Eunice Maria da Silva

Título da dissertação: CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: uma análise de conceitos e sentidos a partir dos dizeres dos professores.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA

EUNICE MARIA DA SILVA

CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
uma análise de conceitos e sentidos a partir dos dizeres dos professores

Maceió, 2010

2

EUNICE MARIA DA SILVA

CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
uma análise de conceitos e sentidos a partir dos dizeres dos professores

Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Educação Brasileira do Centro de
Educação da Universidade Federal de Alagoas,
como exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Educação.
Linha de pesquisa: História e Política da
Educação.
Orientadora: Profª. Drª. Edna Cristina do Prado

Maceió, 2010

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EUNICE MARIA DA SILVA

CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
uma análise de conceitos e sentidos a partir dos dizeres dos professores

Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Educação Brasileira do Centro de
Educação da Universidade Federal de Alagoas,
como exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Educação.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________
Profª. Drª. Edna Cristina do Prado
Universidade Federal de Alagoas
Orientadora

________________________________________
Profª. Drª. Maria Olívia de Matos Oliveira
Universidade do Estado da Bahia
Examinadora

_________________________________________
Profª. Drª. Mercedes Bêtta Quintano de Carvalho
Universidade Federal de Alagoas
Examinadora

4

Ao meu Senhor e Deus,
pela fidelidade e amor incondicional.

À Lílian, Saulo e Felipe,
meus filhos, bênçãos e herança do Senhor.

5
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Armando (em memória) e Lídia, que sempre me incentivaram a
voar como a águia.
Ao Isaac, pelas lições da caminhada.
Aos meus irmãos-amigos, pelo Amor que nos une e nos faz mais que
vencedores.
À minha querida Lídia Moura, pela longa e agradável acolhida em seu lar.
À Professora Doutora Edna Cristina do Prado pelo acolhimento, orientação
criteriosa e significativa contribuição para o alcance de mais esta conquista.
Às Professoras Doutoras Marinaide Lima de Freitas e Maria Olívia de Matos,
presentes no Exame de Qualificação, pelas críticas, sugestões e esclarecimentos
imprescindíveis para a reorientação e conclusão desta dissertação.
À professora Doutora Tânia Maria de Melo Moura, pelas orientações valiosas no
decorrer do nosso trabalho.
Às professoras Doutoras Mercedes Bêtta Quintano de Carvalho e Maria Olívia
de Matos, presentes na Banca Examinadora, pelos olhares e escutas atenciosos.
Aos professores e colegas do Programa de Pós Graduação em Educação
Brasileira da Universidade Federal de Alagoas, pelo carinho e ensinamentos
compartilhados.
Aos colegas professores, funcionários e alunos do Departamento de Educação
da Universidade do Estado da Bahia, Campus de Paulo Afonso – BA, pelo apoio e
viabilização das condições favoráveis à realização deste trabalho.
A todas as pessoas e instituições que cooperaram com a presente pesquisa
fornecendo depoimentos, informações e documentos, sem as quais esta dissertação não
seria possível.
A todos aqueles que, direta ou indiretamente contribuíram para a realização
deste trabalho.

6

RESUMO

Este trabalho teve como objetivo central analisar as concepções de Educação de Jovens
e Adultos (EJA) que fundamentam as práticas dos professores dessa modalidade
educativa da rede pública de ensino do município de Paulo Afonso - BA. Entendemos
como Moron e Brito (2001) que concepções são maneiras próprias de elaborar,
interpretar, representar idéias e agir de acordo com as mesmas. A relevância do estudo
realizado consiste em fazer emergir discussões em torno do processo de formação de
jovens e adultos como sujeitos de direito; contribuir para as compreensões das
concepções de EJA mobilizadas pelos professores e o modo como estas se relacionam
com suas práticas pedagógicas; oferecer subsídios para propostas de formação
continuada de professores de EJA que considerem suas vozes e os saberes sobre suas
práticas; suscitar curiosidades em torno da temática a fim de que outras incursões no
campo das concepções docentes sejam realizadas. Constituiu-se numa pesquisa de
abordagem qualitativa desenvolvida através de estudos bibliográficos e investigação de
campo, utilizando-se a técnica de grupo focal como instrumento de coleta de dados, que
foram submetidos à análise de conteúdo, agrupados nas seguintes categorias: conceitos
e sentidos da EJA, o aluno jovem e adulto e as mediações didáticas. A investigação
revelou um desencontro entre as concepções de EJA dos professores e as proclamadas
nos documentos de referência (Constituição Federal de 1988; Lei de Diretrizes e Bases
da Educação de 1996; Declaração de Jomtien de1990; Declaração de Hamburgo de
1997; Parecer CNE/CEB 11/2000), entre as quais destacamos: o enunciado de
concepções nas quais a conquista do direito de todos à educação não se faz ouvir; a
visualização da EJA como segunda chance de escolarização não realizada antes da vida
adulta em contraposição à concepção do direito universal de aprender, ampliar e
partilhar conhecimentos e saberes apropriados ao longo da vida; a vinculação da EJA,
predominantemente, à perspectiva do emprego, silenciando-se a emergência e o
fortalecimento do sujeito como prioridade educativa. Embora apresentando
distanciamentos das formulações teórico-conceituais de referência, as falas dos
professores revelam também o gosto do pelo trabalho e a contribuição da EJA para a
elevação da auto-estima dos alunos; atribuem significativa importância à dimensão
relacional para a permanência dos adultos no espaço escolar; expressam sentimentos de
solidariedade quanto às condições de estudo do aluno trabalhador e evidenciam o
investimento destes na realização do desejo de aprender. Esses dados apontam para uma
consciência (em formação) do direito à aprendizagem por toda a vida.

Palavras-chaves: Educação de Jovens e Adultos. Professores da Educação de Jovens e
Adultos. Concepções de Educação de Jovens e Adultos.

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RÉSUMÉ

L’objectif central de ce travail a été d’analyser les conceptions d’Education des Jeunes
et des Adultes (EJA) sur lesquelles sont basées les pratiques des professeurs de cette
modalité éducative dans le système d’éducation publique de la commune de Paulo
Afonso, état de Bahia, au Brésil. Nous comprenons comme Moron et Brito (2001) que
les conceptions sont des manières particulières d’élaborer, d’interpréter, de représenter
des idées et d’y réagir. L’importance de cette étude consiste à inciter des discussions
autour du processus de formation des jeunes et des adultes comme sujets de droit ;
contribuer à la compréhension des conceptions d’EJA mobilisées par les professeurs et
leur rapport avec les pratiques pédagogiques ; proposer un soutien aux projets de
formation continue de professeurs d’EJA prenant en compte leurs opinions et leur
savoir concernant leurs pratiques ; susciter des curiosités autour de la thématique afin
que d’autres incursions dans le domaine des conceptions chez les enseignants soient
réalisées. Il s’agissait d’une recherche d’approche qualitative développée à travers des
études bibliographiques et une investigation de terrain en utilisant la technique de
réunions de groupes de discussion comme instrument de récolte de données, qui ont été
soumises à des analyses de contenu et regroupées dans les catégories suivantes :
concepts et sens de l’EJA, l’étudiant jeune et adulte et les médiations didactiques.
L’investigation a révélé un désaccord entre les conceptions d’EJA chez les professeurs
et celles annoncées dans les documents de référence (Constitution Brésilienne de 1988 ;
Loi de Directives et Bases de l’Education de 1996 ; Déclaration de Jomtien de 1990 ;
Déclaration d’Hambourg de 1997 ; Rapport CNE/CEB 11/2000), où nous soulignons :
l’énoncé de certaines conceptions où l’acquis du droit de tous à l’éducation n’est pas
pris en compte, la visualisation de l’EJA comme une seconde chance de se scolariser,
qui n’a pas été réalisée avant la vie adulte en opposition à la conception du droit
universel d’apprendre, de développer et de partager des connaissances et savoirs
appropriés tout au long de la vie ; le fort attachement de l’EJA à la perspective
professionnelle, ce qui ne considère pas le développement du sujet comme la priorité
éducative. Malgré le fait que les témoignages des professeurs s’éloignent des
formulations théoriques et conceptuelles de référence, ils révèlent le goût par le travail
et la contribution de l’EJA pour le soulèvement de l’auto-estime des élèves ; ils
attribuent une importance significative au côté relationnel pour la présence des adultes
dans l’environnement scolaire ; ils expriment des sentiments de solidarité quant aux
conditions d’étude des étudiants salariés et met en évidence leur investissement dans la
réalisation de leur désir d’apprendre. Ces données tendent vers une conscience (en
formation) du droit à l’apprentissage pour toute la vie.

Mots-clefs : Education des jeunes et des adultes, professeurs d’éducation des jeunes et
des adultes, conceptions d’éducation de jeunes et des adultes.

8

Educar jovens e adultos é um desafio.
Repensar quais são os objetivos, as metas, os
enfoques, as epistemologias, as teorias que
fundamentam a docência não é uma tarefa
fácil, mas necessária.
Augusto Teixeira Liche

9
SIGLAS E ABREVIAÇÕES

CEAA – Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos
CNE – Conselho Nacional de Educação
CONFINTEA – Conferência Internacional de Educação de Adultos
EDA – Educação de Adultos
EJA – Educação de Jovens e Adultos
ENEJA – Encontro Nacional da Educação de Jovens e Adultos
FNDE – Fundo Nacional de Ensino Primário
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEB – Movimento de Educação de Base
MEC – Ministério da Educação
MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização
ONG – Organização Não Governamental
PEI – Programa de Educação Integrada
PNAC – Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania
SEA – Serviço de Educação de Adultos
SECAD – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
SEJA – Serviço de Educação de Adultos
SEMEC = Secretaria Municipal de Educação e Cultura
UFAL – Universidade Federal de Alagoas
UFPE – Universidade Federal de Pernambuco

10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................10
APROXIMAÇÃO DO OBJETO DE PESQUISA..................................................................10
DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA........................................................................................15
ABORDAGEM METODOLÓGICA......................................................................................17
ESTRUTURAÇÃO DO TRABALHO...................................................................................18

I. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: PERCURSO E CONCEPÇÕES .....20
1.1. SOBRE CONCEPÇÕES DOCENTES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS .....................21
1.2. FORMAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA DOS
CONCEITOS ..........................................................................................................................23
1.3. CAMPANHAS DE EDUCAÇÃO DE ADULTOS NAS DÉCADAS DE 1940-1990....28
1.4. EDUCAÇÃO DE ADULTOS: CONSCIENTIZAÇÃO E CULTURA POPULAR........33
1.5. EDUCAÇÃO DE ADULTOS EM TEMPOS AUTORITÁRIOS...................................40
1.6. EJA NA NOVA REPÚBLICA.........................................................................................45
1.7. DIALOGANDO COM REFERENCIAIS TEÓRICOS NO CAMPO DA EJA...............49
1.71. DIREITO DE TODOS À EDUCAÇÃO,,...................................................................50
1.7.2. REAFIRMANDO O DIREITO À EDUCAÇÃO ....................................................55
1.73. SATISFAÇÃO DAS NECESSIDADES BÁSICAS DE APRENDIZAGEM.................60
1.7.4. APRENDIZAGEM AO LONGO DA VIDA..............................................................64

II. O CAMINHO DA PESQUISA................................................................................74
2.1. DESCRIÇÃO DO ESTUDO............................................................................................74
2.2. O CONTEXTO DA PESQUISA......................................................................................75
2.3. A AMOSTRA DO ESTUDO...........................................................................................78
2.4. COLETA DE DADOS.....................................................................................................78
2.5. CARACTERÍSTICAS E OPERACIONALIZAÇÃO DO GRUPO FOCAL..................79
2.6. TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS.................................................................81

III. CONCEPÇÕES DE EJA NAS VOZES DOS DOCENTES................................85
3.1. CONCEITOS E SENTIDOS DA EJA NOS DIZERES DOS PROFESSORES.............86
3.2. DIZERES DOS PROFESSORES SOBRE SEUS ALUNOS..........................................94
3.3. OS PROFESSORES E SUAS ESTRATÉGIAS PARA O TRABALHO NA EJA.......102

IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................108
REFERÊNCIAS ..........................................................................................................113
ANEXO.........................................................................................................................121

10
INTRODUÇÃO
Aproximação do Objeto de Estudo
O interesse em estudar as concepções dos professores1 sobre a Educação de
Jovens e Adultos (EJA), em especial, o conjunto de posicionamentos teóricoconceituais que orientam o fazer dos docentes que atuam no ensino fundamental da EJA
da rede pública do município de Paulo Afonso2, emerge de experiências que vivenciei3
em momentos singulares que fazem parte da história que me constitui educadora. De
modo que essa aproximação inclui motivos pessoais e profissionais imbricados, não
sendo possível precisar o limite desta ordem.
Um dos momentos data dos anos 1989 – 1992 quando, ainda estudante de
Pedagogia na Universidade do Estado da Bahia/Campus VIII (UNEB/Campus VIII),
entrei em contato com os constructos teóricos do educador Paulo Freire. O pensamento
freireano, cuja concepção filosófica orientava as discussões em sala, indicava a
emergência de o educador assumir a dimensão política de sua prática. Discutíamos a
relação da educação com a sociedade e como esta poderia também contribuir para a
superação da estrutura desigual, bem como, sobre o papel do educador na mediação
desse processo. Das idéias do autor, saltaram-me aos olhos aquelas que tratavam do
caráter intencional da prática educativa sobretudo na educação de adultos trabalhadores.
Freire (1981, 1986, 1987, 1989, entre outros) advoga que a prática docente deve ser
precedida por uma reflexão sobre o homem concreto e uma análise do meio de vida
deste homem a quem se propõe ajudar a educar-se, e ainda, que a educação de adultos
requer uma posição tão política quanto qualquer outra educação, mas que não tente

1

Ciente da discussão de gênero nos estudos sobre a profissão docente, mesmo ao lidar com um universo
de pesquisa que se caracteriza pelo predomínio do gênero feminino, registro aqui essa questão e opto
nesta investigação por usar o termo professores ao remeter ao grupo de sujeitos investigados.
2
Localizada no estado da Bahia, a cidade de Paulo Afonso faz limite, ao Norte, com o município de
Glória; ao Sul, com o município de Santa Brígida; a Leste, com o estado de Alagoas; a Oeste, com o
município de Rodelas e, a Sudoeste, com o município de Jeremoabo. De acordo com o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) a população do município estimada para o ano de 2009 era de 106.703
habitantes. O Censo do IBGE realizado no ano de 2000 apontou a taxa de analfabetismo de 22,68% da
população pauloafonsina com idade a partir de 15 anos. Na Bahia, o analfabetismo da população com a
mesma faixa etária corresponde a 18,8%, percentual muito aproximado da região Nordeste que é de
21,9%.
3
Torna-se importante frisar que na redação do texto, diferentemente da introdução, utilizo o discurso na
terceira pessoa. Portanto, essa é uma questão consciente, tendo em vista um discurso mais formal, embora
como indivíduo, também interpelado por ideologias, mantenho a subjetividade nas indicações do texto.

