção dos
conteúdos deve basear-se no projeto político-pedagógico da escola e, que tenha relação ao
trabalho e à vida desses sujeitos.
Os educandos da escola, no horário noturno, são na grande maioria desempregados
ou trabalhadores em situação informal, idosos aposentados ou jovens e adultos que
demonstram grande interesse por diferentes práticas de leitura. Muitos deles são oriundos de
famílias analfabetas, por isso necessitam que a instituição lhes possibilitem a compreensão e a
própria produção de diversos gêneros textuais que sejam ou possam vir a serem utilizados no
dia-a-dia, na vida, por prazer ou por necessidade do mundo trabalho, para que exerçam
melhor seus papéis na sociedade.
99
Para Marcuschi (2005, p. 19): [...] “gêneros textuais são fenômenos históricos,
profundamente vinculados à vida cultural e social [...] contribuem para ordenar e estabilizar as
atividades comunicativas do dia-a-dia”. Nesta perspectiva, compreende-se que trabalhar com
os diversos gêneros na sala de aula possibilita o conhecimento mais amplo, nas diversas áreas
do saber. De todos os materiais didáticos utilizados nas aulas observadas, os que mais se
aproximaram da realidade do público da EJA, tanto na temática como na linguagem coloquial,
foram as poesias de cordel e as músicas.
As poesias de cordel foram utilizadas pelas duas professoras. Ao elaborar aula em
que a literatura de cordel foi utilizada como temática, reconhecemos que houve a tentativa de
valorização da cultura dos educandos. Percebemos que em ambas as situações em que foram
lidos e interpretados as histórias e os causos dos livretos de cordel: Código de defesa do
consumidor em literatura de cordel, O exemplo da casa que falou pra mulher, Futebol e
técnica, As andorinhas, A mulher que vendeu o cabelo e visitou o inferno, A intriga do
gato com o cachorro, A traição de Alfredo e A vingança de Justino, entre outros, houve
envolvimento de todos os alunos. Notamos aqui um trabalho que segue a concepção
interacional da língua, no qual os sujeitos/leitores assumiram uma postura ativa diante do
texto, sendo, portanto, construtores sociais no ato da leitura (KOCH & ELIAS, 2009).
Na perspectiva interacionista os leitores não mais são vistos como meros receptores,
superando a concepção de leitura como uma atividade meramente de decodificação de
símbolos e sons. Assim, o ato de ler passa a ser compreendido como ação humana em que os
sujeitos desenvolvem uma função ativa. Dessa forma é possível construir os sentidos do texto
que leem, através das relações que estabelecem entre o conhecimento que possuem sobre o
tema abordado, o conhecimento prévio, e o conhecimento construído a partir da leitura,
conforme nos mostra Kleiman (1989, p. 27):
100
[...] a leitura implica uma atividade de procura pelo leitor, no seu passado de
lembranças e conhecimentos, daqueles que são relevantes à compreensão de
um texto, que fornece pistas e sugere caminhos, mas que certamente não
explicita tudo o que seria possível explicar.
Para a autora a leitura é compreendida como um processo interativo que envolve
diversos níveis de conhecimento: conhecimento de mundo, conhecimento linguístico e
conhecimento textual, que são ativados à medida que o leitor vai se envolvendo com os textos
lidos.
No entanto, o mesmo não aconteceu no dia 06/11/2007, quando a professora F1
utilizou na aula de leitura um poema com a temática infantil – Maria vai com as outras –
retirado da Internet. Pois durante a escuta do texto, percebemos que a maioria dos educandos,
apesar de estar em dupla com o texto nas mãos, permaneceram conversando durante a leitura
da professora. Ao término da leitura, a professora tentou estabelecer uma discussão sobre a
temática do texto, mas os alunos demonstraram desinteresse pelo tema. A professora insistiu,
mas os alunos não se envolveram na discussão, conforme exemplificamos abaixo:
Quadro 2
A1 – Eu entendi que conta a história de uma ovelhinha;
F1 – Sim, mas o que é que tinha essa ovelhinha?
A1 – Ela pegô gripe professora!
F1 – Gripe? E o quê mais?
A1 – Ela comeu jiló.
F1 – Sim, mas que é que esse texto qué dizer pra gente dona M;
A2 – Eu acho que essa história é de criança professora;
F1 – É de criança, mas traz uma mensagem pra gente, que mensagem é essa?
A2 – Eu num sei não;
101
F1 – Seu A sabe o que o texto quis dizer?
A3 – Olha professora eu num li não, pru quê eu tô tentando mexê na agenda do meu celular;
F1 – Então C o que você achou?
C – Eita professora conta a história de uma uveia que andava com otras uveia;
F1 – Sim, mas o que acontecia com essas ovelhas?
A4 – Elas si machucava;
Como podemos observar os alunos não se interessam pelo tema, uma aluna ao ser
requisitada a participar do diálogo chega a explicitar o caráter infantil do texto: A2 – Eu acho
que essa história é de criança professora.
Neste evento observamos que a atividade de leitura em sala não possibilitou o
relacionamento entre leitores e texto, tornando-se uma atividade inócua, pela qual os alunos
não se sentiram atraídos a participar. O texto não trouxe uma temática significativa para
trabalhadores/as que chegam à sala de aula cansados, após um dia de trabalho exaustivo, pois
não discutem assuntos mais pertinentes à realidade e às vivências dos adultos.
A professora não valorizou as experiências de vida e os conhecimentos prévios dos
educandos. Ou seja, a cultura e os saberes dos educandos foram ignorados. A utilização do
referido texto nos faz levantar a seguinte hipótese: talvez a professora não tenha tido tempo
para planejar aulas diferentes para duas turmas em que atuava, já que no momento em que a
pesquisa fora realizada ela trabalhava com dois públicos distintos –, no diurno com crianças e
no noturno com jovens e adultos.
Essa prática de transplantar textos e atividades infantis para as turmas de jovens e
adultos tem sido recorrente na modalidade. Assim sendo, não é exclusividade desta professora
102
pesquisada, conforme demonstramos no primeiro capítulo, no qual traçamos o perfil histórico
dos materiais didáticos mais utilizados nas turmas da EJA.
Especificando a realidade da instituição investigada, avaliamos que a falta de
formação dos/as professores/as aliada à falta de planejamento na escola, impede um trabalho
bem-sucedido, no tocante à leitura, nas turmas da EJA. Considerando o caso isolado da
participante de nossa investigação, sabemos que durante toda a sua formação inicial fora
preparada apenas para atuar com o público infantil. Por isso, ao se deparar com os educandos
da EJA, em alguns momentos, acaba reproduzindo as práticas desenvolvidas com crianças
(MOURA, 2007).
Isso se deve, principalmente, à falta de formação específica em Educação de Jovens e
Adultos, pois os cursos de licenciaturas e pedagogia do Estado não estão garantindo a
formação específica para os pretensos professores da modalidade, conforme denuncia Barros
(2005, p. 67): “essa realidade está cristalizada no Estado, permanecendo, assim, há décadas,
consequência de uma falta de preocupação por parte das universidades e faculdades com a
modalidade”.
Isso vem sendo questionado há algum tempo, no entanto, a situação não avança. No
Estado de Alagoas apenas a UFAL oferta a Disciplina eletiva Educação de Jovens e Adultos e
a Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL), oferece no curso de pedagogia a disciplina
Educação de Jovens e Adultos como disciplina obrigatória.
Com essa lacuna na formação inicial dos/as professores/as restaria às secretarias
municipais e estaduais complementá-la. Entretanto, isso não está ocorrendo, pois o que se
observa no Estado é que as formações para os professores da EJA, quando surgem, vêm sob
forma de ações pulverizadas e pontuais. Essa falta de formação dos professores da EJA, aliada
à escassez de planejamento nas escolas, alimentam a perpetuação dos altos índices de
analfabetismo funcional entre os jovens e adultos do estado de Alagoas.
103
Enfim, podemos avaliar que a postura, tanto da professora F1 como a da professora
F2, demonstra que elas possuem pouco conhecimento teórico acerca do letramento e dos
gêneros textuais. Uma vez que a diversificação textual em suas aulas de leitura foi irrelevante,
não constando, portanto, nesses eventos os gêneros textuais dos diversos domínios discursivos
que circulam na sociedade, pois foram priorizados muitos textos retirados da Internet e alguns
textos do livro didático.
Mesmo conhecendo o perfil da turma em que atuam, as educadoras ainda sentem
dificuldade em desenvolver em sala, práticas letradas que auxiliem os alunos a se apropriarem
da leitura como prática social. Consequentemente, os eventos de letramento ocorridos nas
aulas de leitura das turmas observadas foram limitados, pois alguns gêneros textuais
utilizados não ampliavam o nível de conhecimento dos educandos.
Dessa maneira, o ensino de leitura que as escolas públicas de Maceió estão ofertando
aos alunos da EJA, em algumas ocasiões, ainda se apresenta descontextualizado e sem função
social para o aluno. Portanto, não favorecem a elevação do nível de letramento dos sujeitos,
dificultando e, até certo ponto, impedindo a inserção social desses indivíduos na atual
sociedade letrada.
Para mudar esse quadro é necessário, entre outras ações, que haja a utilização dos
diversos gêneros textuais em sala de aula, desse modo, a língua passa ser estudada nas suas
diversas situações de uso. Ler e analisar textos pertencentes a gêneros variados, cujas formas
foram consagradas nas diversas instâncias da vida em sociedade, deve se tornar uma prática
constante da escola. Sendo assim, os professores das escolas públicas, principalmente os da
EJA, precisam valorizar os diversos gêneros textuais que circulam socialmente, priorizando o
conhecimento de mundo que os alunos trazem da vida.
Assim, a escola será um lugar que propiciará a leitura que favoreça a formação dos
educandos, motivando a tomada de consciência como sujeitos históricos, desenvolvendo o
104
pensamento crítico e reflexivo. Seguindo essa perspectiva, entendemos que os professores da
modalidade deveriam priorizar em suas aulas de leitura textos que tivessem temas geradores,
escolhidos de acordo com as necessidades dos sujeitos envolvidos no processo de
aprendizagem. Acreditamos que, o quê, o para quê e o como se lê têm implicações positivas
no desempenho da leitura na escola e por extensão fora dela.
Nessa concepção, a leitura favorecerá a troca de experiências entre as pessoas, e o
ato de ler se constituirá em um ato de conhecimento. Dessa maneira, a leitura favorece a
remoção das barreiras educacionais de que tanto se fala. E possibilitará oportunidades mais
justas de educação, principalmente, através da promoção do desenvolvimento da linguagem e
do exercício intelectual, o que aumenta a possibilidade de melhora da situação pessoal/social
do indivíduo.
4.3 A escuta de textos proferidos pelas professoras: uma antiga tradição que
sobrevive nas salas de aula da EJA
Analisando os dados coletados em nossa pesquisa podemos observar que as duas
professoras encaminham seus trabalhos, durante as aulas de “leitura” tendo por base a escuta
de textos lidos em voz alta. Apesar dessa técnica ter sido difundida no Brasil nos séculos
XVIII e XIX, constata-se que, ainda hoje, nas aulas de leitura ela continua sendo uma das
práticas mais exercitadas, tornando-se cristalizada e passando de geração para geração. E
chegou ao século XXI, quase sem alteração, pois está presente principalmente nas salas de
aula da EJA.
Após reconhecermos a semelhança no trabalho de leitura nas duas turmas observadas
analisamos os eventos e as práticas de letramento utilizados pelas professoras, focalizando
105
especificamente: As leituras realizadas nas salas de aula da EJA e o apagamento dos
aspectos linguísticos dos gêneros textuais utilizados nas aulas de leitura.
4.3.1 As leituras realizadas nas aulas da Professora F1
Em diversas ocasiões os textos foram lidos na íntegra pela professora, enquanto os
alunos ouviam a leitura passivamente, sem intervirem. Apesar dessa prática ter sido recorrente
nas aulas de leitura da professora F1, tomaremos como referência para análise a aula do dia
26/11/ 2007– texto informativo – Cerco ao cigarro.
Conforme anunciamos anteriormente, neste capítulo, ao realizar os eventos de leitura
em voz alta para os alunos, a educadora seguia quase sempre um ritual: posicionava-se à
frente da turma, em pé, e aumentava o timbre da voz assumindo uma postura de superioridade
diante da turma.
Analisando especificamente as aulas de leitura em que a professora utilizou essa
estratégia, percebe-se que na grande maioria das vezes não conseguia prender a atenção dos
alunos, pois observamos que, em grande parte desses eventos, os alunos não se mostravam
estimulados ou interessados, já que muitos permaneciam dispersos conversando baixo, outros
cochilavam, e alguns poucos prestavam atenção.
Durante essas aulas de leitura os alunos permaneciam sentados em fileiras, com ou
sem os textos nas mãos, e quase não acontecia a interação dos sujeitos com os textos lidos. Os
poucos alunos que prestavam atenção na leitura proferida pela professora eram os que tinham
mais idade, e assumiam uma postura passiva. Este contexto, tão atual de sala de aula, nos
remete à educação bancária que Freire (2005, p. 67) condenava:
106
O educador se põe frente aos educandos como sua antinomia necessária.
Reconhece na absolutização da ignorância daqueles a razão de sua
existência. Os educandos, alienados, por sua vez, à maneira do escravo na
dialética hegeliana, reconhecem em sua ignorância a razão da existência do
educador.
Mencionamos a seguir exemplos desta realidade, ao analisarmos a prática de
letramento utilizada pela professora F1:
EVENTO 1 – Professora F1
Neste evento de letramento a professora encontra-se rouca, por isso elege uma aluna
para ler o texto do livro didático em voz alta, mesmo havendo vinte alunos na sala de aula
apenas uma aluna foi “selecionada” para ler. A aluna escolhida foi aquela que sintetiza os
critérios de boa leitora, segundo a concepção da professora, já que realiza a leitura com um
padrão de entonação e pontuação.
Iniciando esta situação de aula:
26/11/2007 – texto informativo – Cerco ao cigarro
Quadro 3
19:05 – Chegam sete alunos;
19:10 – Professora chega, chegam mais seis alunos, professora senta-se e aguarda;
19:15 – Professora avisa que vai iniciar a aula, pede para chamar os alunos que estão fora
lanchando;
F1 – Boa noite gente (SV), BOA NOITE, gente hoje eu estou um pouco rouca, me ajudem,
vocês trouxeram o livro hoje? (SV) quem não trouxe senta com quem trouxe, e abram na página 283;
A1 – Qual é a página?
107
F1 – 283, todo mundo achou? Gente esse texto fala sobre o quê? Isso o CERCO AO
CIGARRO, agora eu queria saber quem pode ler pra me ajudar que eu estou rouca; quem gostaria? C?
C – Tá bom professora
A aluna lê, enquanto isso há muito ruído na sala, os outros alunos permanecem conversando;
CERCO AO CIGARRO
Novas medidas do governo prometem colocar a indústria do tabaco contra a parede e
complicar a vida de quem fuma.
Fumantes, preparem-se. O Ministério da saúde está para lançar um pacote de ações que
vai dificultar a vida de quem não consegue viver sem a fumaça de cigarro. Antitabagista ferrenho,
o ministro da saúde promete fazer o que os seus antecessores tentaram e não conseguiram: vencer
a luta contra o fumo. Se vai conseguir, é outra historia. O país tem 35 milhões de fumantes, e
calcula-se que a cada ano 80 mil pessoas – ou nove por hora – morrem vitimas de alguma doença
relacionada ao consumo do cigarro. Menos de 3% dos fumantes conseguem abandonar o vício por
ano, segundo estatísticas mundiais.
A Organização Mundial de Saúde, que considera o tabagismo a maior pandemia de
todos os tempos, informa que mais de 1 bilhão de pessoas em todo mundo são dependentes do
cigarro, o equivalente a um terço da população adulta. Resultado: o fumo mata anualmente 3,5
milhões de pessoas, mais que a AIDS, a cocaína, a heroína, o álcool, o suicídio e os acidentes de
trânsito somados. A ironia é que pesquisas feitas nos Estados Unidos mostram que a maioria dos
fumantes sabem disso, mas julga que nada acontecerá com eles.
A primeira medida será aumentar as campanhas antitabagistas. O governo estuda
também uma forma de abrir um processo nos Estados Unidos contra a indústria multinacional do
tabaco. A ideia é cobrar o ressarcimento dos gastos do Sistema Único de Saúde com doenças
originadas do fumo. A indenização pode ficar entre 40 e 50 bilhões de dólares.
108
Cerco ao cigarro, autor desconhecido, livro didático Viver, Aprender, módulo 3, página 283.
Ao término da leitura, a professora não conformada com o resultado da leitura feita
pela aluna, já que muitos alunos permaneceram dispersos e conversando, resolve reler o texto.
Nesta segunda leitura os alunos conversam menos.
Ressaltamos que a professora restringiu o ato de leitura a uma mera “transmissão
vocal”. Sendo assim, nesses eventos não se configurava o ato de ler propriamente dito, porque
apoiando-nos em Bajard (2007) afirmamos que a transmissão vocal, caracteriza-se pela figura
de um proferidor diante de uma plateia, evidenciando, portanto, a presença de um emissor e
de receptor/es, e segundo o autor, em situações desse tipo não se pode considerar que houve
leitura.
Podemos dizer que a professora comunga da ideia de que um bom leitor é aquele que
consegue “ler bem” em voz alta, respeitando a ortografia das palavras. Portanto, dava ênfase,
durante as aulas de leitura, à expressão oral, pois a boa leitura é aquela em que se lê com a
entonação correta, obedecendo aos sinais de pontuação. Ela não estava preocupada com o
entendimento do texto, ou com a função social da leitura, contrapondo-se ao conceito de
leitura enquanto interação defendida neste trabalho.
Desta maneira, a leitura proporcionada pela escola segue um padrão que se
manifestava pela leitura magistral da professora, servindo como modelo, diante de um público
de expectadores que são liberados da procura de sentidos no texto, uma vez que conheceram o
texto através da audição (BAJARD, 2007).
Acreditamos que essa postura assumida pela professora na sala de aula ocorra de
forma alienada por parte da mesma. A professora estava naquele momento transplantando
109
para a sala de aula o modelo de prática de leitura com o qual ela foi alfabetizada e aprendeu a
ler –, um modelo de leitura baseada na transmissão vocal.
Não cabe condenarmos a escuta de textos em sala de aula, pois acreditamos que ela
deva sim ocorrer nas escolas, no entanto, defendemos que essa forma de leitura não pode ser a
única privilegiada. Defendemos a concepção de que os alunos devam realizar suas próprias
leituras para tornarem-se leitores, uma vez que só se aprende a ler, lendo, conforme afirmam
Silveira (2005), Solé (1998), entre outros autores. Ao priorizar em grande parte das aulas de
leitura a “transmissão vocal” de texto para a turma, percebe-se que o objetivo desses eventos
de leitura era a exaltação da boa fluência.
4.3.2 As leituras realizadas nas aulas da professora F2
A professora F2 demonstrou através de sua prática que valoriza a interação, pois
incentiva a leitura realizada por vários sujeitos em sala de aula. No entanto, vimos em nossas
observações, que mesmo possibilitando uma prática de certa forma “democrática”, sempre
após a leitura proferida pelos alunos a professora retomava o turno realizando a releitura na
íntegra dos textos para os alunos.
Em vários eventos proporcionados em sala, a professora pedia que os alunos lessem
trechos ou todo o texto em voz alta para a turma. Em seguida, após a leitura proferida pelos
alunos, a professora relia os textos. Inferimos que a professora agia dessa maneira tentando
demonstrar para a turma, através de seu próprio exemplo, como deve se portar um leitor
fluente que domina as técnicas de leitura.
Constatamos que essa postura da professora tornava, muitas vezes, as aulas de leitura
monótonas. Nessas ocasiões muitos alunos se distraíam com outras ocupações, entre elas
110
estavam: conversar, cochilar ou se ausentar de sala. Adotamos como referência para análise a
aula do dia 22/08/2008, em que foi lido o conto popular – A mulher da capa preta.
Vejamos a seguir esse evento e seus desdobramentos:
EVENTO 1 – Professora F2
22/08/2008 – conto popular – A mulher da capa preta
Quadro 4
F2 – Vamos começando a ler, quem vai começar? Vai A, lê pra gente!
A – Eu não professora dá uma vergonha de lê aqui na sala,
F2 – Tá bom, tem certeza que não qué lê? (sv).... e tu minina lê pra gente, não? E seu J.
J – Tá bom eu vô lê, mas num arrepara os erru professora.
A Mulher da capa preta
Carolinna Sampaio Marques - A Mulher da Capa Preta
Um jovem estava se divertindo em uma boite quando conheceu uma moça muito bonita
que dançou com ele e lhe deu um beijo. Quando foi levá-la em casa, estava chovendo muito, e ele
percebeu que ela estava muito gelada e lhe emprestou a sua capa preta de motoqueiro pra ela se
aquecer. Acontece que ela insistiu em não ficar na porta de casa e ele acabou deixando ela perto de
um cemitério. Antes de ir embora ela escreveu o endereço pra ele ir buscar a capa. No dia seguinte
ele bateu na porta do endereço dado e uma mulher atendeu. Ele contou o ocorrido, mas quando
falou no nome Carolina, a mulher foi grossa com ele e disse que a brincadeira era de extremo mau
gosto pois sua filha havia morrido já há algum tempo. Diante da insistência dele, ela pediu pra ele
descrevê-la, e se surpreendeu quando as características dadas batiam certinho com a foto que ela
111
mostrou na parede (com flores ao lado) da filha morta. Ele não acreditou, então ela o levou
pessoalmente ao túmulo da filha, onde estava a sua capa estendida e o nome Carolinna Sampaio
Marques com datas em algarismo romano e uma foto da moça.
(O aluno lê para a turma com grande dificuldade, em alguns trechos a professora auxilia a
leitura)
F2 – Quem mais qué lê? (SV), seu M?
A2 – Eu tenho vergonha de ler, o seu J num já leu...
F2 – Mas por que o senhô num lê pra gente?
M – Tá bom professora eu võ lê mais a sinhora sabe qui eu num leiu beim;
F2 – Tá certo leia como o senhô sabe.
(O aluno relê o texto para a turma com muita dificuldade, demorando bastante tempo para
terminar a leitura);
20:50 – (Após dois alunos já terem lido para a turma a professora relê o texto para a turma)
F2 – Tá bom vou lê o texto pra gente de novo!
A Mulher da capa preta, texto retirado da Internet, autor desconhecido.
Como observamos os alunos sentem-se envergonhados para realizarem as leituras em
sala, isso é decorrente da dificuldade que a maioria da turma apresenta na realização das
leituras. Isso nos leva a concluir que os alunos da turma, apesar de terem chegado à terceira
fase da EJA, ainda não se tornaram leitores maduros e experientes. Isso se deve à falta de
experiências significativas no tocante à leitura, pois percebemos que os alunos ainda não
avançaram do processo de decodificação.
112
Acreditamos que esses sujeitos chegam a essa fase com tamanha dificuldade de
leitura porque muitos professores das fases de pós-alfabetização entendem que, apenas na
alfabetização, há a “obrigação” de ensinar leitura. Desta maneira, à medida que o aluno
avance da 1ª fase, não mais se ensina a ler, utiliza-se apenas a leitura para ensinar outras
disciplinas.
Analisando esse contexto de sala, deduzimos que nas escolas públicas,
principalmente nas turmas da EJA, a leitura ainda preserva um lugar secundário.
Consequentemente, após a primeira fase da EJA não mais se agencia, nas salas de aula da
modalidade, práticas variadas de leitura que tenham como objetivo desenvolver a leitura dos
alunos. Esse fato ocorre porque os envolvidos no processo educativo – em especial os
professores – não valorizam a importância de se ensinar leitura em todas as instâncias
educativas.
Refletindo sobre essa realidade, inferimos que isso se estende durante toda a
trajetória escolar desses sujeitos. Sendo assim, segue o descaso em relação à formação leitora
dessas pessoas, viventes de periferias, sujeitos marginalizados que necessitam adquirir uma
formação consistente não só para atuarem no mercado de trabalho, mas sim para se tornarem
participantes ativos na sociedade.
De maneira geral, nas aulas observadas, tanto da professora F1, como da professora
F2 não houve uma grande diversidade de situações didáticas, que auxiliassem os educandos a
desenvolverem as estratégias de leitura necessárias para tornarem-se leitores experientes que
são: a predição, a seleção, a inferência, a confirmação, a correção, sendo desenvolvidas,
principalmente, através da prática.
Segundo Silveira (2005), apesar das estratégias de leitura não serem ensináveis,
pode-se organizar o ensino de leitura a partir de técnicas que deem condições aos alunos a
desenvolvê-las. Algumas dessas técnicas seriam:
113
Leitura detalhada – Busca de informação detalhada;
•
Levantamento das ideias centrais – Técnica utilizada para a construção de
resumos;
•
Leitura crítica – Questionamento sob os vários pontos do texto;
Essas técnicas de leitura possibilitariam aos alunos a formularem hipóteses durante o
ato de ler, utilizando tanto seus conhecimentos prévios, como as pistas gráficas, para
chegarem à compreensão e interpretação dos textos lidos. Assim, a prática das educadoras nas
aulas de leitura demonstra que elas ainda possuem uma concepção limitada sobre leitura e
texto.
Com relação aos aspectos referentes à fundamentação teórica sobre os modelos e
estratégias de leitura, não há formação específica para os educadores, tanto nos cursos de
pedagogia, como nas licenciaturas de letras30. Constatamos essa ausência de formação inicial
e continuada ao avaliarmos as entrevistas aplicadas às professoras pesquisadas:
F1 – Não, eu não lembro de ter estudado na faculdade uma disciplina de leitura.
[...] Nas formações continuadas que já participei quase não se fala de leitura é mais
escrita.
F2 – Eu não tive na faculdade muita coisa sobre leitura. [...] olhe! eu nunca mais
tive oficina de leitura...esse ano não.
Sem uma formação específica os educadores da EJA trabalham os aspectos
referentes à leitura nas salas de aula, baseadas/os na intuição, nos poucos conhecimentos
adquiridos através de suas práticas de sala de aula, bem como, nas experiências de leituras
30
Fica essa formação restrita à disciplina Leitura e Cognição, ofertada pelo Curso de Mestrado em Educação do
Centro de Educação (UFAL).
114
vivenciadas em seu período de escolarização, marcadas pelo tecnicismo e autoritarismo
predominantemente.
Essa lacuna na formação as impede de ampliarem suas concepções de leitura, da
mesma maneira, não possibilita a familiarização com os complexos modelos de leitura.
Consequentemente, esses profissionais são privados de conhecerem de que forma os sentidos
de um texto são construídos na mente do leitor, um dos princípios básicos para uma prática
pedagógica de leitura bem sucedida.
Essa concepção limitada de leitura dos/as educandos/as é refletida no ensinoaprendizagem de leitura nas classes da EJA. O processo de leitura para essa modalidade não
avança muito da forma como era realizada há alguns séculos: um conjunto mecânico e
autossuficiente de exercícios linguísticos, servindo apenas à decifração e reconhecimento de
símbolos gráficos.
Nestas condições, os educandos ao se depararem com os textos nos eventos sociais
de leitura, fora do contexto escolar, dedicam-se apenas à decifração dos signos, preocupandose, principalmente com a boa pronúncia das palavras. E acabam sendo condicionados a
realizarem suas leituras “imitando” o modelo que lhes é oferecido na escola, e dessa forma
são tratados como “minimamente leitores”.
4.4 O apagamento dos aspectos linguísticos dos gêneros textuais
Professora F1
Ao analisarmos os dados coletados registramos que, em muitas circunstâncias, a
professora F1 inconscientemente realiza apagamentos de determinados aspectos linguísticos
dos gêneros textuais utilizados em sala. Dessa maneira, a turma fica impedida de adquirir
115
conhecimentos que seriam básicos para a compreensão da estrutura textual, como por
exemplo: coesão e coerência textual, tipologia textual, entre outros.
Tomamos como referência para análise duas aulas observadas: terceira aula, que
aconteceu no dia 15/10/2007, em que foi trabalhada a poesia O açúcar e a quarta aula
observada do dia 22/10/2007, em que foi utilizado o texto informativo A linguagem da
propaganda, ambos retirados do livro didático Viver, Aprender, módulo 3.
EVENTO 1 – Professora F1
15/10/ 2007 – Poesia – O açúcar
Quadro 5
19:00 – Quatro alunos na sala, a professora chega
19:15 – Professora inicia a aula, há 15 alunos na sala
F1 – Olhe gente peguem o livro e abram na página 19. É página 19; isso todo mundo achou?
Olhe por favor todo mundo façam uma leitura silenciosa depois nós vamos fazer os comentários do texto;
agora eu vou fazer a chamada;
(Os alunos iniciam a leitura silenciosa, a professora faz a chamada e espera);
19:25 – Professora pergunta se os alunos terminaram;
F1 – Já terminaram?
A1 – Calma professora, tem que lê devagar pra Intendê...
(Professora retorna a espera);
19:35 – Professora pergunta novamente;
F1 – Vamos gente, todo mundo já leu? Olhe hoje nós vamos trabalhá com esse texto, o que
vocês acharam do texto? Gostaram? Acharam complicado? Quem gostaria de ler o texto em voz alta?
116
Seu J? A? Qué lê? (SV) ...Não eu não tô mandando sei que todo mundo sabe ler eu só to convidando os
voluntários... (sv)
F1 – Um começa e outro termina;
A1 – Tá bom eu leio; (SV);
(Um aluno se dispõe a ler o texto em voz alta para a turma)
F1 – GENTE, POR FAVOR SEU J, VAI LÊ, SILÊNCIO PRA GENTE ENTENDÊ.
TEXTO O AÇÚCAR
O açúcar
(Ferreira Gullar)
O branco açúcar que adoçará meu café
nesta manhã de Ipanema
não foi produzido por mim
nem surgiu dentro do açúcareiro por milagre.
Vejo-o puro
e afável ao paladar
como beijo de moça, água
na pele, flor
que se dissolve na boca. Mas este açúcar
não foi feito por mim.
Este açúcar veio
117
da mercearia da esquina e tampouco o fez o Oliveira,
dono da mercearia.
Este açúcar veio
de uma usina de açúcar em Pernambuco
ou no Estado do Rio
e tampouco o fez o dono da usina.
Este açúcar era cana
e veio dos canaviais extensos
que não nascem por acaso
no regaço do vale.
Em lugares distantes, onde não há hospital
nem escola,
homens que não sabem ler e morrem de fome
aos 27 anos
plantaram e colheram a cana
que viraria açúcar.
Em usinas escuras,
homens de vida amarga
e dura
produziram este açúcar
branco e puro
118
com que adoço meu café esta manhã em Ipanema.
Poesia - O açúcar, autor Ferreira Gullar, livro didático Viver, Aprender, módulo 3, página 19.
Ao término da leitura do texto a professora não levanta questões específicas sobre
aspectos estruturais e linguísticos que o gênero textual poesia traz, como por exemplo: a
estrutura disposta em estrofes e versos, ou os recursos linguísticos como rima, sonoridade, ou
figuras de linguagem. Da mesma maneira, não houve consideração sobre a esfera social em
que o gênero poesia circula atualmente, não houve comparações entre a poesia e os diversos
gêneros e suas funções sociais, da mesma forma, não foram levantadas hipóteses sobre
possíveis leitores.
Vimos que essas questões foram totalmente apagadas no momento da discussão,
restando apenas a valorização da temática textual, através de questionamentos subjetivos:
Quadro 6
F1 – Muito bem seu J, parabéns, o que vocês acharam do texto ele retrata sobre o quê? A
fome? O que mais?
J – A cana-de-açúcar,
A3 – O sofrimento du povo, a pobreza;
F1 – Ôtra coisa quando a gente tá em casa bebendo nosso café com aquele açúcar branquinho
será que agente pensa no trabalhador que planta e colhe a cana?
A4 – Eu sei que eles trabalha muito;
F1 – Alguém aqui já trabalhou no corte da cana?
A5 – Eu não;
F1 – (sv) PERA AÍ, um de cada vez (sv); quem quiser falar levanta a mão;
119
A4 – Meu pai já trabalhou;
F1 – E ele gostava desse trabalho?M?
M – Não professora, mas ele tinha que trabalhá pra gente comê;
F1 – O que ele dizia?
M – Ele dizia que machucava as mão, tinha que arrancá aqueles toquinho, (SV)... aí ele ficou
com dor na coluna, e agora não pode mais trabalhá, meus irmãos também;
F1 – V? Você já trabalhou?
M – Eu não, meu primo, meu pai, quando eu era pequeno levava a comida pra eles, aí quando
eu chegava lá eles tava tudo melado de calvão, tudo latanhado da palha da cana;
F1 – É gente, é um trabalho muito penoso, a gente sabe que é um trabalho de muito sacrifício.
A4 – É professora mais agora ta mudando...
F1 – Mudando como?P
P – Agora eles trabalha das 5:00 até às 9:00 depois pode ir pra casa;
F1 – Num sabia não; mas eles têm que cortar uma quantidade de cana, e como é que eles
chamam a quantidade de cana que tem de cortar?
P – É uma braça, e uma braça é doze palmas, mede com uma vara; e aí ele tem que dá conta de
um batalhão que são sete carrêra de cana;
F1 – E você sabe quanto eles ganham?
P – Eles ganha um salário, ganha pelo trabalho, quanto mais ele trabalha mais ganha, e aí
quem qué mais completa o dia butando veneno, tem que tratá a terra, o que trabalha só no corte, ele
ganha só uma ruela; (SV)...