11
passar por neutra, antes deve afirmar em sua concepção político-pedagógica os
interesses das classes populares4.
A partir de então iniciei o aprendizado da construção do olhar sensível e
curioso sobre o pensamento do professor, a influência de suas visões, crenças e
concepções no processo educativo. Por pensamento do professor, Mizukami (2003, p.
206) entende que são “processos tais como percepção, reflexão, resolução de problemas,
tomada de decisão, relacionamentos entre idéias, construção de significados”.
Continuando a caminhada, destaco outro momento decisivo que ocorreu em
1996 com o meu ingresso no magistério superior da UNEB/Campus VIII. No contexto
acadêmico de janeiro de 1999 a dezembro de 2001, assumi a coordenação do projeto de
Educação de Jovens e Adultos da Área de Abrangência do Programa Xingó5 (EJA/PX)
no município de Paulo Afonso, intensificando, dessa forma, minha aproximação com o
tema através das atividades de extensão.
Este projeto surge como uma alternativa de enfrentamento aos entraves
identificados no estudo diagnóstico “Alguns aspectos da realidade sócio-educacional da
área de abrangência do Programa Xingó”, realizado pela Área Temática Educação (ATEducação). Os resultados obtidos evidenciaram, dentre outras questões,

a necessidade de criação e ampliação da oferta de vagas destinadas à
educação de jovens e adultos assegurando a continuidade de sua
escolarização/profissionalização permitindo a sua inserção na
escola/sociedade enquanto cidadão trabalhador (Diagnóstico do
Programa Xingó, 1997, p. 167).

A partir desses resultados, a AT-Educação elaborou, em articulação ao
Programa de Combate à Seca da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste
(SUDENE), o projeto EJA/PX com o objetivo de desencadear o processo de
escolarização e qualificação profissional de jovens e adultos trabalhadores, sem
discriminação de idade, na perspectiva de melhoria da qualidade de vida desses sujeitos.

4

Tentei encontrar um conceito organizado para definir o termo classes populares. Pesquisei em textos de
autores que usam o termo, encontrei muitas referências, mas nenhuma definição. Chego à conclusão de
que a complexidade, a abrangência e os vários sentidos que o termo assume, dificultam a elaboração de
um significado mais preciso e definitivo. Os autores consultados quando usam o termo referem-se ao
povo, aos pobres, aos índios, aos lavradores, aos trabalhadores em geral, empregados e desempregados.
5
Hoje, Instituto Xingó, constituído por Áreas Temáticas, dentre elas a de Educação. A premissa básica do
Instituto é a implantação de um Núcleo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para dar suporte ao
desenvolvimento integrado e sustentável do semi-árido nordestino.

12
O desenvolvimento do projeto EJA/PX percorreu as seguintes etapas:
seleção e formação de alfabetizadores; o curso de alfabetização e qualificação
profissional de jovens e adultos trabalhadores; avaliação de impactos e elaboração dos
relatórios de execução do projeto, por município.
A formação inicial dos monitores alfabetizadores seguiu orientações
freireanas, em conformidade com os pressupostos teóricos norteadores da proposta
pedagógica. Após esta etapa, deu-se o início das atividades, entre elas, a de
acompanhamento das salas de alfabetização sob a minha responsabilidade.
Dentre os aspectos registrados nas experiências pedagógicas desse projeto,
chamou-me a atenção o fato de as práticas de alfabetização se diferenciarem das
concepções teórico-metodológicas apresentadas na formação inicial. Essa diferença
fortaleceu a suposição de haver um modo próprio e particular de os alfabetizadores
conceberem aquele processo. As minhas inferências sobre o fenômeno observado era
que os alfabetizadores mobilizavam um aporte de saberes adaptando-o àquela situação.
Interessava-me, portanto, conhecer tais saberes: como os alfabetizadores concebiam a
alfabetização de jovens e adultos?

Em quais teorias apoiavam suas opções

metodológicas? Que visões possuíam dos alfabetizandos jovens e adultos? O que
compreendiam por tomar como ponto de partida os “saberes de experiência feito”?
(FREIRE, 1992, p. 59).
Além das questões mencionadas, outras inquietações relacionadas
permearam a experiência descrita, razão pela qual esta se deu num contexto de conflitos
e de saber desejante. Era preciso uma “[...] concentração do olhar que inclui escuta de
silêncios e ruídos na comunicação” (FREIRE, 2006, p. 7).
Em meio a estas inquietações e, em certa medida, motivada pela repercussão
das ações do projeto na instituição acadêmica, fui eleita para o cargo de diretora do
Departamento de Educação do Campus VIII da UNEB (DEDC VIII/UNEB). Nesse
período, a demanda burocrática inerente à função gerencial ocupou espaços antes
dedicados, predominantemente, pelas discussões no campo da EJA. Assim, o olhar que
envolve atenção e presença se deslocou por quatro anos.
No segundo semestre letivo do ano de 2004 assumi a docência da disciplina
Educação de Jovens e Adultos no curso de Pedagogia da UNEB/Campus VIII. Esse fato
concorreu favoravelmente para que a curiosidade espontânea sobre o tema fosse
necessariamente promovida à epistemológica (FREIRE, 1996), forjando-se pelas
atividades de formação dos alunos-professores da EJA da rede pública de ensino do

13
município de Paulo Afonso. Dos entraves identificados ao longo dessa experiência, o
que me chamou mais a atenção foi o fato de parecer existir um desencontro entre a EJA
concebida nos documentos de referência, – a exemplo da Constituição de 1988, LDB de
1996, Parecer CNE/CEB 11/2000 e Declarações de Jomtien (1990) e Hamburgo (1997)
–

como

um direito de

todos

satisfazerem necessidades de aprendizagem

permanentemente e a EJA praticada pela maioria das escolas, onde sobressai a função
de suplência (educação para pessoas que não tiveram o direito à escola antes da vida
adulta). Nesse último caso, a EJA funciona como um espaço de aquisição dos
rudimentos básicos da leitura e da escrita com vistas à preparação de mão-de-obra para
o mercado de trabalho, a meu ver, na perspectiva do subemprego.
Sobre a relação da EJA com o mundo do trabalho, Florestan Fernandes
esclarece que “há muitos que pensam na educação para a classe trabalhadora como uma
educação exclusiva. É trabalhador? Então vai ser operário [...]” (apud RUMMERT,
2002, p. 129). Dessa forma o direito de todos à educação é negligenciado, restando aos
jovens e adultos trabalhadores um processo de instrução e adestramento.
De volta a caminhada, entre janeiro de 2006 a setembro de 2007, coordenei
o Projeto de Complementação do Ensino Fundamental dos Trabalhadores da Área da
Saúde6 (PROFAE/CEF), nessa experiência as preocupações giraram em torno da mesma
temática, ou seja, quais são as compreensões teórico-conceituais sobre EJA que os
professores de jovens e adultos mobilizam em sua cotidianidade? Quais concepções de
EJA fundamentam os fazeres dos professores que atuam nesse modo particular da
educação básica?
O PROFAE/CEF, resguardando-se as devidas particularidades, percorreu
etapas semelhantes às descritas anteriormente no EJA/PX. No caso em pauta, o aluno
era um trabalhador ligado direta ou indiretamente à área da saúde, incluindo-se os
auxiliares de higienização, motoristas de ambulância, atendentes, agentes comunitários,
entre outros, que não haviam concluído os estudos de 1ª a 8ª séries da educação básica,
correspondendo ao ensino fundamental. É oportuno mencionar que a proposta
pedagógica do PROFAE/CEF não contemplava a etapa de qualificação profissional,
entretanto, os componentes curriculares eram orientados pela perspectiva de unidade
teoria-prática.

6

Uma iniciativa do Ministério da Saúde voltada para a Complementação do ensino fundamental dos
profissionais que atuam na área.

14
No contexto do PROFAE/CEF observei que os procedimentos didáticos
adotados pelos professores não condiziam com a fase particular da vida adulta do
educando em razão do predomínio das atividades de memorização, repetições de leitura
e escrita aleatórias, desenhos, pinturas e recortes, além das simplificações/condensações
dos conteúdos do ensino de crianças e adolescentes, adaptados àquela situação.
Sobre esta questão Arroyo (2005, p. 23) adverte:

É necessário rever os saberes escolares apropriados à vida adulta, as
habilidades de leitura, escrita, comunicação, cálculo, os saberes
científicos sobre a natureza e a sociedade, mas não tratados de
maneira infantilizada. Constantemente tem que ser perguntado que
saberes sociais são apropriados, como articulá-los com as experiências
dos alunos e como incorporar nos processos de aprendizagem as
vivências sócioculturais, cognitivas, comunicativas desses jovens e
adultos. O que implica o desenvolvimento de práticas pedagógicas que
valorizem suas experiências e seus conhecimentos prévios e
considerem o vínculo entre educação, trabalho, práticas sociais e
culturais.

Refletir sobre os conteúdos e procedimentos didáticos desenvolvidos em
espaços educativos da EJA implica pensar a concepção do professor sobre esse universo
educativo. Para que se estabeleça uma relação didática que considere os tempos e
espaços de aprendizagem no contexto escolar de jovens e adultos trabalhadores, faz-se
necessário buscar uma concepção mais ampla, na qual educadores e educandos não
ignorem o entorno social com suas questões, antes, concebam a educação como um
direito que se afirma independente da idade.
As experiências acadêmicas no âmbito do ensino e da extensão relatadas
acima representaram uma oportunidade de pensar criticamente sobre a implicação dos
vários enfoques que perpassam o processo ensino e aprendizagem no campo específico
da EJA, seus nexos e peculiaridades, sobretudo por considerar que o processo educativo
é efetivado “por indivíduos [...] que carregam consigo crenças, aspirações, motivações,
propósitos, sentimentos, aspectos que interferem tanto na ação de quem se põe no papel
de educador, como no papel de educando” (SILVA, 2001, p. 20).
Os sentimentos apontados revelam expectativas. Nesse sentido, para Coll e
Miras (2001), o que o professor concebe e espera do processo educativo, assim como as
intenções e funções que lhe atribui, o levam a agir e reagir de forma diferente ante aos
progressos ou dificuldades desse processo. Em sentido análogo, as concepções e

15
expectativas que os professores nutrem a respeito da EJA acabam por afetar o resultado
educativo dessa modalidade.
O panorama descrito acima contextualiza o objeto deste estudo, pois foi a
partir da inserção nos vários espaços de interlocução e ação universitária que a
curiosidade em torno das concepções dos professores sobre a EJA se fez mais
criticamente curiosa, mais metodicamente ‘perseguidora’ do seu objeto (FREIRE,
1996).
Partindo do entendimento que a forma como os sujeitos agem sempre está
relacionada a determinadas teorias ou visões de mundo, busquei com esta pesquisa
situar, a partir das vozes dos docentes, as concepções de EJA que são mobilizadas pelos
professores que atuam no ensino fundamental, dessa modalidade, na rede pública do
município de Paulo Afonso.

Delimitação do Problema

Considerar as concepções de EJA que se configuram nos dizeres dos
docentes dessa modalidade educativa constitui questão central desta pesquisa. O
pressuposto fundamental é que embora os documentos nacionais e internacionais que
referenciam o campo – Constituição Federal de 1988; Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB) de 1996; Parecer CNE/CEB 11/2000; Declaração de Jomtien (1990);
Declaração de Hamburgo (1997) – preconizem uma nova concepção de EJA, traduzida
pelo direito de todos à educação e pelo conceito de formação de adultos como uma
multiplicidade de processos formais e informais de aprendizagem e educação
continuada ao largo da vida, a concepção ainda predominante entre os educadores
continua a ser a visão compensatória que atribui à EJA a mera função de reposição da
escolaridade não realizada na infância ou adolescência.
Na Declaração de Hamburgo (Alemanha, 1997) encontramos a EJA
concebida como o conjunto de processos de aprendizagem, formais ou não, graças aos
quais os adultos, na sociedade à qual pertencem, desenvolvem suas aptidões,
enriquecem seus conhecimentos e melhoram suas qualificações técnicas ou
profissionais ou as reorientam em função de suas próprias necessidades e das
necessidades da sociedade. Tal concepção fundamenta-se no respeito integral aos
direitos humanos, na perspectiva das pessoas jovens e adultas desenvolverem seu
potencial independente da idade. Entretanto, esta ampliação conceitual, que implica em

16
novos desafios às práticas existentes, não foi plenamente assimilada pelos educadores
envolvidos nesta modalidade educativa.
O que tento defender é que existe um desencontro entre as concepções de
EJA mobilizadas pelos professores nos fazeres pedagógicos cotidianos e os preceitos
conceituais dos documentos de referência para o campo. Distanciados de tais
fundamentos teórico-conceituais, os docentes desenvolvem práticas eivadas de
“escolarismo” (PAIVA, 2005), praticadas sem muito saber por que fazê-las,
defendendo rituais e procedimentos distantes de alguns princípios caros à educação que
se pensa como direito, como possibilidade de exercitar, democraticamente, a igualdade
entre sujeitos diferentes.
Para tanto, levantei a seguinte questão de pesquisa: Quais concepções de
EJA orientam as práticas pedagógicas dos professores dessa modalidade educativa?
A partir da problemática anunciada, três suposições foram levantadas para a
investigação: primeiro, os professores concebem a EJA como um processo de
escolarização, cuja finalidade principal é a regularização do fluxo escolar com vistas à
certificação para o mercado de trabalho; segundo, por perceberem a EJA na feição
escolarizada, os professores desenvolvem práticas baseadas na idéia de suprimento das
aprendizagens não realizadas antes da idade adulta; terceiro, sem que se apropriem do
alargamento do conceito de EJA, os professores permanecem silenciando a concepção
de EJA como uma afirmação do direito à educação ao longo da vida.
Ao investigar as concepções que orientam as práticas pedagógicas dos
professores da EJA – tomando por base uma interpretação comprometida com a visão
dos próprios sujeitos – busquei identificar como elas foram sendo tecidas. Parti do
princípio de que as concepções dos professores foram elaboradas por meio de
informações aprendidas e apreendidas através da história, do fazer cotidiano, da relação
com os pares, entre outras; de modo que estas apropriações passam por organizações
mentais categorizadas e ressignificadas.
O objetivo geral da investigação é analisar as concepções de EJA que
fundamentam as práticas educativas dos professores que atuam nessa modalidade de
educação e os objetivos específicos são: caracterizar a evolução das concepções e
sentidos da EJA produzidos nos movimentos da história da educação brasileira, entre as
décadas de 1940 e 1990, que contribuíram com a atual configuração do campo; situar as
concepções de EJA que fundamentam a prática educativa, ouvida as vozes de docentes
dessa modalidade.

17
A formulação dos objetivos levou-me ao estudo teórico sobre concepções,
crenças e pensamento do professor, buscando apreender os efeitos destas no modo de
dizer e fazer a prática docente, em particular, nas classes de EJA.
A relevância deste trabalho justifica-se, portanto, pela possibilidade de
analisar o pensamento do professor sobre os conceitos e sentidos da EJA quando
realizam suas práticas pedagógicas. Dessa análise decorre a reflexão sobre o lugar em
que o professor é “considerado” quando são pensadas políticas de formação continuada
para a EJA. O pesquisador português Antônio Nóvoa (1995), ao analisar a questão,
utilizou-se de imagens triangulares para representar a posição ocupada pelo professor no
interior das discussões de propostas de formação. De acordo com o autor, o sujeito
professor ocupa o terceiro vértice, ou seja, o “lugar do morto”. O professor está
presente, tem de ser considerado, mas sua voz não é essencial, no caso particular da
EJA, para fixar o desfecho de estratégias que considerem não somente a adequação dos
saberes escolares à idade adulta dos alunos, mas, sobretudo, incorpore novos saberes e
competências aos educadores desse público específico.
Portanto, a ênfase nas concepções dos professores decorre das suas
implicações na dimensão intencional da ação docente (BECKER, 1993). Por isso, antes
mesmo de refletir sobre “como ensinar” (método) e o “que” (conteúdo) é ensinado nas
salas de EJA, faz-se necessário, identificar e analisar as concepções que, de modo
explícito ou implícito, norteiam os fazeres educativos.

Abordagem Metodológica

A investigação delineada foi desenvolvida a partir dos elementos que
caracterizam e fundamentam uma pesquisa qualitativa. Nesse sentido, definimos o foco
do trabalho no decorrer da investigação, considerando o processo de indução do
conhecimento, do contexto e das múltiplas realidades construídas pelos sujeitos
envolvidos e suas influências recíprocas (ALVES-MAZZOTI; GEWANDSZNAJDER,
2002).
No intuito de apreender as visões de educação de pessoas jovens e adultas
subjacentes às proposições que instâncias oficiais, movimentos e práticas foram
assumindo historicamente, fiz incursões nos estudos de autores que historicizam a área,
tais como, Arroyo (2005), Beiseigel (1974, 1982), Di Pierro (2001, 2005), Fávero
(1984, 1996), Gusmão; Marques (1978), Haddad (2000), Moura (2004), Paiva (1972),

18
Machado; Ireland (2004), Ribeiro (1992), Soares, Leôncio (2002); nos trabalhos de
Becker (1993), Nóvoa (1995), Ponte (1995), Ribeiro e Ponte (1995), Passos (1995),
Moron e Brito (2001), Fiorentini (1995), Thompson (1997), realizei escavações em
torno dos temas: concepções, crenças, pensamento do professor, como também, sobre as
interferências destes na prática educativa, a fim de compreender mais amplamente o
campo do fenômeno pesquisado. Entre os autores que discutem a Educação em geral
podemos citar Frigotto (1995), Freire (1997), Neves (1997), Rummert (2000).
Na pesquisa de campo, o universo amostral foi constituído por oito
professores do quadro efetivo da rede pública de ensino do município de Paulo Afonso,
em atuação nas turmas de 1ª a 8ª série da EJA, o que corresponde às etapas I e II do
ensino fundamental.
Quanto aos instrumentos de coleta dos dados, optei pela técnica do grupo
focal por ser apropriada aos estudos que buscam entender atitudes, preferências,
necessidades e sentimentos (GATTI, 2009). O corpus7 selecionado para os propósitos
deste estudo foi constituído por recortes das falas dos oito docentes que compõem o
universo amostral da pesquisa empírica.
Os depoimentos obtidos por meio da técnica do grupo focal foram
organizados e analisados na perspectiva da análise de conteúdo, referenciadas por
Bardin (2009) e inseridos na modalidade da análise temática. Os procedimentos da
análise de conteúdo percorrem as etapas de pré-análise, exploração do material e, por
fim, a inferência e a interpretação, etapa na qual os achados são confrontados com os
referencias teóricos da busca investigativa.

Estruturação do Trabalho

Para melhor compreensão deste estudo, apresento sinteticamente a forma de
organização do trabalho. Este se encontra estruturado em três capítulos, além da
introdução, considerações finais, referências e apêndices. No primeiro capítulo, tendo
em vista a complexidade que envolve a temática concepções de EJA, abordei
fundamentos teóricos acerca da categoria concepção do professor a fim de demarcar o
lugar de onde se está falando e as possibilidades do que se está falando. A idéia que
7

Por uma questão de coerência com os fundamentos teórico-metodológicos adotados na análise dos
dados desta pesquisa, o termo corpus utilizado neste trabalho toma como referência a definição de Bardin
(2009), para a qual constitui “o conjunto dos documentos tidos em conta para serem submetidos aos
procedimentos analíticos” (p. 96).

19
levantei no capítulo inicial foi analisar aspectos que envolveram diferentes modos de
conceber e nomear processos formativos de pessoas jovens e adultas das classes
populares, bem como, acontecimentos históricos relacionados ao contexto social,
político e econômico que acomodaram diversas visões de educação de adultos no
período compreendido entre as décadas de 1940 a 1990. Focando meu olhar para os
eventos que marcaram a EJA na década de 1990, situo novos protagonismos,
concepções, tendências e sentidos que referenciam esta modalidade no contexto atual.
No segundo capítulo descrevo a metodologia da abordagem qualitativa, o
contexto da EJA no município de Paulo Afonso, o perfil dos professores participantes
da pesquisa, a técnica e a operacionalização do grupo focal para coleta dos dados e a
modalidade da análise de conteúdo utilizada na análise dos referidos dados.
No terceiro e último capítulo, procedo à análise do material empírico
obtidos na entrevista em profundidade com os sujeitos da pesquisa. Com base nas vozes
dos docentes, apresento o contexto e a discussão das concepções de EJA, buscando
evidenciar, com base no estudo teórico realizado, os conceitos e sentidos que a
modalidade adquire nas falas dos professores, bem como, suas filiações aos contextos e
formulações que foram configurando o campo, desde a década de 1940, sobretudo à luz
dos documentos de referência produzidos no final dos anos de 1980 (Constituição
Federal de 1988) e durante a década de 1990 (Declaração de Jomtien de 1990; LDB de
1996; Declaração de Hamburgo de 1997), por representarem um avanço em direção à
compreensão da educação como direito de todos, em qualquer da idade, e da satisfação
das necessidades de aprendizagem como um processo permanente que se dá ao longo da
vida.
Como conclusão do trabalho, faço algumas considerações no esforço de
apresentar uma síntese das concepções de EJA apreendidas nos dizeres dos professores
e fazer recomendações sobre a importância de tomar as concepções de EJA dos
professores como ponto de partida nos processos de formação de docentes dessa
modalidade educativa.

20

I EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: PERCURSOS E
CONCEPÇÕES
O termo Educação de Jovens e Adultos, freqüentemente designado por EJA,
aparece pela primeira vez na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996
como uma modalidade específica da educação básica, sinalizando a superação da
concepção dominante que durante muito tempo nos remetia meramente a programas de
alfabetização destinados a pessoas que não aprenderam a ler e a escrever quando eram
crianças. A EJA tem se constituído como um campo de práticas e de reflexão que visa
ao desenvolvimento integral dos sujeitos sociais matriculados nesse modo de educação,
considerando necessariamente as suas particularidades de faixa etária e de população
que ficou fora da escola.
Posto isto, este capítulo tem por objetivo tecer algumas considerações sobre
a educação de pessoas jovens e adultas buscando apreender ao longo da história as
compreensões e sentidos atribuídos à educação das maiorias vistas, na sociedade
desigual, como minorias. Para tanto, o texto foi organizado em sete tópicos. Primeiro,
demarcamos conceitualmente a categoria concepção docente e suas interfaces com o
processo educativo; em seguida, identificamos diferentes formas de nomear e fazer a
educação da classe trabalhadora em alguns momentos da história do Brasil República;
na seqüência, analisamos brevemente a política nacional de educação de adultos das
décadas de 1940 e 1950, a fim de evidenciar a concepção de educação nela embutida.
Uma apreciação contextualizada da alfabetização como elemento de conscientização e
das práticas educativas fundamentadas na cultura popular nos anos 1960-1964, precede
a abordagem instrumental e despolitizada da educação de adultos que caracterizou o
período autoritário no Brasil (1964-1985). Uma visão da EJA na Nova República e um
diálogo com referenciais teórico-conceituais produzidos para o campo, na década de
1990, compõem os dois tópicos finais deste capítulo. Nesse diálogo, procuramos
focalizar a EJA na perspectiva do direito de todos à educação, estabelecido pela
Constituição Federal de 1988, reforçado pela Declaração de Jomtiem (1990) e
reafirmado na LDB de 1996; assim como analisar a concepção alargada que o conceito
de EJA adquiriu principalmente a partir da V CONFINTEA, suas formulações na
Declaração de Hamburgo (1997) e desdobramentos no Parecer CNE/CEB 11/2000, a

21
fim de se configurar os conceitos e sentidos da EJA como um direito de todos à
educação ao longo da vida.

1.1 Sobre concepções docentes e práticas pedagógicas

As características dos professores, como objeto de estudo, representam uma
nova perspectiva de análise do processo educativo que, a partir do enfoque nos traços de
personalidade, competências e sentimentos, põe em relevância as investigações sobre
suas crenças e concepções, a exemplo das pesquisas de Ribeiro e Ponte (1995).
O enfoque das investigações sobre as características pessoais em detrimento
do lado instrumentista desses profissionais da educação emerge a partir dos anos
sessenta, na perspectiva de contribuir com mais aportes teóricos para o processo ensinoaprendizagem (PONTE, 1995).
A partir da década de 1980, estes pressupostos passaram a ser considerados
fatores de influência e de mudança no processo ensino e aprendizagem, bem como no
sistema educacional como um todo, conforme afirma Ponte (1995, p.2):

os estudos sobre as crenças e as concepções dos professores assumem
grande importância no início dos anos oitenta. O professor torna-se
cada vez mais o centro das atenções dos investigadores e começa a ser
visto como tendo crenças e concepções que determinam, ou pelo
menos influenciam decisivamente, a forma como desempenha as suas
tarefas.