F1 – PERA AÍ GENTE, VOCÊS TÃO PRESTANDO ATENÇÃO NO DEPOIMENTO DO
V? Olha seu A qué acrescentar;
A – Meu irmão ele trabaiô muito tempo no corte da cana, quando a gente era pequeno, aí eu ia
pra lá, a gente limpava a cana e bebia o caldo da cana, e bebia aguardente também (SV);
120
F1 – É gente com a cana também faz aguardente, né?
M – Mas num é todo trabalhadô que sabe fazê a pinga não; pra trabalhá no alambique é gente
especializado;
F1 – É? Eu num sabia não... Então quem corta, não sabe fazê a pinga não? Né? (SV)...
Como podemos observar, o texto levantou uma discussão significativa, sobre a
negação de direitos dos trabalhadores e o trabalho forçado. No entanto, durante ou após a
discussão sobre a temática textual a professora F1 não faz nenhuma referência aos aspectos
estruturais da poesia. Esse contexto observado nos remete a Queiroz et. alii (2004), quando
ela afirma que os gêneros textuais circulam nas turmas da EJA do município de Maceió, no
entanto, aparecem apenas como instrumentos impulsionadores para discussões, sem que haja
referências às estruturas dos gêneros utilizados.
No segundo momento da aula, a professora propõe para a turma a realização de uma
atividade relacionada a um determinado trecho da poesia:
Quadro 7
F1 – Olha gente agora eu já colhi os depoimentos de vocês, Mais alguém qué falá? Não? (sv)...
Tá bom agora eu quero que vocês façam um trabalho em classe, sentem em dupla por favor. Eu vou
copiar um trecho no quadro pra vocês comentarem;
8:50 – (Professora copia um trecho da poesia no quadro e aguarda que os alunos copiem e se
coloquem em relação ao trecho): (sv)...
Usinas escuras
Açúcar branco
Homens de vida amarga
121
Observamos neste evento que a professora utiliza apenas um trecho da poesia,
realizando um recorte, e avaliamos que, ao elaborar a questão, a professora não levou em
conta a estrutura textual, permanecendo focada apenas em alguns termos da poesia. O trecho
escolhido traz a figura de linguagem antítese, um recurso linguístico muito utilizado por
poetas para despertar sensações contrárias no leitor no ato da leitura. Entretanto, a professora
não se aprofunda nessa discussão, não explica, portanto, a riqueza deste elemento para o
texto, ou a sua função no texto poético.
Após a leitura das produções dos alunos a professora propõe outra atividade
meramente de cunho gramatical:
Quadro 8
21:25 – Professora avisa que vai realizar uma atividade sobre a poesia, logo após, inicia a cópia da
atividade no quadro:
1.
Qual o nome da poesia?
2.
Qual o nome do autor?
3. Circule todas as palavras paroxítonas do texto.
Ao analisarmos a atividade proposta percebemos que assim como a anterior, não
houve o estudo aprofundado sobre o gênero textual poesia, pois as perguntas são apenas
factuais, podendo as respostas ser encontradas facilmente no texto, sem que haja reflexões e
uma leitura mais atenciosa por parte dos leitores. Desse modo, os educandos são direcionados
a responderem mecanicamente a essas perguntas, e o aluno não utilizará nenhuma estratégia
de leitura nessas atividades.
As atividades elaboradas dessa maneira não permitem que o aluno reflita sobre a
temática do texto, e as respostas apenas decodificadas não favorecem situações de
122
aprendizagens significativas, já que não estimulam o diálogo entre o conhecimento do senso
comum que o aluno tem, com o conhecimento enciclopédico. Mesmo porque o gênero, como
já foi dito anteriormente, não foi explorado, e serviu apenas como pretexto para a realização
da “tarefa”, ou seja, o texto poético, mais uma vez perdeu sua função social, ao ser utilizado
apenas para fins didáticos.
Ao avaliarmos essa atividade proposta pela professora compreendemos que o gênero
poesia não foi valorizado enquanto dimensão comunicativa, ele foi utilizado enquanto aspecto
instrumental, e recortado para atender a objetivos extremamente pedagógicos. Práticas como
essa acabam limitando os eventos de letramentos ocorridos nas salas da EJA. Soares (2003, p.
107), denomina essa postura como a pedagogização do letramento, na qual se automatiza as
atividades de leitura e escrita retirando-as de seus usos sociais e criando seus próprios
peculiares eventos de letramentos.
Na aula do dia 22 de outubro de 2007, a professora F1 selecionou o texto A
linguagem da propaganda para trabalhar a leitura em sala. Este texto é apresentado no livro
didático adotado para modalidade. O texto escolhido pela professora faz parte da unidade 4
que trata da linguagem da propaganda. Os autores mostram os jogos de palavras e as figuras
de linguagem utilizadas no gênero, há também a exploração das imagens, indicando ao leitor
que o gênero propaganda utiliza o artifício da linguagem não-verbal como forma para seduzir
os clientes.
Entretanto, a professora não explora ou valoriza essas questões referentes ao gênero
textual propaganda em sua aula. Vejamos este evento e seus desdobramentos:
123
EVENTO 2
22 /10/ 2007 – texto informativo – A linguagem da propaganda retirado do livro
didático Viver, Aprender, módulo 3, página 30.
Ao indicar a leitura para os alunos a professora não faz referências sobre a temática
da unidade, ao contrário, ela pede que os alunos não se detenham nas páginas anteriores e que
leiam apenas o que iria ser trabalhado em sala:
Quadro 9
F1 – Vamos gente, vamos lá, hoje a gente vai trabalhar com a propaganda, pra quem chegou
atrasado é na página 27, agora na página 28 tem umas perguntas, (sv)... eu não vou trabalhar com vocês
essas duas páginas agora, eu vou dá uma orientadazinha depois a gente volta, tá bom.
A professora mostra para a turma a propaganda que aparece no livro. No entanto, não
explora o recurso da utilização de imagens, ou seja, não se aprofunda na discussão relativa ao
não-verbal tão utilizado na linguagem da propaganda. Fez apenas um comentário sutil sobre a
aparência da mulher que aparece na propaganda. O diálogo anterior à leitura do texto limita-se
ao relato de experiências pessoais e as reflexões sobre as marcas de meias e suas qualidades:
Quadro 10
F1 – Vamos pra página 29, aí tem uma propaganda de uma meia...(sv);
A2 – É uma meia Kendal
F1 – Uma meia calça!!!, a A disse meia Kendal, vocês viram a marca, tem a marca ai? Tem o
nome aí da meia Kendal? Vejam ela logo essa se lembrou da meia Kendal? Vocês sabem por que isso
acontece? Porque aparece na televisão a Kendal a Lupo a meia da loba, as marcas famosas. Tem até uma
propaganda que diz faça Lipo ou use Lupo. Já pegaram essa embalagem?
124
A1 – Não;
F1 – (SV)... Ninguém viu essa embalagem? Nas lojas tem: na Marisa tem; na embalagenzinha
tem faça Lipo ou use Lupo, mas como a gente não tem coragem nem tem dindim, a gente usa a meia; [...]
[...] F1 – Primeiro a gente tem que se gostar, o que adianta é comer com qualidade, por
exemplo eu estou fazendo uma dieta, mas assim para minha saúde, eu estava ficado com as mãos
dormentes, como eu passo o dia todo em pé, por causa do peso ficava com dor nas costa; por isso eu
procurei uma médica, ela passou uma dieta toda controladazinha, eu não tô passando fome por isso eu tô
comendo só alimentos saudáveis, porque pão, pizza, macarronada, isso só faz engordar, não
é...(sv)...Feijão, arroz, isso pode...( )
F1 – Bem, mas vamos voltar aqui para o livro, essa imagem é de uma gordinha? (Sv) ... E
vocês acham que por que o dono dessa fábrica que fabricam essas meias não colocou uma pessoa
gordinha ou uma mais feinha ou mais desarrumada? (sv) ...(risos)
A4 – Porque essa magrinha pega bem, se a gente vê que fica bem nela a gente pensa que vai
ficá bem na gente também...
F1 – Muito bem, (sv)... PÉRA AÍ, fala um de cada vez.. Como é O (sv)?
F1 – Mas por trás disso ai ainda tem outra coisa, o que é que o dono quer fazer com a clientela
com o público?
(sv)...
A1 – Vendê mais;
A6 – Agregar o mercado;
F1 – O que mais? Vamos D, o que mais? ( ) ...(sv)... (sv).... Então gente essa meia, esse
corpinho sarado feminino, faz a gente comprá mais;
Analisando o evento acima, percebemos que a professora não conseguiu articular em
sala um trabalho que valorizasse o gênero textual estudado. Esse contexto observado nos
remete às afirmações de Bezerra (2002), quando ela afirma que os gêneros textuais sempre
125
foram trabalhados nas escolas, restritamente como suportes estruturais e formais,
desconsiderando, portanto, sua função e os aspectos comunicativos e interacionais. Sendo
assim, esse gênero textual ao ser inserido nas práticas de leitura da turma observada, na esfera
escolar, perdeu sua função social, sendo utilizado apenas para atender a fins didáticos e
pedagógicos.
Desta maneira, nega-se aos educandos a possibilidade de reflexão sobre o contexto
sócio-histórico no qual esses gêneros textuais estão inseridos, propondo, uma educação
“bancária”, em que o ato de ler representa apenas decodificar letras e palavras, em enunciados
desprovidos de significados. Consequentemente, não se está conseguindo elevar os níveis de
letramento com que os jovens e adultos da EJA do município de Maceió chegam à escola.
Na continuidade da aula sobre propaganda a professora realiza a leitura em voz alta
para a turma, parando em alguns momentos para comentar. Neste evento, da mesma forma, a
professora não faz alusão à estrutura textual ou aos recursos linguísticos utilizados na
linguagem da propaganda. A professora fica presa à temática textual, realizando suas
reflexões apenas sobre os comentários do autor:
Quadro 11
19:40 – Professora faz a leitura em voz alta e os alunos acompanham, com os livros em mãos:
A LINGUAGEM DA PROPAGANDA
Vivemos rodeados de propaganda. São tantos produtos para serem vendidos que muitas
empresas são obrigadas a investir muito dinheiro em propaganda e garantir, com isso, que seu
produto seja visto pelo consumidor como algo “melhor” que outro. Existem empresas e
profissionais especializados em criar esses anúncios.
F1 – Viu gente! Tem pessoas que trabalham para esses produtos.
126
As propagandas aparecem nos jornais, no rádio e na televisão, nas revistas, nos cartazes
e murais espalhados nas ruas, nas estradas, nos ônibus. Pesquisas sobre o comportamento das
pessoas mostram que nem sempre compramos por necessidade.
F1 – (Né verdade gente, às vezes a gente é consumista mesmo e compra o que não precisa)
A decisão de comprar algo pode ser movida por sentimentos e desejos que foram criados
em nós pela influência da propaganda.
F1 – Viu A quando você viu a meia lembrô logo da meia Kendal...
Você já se viu, nas prateleiras de um supermercado, salivando diante de um pacote de
biscoitos que você nunca provou, só porque ele parecia ser “muito crocante” na propaganda?
Para criar esses efeitos as propagandas lançam mãos de alguns recursos:
•
Mostram a embalagem e a marca do produto com bastante destaque, para que
fiquem guardadas na memória.
•
Mostram produtos alimentícios de modo a nos despertarem o apetite; a cerveja
geladinha derramando no copo, o molho de tomate fumegando sobe a bela macarronada....
•
Apresentam os produtos ao lado de pessoas bonitas, ricas ou famosas.
•
Utilizam frases curtas com rimas ou jogos de palavras que fazem com que sejam
mais facilmente memorizadas: “Danoninho, vale por um bifinho” ou “Bombril tem mil e uma
utilidades”, “Se é Bayer é bom”.
•
Utilizam vocabulário familiar, conhecido pelas pessoas.
•
Promovem concursos e sorteios tais como: “Junte três embalagens, envie para
caixa postal...e ganhe uma viagem à Disneylândia”.
F1 – Como é? (SV) hã? É o Monbiju, mostra o Jean Nequini (SV), O da Richester é com o
Fabio Assunção, tá vendo isso eles fazem pra convencer a população.
Mas a linguagem da propaganda não serve só para vender produtos.
Existem anúncios que buscam conscientizar o público sobre fatos importantes (evitar a
Aids, por exemplo) ou convencer as pessoas a fazerem algo para a sociedade (como participar da
127
campanha contra a fome).
F1 – É gente tem essas propagandas que são legais que ajuda a combater uma doença, tem
também aquela contra o câncer de mama....
Nos últimos tempos, as técnicas da propaganda têm sido cada vez mais utilizadas na
política, especialmente na luta entre os candidatos nos períodos de eleição.
F1 – Quando chega o período eleitoral é triste né....
A3 – É uma baixaria (SV)...
A4 – Eles fica prometendo as coisas depois, nem aparece mais....
A1 – Agora professora eu vi que eles tão com problemas se saí do partido (sv)...
F1 – É se sair do partido vai perder a candidatura, mas se o candidato tiver problemas no
partido pode sair (SV)...
A3 – É professora, mas a gente tem que vê isso (SV)...
F1 – Por isso mesmo a gente tem que refletir sobre isso (SV)..., veja a história dos Gabirus,
olha só já ta tudo solto, mas pelo menos passou esse constrangimento (SV)...Pois é gente, muito bem,
mas agora vamos voltar pro texto.
Existem leis para proteger os consumidores das propagandas enganosas ou para alertálos sobre efeitos nocivos de produtos anunciados. Você pode observar que os anúncios de cigarros
trazem um aviso sobre os males do fumo. Os anunciantes não põem esse aviso porque querem mas
porque são obrigados por lei.
20:10 – Professora termina a leitura;
Texto informativo – A linguagem da propaganda, autor desconhecido, livro Viver,
Aprender, módulo3, página 30.
Após a leitura a professora e os alunos iniciam a discussão sobre a temática textual e
os acontecimentos do cotidiano:
128
Quadro 12
F1 – (SV) GENTE POR FAVOR, VAMOS PRESTAR ATENÇÃO, agora tem uma grande
polêmica sobre um produto que saiu na televisão, quem sabe o que é?
A1 – Foi um leite professora.
F1 – É... mas que marca? (SV) ...Parmalat, qual mais? Quem denunciou? E o que tinha nesses
leites?
A2 – Soda cáustica, água oxigenada (SV)...
A3 – Eu acredito que esses produtos que butaru no leite num era pra ficá mais barato, pru quê
esses produtos são mais caros que o leite (SV)...
A4 – Mas eu escutei que ...(SV)... a quantidade que colocaram não faz mal a nós; (sv)...
A2 – Isso é pra inganá a gente;
F1 – A gente tem que refletir sobre isso; lembre-se que isso é briga de cachorro grande, e o
que é que tem por trás disso?
A1 – O homi disse que não ia dá pra família dele não;
F1 – É agora já está aparecendo na televisão uma propaganda com uma atriz muito famosa que
está aparecendo, quem já viu?
A2 – É a Hebe, professora;
F1 – É a Hebe Camargo, e o que é que ela tá dizendo? Ela tá dizendo que a Parmalat não tem
nada a ver com isso, por que usaram a Hebe?
A2 – Porque a Hebe tá na mídia (SV)...
F1 – Porque ela tem um programa, eu particularmente, não gosto, mas muita gente assiste; por
isso mesmo que convence e influenciam o público;
A2 – Ela é muito vulgar;
129
Observando esse evento, notamos que assim como no anterior, a discussão proposta
pelo texto versou apenas sobre as experiências pessoais e os assuntos do cotidiano. Não
houve, portanto, comentários sobre as características textuais, tipológicas e estruturais do
gênero textual utilizado em sala.
A
professora
não
demonstrou
preocupação
em
explicitar
os
elementos
organizacionais do gênero propaganda para a turma. Não ocorreu nenhuma análise específica
em que os alunos pudessem discutir as características linguísticas do gênero. Como por
exemplo, a utilização de determinados tempos e formas verbais empregados nas propagandas.
Da mesma maneira, não foi mencionado para a turma, a ênfase que se dá à linguagem nãoverbal (as imagens) nesse gênero textual.
Mesmo quando o texto mostrou os recursos empregados na propaganda, a professora
não os comentou nem os valorizou. A turma foi de certa forma, impedida de
reconhecer/conhecer a estrutura e a função social dos diversos gêneros que eles têm acesso
dentro e fora da escola. Essa é uma lacuna que a escola deixa na formação desses sujeitos
jovens e adultos, pois para muitos deles a escola representa o principal meio de contato com o
universo da escrita. Nestas condições, os educandos ao se depararem com os textos nos
eventos sociais de leitura, fora do contexto escolar, dedicam-se apenas à decifração dos
signos.
Isso é reforçado pela falta de planejamento que impera, não só na escola pesquisada,
mas nas escolas públicas em todo o país. Essa realidade se aplica, sobretudo, aos docentes da
EJA, que são obrigados a se desdobrarem em duplas e triplas jornadas. Há também docentes
que atuam em outras áreas e têm na EJA, já que acontece preferencialmente à noite, a
possibilidade de se tornarem funcionários públicos, o que lhes garantem uma aposentadoria
futura, como já dissemos anteriormente.
130
A seguir enfocamos dois eventos em sala de aula em que a professora F2 também
“apaga”, ou não valoriza, os aspectos linguísticos dos gêneros trabalhados nas aulas de leitura.
Professora F2
Tomamos como referência para análise duas aulas observadas: segunda aula, que
aconteceu no dia 22 de agosto de 2008, em que foi trabalhada a poesia Carolina, autoria
desconhecida, retirada da Internet e a quarta aula observada no dia 10 de outubro de 2008 em
que foi trabalhada a música Construção, de Chico Buarque, retirada da Internet.
Iniciemos discutindo a segunda aula e seus eventos:
EVENTO 1 – Professora F2
20 /08/ 2008 – texto poesia – Carolina, autor desconhecido, retirado da Internet
Quadro 13
21:00 – (A professora traz uma segunda versão da Mulher da capa preta e entrega aos alunos)
F2 – Agora eu trouxe pra vocês um outro texto pra vocês; leiam o texto bem baixinho depois
diga o que esse texto quis dizer; vou dá um tempo pra vocês, até 9:20.
Carolina
Eu sou a famosa Carolina
Com jeito de menina
Eu morri há dez anos atrás....
131
Mas, até hoje corro atrás...
De um inocente rapaz
Toda sexta-feira
Em plena lua cheia...
Eu invado uma festa especial.
De um jeito fenomenal!
Depois, finjo ser uma viva mulher
E bailo com um rapaz qualquer
No final da festa, este moço belo
Acompanha-me até o meu castelo
Porém, no meio desta viagem
Repleta de uma obscura paisagem
Ele me oferece a sua capa preta
Para me proteger do frio xereta!
Então, eu entro na minha casa
No dia seguinte ele vem na lata
Buscar a preciosa capa
Assim ele descobre que eu morri há dez anos atrás
E desvenda esse mistério
Ele vai ao cemitério
132
E vê que sua capa preta
Não está na sargeta
Eu sou Carolina
Com jeito de menina
Eu morri há dez anos atrás
Mas, até hoje corro atrás
De um inocente rapaz.
Após a leitura silenciosa da turma a professora toma o turno e inicia uma “transmissão vocal”
para os alunos.
(A professora termina a leitura e pergunta à turma de quem é a voz do texto, os alunos não
conseguem identificar o narrador, a professora auxilia até que alguém consegue);
F2 – Gente vamos lá o texto fala sobre o quê? (sv); num sabe?
A – Fala sobre uma tal de Carolina,
F2 – E quem é a Carolina? PRESTA ATENÇÃO! Quem conta essa história?
A4 – É um rapaz;
F2 – Um rapaz? Veja só a primeira estrofe, o que é que diz? Sou a famosa Carolina, vejam o
verbo sou;
J – Ah professora é a Mulher da capa preta que conta;
F2 – Isso gente é a Mulher da capa preta, e como é o nome dela?
A5 – Carolina;
F2 – Isso mesmo é Carolina; Olha gente, vejam esse texto é uma outra versão da história da
Mulher da capa preta, só que esse texto é uma poesia e o outro era um conto; veja, gente é ela mesma
quem fala na poesia. Olha gente tem um momento em que ela diz quando ataca, quem sabe? (sv), nada?
Vejam gente no texto diz!
133
A1 – Aqui diz: toda sexta-feira em plena lua cheia
F2 – Isso, e por que as histórias de Trancoso só se passa em lua cheia?
A2 – Eu só sei que quando era pequena a gente sentava pra conta essas história;
F2 – Eu também gente ficava com meus irmão e meus primos contando essas histórias;
(a discussão se estende até ás 21:30)
Texto poesia – Carolina, autor desconhecido, retirado da Internet
Observamos, ao término da leitura da poesia que a professora trabalhou a temática do
texto e sua autoria. A discussão versou sobre o tema da poesia, percebemos que neste evento,
no que tange à temática textual, a professora está preocupada com a cultura e os saberes dos
alunos, uma vez que traz para a sala de aula uma história do folclore alagoano. Enfatizamos
que esse texto foi extremamente significativo para os sujeitos, uma vez que está ligado aos
contextos sociais dos aprendentes.
Apesar de reconhecermos o avanço na prática da professora, notamos também, que
ela ainda não valoriza ou simplesmente “apaga”, (assemelhando-se à professora F1), as
discussões sobre a estrutura textual e aspectos linguísticos dos mesmos. Especificando essa
aula, podemos observar que a professora levou para a sala dois gêneros textuais diferentes:
um conto e uma poesia que tratavam da mesma temática A mulher da capa preta. No
entanto, a professora não realizou a comparação entre os dois gêneros textuais.
Desta maneira, neste evento, não ocorreu nenhuma análise específica dos gêneros
textuais e, consequentemente, não se discutiu características linguísticas dos gêneros
utilizados. Após a discussão sobre o tema da poesia, a professora faz uma breve menção sobre
os dois gêneros textuais utilizados durante a aula: F2 – Isso mesmo é Carolina; Olha gente,
134
vejam esse texto é uma outra versão da história da Mulher da capa preta, só que esse
texto é uma poesia e o outro era um conto.
Neste evento a professora perdeu uma significativa oportunidade de relacioná-los,
refletindo sobre as características próprias dos dois gêneros, como por exemplo: a estrutura
textual, a linguagem diferenciada, a sonoridade, o eu poético, entre outros. Essas posturas das
professoras vão de encontro a Bazerman (2005, p. 22) quando diz: “Cada texto se encontra
encaixado em atividades sociais estruturadas e dependentes de textos anteriores que
influenciam a atividade e a organização social”.
Após a leitura e a discussão da poesia, a professora propõe uma atividade meramente
gramatical em que pede a identificação dos adjetivos na poesia:
Quadro 14
21:30 – (professora propõe uma atividade de cunho gramatical: circular os adjetivos nos dois
textos)
F2 – Agora eu fazer uma atividade para vocês, lembra que nós estudamos os adjetivos? (SV),
eu sei que foi o mês passado, mas tá no caderno, dê uma lida pra lembrá; (sv), tá bom agora circule os
adjetivos da Mulher da capa preta nos dois textos;
A1 – Tá tarde! Vai dá tempo?
F2 – Se não dé pra fazê hoje, vocês terminam amanhã;
(Os alunos iniciam a atividade a professora faz a chamada);
10:00 – (Os alunos ainda estão realizando a atividade, termina a aula)
Diante do que observamos, consideramos relevante ressaltar que o gênero textual
poesia foi utilizado como texto base para a exploração gramatical, perdendo sua função social
e os seus propósitos comunicativos. Desta maneira, a prática da professora F2, demonstra
135
certo desconhecimento sobre os gêneros textuais e como eles devem ser trabalhados nas aulas
de leitura.
Nesta circunstância, verificamos que o texto é compreendido como um repertório de
elementos gramaticais, características bem marcantes da concepção escolar de leitura. Desta
maneira, apagam-se as características sócio-comunicativas originais dos gêneros textuais que
circulam em sala.
Explicitamos que os textos utilizados nas aulas de leitura estão servindo basicamente
para as discussões e o trabalho de reconhecimento de formas gramaticais no texto. A respeito
do tema Kleiman (1989, p. 30), afirma que:
[...] o contexto escolar não favorece a delineação de objetivos específicos em
relação a essa atividade. Nele a atividade de leitura é difusa e confusa,
muitas vezes se constituíndo apenas em um pretexto para cópias, resumos,
análises sintáticas, e outras tarefas do ensino da língua.
Observemos outro momento em que a professora F2 demonstra que ainda não
consegue articular em suas aulas de leitura a discussão sobre as características dos gêneros
textuais.
EVENTO 2 – Professora F2
10 /10/ 2008 – texto música – Construção, Chico Buarque, retirado da Internet
Quadro 15
20:30 (A professora sai para pegar um aparelho de som na sala da direção. Volta e instala para
a turma ouvir a música);
136
F2 – G por favor me ajuda aqui, que eu tô com dificuldade pra passar o CD;
(A professora coloca o CD, os alunos acompanham a música Construção, de Chico Buarque
com o texto copiado em mãos. Ao terminar a professora puxa uma breve discussão)
F2 – Olha gente nessa música aconteceu alguma coisa quem descobriu?
A1 – Ah professora o homi dançou, cantou, cumeu;
F2 – Sim mas tem uma coisa bem importante, quem sabe?
A4 – Ô professora eu acho que o homi morreu;
F2 – E foi? Como é que você descobriu isso seu P? O texto diz isso onde? Lê pra gente!
P – Na primeira parte lá no final ele diz: Morreu na contramão atrapalhando o tráfego;
F2 – Isso gente ele morreu, mas morreu de quê?
A5 – Eu acho que ele sintiu que ia morrer, eu acho que morreu do coração;
F2 – Do coração? E O TEXTO FALA ISSO?
A5 – Eu intendi, assim;
F2 – Olha gente, presta atenção aqui diz na música:
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego;
F2 – Veja gente, esse texto tá dizendo o quê? Que ele se suicidou!
A6 – Eu num entendi não; e aí diz que ele se matou? Aonde?
F2 – Olha ele não diz diretamente, ele diz com outras palavras. Tá bom, agora eu vou fazer
umas perguntas pra vocês responderem, pode ser em dupla;
137
A professora copia uma atividade no quadro;
21:10 – (Os alunos não conseguem ler os implícitos, nem percebem as figuras de linguagem, a
professora, entretanto, não se detém e inicia uma atividade com perguntas factuais)
RESPONDA
a) Quem o personagem beijou?
b) Depois que saiu de casa o personagem foi para onde?
c) O que fez lá?
d) Ele voltou para casa? Sim ou não? Por quê?
e) Retire do texto cinco palavras proparoxítonas.
f) Separe as sílabas e classifique essas palavras, de acordo com a sílaba tônica: tijolo,
tráfego, atrapalhando, patamar, príncipe.
F2 – Pronto gente, agora respondam depois corrijo no quadro;
21:40 – Vamos respondê? Eu faço a pergunta e vocês respondem, TÁ CERTO? Primeira dupla
M e A.
(Os alunos respondem, a professora registra as respostas no quadro, 22:00, a aula termina).
Observando esse evento podemos constatar que em nenhum momento houve a
exploração do gênero textual música, ou o domínio discursivo em que circula. Afirmamos que
esse gênero foi utilizado nessa aula apenas como pretexto para a exploração de formas
gramaticais isoladas do contexto. Mais uma vez não houve sequer a menção das
características do gênero, como por exemplo: a linguagem figurada, as estrofes, as rimas e a
sonoridade. Consequentemente, os alunos não são levados a perceber os efeitos de sentido
criados pelo autor quando ele usa hipérboles, metáforas, entre outras figuras de linguagem.
138
Sendo assim, não foram valorizadas as características sócio-comunicativas originais
desse gênero, ou seja, no ambiente escolar, sobretudo, nas turmas de EJA conforme
observamos, os textos continuam31 sendo transformados em enunciados escolares que servem
para o reconhecimento e a memorização de nomenclaturas gramaticais.
Enfatizamos que os eventos de letramentos nas aulas de leitura das professoras da
EJA são direcionados, sobretudo, para atender a fins didáticos e pedagógicos, e ficam
relegados a um segundo plano a formação de um leitor que necessita transitar pelos diversos
domínios discursivos, nos quais circulam os gêneros. Com relação às questões formuladas,
vimos que praticamente ignoram a voz do texto, e não levam o aluno à reflexão, pois são
perguntas superficiais e mecânicas, portanto, não exigem esforço cognitivo por parte dos
alunos.
Ao agir desta maneira, as professoras demonstram que não percebem que a
identificação de gêneros através das características é um conhecimento muito útil para
atribuirmos significados àquilo que lemos, conforme nos informa Benzerman (2006, p. 3031):
[...] gêneros são o que nós acreditamos que eles sejam. Gêneros emergem
nos processos sociais. Por isso, para que haja uma discussão, neste sentido,
nas aulas de leitura da EJA as professoras necessitariam dominar os
conhecimentos a cerca do tema, o que efetivamente não ocorre na prática.
A partir de nossas observações, certificamos que os eventos de letramentos
proporcionados aos sujeitos da EJA, nas aulas de leituras, mostram-se, quase sem exceção,
desvinculados dos contextos sócio-culturais reais. Ou seja, há a falta de sintonia entre as
práticas e os eventos de letramentos que ocorrem dentro e fora da escola. Soares (2003, p.
106) nos mostra essas diferenças:
31
Houve uma pesquisa realizada nesta mesma instituição em 2004, com outras professoras, em que foi
constatada a dificuldade dessas profissionais em articular trabalhos em sala de aula com os gêneros textuais.
Pesquisa realizada por Queiroz, et. alii. (2004).
139
•
na vida cotidiana, uma narrativa, um poema aparecem em um livro
que atrai pela capa, pelo autor, pela recomendação de alguém [...] na escola,
a narrativa ou poema estão na página do manual didático ou reproduzidos
em uma folha solta, desligados de seu portador original, não há escolha, deve
ser lidos e relidos, haja ou não interesse.
•
na vida cotidiana, um anúncio publicitário é visto de relance em um
outdoor, ao se atravessar uma rua, ou em uma página impressa, ao se folhear
uma revista, é lido casualmente [...] na escola, o anúncio publicitário aparece
reproduzido numa página do manual didático, fora de seu contexto original,
deve ser analisado, interpretado, questões devem ser respondidas.
•
na vida cotidiana, o jornal é folheado em casa, no ônibus, no banco da
praça, o leitor escolhe, levado por interesses pessoais ou profissionais, uma
determinada reportagem ou notícia [...] na escola, a reportagem ou notícia
[...] haja ou não interesse, deve ser lida com atenção, deve ser interpretada,
pressupostos devem ser identificados, inferências devem ser feitas.
Um trabalho como esse, muitas vezes, não atrai o público da EJA que é formado por
sujeitos possuidores de culturas e de múltiplos saberes, que diariamente aprendem a
sobreviver numa sociedade regida pela escrita em que a escolarização deveria lhes
proporcionar independência e inclusão social.
Dessa forma, o estabelecimento de objetivos para a leitura, no contexto escolar, deve
ser revisto, pois, fora dos seus muros, no cotidiano, as leituras acontecem em práticas sociais.
Lemos para satisfazer nossas necessidades, seja para informar, divertir, trabalhar se
aperfeiçoar.
Finalmente, gostaríamos de afirmar que as práticas das professoras mostram que
ambas estão influenciadas pelo uso dos gêneros textuais em sala. Entretanto, não possuem
ainda uma visão clara sobre a relação que há entre gêneros textuais e letramento, uma vez que
não reconhecem os gêneros textuais enquanto instrumentos que dão suporte para as atividades
nas diversas situações do cotidiano dos educandos.
Com isso, percebemos que os gêneros textuais, quando utilizados nas aulas de leitura
nas turmas da EJA, são trabalhados pelas professoras inconscientemente, sem que haja um
140
trabalho intencional para as funções dos gêneros sociais nos domínios discursivos em que
circulam. A partir dos dados coletados afirmamos que as professoras da EJA, mesmo se
esforçando, ainda não estão preparadas para auxiliar os educandos a superarem suas
limitações em relação à leitura.
Acreditamos que essa situação persiste, principalmente, devido à formação inicial
das professoras pesquisadas que não investiram nas discussões teórico-metodológicas sobre
os gêneros textuais, enfatizando as questões constitutivas dos gêneros, sobretudo, no que se
refere à temática, sentidos, conteúdos e as esferas discursivas com suas realidades sócioculturais.
No tocante à formação continuada dos educadores da EJA que estão atuando nas
escolas da SEMED, observamos que não há uma política, desde 2007. Sendo assim, não
houve uma discussão aprofundada com esses educadores que incluísse os estudos teóricos
acerca dos gêneros textuais, para que eles pudessem posteriormente utilizar esses
conhecimentos para ampliar a competência linguística, textual e discursiva dos educandos.
A partir dos aspectos acima discutidos, detectamos a necessidade de se garantir no
Estado de Alagoas, oportunidade de formação continuada para os profissionais que atuam na
EJA, para que eles/as tenham um espaço para refletir sobre sua prática e sobre sua própria
formação enquanto leitores/as. E que nestes momentos de estudos possam haver momentos
para questionamentos do tipo: em que consiste a prática de leitura? Qual a diferença entre
leitura como prática social e leitura como prática escolar? O que é ser agenciador/a de
letramento? O que e quais são a estratégias de leitura? Em que fase da EJA devemos ensinar
leitura?
Enfim, uma formação que leve o professor da EJA a perceber-se enquanto leitor,
aliada a discussões que não restrinjam o ensino da leitura apenas ao domínio do código. Mas
que defendam que o ato de ler se constrói na interação entre sujeitos de uma determinada
141
cultura, tendo o professor como principal agenciador desta construção de conhecimentos,
possibilitando, assim, a reavaliação das práticas de leituras presentes no cotidiano escolar,
sobretudo, nas turmas da modalidade.