Passos (1995) chama a atenção para o fato de não haver consenso quanto à
definição do termo concepção. Uma dos motivos assinalados pelo pesquisador para esta
plasticidade é em razão dos estudos das concepções abordarem também o conceito de
crença, apresentando as definições dos dois termos como sendo similares. Outros
estudos, a exemplo dos realizados por Ponte (1992), concebem esses termos como
sendo distintos, mesmo embora afirmem que há pouca diferença na definição. No
entanto, as crenças e concepções aparecem geralmente na literatura do ensino como
categorias distintas.
Neste estudo das concepções dos professores sobre a EJA, adotamos a
definição de Moron e Brito (2001) que baseadas nas conceituações apresentadas por
Canavarro (1994) e Ponte (1992) sobre concepções, definiram as mesmas como:

22
a maneira própria de cada indivíduo elaborar, interpretar, representar
suas idéias e agir de acordo com as mesmas. É construída das
experiências individuais que são influenciadas por uma série de
variáveis do ambiente, conhecimentos, experiência prática e
componente emocional (MORON e BRITO, 2001, p. 226).

Fiorentini (1995, p. 3-4) esclarece que no modo de ensinar, “esconde-se
uma particular concepção de aprendizagem, ensino [...] e de educação”. Por sua vez,
Thompson (1997) assegura que os padrões de comportamento dos professores, com
destaque para a prática docente, são em função de seus pontos de vista, isto é, sofrem
influências e determinações das suas concepções. Parte dessas considerações o
entendimento de que
qualquer esforço para melhorar a qualidade do ensino [...] deve
começar por em compreender as concepções sustentadas pelos
professores e pelo modo como estas estão relacionadas com sua
prática pedagógica. (THOMPSON, 1997, p. 14)

As considerações acima são reveladoras da importância do enfoque nas
concepções dos professores como objeto de estudo. Revelam, ainda, que o
comportamento do professor é em grande parte resultado de seu próprio pensamento, o
que ele conhece, as suas estratégias para se apropriar da informação e para utilizá-la na
resolução de problemas.
Desta forma, todos os professores possuem alguma teoria pessoal sobre
educação, professores, alunos e classes, a qual é freqüentemente8 expressa como
princípio de prática pedagógica. Nesse sentido, não há fazer docente fundado no vazio
conceitual, isso implica dizer que nessas mediações os professores
são produtores e/ou expositores de uma teoria. “Teoria que não
significa “saber erudito” e nem se contrapõe ao saber popular”, mas
que transforma seus divulgadores muito mais em executores de
determinadas teorias do que em seus próprios senhores (...) a teoria,
da qual o autor é expositor, determina sua concepção da realidade.
Tal concepção (consciente ou inconsciente) é filtrada por seu discurso
[...]. (FRANCO, apud PRADO, 2007 p. 94)

8

A escrita da presente dissertação segue as normas estabelecidas pela Reforma Ortográfica, Lei n.º 5765
de 18 de dezembro de 1971, uma vez que, mesmo sendo assinada em 29 de setembro de 2008 pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a atual Reforma Ortográfica teve apenas a sua introdução em 1º de
janeiro de 2009, sendo sua implantação total prevista para 2012.

23
Vale dizer que as concepções, crenças e atitudes docentes se expressam e se
caracterizam por um corpo de conceitos e valores organizados em teorias explícitas e
latentes, evidenciadas pelos modos de agir do sujeito. Assim, de acordo com seu
funcionamento, as concepções podem ser transformadas pelo contexto imediato que as
provocam, o que implica dizer que podem ser reconstruídas com base nos saberes
acumulados pelo indivíduo. Trata-se, neste caso, de fenômeno relativo à evolução de
concepções, de crenças, de pensamentos, refletindo seu caráter de dinamicidade.
No momento em que admitimos uma relação recíproca entre concepções e
práticas docentes, não pretendemos com isso usar a prática como instrumento de
recriminação do professor, senão como caminho de formação teórica (FREIRE, 1997).
Ainda é Freire (1997, p. 68) quem nos ajuda a explicar a relação de
reciprocidade dos termos concepção e prática, quando afirma:

Não haveria prática, mas puro mexer no mundo se quem, mexendo no
mundo, não se tivesse tornado capaz ele de ir sabendo o que fazia ao
mexer no mundo e para que mexia. Foi a consciência do mexer que
promoveu o mexer à categoria de prática e fez com que a prática
gerasse necessariamente o saber dela (grifo do autor).

De acordo com o exposto, a prática não se caracteriza por ações aleatórias,
acidentais, sendo o que não seria prática e sim um ‘mexer no mundo’. Isto significa
dizer que a prática requer uma consciência dela, isto é, reside numa ação intencional; e
ainda, a prática gera um saber dela, portanto, é explicativa do que faz e do para que faz;
é atravessada por aspirações, motivações, propósitos, aspectos que interferem na ação
de quem se coloca no papel de educador; por fim, “[...] a consciência da prática implica
a ciência [concepção] da prática embutida, anunciada nela” (FREIRE, 1997, p. 68).
Particularizando o exposto acima, podemos dizer que a prática docente na
EJA evidencia o conhecimento que a fundamenta e as teorias subjacentes que a
explicam.

1.2 Formação de Jovens e Adultos: uma abordagem histórica dos conceitos

A análise que empreendemos baseada nos textos estudados nos permitiu
mapear um relativo conjunto de concepções acerca da educação de pessoas jovens e
adultas. Cada uma com sua lógica e objetivos próprios, mas, todas indicando e
ratificando um modo particular de dizer os sentidos da educação de adultos.

24
Resumindo a história podemos afirmar que a educação de adultos marca o
seu lugar no campo das discussões políticas, principalmente, através de sua imbricação
com o cenário da instalação de um regime republicano, alicerçado no direito, não no
privilégio; na democracia, não na monarquia ou aristocracia; na nação, não nos
interesses particulares, fundados em pressupostos de natureza familiar, partidária,
classista, racial ou religiosa (CARLOS, 2002).
Com efeito, ao nível das Constituições (1891, 1934, 1937 e 1946) a
educação de adultos apareceu, de um lado, como precondição para o exercício político
de votar, mediante a interdição do voto do analfabeto; de outro, inserida no contexto do
ensino primário.
No que tange as reformas de ensino (industrial, comercial, agrícola e
primária), a educação de adultos se apresentou de forma multifacetada. Ora,
conservando algumas facetas delineadas nos atos constitucionais, ora introduzindo
outras perspectivas.
Quanto os decretos militares (1909, 1913, 1914, 1928), que prescreveram
acerca da educação militar das praças, a educação de adultos foi vinculada as dimensões
escolar, profissional e militar.
É oportuno dizer que, inicialmente, a educação dirigida a jovens e adultos
não foi sempre denominada ‘educação de adultos’. Só a partir dos anos 1940 que essa
expressão repercutiu nacionalmente e se tornou signo representativo da prática
educativa destinada ao público em tela, marcadamente, pela via das ações
governamentais de desanalfabetização do país.
A partir do exposto podemos inferir que, se a designação ‘educação de
adultos’, como expressão que identifica a prática educativa para jovens e adultos surgiu
e se consolidou no final da década de 1940, significa, necessariamente, que essa
modalidade educativa tenha sido concebida, anteriormente, de outras maneiras.
De fato, nossas incursões encontraram o registro de várias expressões
justificadas pelos sentidos e fins pretendidos, a saber: escola noturna, alfabetização,
ensino primário supletivo, ensino profissional, instrução primária das praças, educação
de adolescentes e adultos analfabetos.
A ‘escola noturna’ acusava a necessidade de um tipo de educação
endereçada aos que possuíam incompatibilidade etária e indisponibilidade de tempo
para os estudos diurnos. Essa demanda equivalia ao coletivo de indivíduos adultos e
trabalhadores analfabetos. A escola diurna destinava-se a alunos na faixa etária

25
considerada regular. O adulto analfabeto contrariava essa regra. Ademais, ela também
fora feita para educandos que não se ocupavam cotidianamente com o mundo da
produção. Também, nesse caso, o adulto analfabeto extrapolava a sua lógica e estrutura.
Decorrem daí, a incompatibilidade e a impossibilidade: a necessidade de uma escola
noturna que pudesse atender a demanda de um aluno fora da faixa etária e trabalhador.
A ‘escola noturna’ tornara-se uma expressão identitária de uma educação destinada a
jovens e a adultos.
Funcionando como uma espécie de contraponto ao fenômeno sociocultural
do analfabetismo, surge a ‘alfabetização de adultos’. Ela abrigava uma concepção
central, isto é, trazia em sua formulação o entendimento de que o domínio da leitura e
da escrita era o veículo da apropriação do saber produzido e acumulado pela
humanidade. Esse domínio potencializaria a constituição de um indivíduo afinado com
o seu tempo e com sua história; um tempo e uma história marcados pelo signo da
escrita.
Nesse contexto, a alfabetização funcionava como uma espécie de
mecanismo de denúncia da existência de um segmento majoritário da população
marginalizada do mundo das letras. Ao posicionar o alfabetismo como condição para
ser eleitor e pré-requisito à qualificação profissional ou à vida cívica, evidenciava-se
uma situação de sujeição, estigmas e maus-tratos que a condição de analfabeto
acarretava.
O termo ‘ensino primário supletivo’ fixado, sobretudo a partir da Lei
Orgânica do Ensino Primário de 1946, representou, em última, instância, a
institucionalização da educação de adultos como uma modalidade de ensino integrada
ao sistema educacional brasileiro, distinta da educação infantil.
Conforme podemos observar na proposição do Artigo 2º, na letra “b”da
referida Lei, o ensino primário supletivo [é] destinado aos adolescentes e adultos. Essa
formulação possibilita a identificação de duas faces do modo de existência da educação
de adultos: a feição do ensino supletivo e a distinta da educação infantil.
No primeiro caso, revela-se a face aligeirada e empobrecida da educação de
adultos. A condensação do conteúdo programático e consequente redução do tempo
escolar como expressão do modo de ensino supletivo, vai configurando a educação de
adultos como formação em situação de emergência e reduzida do ponto de vista
curricular, enquadrando-na na categoria de educação de segunda classe.

26
No segundo caso, se expressa a face específica da educação de adultos como
uma conquista que a diferenciava da prática para crianças. Nota-se, portanto, uma
indesejável coincidência entre a prática pedagógica e o tipo de educando para quem ela
se destinava. De sorte que, com a expressão ‘ensino primário supletivo’ inaugura-se, no
Brasil, uma modalidade de educação de adultos: a supletiva.
A designação ‘ensino profissional’ confere uma nova concepção de
educação de adultos. O novo modo de perceber a educação de adultos se diferencia pelo
critério da alfabetização e escolarização primária, estas, fundadas no pressuposto da
aprendizagem da leitura, da escrita e de um saber escolástico. A educação de adultos
concebida como ‘ensino profissional’9 objetivava dar conta dos problemas oriundos do
mundo do trabalho, o que exigia o desenvolvimento de conhecimentos práticos e
habilidades manuais específicas.
Essa nova concepção de educação de adultos ganhou visibilidade nacional,
sobretudo a partir das leis orgânicas do ensino industrial, comercial e agrícola que
fizeram referência aos cursos artesanais, de aprendizagem e de continuação,
basicamente como uma modalidade de caráter eminentemente prático, voltada,
exclusivamente, para fornecer aos jovens e aos adultos, não diplomados ou habilitados,
uma formação sumária e rápida que os capacitassem para o exercício de atividades
simples, porém necessárias a sua realidade local e sua urgência de emprego.
Essa prática educativa poderia ser realizada sob a orientação e tutela do
Estado ou sob a responsabilidade das empresas, fábricas e fazendas. No primeiro caso,
foi emblemática a capacitação propiciada pelo Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (SENAI)10 e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC)11. No
segundo, o lugar de qualificação seria o próprio lugar de trabalho.
Entretanto, independente do lugar e do promotor, a escolarização primária
funcionava como requisito de entrada, de participação no ensino profissional. Assim
sendo, o ‘ensino profissional’ traduzia um modo de conceber a educação de adultos pela
9

Para maiores aprofundamentos, ler: CUNHA, Luiz Antônio. O ensino de ofícios nos primórdios da
industrialização. São Paulo: Editora UNESP, Brasília, DF: Flacso, 2000.
10
Criado em janeiro de 1942 pelo Decreto-Lei Nº 4.048, na época designado como Serviço Nacional de
Aprendizagem dos Industriários, órgão subordinado à Confederação Nacional das Indústrias.
11
Órgão vinculado à Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, criado em
janeiro de 1946 pelo Decreto-Lei nº 8.621 e 8.622.