Devemos, da mesma maneira, enfatizar que a formação continuada desses
profissionais, muitas vezes, é prejudicada por questões financeiras. Devido ao excesso de
carga horária, pois trabalham nos três horários, os professores da EJA não têm disponibilidade
para participarem das poucas “formações”, que acontecem de maneira pontual, conforme
dissemos anteriormente.
142
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo de nossa pesquisa foi investigar até que ponto os eventos e práticas de
letramentos que os educandos da EJA estão tendo acesso no espaço escolar, especificamente,
nas aulas de leitura, lhes possibilitam tornarem-se leitores experientes/letrados. Ao analisar a
realidade pesquisada à luz da fundamentação teórica escolhida constatamos que as práticas de
letramentos, das aulas de leitura, presentes no cotidiano escolar das turmas da EJA, do
município de Maceió, ainda não estão oferecendo as condições adequadas que atendam às
necessidades de inserção social dos sujeitos que a frequentam na atual sociedade letrada.
A análise dos dados nos aponta, que ambas as professoras pesquisadas são formadas
em pedagogia e possuem pós-graduação em psicopedagogia e educação infantil, e ainda
possuem uma concepção limitada tanto da modalidade, como de leitura. Da mesma forma,
notamos que na escola pesquisada não se compreende a importância da área, pois quando a
leitura aparece nos projetos pedagógicos da escola, ocorre de forma isolada, fragmentada e
superficial. Desta maneira, permanece ocupando um lugar secundário no currículo da escola.
Analisando o ambiente escolar investigado, observamos que o ensino de leitura está
sendo limitado. Apontamos a seguir três empecilhos básicos que a instituição escolar impõe
aos sujeitos professores e alunos e destacamos posteriormente os aspectos observados que
limitam os eventos e as práticas de letramento nas turmas da EJA.
Quanto ao ambiente escolar destacamos que no nível macro -, da escola enquanto
espaço leitor detectamos, por exemplo, a falta de estrutura. A escola não possui um espaço
exclusivo para que os alunos realizem suas leituras, o único espaço disponível possui um
acervo limitado, no qual os/as professores/as não se sentem bem acomodados com os alunos
143
devido ao tamanho reduzido e a falta de segurança; sendo assim, os eventos de letramento que
a instituição oferta aos educandos do turno noturno limitam-se quase que exclusivamente aos
que ocorrem em sala de aula;
Quanto ao planejamento, notamos a ausência de um planejamento – no qual se
construa uma metodologia de intervenção que ressignifique o processo de aprender a ler,
valorizando as interações dos sujeitos/educandos com o mundo letrado e os usos sociais da
leitura;
Aliado a isso, foi visível a dificuldade de acesso aos materiais escritos – que se revelou
como um dos principais obstáculos para o desenvolvimento do trabalho com textos na sala de
aula observada. A escassez de material escrito na escola, acontece porque a máquina
copiadora encontra-se quebrada, desde 2007. Sendo assim, nas aulas de leitura em que os/as
professores/as não utilizam os textos do livro didático, os alunos acompanham a leitura
realizada em sala sem estarem com os textos em mãos e também confirmamos a ausência de
eventos de letramento fora de sala.
E no nível micro, isto é, no espaço da sala de aula enquanto espaço do ensino de
leitura observamos que no conjunto das aulas observadas, especificando a prática
desenvolvida nas aulas de leitura percebemos que as professoras rompem com a postura de
considerar o livro didático como único recurso para se trabalhar leitura, e de certa forma há
um avanço. No entanto, talvez por falta de condições objetivas de produções materiais, foram
utilizados em suas aulas uma diversidade muito limitada de gêneros textuais, priorizando o
trabalho com textos retirados da Internet.
Dessa maneira, não foi apresentado nas duas turmas uma quantidade significativa
dos gêneros textuais que circulam nas diversas esferas sociais. Consequentemente, os eventos
de letramento proporcionados aos sujeitos, nas aulas de leitura, estão desvinculados dos
contextos sócio-culturais que ocorrem fora do contexto escolar.
144
No que tange às temáticas dos textos utilizados nas aulas de leitura, comprovamos
que houve oscilação nas escolhas das professoras, entre textos que abordam assuntos
pertinentes à realidade dos alunos e textos que não despertam o interesse dos alunos e que, ao
contrário, os infantilizam.
A postura da professora F1, principalmente, nos mostra que ainda não conseguimos
superar a tradição de infantilizar os trabalhadores que buscam a escolarização nas turmas da
EJA, no município de Maceió. Essa distância entre as práticas sociais de leitura dentro e fora
da escola faz com que muitos alunos abandonem a escola, já que os assuntos da escola muitas
vezes não lhes interessam.
Analisando as escolhas das temáticas textuais da professora F2 percebemos que ela
conseguiu superar essa tradição de infantilização dos educandos da EJA que citamos no
parágrafo anterior, pois os textos escolhidos trazem temas adultos, atuais e que despertaram o
interesse dos sujeitos aprendizes/leitores. Contatamos em nossa pesquisa a utilização de
poemas, crônicas, descrição, música entre outros gêneros textuais.
Especificando o trabalho com esses gêneros, detectamos que a prática das duas
profissionais se assemelha, uma vez que não fazem referência às especificidades de cada
gênero, apresentando, portanto, uma enorme dificuldade em trabalhar aspectos linguísticos e
estruturais que esses gêneros possuem.
Assim, ressaltamos que os gêneros textuais circulam nas turmas da EJA, sobretudo
para atender a procedimentos didáticos, seguindo quase sempre uma rotina: leitura em voz
alta, ou transmissão vocal proferida pelas professoras, interpretação textual direcionada pela
professora, realização de exercícios que acompanham os textos, e a correção oral de
atividades. Desta forma, as professoras, ao trabalharem com gêneros textuais em sala não
estão levando em conta as suas funções e os aspectos comunicativos e interacionais,
limitando-os a suportes servirem para a realização de atividades.
145
Enfim, durante o período da investigação, constatamos que no tocante ao ensino de
leitura, tanto a professora F1 como a professora F2, raramente conseguem agenciar em suas
aulas, práticas de letramento significativas, que auxiliem os educandos a tornarem-se leitores
experientes e maduros. As principais dificuldades que coincidiram nas práticas das duas
professoras pesquisadas foram:
● De maneira geral, o ensino de leitura raramente ocorreu nas aulas observadas, ou
quando acontecia, aparecia como coadjuvante. Acreditamos que essa “desobrigação” por
parte das professoras em ensinar leitura deva-se à compreensão equivocada de muitos
profissionais. Muitos entendem que apenas na alfabetização há “obrigação” de ensinar leitura,
e desta maneira, à medida que o aluno avança da 1ª fase, não mais se ensina a ler, e utiliza-se
apenas a leitura para ensinar outras disciplinas. Esse fato ocorre porque os envolvidos no
processo educativo – em especial os professores – não valorizam a importância de se ensinar a
leitura em todas as instâncias educativas.
● Houve uma grande recorrência do trabalho com leitura baseado na transmissão
vocal, e vimos que essa metodologia utilizada pelas professoras não conseguia envolver
grande parte da turma, já que muitos alunos não se concentravam na escuta dos textos
proferidos pela professora, permanecendo dispersos. Inferimos que nessas circunstâncias o
processo de letramento dos alunos não foi fortalecido.
Analisando as práticas das professoras, observamos que estas dificuldades no trato
com a leitura e letramento dos educandos demonstram que ambas não possuem a formação
específica para atuar na EJA, bem como, desconhecem, os fundamentos linguísticos
necessários às atividades para trabalharem a leitura. Assim sendo, agem muitas vezes
baseadas na intuição, ou transplantam para a modalidade práticas pedagógicas que
vivenciaram em seus períodos de escolarização.
146
Avaliando esse contexto, afirmamos a urgência em se garantir, tanto nas formações
iniciais, como nas formações continuadas para os professores da EJA, no Estado de Alagoas,
a presença de fundamentação teórica específica na área de leitura, que traga reflexões sobre:
Alfabetização, Letramento e Modelos e estratégias de leitura. Conhecendo essas teorias,
acreditamos que esses/as educadores/as talvez possam ampliar as suas percepções em relação
ao processo de leitura, reconstruindo seus pontos de vista em relação à área. Dessa forma,
poderão refletir sobre as suas práticas pedagógicas, no sentido de observarem que tipo de
leitores eles estão efetivamente formando.
Da mesma forma, é imprescindível que esses/as profissionais tenham em sua
formação inicial/continuada uma fundamentação teórica sobre as especificidades do público
da EJA, pautada, sobretudo, na Pedagogia Progressista Libertadora de Freire. Para que os
sujeitos professores possam desenvolver nas salas da modalidade um ensino de leitura que
supere a visão de transferência de conhecimentos, memorização de conteúdos e leitura
desconectada da realidade a partir de textos infantis.
Com essa formação específica os professores da EJA poderão auxiliar o
desenvolvimento da autonomia leitora dos educandos, reproduzindo em sala de aula os
eventos e práticas de letramentos que os sujeitos têm ou possa vir a ter em seu cotidiano. E
que possam demonstrar, através dos diversos gêneros textuais, que a leitura é utilizada em
todos os momentos de suas vidas, servindo a diversas finalidades: divertir em alguns
momentos, informar, instruir, possibilitar a aprendizagem de todas as outras disciplinas e
acessibilizar melhores possibilidades de emprego.
Finalmente, reafirmamos a importância dos professores da EJA inserirem nas salas
de aula um contexto de aprendizagem baseado na interação, no qual o aluno seja percebido
não como mero leitor passivo de um texto que traz um único significado, mas que sejam
considerados como detentores de conhecimento capazes de dialogar com os autores. E tenham
147
condições de refletirem e interpretarem os significados dos textos lidos, ou seja, sujeitos
ativos e reflexivos construtores de conhecimentos, criando condições para que essas pessoas
se tornem efetivamente leitoras experientes e letradas. Enfim, a partir do que a pesquisa
apontou, fica explícita a necessidade de se estreitar o diálogo entre Pedagogia e Letras.
148
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156
APÊNDICES
Apêndice 1
QUESTIONÁRIO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Prezada(s) Professora(s)
Como você(s), sou professora da Educação de Jovens e Adultos (EJA), da Secretaria
Municipal de Educação de Maceió (SEMED), no momento estou cursando o Mestrado em
Educação no CEDU/UFAL, o meu objeto de pesquisa é: Os eventos e práticas de
letramento que os educandos da EJA estão tendo acesso no espaço escolar,
especificamente, nas aulas de leitura, lhes possibilitam tornarem-se leitores proficientes?
Faz parte do contexto dessa investigação a observação de aulas de Língua Portuguesa, mais
especificamente, de leitura de professores da EJA da rede municipal, que atendam aos
critérios pré-estabelecidos, avaliando de que forma o livro didático está sendo utilizado em
sala.
Este questionário nos auxiliará na coleta de informações, no que diz respeito às
características pessoais e de formação dos profissionais que estão atuando na EJA. Os dados
de investigação serão utilizados no meio acadêmico, sendo assim, garanto que seus dados
pessoais serão mantidos em sigilo absoluto.
Agradeço a colaboração, buscando a melhoria de qualidade da Educação de Jovens e
Adultos do Município de Maceió e do Estado de Alagoas.
157
Apêndice 2
QUESTIONÁRIO:
I - Identificação:
Nome (opcional): _________________________________________________
Faixa etária:
20 a 25 anos ( )
26 a 31 anos ( )
32 a 37 anos ( )
38 a 43 anos ( )
+ 44 anos
( )
Sexo:
Fem (
)
Masc ( )
II- Formação Profissional
Possui curso médio normal (antigo magistério)
( ) Sim ( ) Não, qual ?____________________________________________
158
Possui curso superior?
( ) Sim, qual?____________________________________________________
( ) Não;
Possui Pós-graduação? Qual?
III – Dados Funcionais
Há quanto tempo trabalha na Secretaria Municipal de Educação de Maceió SEMED?
_______________________________________________________________
Qual foi a sua forma de acesso a esta instituição?
( ) concurso – Ano _________
( ) contratação – Ano________
IV- Outros dados
Exerce o magistério em outra instituição?
( ) sim, que série?______________________________________________
159
( ) não
Com que frequência você usa o livro didático em suas aulas de Língua Portuguesa?
( ) todo dia;
( ) mais que três vezes por semana;
( ) menos que três vezes por semana;
160
Apêndice 3
ENTREVISTA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA
1.
Quanto tempo trabalha na EJA?
2.
O que motivou a dar aulas para o público da EJA?
3.
Utiliza apenas o livro didático em suas aulas de leitura ou recorre a outros
materiais? Quais?
4.
Em sua formação inicial ou continuada houve/há alguma disciplina
exclusiva em leitura?
5.
O que está lendo atualmente?
6.
Que importância você dá a leitura?
7.
Você se considera leitora?
8.
O que mais gosta de ler em suas hora vagas?
9.
O que é Letramento para você?
161
Apêndice 4
AULAS ANALISADAS
06/11/2007 – MARIA VAI COM AS OUTRAS
19: 15 – cinco alunos na sala de aula;
(professora entra na sala e senta-se esperando que chegue mais alunos)
19:30 – ( 15 alunos em sala de aula, professora inicia a aula);
F1 – Boa noite, hoje nós vamos começar a aula com uma poesia bem conhecida é MARIA
VAI COM AS OUTRAS, vamos lá quem qué lê?
F1 - seu J o senhô começa,
F – não professora to cum dõ de cabeça;
F1 – Seu M num qué lê?
M – Tá bom professora vou lê
(o alunom lê o texto na integra)
MARIA VAI COM AS OUTRAS
Era uma vez uma ovelha chamada Maria
Onde as outras ovelhas iam, Maria ia também
As Ovelhas iam pra baixo. Maria ia pra baixo
As ovelhas iam pra cima. Maria ia pra cima
Maria ia sempre com as outras
Um dia, todas as ovelhas foram para o Pólo Sul
Maria foi também
Aí, que lugar frio!
As ovelhas pegaram uma gripe!!!
Maria pegou gripe também. Atchim!
Maria ia sempre com as outras
Depois todas as ovelhas
Foram para o deserto
Maria foi também
AÍ, que lugar quente!
As ovelhas tiveram insolação
Maria teve insolação também. Uf! Puf!
Maria ia sempre com as outras
Um dia, todas as ovelhas resolveram comer salada de jiló
Maria detestava jiló. Mas, como todas as ovelhas comiam jiló
Maria comia também. Que horror!
162
Foi quando, de repente, Maria pensou:
“Se eu não gosto de jiló
Por que é que eu tenho que comer salada de jiló?”
Maria pensou, suspirou,
Mas continuou fazendo o que as outras faziam
Até que as ovelhas resolveram pular do alto do
Corcovado pra dentro da lagoa
Todas as ovelhas pularam
Pulava uma ovelha
Não caía na lagoa, caía na pedra
Quebrava o pé e chorava: mé!
Pulava outra ovelha,
Não caía na lagoa, caía na pedra,
Quebrava o pé, chorava: mé!
E assim quarenta e duas pularam,
Quebraram o pé, chorando: mé! mé! mé!
Chegou a vez de Maria pular
Ela deu uma requebrada,
Entrou num restaurante e comeu uma feijoada
Agora, mé, Maria vai para onde caminha o seu pé!
( ao terminar a leitura a professora tentar estabelecer um diálogo sobre o texto, mas os alunos
não se mostram interessados)
F1 – Gente e aí o que foi que vocês entenderam do texto? (SV)
A1 – Eu entendi que conta a história de uma ovelhinha;
F1 – Sim, mas o que é que tinha essa ovelhinha?
A1 – Ela pegô gripe professora!
F1 – Gripe? E o quê mais?
A1 – Ela comeu jiló.
F1 – Sim, mas que é que esse texto qué dizer pra gente dona M;
A2 – Eu acho que essa história é de criança professora;
F1 – É de criança, mas traz uma mensagem pra gente, que mensagem é essa?
A2 – Eu num sei não;
F1 – Seu A sabe o que o texto quis dizer?
A3 – Olha professora eu num li não, pru quê eu tô tentando mexê na agenda do meu celular;
F1 – Então C o que você achou?
C – Eita professora conta a história de uma uveia que andava com otras uveia;
163
F1 – Sim, mas o que acontecia com essas ovelhas?
A4 – Elas si machucava;
F1 – mais alguém qué falá? (sv), ninguém?