27
oferta de cursos artesanais, de aprendizagem e de continuação a um só tempo, pois,
mantinha também com o ensino primário uma ligação de dependência. A formação
escolar primária era o pré-requisito para adquirir a qualificação profissional.
A ‘instrução primária das praças’ designava a prática educativa alfabetizante
e profissional-militar de jovens adultos oferecida pelas escolas regimentais que
funcionavam dentro do quartel do exército. Os soldados matriculados obrigatoriamente
nas escolas regimentais constituíam um contingente de recrutas analfabetos ou com
escolarização deficiente. Esse ensino oferecido pelo exército se fez presente durante
toda a República, antecipando-se mesmo as próprias iniciativas da União nessa esfera
educacional (CARLOS, 2002).
Por fim, a ‘educação de adolescentes e adultos analfabetos’ surge como uma
alternativa de designar a educação de adultos. Essa expressão foi cunhada no decorrer
dos anos 1940 como o signo da Campanha Nacional de Educação de Adolescentes e
Adultos Analfabetos, desencadeada pela União em 1947 e, recorrentemente descrita
como Campanha de Educação de Adultos. A expressão foi introduzida definitivamente
nos discursos do meio educacional, a ponto de nomear um dos serviços educacionais
realizados pelo Departamento Nacional de Educação, de Serviço de Educação de
Adultos12.
Essa expressão contemplava ao mesmo tempo a via de enfrentamento
utilizada pelo governo, isto é, a estratégia de campanha e o público alvo a ser atingido,
ou seja, os adolescentes e os adultos analfabetos, que, segundo o Censo de 1940,
representavam, naquele ano, cerca de 55% da população do país, acima de 15 anos.
É oportuno registrar que, embora a expressão ressalte o caráter alfabetizante
e quantitativo da Campanha, ela era encarada como um movimento que pretendia levar,
à população analfabeta, muito mais do que o acesso à leitura, à escrita e aos rudimentos
da matemática. Sua meta correspondia a uma pretensão mais arrojada, isto é, cada classe
criada pela Campanha deveria se tornar um “centro de propagação de informações úteis,
no sentido da educação da saúde, da educação cívica, da divulgação das modernas
técnicas de produção agrícola e de pequenas indústrias” (BRASIL, 1947b, p.65).
Feito o delineamento de conceitos, sentidos e público referentes à educação
de pessoas jovens e adultas até os anos 1940, é possível analisar brevemente, no

12

Cf. BRASIL, 1947. Portaria n. 57, de 30 de janeiro de 1947, que autorizava o Departamento Nacional
de Educação a orientar e a coordenar a Campanha.

28
próximo tópico, as concepções de ‘educação de adultos’ nas políticas oficiais do Brasil
de 1940 a 1950.

1.3 Campanhas de Educação de Adultos nas décadas de 1940 – 1950

A política oficial de educação de adultos, no Brasil, é marcada por
campanhas, cujo termo remete a algo emergencial, provisório, à parte do sistema
regular de ensino; legitimando, em última instância, os interesses econômicos, a
manutenção das desigualdades e a negação dos direitos proclamados13.
Essas campanhas foram lançadas em muitos países periféricos e
semiperiféricos após a II Guerra Mundial, incentivadas, principalmente, pela recémcriada Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura
(UNESCO), órgão vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU), para incentivar,
entre outras iniciativas, a realização de programas nacionais de educação de adultos
justificadas pela urgência de integrar os povos visando à paz e à democracia.
Foi a partir da década de 1940 que o espaço específico da educação de
pessoas jovens e adultas das classes populares se delineou no interior das políticas
públicas educacionais com a perspectiva de preparar a mão-de-obra para o setor
produtivo e aumentar o contingente eleitoral:

as idéias, as leis e as iniciativas que se consolidam [...] [configuram]
uma situação inteiramente nova. Até então, registravam-se alguns
esforços locais, [...] mas, na década de 40, cogita-se uma educação
para todos os adolescentes e adultos analfabetos do país (BEISIEGEL,
1982, p. 177).

Diante do quadro de analfabetismo no cenário mundial e nacional, as ações
na área de educação de adultos que vinham se realizando desde 1942 são intensificadas,
quando do Decreto nº 19.513 que criou o Fundo Nacional de Ensino Primário. Por volta
do final dos anos 1940 e início dos anos 1950, conforme citamos anteriormente, cerca
de 55% da população brasileira acima de 15 anos era constituída por analfabetos. Foi
nesta ocasião que a UNESCO liderou o movimento a que já nos referimos, de estímulo
à criação de programas nacionais de educação de adultos analfabetos, principalmente
13

A Constituição de 1934 reconhece pela primeira vez, em caráter nacional, a educação como direito de
todos. Apesar dos avanços, o direito de todos à educação, proclamado naquela Constituição, não se
efetivou, pois, a obrigatoriedade não incidiu coativamente sobre o Estado.

29
nas regiões consideradas mais atrasadas do país, elaborando o conceito de educação
funcional (LEAL, 1985).
Nesse período, a educação de adultos define sua identidade tomando a
forma de campanha nacional de massa. A exemplo disso mencionamos, a Campanha de
Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), lançada em 1947 e, em 1952, a
Campanha Nacional de Educação Rural (CNER), esta, especialmente voltada para a
Região Nordeste. Tais campanhas organizaram um número significativo de classes de
alfabetização, com o objetivo de levar a educação de base aos brasileiros iletrados das
cidades e das áreas rurais, entendo-se por educação de base o processo educativo

destinado a proporcionar a cada indivíduo os instrumentos
indispensáveis ao domínio da cultura de seu tempo, em técnicas que
facilitassem o acesso a essa cultura [...] e com os quais, segundo suas
capacidades, cada homem pudesse desenvolver-se e procurar melhor
ajustamento social (BEISIEGEL, 1982, p.14) (grifo nosso)

A partir dessa concepção funcional a educação de adultos percorre
caminhos com vistas a favorecer o enquadramento, o ajuste social de cada indivíduo,
conforme suas capacidades e, nessa direção, é implementada em harmonia com os
projetos de desenvolvimento prevalentes no país. Ou seja, além de manter o traço
assistencialista, agora o foco é a preparação de trabalhadores para a vida urbanoindustrial.
Na prática, a educação de base correspondia a uma alfabetização em três
meses e a condensação do curso primário em dois períodos de sete meses; no período
seguinte as ações voltavam-se para o desenvolvimento comunitário e para o treinamento
profissional. Em um curto período de tempo, foram criadas várias escolas supletivas;
pretendia-se estimular o desenvolvimento social e econômico, através de um processo
educativo que supostamente poderia promover a melhoria das condições de vida da
população. Segundo Fávero (1984, p. 4), neste momento, a UNESCO definia que

a educação de base seria, então, esse mínimo fundamental de
conhecimentos, em termos das necessidades individuais, mas levando
em conta também às necessidades e os problemas da coletividade,
assim como promovendo a busca de soluções para esses problemas
(grifo nosso)

Cabe questionar o que constituía, no Brasil, esse conhecimento mínino
fundamental traduzido por educação de base.

30
Os elementos esclarecedores dessa questão podem ser encontrados nas
premissas ideológicas do 1º Congresso de Educação de Adultos ocorrido em 1952, cujo
slogan ser brasileiro é ser alfabetizado, evidencia uma concepção de educação para a
democracia, elegendo a alfabetização como condição para o exercício da cidadania.
Nota-se, então, como o sentido da educação de adultos vincula-se, estreitamente, à vida
cívica, até mesmo pelo retorno das eleições diretas que marcou aquele momento
histórico; além do mais, o processo educativo se restringia à alfabetização, no sentido de
ensinar a ler e escrever; a cartilha é o recurso, a silabação é o método.
Vale dizer que nos encontros preparatórios do 1º Congresso o Serviço de
Educação de Adultos do Ministério da Educação e Cultura (MEC) elaborou e veiculou
um conjunto de publicações sobre o tema. De acordo com Soares (1996), tais
publicações expressavam uma concepção de educação de adultos, segundo a qual o
investimento na educação objetivava solucionar os problemas da sociedade e o ensino
de adultos era considerado uma tarefa fácil, portanto, não requeria formação específica.
Nessa concepção, o alfabetizador era identificado como um missionário, sendo assim,
deveria valorizar o ‘voluntariado’ em detrimento da remuneração.
Quanto à CEAA seu período áureo foi entre 1947 e 1953. A partir de 1954,
“depois de um período curto de êxito, em que atendeu a demanda reprimida, essa
campanha entrou numa letargia tão mais profunda quanto maior foi sua absorção pela
burocracia que ela mesma ajudou a criar” (PAIVA, 1990, p. 10). De modo que em 1958,
no 2º Congresso Nacional de Educação de Adultos se reconheceu oficialmente o
fracasso do programa, principalmente por seu caráter eleitoreiro. Ainda assim,
sobreviveu a rede de ensino supletivo por meio dela implantada, assumida pelos estados
e municípios.
Sobre a CEAA recai a crítica de que desvincular o conteúdo pedagógico da
alfabetização do contexto econômico, social e política do país legitimava uma visão do
adulto analfabeto como causa e não como conseqüência do subdesenvolvimento do
país. Essa concepção legitimava a visão do adulto analfabeto como incapaz e
identificado psicologicamente com a criança, submetido à menoridade econômica,
política e jurídica, não podendo, então, votar ou ser votado (CUNHA, 1999).
Contudo, essa visão sofreu alterações durante a própria Campanha; foram
adensando-se as vozes dos que superavam esse preconceito, reconhecendo o adulto
analfabeto como ser produtivo, capaz de raciocinar e resolver seus problemas. Para
tanto, contribuíram também teorias mais modernas da psicologia, que desmentiam

31
postulados anteriores de que a capacidade de aprendizagem dos adultos seria menor do
que a das crianças.
É oportuno registrar que nem mesmo o comprovado fracasso de inúmeros
programas de massa em todo o mundo foi suficiente para que o Brasil deixasse de
investir em experiências do gênero até os dias de hoje, a exemplo do Programa Brasil
Alfabetizado, lançado pelo Governo Lula desde 2003, que no Estado da Bahia é
designado Todos pela Alfabetização (TOPA). Assim como na CEAA, também no
TOPA, o alfabetizador é identificado como um bolsista voluntário, no caso do Programa
baiano, a remuneração do alfabetizador é de aproximadamente meio salário mínimo14.
Além disso, embora a proposta do TOPA mencione que o alfabetizador deva ser,
preferencialmente, um professor da educação básica, na prática, recruta-se voluntários
com formação em nível médio de qualquer área disciplinar. Esses dados atestam que os
processos formativos de jovens e adultos continuam ocupando um lugar improvisado
nas iniciativas oficiais e legitimando a idéia de que o educador pode ser um professor
aligeirado ou um voluntário idealista motivado apenas pela boa vontade, negando-se
que “[...] o preparo de um docente voltado para a educação de jovens e adultos deve
incluir, além das exigências formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas
à complexidade diferencial desta modalidade de ensino” (BRASIL, 2000, p.56).
Ao analisar a oferta educativa do período em tela, Moura (2004) denuncia
que a educação de adultos desenvolvida sistematicamente através do ensino supletivo,
funcionava de forma semelhante ao ensino para crianças. Além dos procedimentos e
recursos metodológicos, toda a prática era transplantada da prática desenvolvida com
crianças. O conteúdo do material didático elaborado para orientar os trabalhos do ensino
supletivo guarda verdadeira identidade com os destinados às crianças. A autora,
baseando-se nos estudos de Beisiegel (1974), esclarece que o ensino supletivo ao
depender das salas de aula e de todo o corpo docente, técnico, administrativo que
atendia às crianças, definiu-se como uma réplica do ensino infantil.
O que podemos assistir nas experiências das décadas de 1940 e 1950 é que a
forma de conceber e desenvolver a educação de adultos parte da visão que se tem do
aluno adulto que, naquele contexto, era concebido como um ser dotado de “[...] um
vazio a ser preenchido por um saber do qual não tem o domínio e que o levará a sua

14

Considerando-se o salário mínimo de R$ 465,00, em vigor no ano de 2009.

32
auto-promoção. A ignorância seria vencida pelo esforço próprio, e a escola, o
instrumento de sua realização” (HADDAD, 1983, p. 14).
Nesse período, na contramão da concepção de educação tecnicistafuncional, aparecem, em documentos e pronunciamentos oficiais, o conceito de cultura
popular como meio de incentivo à alfabetização. E, concomitantemente à caracterização
desses programas como “fábricas de eleitores” (PAIVA, 1983), emergem as primeiras
teses da educação de adultos como meio de transformação social. Iniciou-se um
processo educativo que já não considerava a cultura dominante como única, e a cultura
dos dominados foi, gradativamente, ganhando expressão sob o termo de cultura
popular.
De acordo com Moura (2004), nesse período,

pode-se constatar a coexistência de três frentes de lutas no campo das
propostas e iniciativas para a área: a predominância das Campanhas,
que duraram até 1963; a sistematização e divulgação do ensino
Supletivo, concentrado nas capitais e desenvolvido em sua maioria
através de professores leigos e, a emergência de grupos nacionalistas,
percebendo a educação como um instrumento de difusão de idéias,
necessitando de ser estimulada e proporcionada a todos.

No final da década de 1950 e início da década de 1960, em meio a embates
por reformas de base, a educação de jovens e adultos trabalhadores “passa a se
constituir em uma espécie de pomo de discórdia de natureza política, social, cultural e
pedagógica” (FRIGOTTO, 1995, p. 139). Ao lado de práticas pedagógicas baseadas no
entendimento de que o processo educativo deve suprir a não-escolarização na idade
considerada própria e diminuir a suposta marginalização cultural da população – que,
em grande parte, seria responsável pelo atraso econômico do país –, cresce uma
concepção na qual o processo educativo é visto como emancipador, na medida em que
pode promover a conscientização política dos setores populares e incentivar a sua
organização e autonomia, engajando-os num projeto de transformação social. Essa
compreensão político-pedagógica da educação das classes populares se concretiza
principalmente no início da década de 1960, em experiências de educação popular.
De modo geral, podemos afirmar que coexistem no período de 1960 a 1964
duas concepções distintas de educação de adultos: uma que concebia a educação como
formadora da consciência nacional e viabilizadora de transformações político-sociais
profundas na sociedade brasileira e; outra que a entendia como funcional, isto é,

33
preparadora de recursos humanos para as tarefas da industrialização, modernização da
agropecuária e ampliação dos serviços.
A primeira concepção distinguia-se qualitativamente da segunda pelo
avanço que representou em termos da compreensão do problema colocado pelo projeto
de desenvolvimento apregoado, projeto que não contava com a unanimidade do
governo, já que dentro do próprio MEC havia a inquietação com uma abordagem
puramente técnica da questão. De qualquer forma, estas inquietações ganharam corpo
dentro do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), como pode ser apreendido
nas palavras de Álvaro Vieira Pinto:

O que nos parece necessário, no entanto, é imprimir novo rumo à
nossa educação, a fim de orientá-la, sem compromisso com qualquer
credo político, no sentido da ideologia do desenvolvimento econômico
e social (apud FÁVERO, 1983, p. 33).

Nesse contexto, são significativos os movimentos realizados pela sociedade,
em parceria ou não com o Estado, na organização e execução de experiências educativas
de alfabetização e conscientização. Superando a rigidez e o formalismo da instituição
escolar, configuram-se amplamente no período (início da década de 1960) as iniciativas
que virão a ser denominadas de Educação Popular15.
Procede-se, a partir de agora, uma breve abordagem das experiências mais
expressivas de educação de adultos ocorridas no Brasil pré-1964, vinculadas à primeira
concepção acima citada, as que tinham em seus horizontes políticos e sociais o
incremento da educação e da cultura popular e a ampliação da participação das massas
no processo político.
1.4 Educação de adultos: conscientização e cultura popular
Ao final da década de 1950 até os meados da década de 1960, iniciou-se
uma intensa mobilização da sociedade civil em torno das reformas de base, pois,
Pretendiam todos a transformação das estruturas sociais, econômicas e
políticas do país, sua recomposição fora dos supostos de ordem
vigente; buscavam criar a oportunidade de construção de uma
15

Refere-se ao conjunto de práticas educativas fundamentadas no referencial teórico-metodológico
freireano, como uma concepção de educação, realizada por meio de processos contínuos e permanentes
de formação, que possui a intencionalidade de transformar a realidade a partir do protagonismo dos
sujeitos.

34
sociedade mais justa e mais humana. Além disso, fortemente
influenciados pelo nacionalismo, pretendiam o rompimento dos laços
de dependência do país com o exterior e a valorização da cultura
autenticamente nacional, a cultura do povo (PAIVA, 1987, p. 230).

Esse contexto contribuiu para a mudança das iniciativas públicas de
educação de adultos. Em 1958 o governo brasileiro convoca o II Congresso Nacional de
Educação de Adultos com a finalidade de avaliar as Campanhas de Alfabetização a que
vinham tendo lugar no país desde 1947. Esse Congresso se transformou num verdadeiro
divisor de águas da educação escolar brasileira, pois, marcou
o início da transformação do pensamento pedagógico brasileiro, com o
abandono do ‘otimismo pedagógico’ e a (re)introdução da reflexão
social na elaboração das idéias pedagógicas. Além disso, ele serviu
também como estímulo ao desenvolvimento de novas idéias e novos
métodos educativos para adultos (PAIVA, 1987, p. 210-211).

No referido Congresso, foram feitas críticas à precariedade dos prédios
escolares, à inadequação do material didático e à qualificação do professor. Várias teses
e diversas correntes foram apresentadas, sendo que, em síntese, competiram duas
tendências principais: os que concebiam a educação de adultos como uma ação
preventiva contra a subversão e as perturbações sociais que seriam possibilitadas, em
oposição aos que a concebiam como viabilizadora de uma verdadeira democracia. “Esta
só seria possível quando todos os maiores de dezoito anos soubessem ler a chapa dos
candidatos e escolhê-los em função de suas posições e atitudes frente à coisa pública”
(SCOCUGLIA, 2001, p. 47).
Não obstante, a principal preocupação política desses grupos residia no
perigo da convulsão social. Temia-se que a grande maioria dos adultos, excluída de
qualquer processo de decisão ou escolha sociopolítica, pudesse, ao saber melhor a
realidade, adquirir um poder de transformação16 até então desconhecido e, por isso
mesmo, imprevisível, talvez incontrolável. Era praticamente consensual que o saberpoder presente na educação de adultos teria que ser controlado.
Entretanto, no mesmo Congresso, a delegação de Pernambuco liderada por
Paulo Freire apresentou o Relatório intitulado: A Educação de Jovens e Adultos e as
Populações Marginais: O Problema dos Mocambos17. Nesse documento podem-se
16

Ver Paiva, 1987, p. 209.
O Congresso de 1958 foi antecedido de Seminários Regionais. O Seminário de Pernambuco teve como
relator da Comissão de Estudos nº 3, Paulo Freire, composta por ele e mais a orientadora educacional

17

35
vislumbrar as perspectivas da futura proposta pedagógica freireana já nele presentes,
pois, defendia “que a educação de adultos, nessas zonas, como de resto em quaisquer
outras, não pode reduzir-se a um mero trabalho de alfabetização, ou de simples
suplementação [...]” (SOUZA, 2002, p.144). Entre outras propostas e afirmações, o
Relatório, advogava: a conscientização a respeito do desenvolvimento nacional por
parte do povo e a intensa participação deste nas decisões da vida pública do país; o fim
dos transplantes educacionais, perpetuadores da colonização, e a elaboração de cursos e
materiais didáticos que correspondessem à realidade existencial dos alfabetizandoseducandos adultos; a viabilização de um trabalho educativo com o homem e não para o
homem; a formação de um novo educador, participante (não-diretor) do processo
alfabetizador, enquanto construtor de um novo país; a substituição do discurso do
professor pelo debate no grupo e a utilização de técnicas modernas de trabalho em
grupos (depois denominados círculos de cultura) com auxílio de recursos audiovisuais.
Encontram-se, nessas idéias, um posicionamento específico que revela a
intuição central que se manterá, sendo aprofundada e adquirindo rostos próprios de
acordo com os desafios do momento histórico (atualidade) em que vão sendo
produzidos. Essa intuição são as relações entre a prática pedagógica e a realidade sóciocultural nos processos educativos que perseguem a finalidade da “formação humana do
sujeito humano” como finalidade exclusiva da nova Educação Popular, nascida, entre
outros processos latino-americanos, daqueles embriões brasileiros (SOUZA, 2002, p.
151).
Uma nova visão sobre o problema do analfabetismo foi surgindo, junto à
consolidação de uma nova pedagogia de alfabetização de adultos, que tinha como
principal referência Paulo Freire. O analfabetismo, que antes era apontado como causa
da pobreza e da marginalização, passou a ser, então, interpretado como efeito da
pobreza gerada por uma estrutura social não igualitária (SOARES, 1996). É possível
identificar no Relatório de Pernambuco que a educação de adultos é concebida como
instrumento de transformação social e construção da sociedade futura, sob a influência
do nacionalismo (PAIVA, 1987).
O novo paradigma pedagógico – o novo entendimento da relação entre a
problemática educacional e a problemática social – dá uma virada no enfoque da

Dulce Chacon, a Professora Elza Freire, a assistente social Judite da Mata Ribeiro e o estudante
universitário José Augusto de Souza Peres. O documento desta Comissão foi levado para o Congresso
Nacional e lido pelo Professor Paulo Freire.

36
educação das camadas populares, ao propor que os processos metodológicos para a
alfabetização de adultos transcendam as técnicas e centrem-se em elementos de
conscientização. Com efeito, Paulo Freire e sua equipe de trabalho lançam seu
manifesto contra a educação bancária que desumaniza o homem e o converte num
depósito de conteúdos; e propõem como saída a educação problematizadora. O desafio
proposto por Freire era conceber a alfabetização de adultos para além da aquisição e
produção

de

conhecimentos

cognitivos,

mesmo

sendo

estes

necessários

e

imprescindíveis.
O pensamento pedagógico de Paulo Freire, assim como sua proposta para a
alfabetização de adultos inspiraram os principais programas de alfabetização e educação
popular que se realizaram no país no início dos anos 1960. Esses programas foram
empreendidos por intelectuais, estudantes e católicos engajados numa ação política
junto aos grupos populares. Desenvolvendo e aplicando essas novas diretrizes, atuaram
os educadores do Movimento de educação de base (MEB), ligados à Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dos Centros de Cultura Popular (CPCs),
organizados pela União Nacional dos Estudantes (UNE), dos Movimentos de Cultura
Popular, que reuniam artistas e intelectuais e tinham apoio de administrações
municipais; a Campanha de Educação Popular (CEPLAR) na Paraíba e a Campanha de
Pé no Chão Também se Aprende a Ler, da Secretaria Municipal de Educação de Natal.
É também no Rio Grande do Norte, através de iniciativa do Governo
Estadual, que, em 1963, Paulo Freire experimenta, em larga escala, a proposta
pedagógica, a partir do Serviço de Extensão Cultural da Universidade de Recife, hoje,
Federal de Pernambuco, que veio a ser conhecida como Sistema Paulo Freire de
Educação.
Todos esses movimentos, pelo fato de terem assumido um compromisso em
favor das classes trabalhadoras rurais e urbanas, e por terem orientado sua ação
educativa para uma renovação política, representam uma proposta qualitativamente
diferente das campanhas e mobilizações promovidas anteriormente, das campanhas e
movimentos do pós-1964 e das que existiam em paralelo, como, por exemplo, a
educação promovida pelo sistema empresarial18. Isto porque eles entendiam que a
educação e a cultura popular, como canais de conscientização, exerciam um papel
central na transformação da sociedade.

18

Desse caráter são representantes o Sistema S na década de 1940 (SESI, SESC, SENAI, SENAC).

37

O problema da cultura popular seria colocado, então, sobre novas
bases. Enquanto esta foi, talvez, o pretexto para as elites se dirigirem
ao povo, num impulso tão populista quanto paternalista, a cultura
popular assumiria forma no e a partir daquilo que os analfabetos e
semi-analfabetos exprimem. Uma alfabetização orientada para a
expressão, e não para o consumo, é também uma alfabetização que faz
do outro sujeito de sua própria atividade e, conseqüentemente, o
agente de sua transformação social. (FURTER, 1965, p. 41) (grifo
nosso)

Scocuglia (2001, p. 50-51) faz uma reflexão acerca do que houve de tão
poderoso na educação popular dos anos 1960 para interessar tantas pessoas e entidades.
O autor, citando Fávero (1983, p. 9), esclarece que
Dentre as formas de luta popular que surgiram naqueles anos [1960],
ou que neles conseguiram se fortalecer, uma delas se chamou cultura
popular; e ela subordinava outra: a educação popular. Nesse campo,
tudo se refez e tudo se imaginou criar ou recriar, a partir da
conscientização e da politização – ou seja, da organização das classes
populares. O que se pretendia? Transformar a cultura brasileira e,
através dela, pelas mãos do povo, transformar a ordem das relações de
poder e a própria vida do país. Os instrumentos? Círculos de cultura,
centros de cultura, praças de cultura, teatro popular, rádio, cinema,
música, literatura, televisão [...], sindicatos, ligas [...] com/para/sobre
o povo. Instrumentos que se convertiam em movimento.

O paradigma pedagógico que se construiu nessas práticas baseava-se na
concepção de que o processo educativo precisava interferir na estrutura social que
produzia o analfabetismo. Nesse sentido, "a educação de adultos teria, portanto,
objetivos de integração do homem marginal nos problemas da vida cívica e de unificar a
cultura brasileira" (PAIVA, 1987, p.184).
A alfabetização e a educação de adultos deveriam partir sempre de um
exame crítico da realidade existencial dos educandos, da identificação das origens de
seus problemas e das possibilidades de superá-los.
Uma educação que lhe propiciasse a reflexão sobre seu próprio poder
de refletir e que tivesse sua instrumentalidade, por isso mesmo, no
desenvolvimento desse poder, na explicitação de suas potencialidades,
de que decorreria sua capacidade de opção (FREIRE, 1985, p.59).

Em outras palavras, uma educação que "tratasse de ajudar o homem
brasileiro em sua emersão e o inserisse criticamente no seu processo histórico.
Educação que por isso mesmo libertasse pela conscientização". (FREIRE, 1986, p.66).