F1 - Tá bom então agora eu vô lê otro texto pra gente;
Agente pode
( autor desconhecido)
Agente pode
Agente pode morar numa casa mais ou menos;
Numa rua mais ou menos;
Numa cidade mais ou menos;
Agente pode
Dormir numa cama mais ou menos;
Comer um feijão mais ou menos;
Ter um transporte mais ou menos;
Até ser obrigado a acreditar mais ou menos no futuro;
Agente pode
Olhar em volta e sentir que tudo está mais ou menos;
Tudo bem;
O que agente não pode
Mesmo, nunca, de jeito nenhum;
É amar mais ou menos;
É sonhar mais ou menos;
É ser amigo mais ou menos;
É namorar mais ou menos;
É ter fé mais ou menos;
É acreditar mais ou menos;
Senão agente corre o risco de se tornar uma pessoa mais ou menos;
20:45 – ( professora termina a leitura e pede a opinião dos alunos)
A1 – É professora ninguém pode ser mais ou menos;
164
PN – Sim, isso a poesia diz, mas eu quero que vocês digam qual a mensagem do texto;
A2 – Há! eu entendi que agente tem que ter opinião, tem que saber o que é que quer da vida.
Por que esses jovens de hoje, não quere nada, não tem Deus no coração, por isso faze tanta
coisa errada;
PN – É verdade seu J, o senhor tem razão as pessoas hoje não sabem o que querem da vida;
A3 – Eu mesmo todo dia rezo pros meus filhos num fazer coisa errada, também converso
muito com eles;
A4 – por que é como seu J diz as pessoas hoje não procura Deus só quere beber e fuma droga;
PN – por isso agente precisa conversar mais com esses jovens;
A1 – No meu tempo professora agente tinha medo das coisas, hoje não;
(houve muita conversa paralela, discussão interessante)
21:00 – ( diretora pede licença e dá um aviso sobre a falta de água na escola)
PN – ta bom, mas agora vamos fazer uma atividade; ( professora copia uma atividade de
palavras cruzadas no quadro para os alunos copiarem e responderem em dupla);
21:15– (Alguns alunos reclamam)
A3 – professora é quantos quadrinhos?
A4 - eu já perdi a conta;
PN- Tem que contar direitinho senão fica errado, não vai dá pra escrever a palavra dentro;
A1 – Professora o número um são quantos quadrados?
PN – são dez!
A1 – É ta certo;
A5 – Olha professora, eu num vou fazer não meu óculos ta ruim, e eu num to enxergando
nada;
PN – Ta bom dona M, se a senhora não ta conseguindo copiar, deixe que V copia pra vocês
duas;
21:30- ( os alunos começam a reclamar das dificuldades)
A3 – Professora eu to quebrando a cabeça;
PN – É pra quebrar a cabeça mesmo, tem que pensar!
A4 – Há! Já to ficando com dor de cabeça;
A2 – professora por que que a senhora num responde no quadro?
PN- Não seu J se eu responder toda vez no quadro vocês não vão aprender. Olha a dupla que
responder primeiro vai ganhar um ponto;
21;35 - ( professora pergunta se alguém havia terminado, uma dupla diz que sim)
A6 – Professora acho que agente conseguiu, a senhora que olhar?
165
PN – Ta bom vou aí!
PN – Não seu M, vocês responderam como vocês acham a palavra é a resposta da pergunta e
tem que preencher todos os quadrinhos;
A6 – há professora assim é muito difícil;
PN- Olha tem que presta atenção nas perguntas e a resposta tem que ser ua palavra que caiba
nos quadrinhos;
PN – Alguma outra dupla já fez?
A2 – sim, olha aqui professora!
PN – Muito bom, ta certo, essa dupla terminou gente;
A4 – Já terminamos também, vem cá professora!
PN- essas aqui tão certas, mas olhe estas duas...Quem mais terminou? Olha gente vamos
cuidar que a hora ta passando;
9:30 – (professora resolve ir responder no quadro com ajuda dos alunos)
PN – Vamos lá seu J e dona M a resposta do número um;
A1 – a resposta é agrotóxico
PN – E a dois seu P e dona J;
A3 – a resposta é agricultura;
PN- A três quem responde/
A4 – nós professora;
PN- diga V;
A4 – é nordeste
PN – Quem qué responder a quatro?
A5 – eu professora!
PN – diga!
A5 – inverno
PN- a cinco?
A6 – aqui professora, a resposta é Alagoas;
PN- agora vou indicar uma dupla que ainda não falou, dupla três;
A7 – Agente não consegui professora tá muito difícil;
PN- Vamos ajudar, gente,
PN- Qual é a capital do Brasil?
A – Brasília;
PN – Muito bem;
PN- a seis agora, seu P e dona C;
166
A8 – Maceió;
PN- muito bem;
PN- nossa só falta dez minutos pra tocar vou responder as que falta;
PN- a sete é Arapiraca, a oito é Palmeira, nove é português, a dez é América do Sul;
22:00 – a aula termina;
167
Apêndice 5
AULAS ANALISADAS
26/11/2007
CERCO AO CIGARRO
7:05 – (chegam sete alunos )
7:10 – ( professora chega, chegam mais seis alunos, professora senta-se e aguarda);
7:15 – (professora avisa que vai iniciar a aula, pede para chamar os alunos que estão fora
lanchando);
F1 – boa noite gente (SV), BOA NOITE, gente hoje eu estou um pouco rouca, me ajudem,
vocês trouxeram o livro hoje? (SV) quem não trouxe senta com quem trouxe, e abram na
página 283;
A1 – qual é a página?
F1 - 283, todo mundo achou? Gente esse texto fala sobre o quê? Isso o CERCO AO
CIGARRO, agora eu queria saber quem pode ler pra me ajudar que eu estou rouca; quem
gostaria? C?
A2 –tá bom professora ( aluna lê, enquanto a aluna lê há muito ruído na sala, os outros alunos
permanecem conversando )
CERCO AO CIGARRO ( livro didático)
CERCO AO CIGARRO
Novas medidas do governo prometem colocar a industria do tabaco contra a parede e
complicar a vida de quem fuma.
Fumantes, preparem-se. O Ministério da saúde está para lançar um pacote de ações que
vai dificultar a vida de quem não conseguem viver sem a fumaça de cigarro.
Antitabagismo ferrenho, o ministro da saúde promete fazer o que os seus antecessores
tentaram e não conseguiram: vencer a luta contra o fumo. Se vai conseguir, é outra
historia. O país tem 35 milhões de fumantes, e calcula-se que a cada ano 80 mil pessoas –
ou nove por hora – morrem vitimas de alguma doença relacionada ao consumo do
cigarro. Menos de 3% dos fumantes conseguem abandonar o vicio por ano, segundo
estatísticas mundiais.
A Organização Mundial de Saúde, que considera o tabagismo a maior pandemia de
todos os tempos, informa que mais de 1 bilhão de pessoas em todo mundo são
dependentes do cigarro, o equivalente a um terço da população adulta. Resultado: o
168
fumo mata anualmente 3,5 milhões de pessoas, mais que a AIDS, a cocaína, a heroína, o
álcool, o suicídio e os acidentes de transito somados. A ironia é que pesquisas feitas nos
Estados Unidos mostram que a maioria dos fumantes sabem disso, mas julga que nada
acontecerá com eles.
A primeira medida será aumentar as campanhas antitabagista. O governo estuda
também uma forma de abrir um processo nos Estados Unidos contra a industria
multinacional do tabaco. A idéia é cobrar o ressarcimento dos gastos do Sistema Único
de Saúde com doenças originadas do fumo. A indenização pode ficar entre 40 e 50
bilhões de dólares.
F1 – olhe gente eu vou dá uma refoçada, mesmo estando rouca, eu vou lê pra vocês; olhe
gente o título do texto é: CERCO AO CIGARRO; (professora relê o texto)
F1 - olha gente vocês já perceberam que o texto é muito importante né, ele fala o quê? Que
mais de 35 milhões de pessoas morrem por ano no mundo e que nove pessoas morrem por
dia, já pensaram nisso? Além de outras doenças que o cigarro agrava; olhe! pensem bem num
é grave, tem alguém fumante aqui?
A2 – eu fumo;
F1 – você já pensou sobre isso;
A3 – Olhe professora eu já fumei e deixei; (SV)
F1 – Péra aí seu A que eu vou até aí, GENTE POR FAVOR VAMOS OUVIR SEU A TÁ
FALANDO;
A3 – Eu fumei mais de 20 anos professora depois eu deixei, eu comecei era novo e já deixei
tem mais de 30 anos; ta cum mais de 3 eu deixei em 76;
F1 – Seu A e o senhor acha que ta livre dos malefícios do cigarro?
A3 – olhe professora, segundo a medicina diz que adepois que a pessoa deixa ainda fica o
cigarro no organismo, veja só há dois anos atrás eu fui tirar um raio X e ainda apresentou,
olha só professora depois de 30 anos;
F1 – Ta vendo gente?
A3 – por isso professora num é grave não, é gravíssimo; (SV);
A1 – agora tem um tratamento que dá uma pastilha de necotina e a pessoa começa a deixar, as
nem todo mundo consegue, eu mesma num consegui;
F1 – E me digam uma coisa a pessoa fuma por que qué?
A3 – no começo é por que qué, a despois se avissia,
A1 – é toda raivinha, toda coisinha você qué fuma,
A3 – a tóia do cigarro nem o cachorro qué, e o fumante pega e bota na boca que eu já vi;
A4 – Eu sou fumante mais queria deixar;
169
A3- Dona M acabe cum isso que num presta; (SV)
F1 – ô M se você é fumante por que num fuma na escola?
A4 – o ano passado eu ainda trazia, hoje não;
P1 – vocês sabiam que o cigarro num faz mal só a você, não toda família fuma junto, sabiam
disso? (SV)..
F1 – ô gente, e que vocês acham dessas campanhas que aparecem na televisão? (SV),
AMEDRONTAR NÃO CONSCIENTIZAR; (SV);
F1 – então gente uma pessoa em sã consciência não devia nem colocar um cigarro na boca;
(SV)..
A2 – e a bebida professora? (SV)...
F1 - inclusive tem até uma música: aquela beber cair e levantar; que letras né gente? que
cultura que vamos deixar pro nossos filhos...
A4 – um amigo foi comprar uma carteira e dizia assim fumar causa impotência sexual, aí ele
disse não quero essa me de essa outra, e na outra dizia fumar causa câncer de pulmão;
F1 – veja ele é tão machista que prefere o que causa câncer de pulmão, mas o cigarro causa os
dois...(sv)...
A5 – agora tem gente que fuma quando ta esperando bebê, aí a criança tá fumando também;
F1 – É gente mais essa pessoas são doente a nicotina que tem no cigarro vicia, a pessoa fica
dependente; e o que vocês acham que agente pode fazer pra se livrar do vício do cigarro?
quero sugestões? O que vocês acham que os órgãos públicos podem fazer pra ajudar as
pessoas a deixar o cigarro; os fabricantes, os políticos; Vocês acham que rola muito dinheiro
por trás da indústria do cigarro?
A6 – é claro professora que tem dinheiro, por que as fábricas pagam muito imposto e aí os
governantes se fazem que não tão vendo;
F1 – olha gente o que o Otávio ta dizendo é isso mesmo; a industria de cigarro pagam muitos
impostos, por isso o cigarro e negociado livremente, qualquer criança pode comprar. (SV)....
Muito bem, agora eu gostaria que vocês fizessem em dupla algumas sugestões que pudesse
melhorar essa situação. Vamos dizer que vocês estivessem no poder o que vocês fariam para
restringir a venda de cigarro, gostaria de saber o que vocês fariam pra resolver esse problema;
Escrevam numa folha de papel, podem recorrer ao texto;
20:40 – (professora pede uma produção textual e aguarda, faz a chamada)
21:00 – (professora pede pra eles se apressem)
F1 – Vamos gente olha a hora;
170
( os alunos continuam discutindo entre si e realizando a atividade, ao terminar entregavam a
professora);
21:10 - (professora avisa que vai começar a ler as sugestões dos alunos)
F1 – vamos lá gente vou começar lendo o da Maria Creuza, mas eu vou ler só as sugestões
mais interessantes.... a Maria Creuza diz que; se tivesse o problema nas mãos dela, ela iria
ao órgão publico e pedia pra acabar com o plantio do fumo, aumentava também o valor
do cigarro, que uma carteira de cigarro custasse dez reais. O que vocês acham?
A2 – era bom mesmo, pro tem carteira que custa até um real;
A4 – Mas é Paraguai,
F1 – Como é esse Paraguai?
A5 – é um tipo de cigarro professora que é pior do que o outro, meu genro mesmo fuma e
quando ele fuma esse do Paraguai dá uma tosse nele;
F1 – E é? Eu nem sabia desse outro tipo cigarro;(sv)... Nunca fumei graça a Deus, uma vez eu
tentei fumar tinha uns treze anos aí eu me ingasguei com a fumaça nunca mais quis;
A3 – e eu professora comecei a fumar com sete anos;
F1 – sete anos? E quem fumava na sua casa?
A3 – meu pai e minha mãe, ela mandava eu acender o cigarro, aí eu acendia e fiquei viciada;
meu pai saia e comprava aqueles fumo de rolo aí ele dividia um pedaço pra ele, um pedaço
pra minha mãe, um pra mim e outro pro meu irmão;
F1 – O GENTE PRESTA ATENÇÃO!
A3 – Aí minha mãe dizia o J tu vai deixar esses minino tudo viciado, aí ele dizia é melhor eu
dá di que eles carregar do fumo dagente;
A3 – Eu fumava escondido, e meu pai dizia que se pegasse dava um tapa na boca dagente;
(SV)...E lá em casa três fumava e dois não fumava;
F1 – Vejam só gente quanta história interessante; mas vamos lá vamos ver o que o T sugeriu:
ele diz: eu sou contra o cigarro , ele complica a vida das pessoas; mas T você não sugeriu
o que fazer, faltou você botá aqui sua sugestão, era pra dá sua sugestão;
A7 – há professora, mas eu intendi assim;
F1 – tá bom, tá certo, agora vou lê a do O aí ele diz: Todos os brasileiros precisam tomá
atitude pra deixar o cigarro, pra depois não sofrê com as doenças que o cigarro causa;
Sim Otávio, mas faltou também a sua sugestão; vou lê agora o de dona M ela diz: Eu sou
fumante, mas não gosto de cigarro, eu gostaria que os governantes fizessem uma
campanha para acabar com o tráfico eu digo que é tráfico por que o cigarro é uma
droga que mata muitas pessoas, vamos lutar para acabar com o vicio; Olha dona M não
171
existe tráfico por que o cigarro é comerciado livremente, no entanto, é uma droga sim, e mata
muita gente; vejam mesmo ela sendo fumante ela é contra. Agora eu vou ler a opinião do seu
J ele diz : Eu ia proibir a venda do cigarro pra que ninguém pudesse fumar, Vejam gente
vocês acham que isso resolveria? (SV)...
Vamos ver a opinião do V ele diz :se eu fosse o presidente eu acabaria com o plantiu do
fumo no mundo; O M : se tivesse um modo pra acabar com isso eu fecharia as fábricas
de cigarro; é o quê? (sv).... O seu A, vamos ver a opinião de seu A gente ele diz assim: Eu
fecharia as fábricas e colocava os doentes numa clínica de tratamento; ou os fumantes
poderia tomar uma atitude e deixar de fumar, ta vendo gente, agora vamos ver a fala....de
(SV) ...Vamos lá gente agora ver o que o C disse: deviam perseguir os fabricantes de
cigarro como perseguem os maconheiros; .....(SV),como é ? é mais pelo contrário, né gente!
os donos das fábricas são paparicados... Agora vamos lê a opinião da Â: ela diz que
deveriam proibir a venda de cigarro as crianças, para que eles não ficassem viciados;
então gente não pode vender cigarro a crianças; dona M L não colocou nenhuma sugestão
colocou só que temos que deixar de fumar pra não adoecer; bem gente, esse texto é muito
importante por que as pessoas tem que se conscientizar, e também saber que tem respeitar as
pessoas que não fumam;
A4 – É por isso que existe lugar pra fumante e não fumante, no shoping tem lugar pras pessoa
fumar;
F1- é isso tem que ter lugar pra fumar (sv)... ô gente amanhã eu vou retornar a esse texto pra
gente ver a parte gramatical do texto, por que hoje a aula já tá acabando.... (22:00- a
professora está terminando de falar quando o sinal toca e acaba a aula).
172
Apêndice 6
AULAS ANALISADAS
22 /10/ 2007 – o açúcar
19:00 – ( quatro alunos na sala, a professora chega )
19:15 – ( professora inicia a aula,
tem 15 alunos na sala )
F1 - Olhe gente peguem o livro e abram na página 19, É página 19; isso todo mundo achou?
Olhe por favor todo mundo façam uma leitura silenciosa depois
nós vamos fazer os
comentários do texto; agora eu vou fazer a chamada;
( os alunos iniciam a leitura silenciosa, a professora faz a chamada e espera);
19:35 – (professora pergunta se os alunos terminaram);
F1 – já terminaram?
A1 – calma professora, tem que lê devagar pra entender...
(professora retorna a espera);
19:35 – ( professora pergunta novamente);
F1 - Vamos gente, todo mundo já leu? Olhe hoje nós vamos trabalhar com esse texto, o que
vocês acharam do texto? Gostaram? Acharam complicado? Quem gostaria de ler o texto em
voz alta? Seu Jacinto? Alessandra? Qué lê? (SV) ...Não eu não tou mandando sei que todo
mundo sabe ler eu só to convidando os voluntários...
F1 – um começa e outro termina;
A1 – tá bom eu leio;
(Um aluno se dispõe a ler o texto em voz alta para a turma)
F1 – GENTE, POR FAVOR SEU J, VAI LÊ, SILÊNCIO PRA GENTE ENTENDÊ.
173
TEXTO O AÇUCAR
O açúcar
Ferreira Gullar
O branco açúcar que adoçará meu café
nesta manhã de Ipanema
não foi produzido por mim
nem surgiu dentro do açucareiro por milagre.
Vejo-o puro
e afável ao paladar
como beijo de moça, água
na pele, flor
que se dissolve na boca. Mas este açúcar
não foi feito por mim.
Este açúcar veio
da mercearia da esquina e tampouco o fez o Oliveira,
dono da mercearia.
Este açúcar veio
de uma usina de açúcar em Pernambuco
ou no Estado do Rio
e tampouco o fez o dono da usina.
Este açúcar era cana
e veio dos canaviais extensos
que não nascem por acaso
no regaço do vale.
Em lugares distantes, onde não há hospital
nem escola,
homens que não sabem ler e morrem de fome
aos 27 anos
plantaram e colheram a cana
que viraria açúcar.
Em usinas escuras,
homens de vida amarga
e dura
produziram este açúcar
branco e puro
com que adoço meu café esta manhã em Ipanema.
F1 – Muito bem seu J, parabéns, o que vocês acharam do texto ele retrata sobre o que? A
fome? O que mais?
A2 - a cana de açúcar,
174
A3 - o sofrimento do povo, a pobreza;
F1 – otra coisa quando agente ta em casa bebendo nosso café com aquele açúcar branquinho
será que agente pensa no trabalhador que planta e colhe a cana?
A4 – eu sei que eles trabalha muito;
F1 – alguém aqui já trabalhou no corte da cana?
A5 – Eu não;
F1 – (sv) PERA AÍ, um de cada vez (sv); quem quiser falar levanta a mão;
A4 – meu pai já trabalhou;
F1 – e ele gostava desse trabalho?
A4 – não professora, mas ele tinha que trabalha pra gente comê;
F1 – o que ele dizia?
A4 – ele dizia que machucava as mão,tinha que arrancar aqueles toquinho, (SV)... aí ele ficou
com dor na coluna, e agora não pode mais trabalhar, meus irmãos também;
F1 – V? Você já trabalhou?
A4 – Eu não, meu primo, meu pai, quando eu era pequeno levava a comida pra eles, aí
quando eu chegava lá eles tava tudo melado de calvão, tudo latanhado da palha da cana;
F1 – É gente, é um trabalho muito penoso, agente sabe que é um trabalho de muito sacrifício.
A5 – é professora mais agora ta mudando...
F1 – mudando como?
A5 – Agora eles trabalha das 5:00 até às 9:00 depois pode ir pra casa;
F1 – num sabia não; E como é que eles chamam a quantidade de cana que tem que cortar?
A5 – É uma braça, e uma braça é doze palmas, mede com uma vara; eaí ele tem que dá conta
de um batalhão que são sete carrêra de cana;
F1 – e você sabe quantu ele ganha?
A5 – ele ganha um salário, ganha pelo trabalho, quanto mais ele trabalha mais ganha, e aí
quem qué mais completa o dia butando veneno, tem que trata a terra, o que trabalha ó no
corte, ele ganha só uma ruela; (SV)...
F1 – PERA AÍ GENTE, VOCES TÃO PRESTANDO ATENÇÃO NO DEPOIMENTO DO
V? Olha seu Anísio qué acrescentar;
A1 – Meu irmão ele trabalhou muito tempo no corte da cana, quando agente era pequeno, aí
eu ia pra lá, agente limpava a cana e bebia o caldo da cana, e bebia aguardente também (SV);
F1 – É gente com a cana também faz aguardente, nÉ?
A4 – Mas num é todo trabalhado que sabe fazê a pinga não; pra trabalha no alambique é gente
especializado;
175
F1 – Então quem corta, não sabe faze a pinga não? Né? (SV)... Olha gente agora eu já colhi os
depoimentos, de vocês, Mais alguém qué falá? Não?
Ta bom agora eu quero que vocês façam um trabalho em classe, sentem em dupla por favor.
Eu vou copiar um trecho no quadro pra vocês comentarem;
20:50 – (professora copia um trecho no quadro e aguarda que eles copiem e se coloquem em
relação ao trecho):
(sv)...
Usinas escuras
Açúcar branco
Homens de vida amarga
A3 – ô professora dá pra explicá de novo;
F1 – tá certo, é pra falar sobre esse trecho que vocês tão vendo no quadro, num precisa nem
copiá, eu quero que vocês digam por que o autor usa esse termos no texto : Usinas escuras,
açúcar branco, homens de vida amarga; pensem um pouco; vou dá um tempo pra vocês
discutirem depois vocês vão falar pro grupo; (SV)...
F1 – já terminaram?
A1 – Ô professora dá mais um tempo que agente ta quebrando a cabeça; pra escreve;
F1 – se não quiser não precisa escrever é só falar,
A3 – Hà! mais agente tem que escreve pra depois falá,
F1 - ta certo vou espera mais uns dez minutos.. (sv)...
21:05 – Ta bom gente quem já terminou? Qual é a dupla que já está preparada? (SV)...Tá M e
e M;
A2 – usinas escuras professora é pru quê as usinas do interior é longe de tudo;
F1 – e vidas amargas?
A2 – por que a vida deles é muito dura;
F1 – ôtra dupla dona M e a C;
A6 – Mesmo essas pessoa trabalhando com o açúcar doce, ele não serve pra adoçá a vida
deles que trabalha debaixo do sol da chuva e tudo mais; e eu acho que fala assim usina escura
por que tem muita fumaça;
P1 – e o açúcar branco?
A5 – Eu vô lê mais;
P1 – Eu vou passar pra ôtra dupla; Dona D e seu A; pra vocês o quer dizer açúcar branco?
176
A1 – por que na usina faz o açúcar branco e o açúcar preto o Demerara, homens de vida
amarga é pro causa da vida dos homens, pro quê num tem nada de bom na vida deles, e a
usina paga mau pro trabalhado, por isso ele sofre todas essas amarguras;
F1 – E as usinas escuras?
A1 – pro quê, na minha opinião o escuro é por que ta oprimindo o trabalhadô que ta sofrendo;
F1 – muito bem, seu Anísio, e essa dupla?
A7 – Eu penso assim...(sv), por que o trabalho deles é muito pesado e devia trabalha em outra
coisa, mas não tem outro trabalho, tem que trabalha na cana;
F1 – e usina escura?
A2 – Eu acho que é por não tem energia;
P1 – e você C qué falar alguma coisa?
A7 – Eu não!
P1 – E essa dupla aqui: Valdir e Carlos;
A5 – A vida amarga é por que ele é praticamente um escravo, por que esses homens não tem
opção e a escuridão é por que eles tem que permanecer ali, não tem pra onde ir, isso também
é a vida amarga, agora o açúcar branco eu não sei, o branco deve ser por que sai da escuridão,
por sai dali, então o branco deve ser a liberdade;
P1 -
E aqui essa dupla? N e V
A3 – Há professora eu vô lê o que eu escrevi; (sv)... o açucar chega em nossa mesa
branquinho, bem branquinho eu não sei qual é o processo que ele passa, eu só sei que deve
ser um trabalho bem difícil; e ganha bem poquinho;
F1 – Vamos aqui a minha outra dupla;
A4 – Em relação ao açúcar é que agente quando vai compra o açúcar agente prefere o açúcar
branco, não qué o preto; e sobre os homens que trabalham no corte da cana sofre muito por tra
balha no sol e na chuva; agora eu vou passa a palavra pra Vanise.
A8 – olha professora eu vou falar sobre as vidas amargas, eu acho que é por que esses homens
sofre muito a vida é muito difícil; ele é bóia fria, então sofre muito;
F1 – Essa dupla que ainda não falou; (sv), A C e a M;
A9 – Ô professora todo mundo num já falo?
F1 – não mais eu quero ouvi vocês duas;
A9 – usinas escuras, por que tem muita fumaça, mas também é por esses homens trabalham
muito; (SV), sofre muito, eles só não, tem muitos assim,;
F1 – Dona M
A10- eu fiquei sozinha;
177
F1 – fale assim mesmo;
A 10 – Olhe professora de usina a sinhora não me pergunte nada, que eu não sei de nada,
F1 –Tá bom mais alguma dupla? Não ? então eu vô fazê outro exercício.
21:25 – Professora avisa que vai realizar uma atividade sobre a poesia, logo após, inicia a
cópia da atividade no quadro:
3.
Qual o nome da poesia?
4.
Qual o nome do autor?
5.
Circule todas as palavras paroxítonas do texto.
( a professora apenas copia e pede para os alunos realizarem a atividade em dupla)
22:00 –( termina a aula)
178
Apêndice 7
AULAS ANALISADAS
22 /10/ 2007 – texto informativo – A linguagem da propaganda
19:00 – ( SV)...
F1 - boa noite, quantas pessoas tem lá fora? (baixo tom)
A1 – Têm umas pessoas lanchando...(SV)
F1 – por favor M, chame o pessoal lá fora....
19:05 - ( SV)...( alunos entrando na sala);
F1 – vou fazer a chamada (....)
F1 – Vamos gente, vamos lá, hoje a gente vai trabalhar com a propaganda, pra quem chegou
atrasado é na página 27, agora na página 29 tem umas perguntas, (sv)... eu não vou trabalhar
com vocês essas duas páginas agora, eu vou dá uma orientadazinha depois a gente volta, tá
bom.
F1 - Vamos pra página 29, aí tem uma propaganda de uma meia...(sv)
A2 – é uma meia Kendal
F1- uma meia calça!!!, a A disse meia Kendal, vocês viram a marca, tem a marca ai? tem o
nome aí da meia Kendal? Vejam ela logo essa se lembrou da meia Kendal? Vocês sabem por
que isso acontece? Por que aparece na televisão a Kendal a Lupo a meia da loba, as marcas
famosas. Tem até uma propaganda que diz faça Lipo ou use Lupo. Já pegaram essa
embalagem?
A – não;
F1- (SV)... ninguém viu essa embalagem? Nas lojas tem: na Marisa tem; na embalagenzinha
tem faça Lipo ou use Lupo, mas como agente não tem coragem nem tem dindim, agente usa a
meia;
A1 – Mas como se a gordura é na barriga o que é que tem haver a meia com Ia barriga? (sv)...
F1- mas tem, tem olhe só, tem uns macaquinhos....(sv)...
A1 – a Lipo é pra sempre, mas a meia...
F1- a Lipo é pra sempre? Subtende-se que é pra sempre, mas não é para sempre, o que vocês
acham?
179
A3 – não, diminui se for gordura, mas se for banha...
A2 – MAS diminui
F1- Quem conhece alguém aqui que já fez e voltou tudo de novo?
A4 – eu não conheço;
F1- Pois eu conheço; (SV)
(sv)...
A5 – pois eu conheço uma mulher que fez num sei quantas Lipo e voltou tudo de novo,
depois as pernas ficaram cheia de banha (risos)...
F1- primeiro agente tem que se gostar, o que adianta é comer com qualidade, por exemplo eu
estou fazendo uma dieta, mas assim para minha saúde, eu estava ficado com as mãos
dormentes, como eu passo o dia todo em pé, por causa do peso ficava com dor nas costa; por
isso eu procurei uma medica, ela passou uma dieta toda controladazinha, eu não to passando
fome por isso eu to comendo só alimentos saudáveis, por que pão, pizza, macarronada, isso só
faz engoradar, não é...(sv)...Feijão, arroz, isso pode...( )
F1 – Bem mas vamos voltar aqui para o livro, essa imagem é de uma gordinha? (Sv) ... E
vocês acham que por que o dono dessa fabrica que fabricam essas meias não colocou uma
pessoa gordinha ou uma mais feinha ou mais desarrumada? (sv) ...(risos)
A4 – por que essa magrinha pega bem, se agente vê que fica bem nela agente pensa que vai
ficar bem na gente também...
F1- muito bem, (sv)... Pêra aí fala um de cada vez.. Como é O?
A6 – é por que se for um avião vende mais;
F1- mas por traz disso aí ainda tem outra coisa, o que é que o dono quer fazer com a clientela
com o publico?
(sv)...
A1 – vender mais;
A6 – agregar o mercado;
F1– O que mais? Vamos D, o que mais? ( ) ...(sv)... Muito bem, ou seja gente convencer ao
público feminino; (sv).... Então gente essa meia, esse corpinho sarado feminino, faz um apelo
visual, e com esse apelo ele tem a intenção de convencer, num é isso? Agora na página 30
tem a linguagem da propaganda, agora eu vou fazer uma leitura rapidinha, sabe por que?
senão agente vai ficar com pouco tempo, se alguém tiver uma dúvida eu paro e respondo e
agente continua. Agora eu vou ler e vocês me acompanham:
19:40 - (professora faz a leitura em voz alta e os alunos acompanham);
180
A LINGUAGEM DA PROPAGANDA
Vivemos rodeados de propaganda. São tantos produtos para serem vendidos que
muitas empresas são obrigadas a investir muito dinheiro em propaganda e garantir,
com isso, que seu produto seja visto pelo consumidor como algo “melhor” que outro.
Existem empresas e profissionais especializados em criar esses anúncios.
F1 – viu gente! tem pessoas que trabalham para esses produtos.
As propagandas aparecem nos jornais, no rádio e na televisão, nas revistas, nos
cartazes e murais espalhados nas ruas, nas estradas, nos ônibus. Pesquisas sobre o
comportamento das pessoas mostram que nem sempre compramos por necessidade.
F1 – ( né verdade gente, às vezes agente é consumista mesmo e compra o que não
precisa)
A decisão de comprar algo pode ser movida por sentimento e desejos que foram
criados em nós pela influencia da propaganda.
F1 – Viu  quando você viu a meia lembrô logo da meia Knendal...
Você já se viu, nas prateleiras de um supermercado, salivando diante de um
pacote de biscoitos que você nunca provou, só porque ele parecia ser “muito crocante”
na propaganda?
Para criar esses efeitos as propagandas lançam mãos de alguns recursos:
•
Mostram a embalagem e a marca do produto com bastante destaque, para que
fiquem guardadas na memória.
•
Mostram produtos alimentícios de modo a nos despertarem o apetite; a cerveja
geladinha derramando no copo, o molho de tomate fumegando sobe a bela
macarronada....
•
Apresentam os produtos ao lado de pessoas bonitas, ricas ou famosas.
•
Utilizam frases curtas com rimas ou jogos de palavras que fazem com que sejam
mais facilmente memorizadas: “Danoninho, vale por um bifinho” ou “Bombril
tem mil e uma utilidades”, “Se é Bayer é bom”.
•
Utilizam vocabulário familiar, conhecido pelas pessoas.
•
Promovem concursos e sorteios tais como: “Junte três embalagens, envie para
caixa postal...e ganhe uma viagem à Disneylândia”.
F1 – como é? (SV) hã? É o Monbiju, mostra o Jean Nequini (SV), O da Richester é
com o Fabio Assunção, tá vendo isso eles fazem pra convencer a população.
181
Mas a linguagem da propaganda não serve só para vender produtos.
Existem anúncios que buscam conscientizar o publico sobre fatos importantes (evitar a Aids,
por exemplo) ou convencer as pessoas a fazerem algo para a sociedade(como participar da
campanha contra a fome).
F1 – É gente tem essas propagandas que são legais que ajuda a combater uma doença, tem
também aquela contra o câncer de mama....
Nos últimos tempos, as técnicas da propaganda tem sido cada vez mais utilizadas na
política, especialmente na luta entre os candidatos nos períodos de eleição.
F1 – Quando chega o período eleitoral é triste né....
A3 – É uma baixaria (SV)...
A4 – Eles fica prometendo as coisas depois, nem aparece mais....
A1 – agora professora eu vi que eles tão com problemas se saí do partido (sv)...
F1 – É se sair do partido vai perder a candidatura, mas se o candidato tiver problemas no
partido pode sair (SV)...
A3 – É professora, mas agente tem que vê isso (SV)...
F1 – Por isso mesmo agente tem que refletir sobre isso (SV)..., veja a história dos Gabirus,
olha só já ta tudo solto, mas pelo menos passou esse constrangimento (SV)...Pois é gente,
muito bem, mas agora vamos voltar pro texto.