38
Além da dimensão social e política, os ideais pedagógicos que se difundiam
tinham um forte componente ético, implicando um profundo comprometimento do
educador com os educandos. Os analfabetos deveriam ser reconhecidos como homens e
mulheres produtivos, que possuíam uma cultura. Nessa perspectiva, Paulo Freire
criticou a chamada educação bancária, que considerava o analfabeto rejeitado e
ignorante, uma espécie de gaveta vazia onde o educador deveria depositar
conhecimento. No dizer de Freire (2002, p.67):
A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem
com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens
como seres "vazios” a quem o mundo "encha” de conteúdos; não pode
basear-se numa consciência espacializada, mecanicistamente
compartimentada, mas nos homens como "corpos conscientes” e na
consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a
do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em
suas relações com o mundo.

Tomando o educando como sujeito de sua aprendizagem, Freire propunha
uma ação educativa que não negasse sua cultura, mas que fosse transformando através
do diálogo. Na época, ele referia-se a uma consciência ingênua ou intransitiva, herança
de uma sociedade fechada, agrária e oligárquica, que deveria ser transformada em
consciência crítica, necessária ao engajamento ativo no desenvolvimento político e
econômico da nação.
Ao contrário das práticas tradicionais de alfabetização, voltadas
prioritariamente para o aprendizado instrumental, Paulo Freire muda o foco para o
sentido da aprendizagem na vida das pessoas. Assim, a partir da concepção da educação
e da alfabetização como expressões culturais, Paulo Freire contribuiu para a produção
de um novo arcabouço conceitual e uma nova postura epistemológica para os processos
de alfabetização e educação popular.
O paradigma da educação popular, inspirado originalmente no trabalho de
Paulo Freire nos anos 1960, encontrava na conscientização sua categoria fundamental.
A prática e a reflexão sobre a prática levou a incorporar outra categoria não menos
importante: a da organização. Afinal, não basta estar consciente, é preciso organizar-se
para poder transformar.
Esses diversos grupos foram se articulando e passaram a pressionar o
governo federal para que os apoiasse e estabelecesse uma coordenação nacional das
iniciativas. No início de 1964 o governo federal institui, no Ministério da Educação e

39
Cultura, o Programa Nacional de Alfabetização (PNA). Mediante a utilização do
referencial de alfabetização de Paulo Freire, pretendia-se alfabetizar em torno de cinco
milhões de brasileiros, tendo o próprio Paulo Freire sido convidado para coordenar o
Programa. Contudo, logo em seguida, com o golpe civil-militar, o Programa foi extinto,
sob a alegação de ser de teor subversivo. Também as outras experiências de educação
popular, que vinham sendo desenvolvidas desde 1960, foram objeto de crítica dos
defensores da ordem político-social instalada, e quase todas foram sufocadas,
reprimidas com o regime político de Ditadura Civil-Militar.
O único grande movimento a sobreviver foi o Movimento de Educação de
Base (MEB), sob o custo da ruptura com os compromissos da educação de classe que
vinha desenvolvendo e da revisão dos seus pressupostos teóricos e metodológicos, além
da sua mudança geográfica (deslocamento do Nordeste para a Amazônia).
Paralelamente, multiplicam-se os movimentos de desenvolvimento comunitário e os
programas de extensão universitária dedicados à educação dos adultos (PAIVA, 1987),
agora ancorados em um projeto político-ideológico completamente distinto do proposto
no período anterior.
É interessante destacar a forma como o MEB se metamorfoseou para
continuar com o apoio oficial e, assim, garantir sua inclusão, em 1970, no PNA. Nessa
mudança de orientação, substituiu-se o seu papel de agente transformador pelo de
evangelizador:

A mudança de orientação observou-se imediatamente no nível
didático. Viver é lutar era substituído pelo Mutirão, passando o MEB
da ênfase sobre a conscientização para a ênfase sobre a ajuda mútua.
Segundo Emmanuel Kant, a politização era substituída pela
cristianização. (LEAL, 1985, p. 30)

Com o Golpe de 1964, há um profundo corte no processo de ampliação da
participação na esfera pública. O Estado, ao mesmo tempo em que atua com base numa
política econômica fortemente modernizadora, mantém e aprofunda as disparidades
regionais e a desigual distribuição de renda. Com respeito à educação, as ações públicas,
de uma forma geral, incluíram as estratégias de obtenção de consenso passivo e de
adaptabilidade às relações de produção. Assim, a Ditadura tentou, pela via educacional,
integrar parcelas da força de trabalho ao projeto de modernização, incorporando-as à
proposta educacional do capital: "Eis o sentido econômico e político-social do binômio

40
educação/desenvolvimento que perpassou todo o discurso e as práticas educacionais dos
governos pós-64" (NEVES, 1997, p. 49).
Sob a denominação de ‘educação popular’, entretanto, diversas práticas
educativas de reconstituição e reafirmação dos interesses populares inspiradas pelo
mesmo ideário das experiências anteriores persistiram sendo desenvolvidas de modo
disperso e quase que clandestino no campo da sociedade civil. Algumas delas tiveram
vida curta; outras resistiram pari passu às experiências que concebiam a educação como
instrumento para a formação de recursos humanos, dentro dos padrões de exigência do
modelo de industrialização adotado, durante o período autoritário.
1.5 Educação de Adultos em Tempos Autoritários
O Golpe Militar de 1964 caracteriza o início de um período de intensa
perseguição e repressão política aos movimentos populares de educação de adultos. De
1964 até meados de 1980, as experiências no âmbito dos movimentos sociais são
proibidas e substituídas por iniciativas centralizadas pelo governo federal. Materiais são
apreendidos e, num primeiro momento, o governo autoritário substituiu o PNA pela
Cruzada da Ação Básica Cristã (Cruzada ABC)19. Depois implementou, com muito
mais amplitude e raio de ação, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL); o
Ensino Supletivo cresceu e ganhou legitimidade. O tecnicismo e o economicismo na
educação serão as marcas das experiências no período.
Com a repressão dos programas de educação popular anteriores ao Golpe
Militar, este segmento permaneceu praticamente relegado a um segundo plano. Somente
no final de 1966, segundo Fernandes (2002), o governo retoma a esta questão através da
Cruzada ABC que, em função de dificuldades de ordem financeira, foi extinta em 1971.
A

Cruzada

pretendia

desenvolver,

a

partir

de

uma

concepção

assistencialista, programas de alfabetização, educação continuada, comunitária e
orientação profissional. Sua prática acabou por significar a distribuição de alimentos,
com a função de assegurar a atividade voluntária de professores e membros da
comunidade bem como manter elevada a freqüência integral às atividades escolares
(PAIVA, 1998). Nesse contexto reaparece a visão do analfabeto como “mancha negra”

19

Definindo-se ideologicamente a favor da ordem social, a Cruzada ABC foi organizada como um
programa de impacto norte-americano, financiado com verbas dos acordos MEC-USAID. Seus trabalhos
tiveram início no Recife-PE, em seguida, atingiram os Estados do Nordeste, o Rio de Janeiro e a
Guanabara.

41
a ser exterminada. “A concepção das Cruzadas era a de que o analfabeto seria um
incapaz de participar ativamente do meio social, econômico e político [...] um parasita
econômico que impedia o desenvolvimento do país”. (FERNANDES, 2002, p. 36).
Os militares tomaram o poder com o discurso de que construiriam um
grande país. Ao interromper os programas educacionais existentes, os índices de
analfabetismo poderiam se elevar, o que não seria visto com bons olhos pela
comunidade nacional e internacional. Para responder às críticas de que é dever do
Estado proporcionar escolarização aos jovens e adultos, o governo militar criou, em
1967, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) como um programa de
proporções nacionais, proclamadamente voltado a oferecer alfabetização a amplas
parcelas dos adultos analfabetos nas mais variadas localidades do país.
Tal Programa, diferentemente do que ocorreu na Campanha de 1947,
recebeu um volume significativo de investimento do governo federal20 a fim de que
funcionasse em âmbito nacional e de forma autônoma em relação às secretarias
estaduais e ao próprio Ministério da Educação. A execução das atividades e o controle
centralizado da orientação, supervisão pedagógica e produção de materiais didáticos,
ficaram sob a responsabilidade das comissões municipais instaladas pelo MOBRAL por
todo o país.
Concebido como iniciativa sazonal que se extinguiria depois de resolvido o
problema do analfabetismo, o MOBRAL possuía baixa articulação com o sistema de
ensino básico. Não obstante, sua presença maciça no país e sua capilaridade,
favoreceram a legitimação da nova ordem política implantada em 1964. De acordo com
Di Pierro et al (2001, s.n)
Além da legitimação interna, esta iniciativa governamental também
visava responder a orientações emanadas de agências internacionais
ligadas à Organização das Nações Unidas, em especial a UNESCO,
que desde o final da Segunda Guerra vinham propugnado o valor do
combate ao analfabetismo e da universalização de uma educação
elementar
comum
como
estratégia
de
desenvolvimento
socioeconômico e manutenção da paz.

Na verdade, embora o MOBRAL tenha mobilizado a sociedade, através de
intensa campanha publicitária, em prol da “erradicação do analfabetismo” –

20

O governo federal facultou aos empresários a destinação para o MOBRAL de 1% do imposto devido
pelas empresas; além disso, o MOBRAL contou com recursos na ordem de 24% da renda líquida da
Loteria Esportiva (HADDAD e DI PIERRO, 2000).

42
preconizando a integração de pessoas, classes sociais, entidades públicas e privadas em
torno de objetivos comuns – sua preocupação central era que o indivíduo fosse
alfabetizado para facilmente receber as informações e desempenhar adequadamente seu
papel na sociedade e no desenvolvimento do país. Desse modo, pretendia,
implicitamente, atingir objetivos não só de natureza econômica, mas, principalmente
ideológica e política.
Verifica-se, de imediato, a diferença entre as concepções de alfabetização do
MOBRAL e a proposta teórico-metodológica de Paulo Freire, pois, enquanto o
educador concebia a educação de adultos como um ato de recriação de significados e
“como prática da liberdade", o MOBRAL propunha intrinsecamente o condicionamento
do indivíduo para a manutenção do status quo (BELLO, 1993).
Apesar disso, buscou assemelhar-se às concepções freireanas na técnica e na
forma do material didático, embora esvaziados de sua visão problematizadora, conforme
esclarece Feitag (1986, p. 93): “Podemos dizer que o método foi refuncionalizado como
prática, não de liberdade, mas de integração ao Modelo Brasileiro ao nível das três
instâncias: infra-estrutura, sociedade política e sociedade civil”.
Uma análise comparativa das concepções de educação de adultos em Paulo
Freire e a do período da Ditadura Militar pode ser observada nos estudos de MOURA
(2004). A autora explicita que desde as primeiras reflexões e produções teóricas de
Freire sobre a alfabetização de adultos, são descartadas qualquer possibilidade de
concebê-la como uma ação puramente mecânica e, citando Freire (1969), apresenta o
conceito de alfabetização de adultos, compreendido como
[...] a alfabetização do homem brasileiro, em posição de tomada de
consciência, na emersão que fizera no processo de nossa realidade.
Num trabalho com que tentássemos a promoção da ingenuidade em
criticidade, ao mesmo tempo que alfabetizássemos [...] Pensávamos
numa alfabetização direta e realmente ligada à democratização da
cultura, que fosse uma introdução a esta democratização [...] numa
alfabetização que fosse em si um ato de criação, capaz de desencadear
outros atos criadores. Numa alfabetização em que o homem, porque
não fosse seu paciente, seu objeto, desenvolvesse a impaciência, a
vivacidade, características dos estados de procura, de invenção e
reivindicação (idem, p. 57).

Por sua vez, o MOBRAL concebe a alfabetização de adultos como
[...] um processo global e integrado, de formação técnica e
profissional do adulto – em sua forma inicial – feito em função da
vida e das necessidades do trabalho; um processo educativo

43
diversificado, que tem por objetivo converter os alfabetizados em
elementos [...] ativos e eficazes na produção e no desenvolvimento em
geral. Do ponto de vista econômico, a alfabetização funcional tende a
dar aos adultos iletrados os recursos pessoais apropriados para
trabalhar, produzir e consumir mais e melhor. Do ponto de vista
social, a facilitar-lhe sua passagem de uma cultura oral a uma cultura
escrita [...] (BEISIEGEL, 1974, apud MOURA, 2004, p. 30 – 31).

Assim, as práticas de alfabetização do MOBRAL constituíram-se em
estratégia de despolitização, de suavização das tensões sociais e como instrumento
fundamental de preparação de mão-de-obra para colaborar com os mecanismos de
desenvolvimento econômico.
Desta forma, a conceituação de alfabetização de adultos e a definição
de seus objetivos são fundamentadas em concepções filosóficas
positivistas de caráter pragmático – características dos modelos
econômicos liberal e neo-liberal; concepções psicológicas empiristasassociacionistas que consideram o adulto analfabeto como um ser
inferior do ponto de vista das capacidades superiores de inteligência; e
uma visão antropológica de um indivíduo pobre culturalmente
(MOURA, 2004, p. 31).