Existem leis para proteger os consumidores das propagandas enganosas ou para alertalos sobre efeitos nocivos de produtos anunciados. Você pode observar que os anúncios de
cigarros trazem um aviso sobre os males do fumo. Os anunciantes não põem esse aviso
porque querem mas porque são obrigados por lei.
20:25 – (termina a leitura )
F1 – (SV) GENTE POR FAVOR, VAMOS PRESTAR ATENÇÃO, agora tem uma grande
polêmica sobre um produto que saiu na televisão, quem sabe o que é?
A1 – foi um leite professora, o leite longa vida.
F1 – É... mas que marca? (SV) ...Parmalat, qual mais? Quem denuncio? E o que tinha nesses
leites?
A2 – Soda Caustica, água oxigenada (SV)...
A3 – Eu acredito que esses produtos que butaru no leite num era pra ficar mais barato, pru quê
esses produtos são mais caros que o leite (SV)...
A4 – Mas eu escutei que ...(SV)... a quantidade que colocaram não faz mal a nós; (sv)...
182
A2 – Isso é pra inganá agente;
F1 – Agente tem que refletir sobre isso; lembre-se que isso é briga de cachorro grande, e o
que é que tem por traz disso?
A1 – O home disse que que não ia dá pra família dele não;
F1 – É agora já está aparecendo na televisão uma propaganda com uma atriz muito famosa
que está aparecendo, quem já viu?
A2 – É a Hebe Camargo, professora;
F1 – É a Hebe, e o que é que ela ta dizendo? Ela ta dizendo que a Parmalat não tem nada
haver com isso, por que usaram a Hebe?
A2 – Por que a Hebe ta na mídia (SV)...
F1 – por que ela tem um programa, eu particularmente, não gosto, mas muita gente assiste;
por isso mesmo que convence e influenciam o público;
A2 – Ela é muito vulgar;
F1 – então ela ta fazendo o quê? Ta... formando opinião; Que legal gente é isso mesmo, ela
recebe dinheiro pra isso. (SV); é isso mesmo eles querem que todo mundo volte a consumir o
leite. TÁ BOM GENTE, agora eu tenho um trabalho para vocês, alguém tem mais alguma
coisa pra dizer? Vejam bem, há
algum tempo atrás nós trabalhamos uma propaganda do leite materno, lembram?
A1 – sim, professora o leite materno é o melhor leite pra criança;
A2 – professora tem alguma mãe que não pode dá de mamar pro filho?
F1 – Há uns casos extremos como é o caso das mães que tem HIV; e o que é o HIV? Em
gente? (SV)... isso é a AIDS;
A3 – Eu conheço uma mulher que deu de mamá ao bebe e ela tinha AIDS;
F1 - (SV)... é sim tem que rezar para Deus livrar o bebê de ter AIDS; mas, veja bem gente,
alguém tem mais alguma coisa pra dizer? (SV).... é o leite tem açúcar e o leite materno não;
(SV)... Então gente à partir de agora eu quero que vocês fiquem em dupla eu vou distribuir
pra vocês tesoura e revistas e vocês vão escolher um produto pra fazer uma propaganda e
convencer os clientes a comprar os produtos que vocês vão oferecer;
A6 – ô professora? Eu num sei fazê isso não como é que faz?
F1 – Olhe, eu vou dá um exemplo: olhe pego a foto de um brinco e escrevo essa africana é
muito linda se você usar vai ficar igual a Gisele bicheam; (sv) ...( risos)...
A2 – È pra mentir é professora?
F1 – É pra convencer, não é pra mentir; mas às vezes a linguagem da propaganda aumenta um
pouco o poder da mercadoria; olhe, então agora é vez de vocês; vocês vão colar numa folha o
183
objeto que vocês vão vender, e tem que fazer uma propaganda convencendo todo mundo;
(SV);
F1 – É um só a dupla faz um só, pode ser qualquer coisa, mas quem vai escolher é vocês;
pronto não vou falar mais nada agora é com vocês; vou pegar o papel e mais revistas
21:00 - ( professora sai para pegar mais revistas, os alunos permanecem fazendo os trabalhos
em dupla);
21:05 – ( professora volta os alunos se mostram bem interessados conversando em duplas);
21:30 – ( professora pede pra que os alunos leiam suas produções)
F1 – quem qué ler primeiro?
A2 – Á professora eu tenho vergonha;
A2 – Eu também tenho, por que a senhora a senhora num vem aqui que agente mostra...(sv);
F1 – num é melhor vocês lerem? Não? ...tá bom eu vou em cada banca, vou logo aí seu J ....
(sv)....( )...
22:00 –(termina a aula, a professora termina o recolhimento das produções);
184
Apêndice 8
AULAS ANALISADAS
20 /08/ 2008 – texto - Mulher da capa
19:00 –(professora chega e diz que vai esperar outros alunos)
19:15 – ( professora inicia aula tem sete alunos em sala);
F2 - Hoje nós vamos continuar falando sobre folclore, então eu achei um texto bem
interessante; eu trouxe o texto a mulher da capa preta pra vocês, alguém conhece aqui a
história da mulher da capa preta, sim? (sv);
A1 – a professora o A já namorou com ela,
F2 – FOI MESMO? Ta bom, mas agora eu vou colocar vocês em dupla e vou dá esse texto
fatiado pra vocês, depois agente lê e comenta;
A2 – e o que é mesmo fatiado professora?
F2 – é um texto que está em pedaços, pra vocês juntarem, tá certo? Aí vocês juntam e colam
no caderno;
19:25 - ( a professora organiza os alunos em dupla e sai para pegar cola e tesouras)
19:30 – (professora retorna e avisa que vai fazer a chamada);
A2 – ô professora ta faltando pedaço do texto?
F2 – Não o texto ta todo aí, mas tem que ler pra conseguir juntá;
(alguns alunos sentem dificuldade em realizar a atividade, por isso chamam a professora para
auxiliá-los. A professora circula por entre as carteiras );
20:00 ( A professora pergunta se os alunos terminaram)
F2 – Gente por favor, vocês já terminaram/ (sv), só duas duplas? Ta bom vou espera mais um
pouco;
20:20 – (A professora pede que os alunos leiam o que fizeram, os alunos começam a ler);
F2 – Vamos começando a ler, quem vai começar? Vai A, lê pra gente!
A – Eu não professora dá uma vergonha de lê aqui na sala,
F2 - Ta bom, tem certeza que não qué lê? (sv).... e tu minina lê pra gente, não? E seu J.
J – ta bom eu vô lê, mas num arrepara os erro professora.
185
A mulher da capa preta
Carolinna Sampaio Marques - A Mulher da Capa Preta
Um jovem estava se divertindo em uma boite quando conheceu uma moça muito bonita que dançou com
ele e lhe deu um beijo. Quando foi levá-la em casa, estava chovendo muito, e ele percebeu que ela estava
muito gelada e lhe emprestou a sua capa preta de motoqueiro pra ela se aquecer. Acontece que ela insistiu
em não ficar na porta de casa e ele acabou deixando ela perto de um cemitério. Antes de ir embora ela
escreveu o endereço pra ele ir buscar a capa. No dia seguinte ele bateu na porta do endereço dado e uma
mulher atendeu. Ele contou o ocorrido, mas quando falou no nome Carolina, a mulher foi grossa com ele e
disse que a brincadeira era de extremo mau gosto pois sua filha havia morrido já há algum tempo. Diante
da insistência dele, ela pediu pra ele descrevê-la, e se surpreendeu quando as características dadas batiam
certinho com a foto que ela mostrou na parede (com flores ao lado) da filha morta. Ele não acreditou,
então ela o levou pessoalmente ao túmulo da filha, onde estava a sua capa estendida e o nome Carolinna
Sampaio Marques com datas em algarismo romano e uma foto da moça.
(o aluno lê para com grande dificuldade, em alguns trechos a professora auxilia a leitura)
F2 – Quem mais qué ler?(SV), seu M?
A2 – eu tenho vergonha de ler, o seu J num já leu...
F2- mas por que o senhô num lê pra gente?
M – tá bom professora eu võ lê mais a sinhora sabe qui eu num leio beim;
F2 – ta certo leia como o senhô sabe.
(o aluno relê o texto para turma como muita dificuldade, demorando bastante tempo para
terminar a leitura);
20:50 - ( após dois alunos já terem lido para a turma a professora re-lê o mesmo texto para a
turma )
F2 – tá bom vou lê o texto pra gente de novo!
(A professora relê o texto para turma que atenção)
F2 - todo mundo acompanhou? Não? O que faltou C e E?
A3 – é que nós colemu erradu;
F2 – eita, vou dá outro texto pra vocês; as agora gente sobre o que que esse texto fala?
A4 – sobre a mulher da capa preta que ela já tinha morrido;
F2 – e foi? E o quê mais? (SV) É gente fala sobre uma mulher que seduz os homens; e vocês
acham que essa história é verdadeira?
A – eu acho que é verdade sim professora já assou até na televisão; tem até uma catatumba;
F2 – Essa catatumba existe mesmo, ou é invenção?(sv);
A4 – professora já apareceu na televisão;
F2 – nossa e foi? Eu num vi não; mas ta bom, agora eu queria saber que tipo de texto é esse?
Quem sabe?
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A4 – como assim? Professora? É uma lenda?
F2 – isso é uma lenda ? ( ), não gente é uma história de trancoso;
A3 – a professora era que no interior agente quando era pequenu sentava tudu na porta e o
povo se danava pra contar história de trancoso, aí depois pra durmir era tudo cum medo, eu i
meus irmãos.
F2 – Mais você acham qué mentira ou é verdade? (sv), é essas histórias vai passando de um
pra outro e cada aumenta um pouco;
21:00 - (a professora traz uma segunda versão da mulher da capa preta e entrega aos alunos)
F2 - agora eu trouxe pra vocês um outro texto pra vocês; leiam o texto bem baixinho depois
diga o que esse texto quis dizer; vou dá um tempo pra vocês, até 9:20.
Carolina Sampaio Marques
Eu sou a famosa Carolina ,
Com jeito de menina ,
Eu morri há dez anos atrás ...
Mas , até hoje corro atrás ...
De um inocente rapaz ...
Toda a sexta – feira ...
Em plena lua cheia ...
Eu invado uma festa especial ...
De um jeito fenomenal !
Depois , finjo ser uma viva mulher ...
E bailo com um rapaz qualquer !
No final da festa , este moço belo ...
Acompanha-me até o meu castelo !
Porém , no meio desta viagem ,
Repleta de uma obscura paisagem ,
Ele me oferece a sua capa preta ...
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Para me proteger do frio xereta !
Então , eu entro na minha casa ...
Com a capa preta na minha asa !
No dia seguinte , ele vem na lata ,
Buscar a sua preciosa e quente capa !
Assim , ele descobre que eu morri há dez anos atrás ...
E para se sentir seguro em paz ...
E desvendar este mistério ...
Ele vai ao cemitério ...
E vê que a sua capa preta ...
Não está na sarjeta !
Pois , ela está no meu túmulo branco ,
Intacta de um jeito franco !
Eu sou a Carolina ,
Com jeito de menina ,
Eu morri há dez anos atrás ...
Mas , até hoje corro atrás ..
De um inocente rapaz ...
Toda a sexta – feira ...
Em plena lua cheia ...
Eu invado uma festa especial ...
De um jeito fenomenal .
( A professora termina a leitura e pergunta a turma quem qual é a voz do texto, os alunos não
conseguem identificar o narrador, a professora auxilia até que alguém consegue);
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F2 – gente vamos lá o texto fala sobre o quê? (sv); num sabe?
A – Fala sobre uma tal de Carolina,
F2 – e quem é a Carolina? PRESTA ATENÇÃO! Quem conta essa história?
A4 – é um rapaz;
F2 – Um rapaz? Veja só a primeira estrofe, o que é que diz? Sou a famosa Carolina, vejam o
verbo sou;
J- há professora é a mulher da capa preta que conta;
F2 – Isso gente é a mulher da capa preta, e como é o nome dela?
A5 – Carolina;
F2 – Isso mesmo é Carolina;
F2 – olha outra coisa, quando é que essa mulher ataca? Quem sabe? No texto diz;
A1 – aqui diz: toda sexta-feira em plena lua cheia
F2 – é e por que as histórias de trancoso só se passa em lua cheia?
A2 – Olha e a história do ET,
F2 – Que ET, é esse?
A3 – Apareceu no Ratinho, apareceu também o chupa cabra;
F2 – foi mesmo? É mentira do Ratinho;
A – Olha professora num é mintira não existi essas coisa de alma; mas é só no interior, lá
mermo onde eu morava tinha um homi qui virava lobisome;
F2 – Isso é história A, você já viu alguma vez o lobisome?
A – eu não professora, mas meu pai disse que viu;
F2 – Não gente; veja só isso é folclore, na verdade isso não existia;
20:40 – (professora propõem uma atividade de cunho gramatical: circular os adjetivos nos
dois textos)
F2 - Agora eu fazer uma atividade para vocês, lembra que nós estudamos os adjetivos? (SV),
eu sei que foi o mês passado, mas tá no caderno, dê uma lida pra lembra; (sv), ta bom agora
circule os adjetivos da mulher da capa preta nos dois textos;
A1 – tá tarde! Vai dá tempo?
F2 –se não dé pra fazê hoje, vocês terminam amanhã;
(os alunos iniciam a atividade a professora faz a chamada;
22: 00 – (termina a aula)
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Apêndice 9
AULAS ANALISADAS
10 /10/ 2008 – texto música – Construção ( Chico Buarque)
(professora chega na sala de aula às 19:20, há dez alunos)
F2 – Boa noite, vamu entrá? Isso (SV), é gente hoje agente vai trabalhar com
Uma música que eu gosto muito de um cantor da MPB, o nome dele é Chico Buarque, quem
conhece?
A1 – ô professora ele é das antigas;
F2 – É ele é das antigas, mas ainda faz muita música, mas as pessoas não escutam ele, sabe
por quê? Por que no Brasil não se valoriza a Música Popular Brasileira;
A2 – Por que o povo num gosta;
F2 – Mais o povo num gosta purquê na mídia não coloca esses cantores pra cantá num é
gente? A mídia que eu falo é a TV e o rádio que só mostra quem? Calcinha preta, aviões do
forró, e essas bandas de forró;
A3 – E num é bom não? Eu bem que gosto dessas bandas;
F2 - - sim gente o problema é que não dão oportunidade pra os outros cantores como Caetano,
Gil e os outros; é só essas bandas essa tal de Calypso e outras, é essa história é longa mas
agora eu vou copiar aqui no quadro a música Construção de Chico e depois agente vai ouvi e
procurá umas coisas na música , vamos lá;
19:48 - (professora inicia a cópia no quadro)
Construção – Chico Buarque
Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
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Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acbou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado
20:00 - (professora termina de copiar e senta-se para fazer a chamada)
20:20 - ( A professora pergunta aos alunos se eles já haviam terminado)
F2 – Vamos Lá? (sv);
A2 – pera aí professora agente ainda tá copiando;
F2 – Tá bom gente mais dez minutos, falta muito?
A3 – Já to no final,
F2 – Tá certo;
20:30 ( A Professora sai para pegar um aparelho de som na sala da direção. Volta e instala
para a turma ouvir a música);
F2 – G por favor me ajuda aqui, que eu to com dificuldade pra passar o CD;
(a professora coloca o CD, os alunos acompanham a música construção com o texto copiado
em mãos)
F2 – Olha gente nessa música aconteceu alguma coisa quem descobriu?
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A4 – o professora eu acho que ele morreu;
F2 – E foi como é que você descobriu isso seu P? O texto diz isso onde? Lê pra gente!
P – Na primeira parte lá no final ele diz: Morreu na contramão atrapalhando o tráfego;
F2 - Isso gente ele morreu, mas morreu de quê?
A5 – Eu acho que ele sintiu que ia morrer, eu acho que morreu do coração;
F2 – do coração? E O TEXTO FALA ISSO?
A5- eu intendi, assim;
F2 – olha gente, presta atenção aqui diz na música:
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego;
F2 – Veja gente, esse texto ta dizendo o quê que ele se suicidou!
A6 – eu num entendi não; e aí diz que ele se matou? Aonde?
F2 – Olha ele não diz diretamente, ele diz com outras palavras, está implícito;
21:10 - ( os alunos não consegue ler os implícitos, nem percebe as figuras de linguagem, a
professora não se detém e inicia uma atividade com perguntas factuais)
F2 – tá bom, agora eu vou fazer uma perguntas pra vocês responderem pode ser em dupla;
A professora copia uma atividade no quadro:
a) Quem o personagem beijou?
b) Depois que saiu de casa o personagem foi para onde?
c) o que fez lá?
d) Ele voltou para casa? Sim ou não? Por quê?
e) essa história aconteceu em que dia?
F2 – pronto gente, agora respondam depois corrijo no quadro;
21:40 – vamos respondê? Eu faço a pergunta e vocês respondem, TÁ CERTO ? primeira
dupla M e A.
(Os alunos respondem, a professora registra as respostas no quadro, 22:00, a aula termina).