O MOBRAL oferecia à população a alfabetização e um programa que
correspondia a uma condensação do antigo curso primário. “Buscava-se instituir um
movimento permanente de alfabetização e semiprofissionalização de adolescentes e
adultos, durável enquanto persistissem as elevadas taxas de analfabetismo observadas
no país” (BEISIEGEL, 1982, p. 174). Mas não se restringia a isso, ampliava-se e
diversificava-se o campo de atuação, o que pôde ser percebido pelos seus vários
programas, lançados na média de um por ano, na década de 1970, os quais iam desde o
Programa de Alfabetização Funcional até o Programa de Atendimento Pré-Escolar,
passando pelo Programa de Profissionalização e pelo Programa de Educação
Comunitária para o Trabalho. Entretanto, apesar de toda essa estrutura, o MOBRAL não
obteve resultados satisfatórios. “O desacerto técnico era, porém, a condição para aquilo
que os representantes do regime viam como um acerto político” (PAIVA, 1981, p. 86).
Ao analisar o papel político do MOBRAL, a autora afirma que a
compreensão dessa nova campanha deve ser buscada não apenas nas idéias que
conectam educação e desenvolvimento econômico, mas também na sua utilização como
instrumento de controle ideológico das massas:

44
Na concreta situação política do período, quando ainda se acreditava
que o campo apresentava grandes riscos políticos e crescente tensão: a
campanha alfabetizadora servia ai como ponta de lança para o controle
político das massas, especialmente no interior, estendendo a todos os
municípios brasileiros tentáculos capazes de perceber rapidamente não
apenas as tensões sociais, mas também eventuais mobilizações de
natureza política num período em que ainda vicejavam, bem ou mal
movimentos guerrilheiros no campo. (PAIVA, 1990, p. 11)

Apesar do discurso inovador preconizado pelos gestores do Estado militar, o
MOBRAL foi muito criticado por vários motivos que foram determinantes para o seu
fim. Há que se destacar “o pouco tempo destinado à alfabetização, os critérios de
verificação de aprendizagem” (HADDAD e DI PIERRO, 2000, p. 116), “os números
que apresentavam como resultado e a insuficiência do domínio rudimentar da escrita
que era capaz de promover” (DI PIERRO; JOIA; RIBEIRO, 2001, p. 61), além da
padronização da metodologia utilizada em todo o território nacional, não considerando
as especificidades regionais. Outro complicador era o despreparo dos alfabetizadores.
Assim como ocorre nos programas atuais, na época do MOBRAL, havia em algumas
regiões pessoas na condição de alfabetizador que não ultrapassavam um conhecimento
rudimentar do código escrito.
Nessa conjuntura, desacreditado nos meios políticos e educacionais, o
MOBRAL foi extinto em 1985, quando o processo de abertura política já estava
relativamente avançado. O montante de recursos de que dispunha já havia diminuído
muito e o que restava de sua estrutura foi assimilado pela então criada Fundação
Nacional para Educação de Jovens e Adultos (Fundação EDUCAR), que passou a
apoiar técnica e financeiramente iniciativas de governos estaduais e municipais e
entidades civis, abrindo mão do controle político pedagógico que caracterizara até então
a ação do MOBRAL.

Nesse período, muitos programas governamentais acolheram
educadores ligados a experiências de educação popular, possibilitando
a confluência do ideário da educação popular até então desenvolvido
prioritariamente em experiências de educação não formal com a
promoção da escolarização de jovens e adultos por meio de programas
mais extensivos de educação básica (DI PIERRO, 2001, p. 63).

Para tanto, um novo enquadramento legal já estava disponível com a
promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5692 de 1971 (LDB
5692/71), que consagrara a extensão da educação básica obrigatória de 4 para 8 anos

45
constituindo o então denominado ensino de primeiro grau e, concomitantemente, dispôs
as regras básicas para o provimento de educação supletiva que corresponde a esse grau
de ensino aos jovens e adultos. Segundo Haddad e Di Pierro (2000, p.117) com a
regulamentação do Ensino Supletivo “se propunha a recuperar o atraso, reciclar o
presente, formando uma mão-de-obra que contribuísse no esforço para o
desenvolvimento nacional, através de um novo modelo de escola”.
Como forma de cumprir seus objetivos, o Ensino Supletivo foi organizado
em quatro funções: suplência (objetivava suprir a escolarização regular para
adolescentes e adultos que não tenham seguido ou concluído na idade própria);
suprimento (objetivava proporcionar estudos de aperfeiçoamento ou atualização para os
que tenham seguido o ensino regular no todo ou em parte); aprendizagem (objetivava
proporcionar formação metódica no trabalho) e qualificação (objetivava formar
recursos humanos para o trabalho).
Sobre a formação de professores para atuar no Ensino Supletivo, o artigo 32
da LDB 5692/71, diz que “o pessoal docente do ensino supletivo terá preparo adequado
às características especiais desse tipo de ensino, de acordo com as normas estabelecidas
pelo Conselho de Educação”. Apesar do artigo demonstrar preocupação com a
qualificação dos professores para atuar nessa modalidade de ensino, os professores que
do Ensino Supletivo eram identificados como professores leigos, pois não tinham
formação em magistério.
Di Pierro, Jóia e Ribeiro (2001, p. 62) observavam que com a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação 5692/71 “pela primeira vez, a educação voltada para
este segmento mereceu um capítulo específico na legislação educacional”. Com ela,
forma garantidos aos adultos material didático em módulos e sessões de estudos para as
quais a freqüência é livre, além da manutenção dos exames supletivos, como
mecanismo de certificação. Porém, “o direito mais amplo à educação básica, só seria
estendido aos jovens e adultos na Constituição Federal de 1988”.

1.6 EJA na Nova República

Com o processo de abertura democrática no país, na primeira metade dos
anos 80, são postos no cenário nacional os debates em torno das grandes questões
sociais, dentre elas, a educação pública, de boa qualidade e universalizada para todos.

46
A partir de 1985, o Governo Federal rompe com a política de educação de
adultos do período militar extinguindo o MOBRAL e criando a Fundação EDUCAR.
No início, a Fundação EDUCAR apoiou técnica e financeiramente algumas iniciativas
de educação de jovens e adultos conduzidas por prefeituras municipais e instituições da
sociedade civil.
Em 1986, o Ministério da Educação organizou uma comissão de elaboração
de Diretrizes Curriculares Político-Pedagógicas da Fundação EDUCAR, a qual
reivindicou do Estado a oferta pública, gratuita e de boa qualidade do ensino de 1º Grau
aos jovens e adultos, dotando-se de identidade própria.
Nesse período, teve início o processo de descentralização dos recursos e do
poder decisório até então concentrados no MEC em torno das políticas educacionais.
Emergem, neste processo, duas organizações fundamentais: o Conselho de Secretários
de Educação (CONSED) e a União dos Dirigentes Municipais da Educação (UNDIME).
Estas organizações criaram vários Fóruns, todos com a finalidade de pôr em prática as
diretrizes de uma política educacional que não saía do papel. Outrossim, vislumbra-se
neste período, a emergência de ofertas de educação de jovens e adultos pelos próprios
estados e municípios que passam a assumir, com seus orçamentos próprios, a demanda
de alfabetização e escolarização deste público.
Problemas sociais e péssima qualidade das escolas fundamentais continuam
alimentando os altos índices de analfabetismo.
A busca da ampliação do atendimento à escolarização da população jovem e
adulta pelos sistemas estaduais se vincula às conquistas legais referendadas pela
Constituição Federal de 1988. Nesta Constituição, a EJA passa a ser reconhecida
enquanto modalidade específica no conjunto das políticas educacionais brasileiras,
estabelecendo-se o direito à educação gratuita para todos os indivíduos, inclusive aos
que a ela não tiveram acesso na “idade própria”.
Entretanto, ainda hoje, quando se analisam os currículos dos programas de
EJA, o que se constata é uma grande homogeneidade na reprodução dos conteúdos do
ensino regular, sua organização nas disciplinas e seqüenciação. São poucas as
experiências que inovam nesse sentido, experimentando novos eixos curriculares e
novas formas de organizar os tempos e espaços de aprendizagem.
Vale mencionar que, com o fim da Fundação EDUCAR no ano de 1990 –
ano que a UNESCO institui como o Ano Internacional da Alfabetização – o Governo

47
Federal omite-se do cenário de financiamento para a EJA, ocorrendo o encerramento
dos programas de alfabetização até então existentes.
Neste mesmo ano, realiza-se em Jomtien, Tailândia, a Conferência Mundial
de Educação para Todos, explicitando a dramática realidade mundial de analfabetismo
de pessoas jovens e adultas, bem como dos dramáticos índices do reduzido tempo de
escolarização básica e da evasão escolar de crianças e adolescentes. Na Declaração de
Jomtien, elaborada nesta Conferência, a educação de adultos é incluída no conceito de
educação básica e é recomendada aos países participantes a elaboração de um plano
decenal de educação a ser realizado na década de 1990. Segundo Di Pierro, Joia e
Ribeiro (2001, p. 68), “Esta declaração deu destaque à redução de taxas de
analfabetismo, além da expansão dos serviços de educação básica e capacitação aos
jovens e adultos, com avaliação sobre seus impactos sociais”.
No ano de 1991 (Governo Collor), foi lançado o Plano Nacional de
Alfabetização e Cidadania (PNAC), como uma primeira tentativa de priorização da
alfabetização de adultos. Porém, ele acabou morrendo antes mesmo de seu nascimento,
por falta de apoio político e financeiro, pois o Ministro da Educação, professor José
Goldemberg e outras personalidades influentes declararam publicamente opor-se a que
os governos investissem na educação de adultos (BRZEZINSKI, 1997).
Com o impeachment de Fernando Collor, assume o novo presidente, Itamar
Franco e o Ministro da Educação, Murilo Hingel, que desencadeara o processo de
elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003), envolvendo setores
governamentais, entidades e sindicatos de educação, tendo como meta o atendimento de
8,3 milhões de jovens e adultos (2,7 milhões de analfabetos e 4,6 milhões de
subescolarizados) (BRASIL/MEC, 1994).
A aparente boa vontade em relação à EJA manteve-se por pouco tempo,
uma vez que o próximo Presidente da República eleito, Fernando Henrique Cardoso, ao
adotar políticas neoliberais, colocou o Plano Decenal de lado e reduziu os recursos. A
EJA passou a ser uma política à margem, desqualificando a educação de adultos por
meio de uma sutil alteração no inciso do artigo 208 da Constituição, no qual o governo
manteve a gratuidade da educação básica de jovens e adultos, mas suprimiu a
obrigatoriedade de o poder público oferecê-la, restringindo o direito público subjetivo21

21

Direito público subjetivo é aquele pelo qual o titular de um direito pode exigir imediatamente o
cumprimento de um dever e de uma obrigação. Trata-se de um direito positivado, constitucionalizado e
dotado de efetividade.

48
de acesso ao ensino fundamental apenas à escola regular (BRZEZINSKI, 1997),
reforçando, assim, a afirmação de Lima (1979, p.35), segundo a qual “O ‘sistema’
educacional nunca foi destinado ao povo, ao longo de nossa história”.
Desse modo, acreditamos que a conquista e a definição da modalidade de
EJA como política pública de acesso e continuidade à escolarização básica, ainda não se
concretizou em sua plenitude. Essa conquista vem sendo adquirida aos poucos e por
pressões externas, em função de acordos que o Brasil assinou após a abertura
democrática.
No ano de 1996 é promulgada a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei 9394/96, na qual a EJA passa a ser considerada uma modalidade da
educação básica, de caráter permanente, nas etapas do ensino fundamental e médio.
Continuando a relatar o descaso político com a EJA, é importante ressaltar a
aprovação da Emenda Constitucional número 14 (quatorze) que suprime a
obrigatoriedade do poder público em oferecer o Ensino Fundamental para os que a ele
não tiveram acesso antes da vida adulta; suprime o compromisso de eliminar o
analfabetismo no prazo de dez anos, bem como a vinculação dos percentuais de recursos
financeiros estabelecidos em lei para este fim. Com esta Emenda, cria-se o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (FUNDEF), regulamentado pela Lei 9424/96, na qual é vetada a
contabilização das matrículas de Ensino Fundamental nos cursos de Educação de Jovens
e Adultos, para fins de repasse de recursos. Este veto inviabilizou a inclusão da
demanda de EJA no financiamento da educação básica, evidenciando, mais uma vez, o
descaso para o atendimento desta demanda.
A segunda metade da década de 1990 apresentou um processo de
articulação de diversos segmentos sociais, buscando debater e propor políticas públicas
para a EJA em nível nacional. Provocados pelas discussões preparatórias e posteriores à
V Conferência Internacional de Educação de Adultos (CONFINTEA), realizada em
julho de 1997, em Hamburgo, Alemanha, estes vários segmentos iniciam sua
articulação por meio da constituição de Fóruns Estaduais de EJA, num crescente e
importante movimento cuja culminância vem ocorrendo em Encontros Nacionais de
EJA (ENEJAS), desde o ano de 1999.
Dez anos após a assinatura da Declaração Mundial de Educação para todos
(1990), em Dacar, Senegal, um balanço das metas estabelecidas em Jomtien revelou
que, na maioria dos países em desenvolvimento, a meta de educação básica fora

49
reduzida à educação primária para todos que, proposta como piso mínimo, tornou-se
teto máximo. Ao mesmo tempo, a promessa de educação para todos se reduziu à
educação para todas as crianças e adolescentes, excluindo ou dando atenção marginal
para a educação e aprendizagem de adultos (UNESCO, 2004).
É neste contexto que foram aprovadas em 19/05/2000, as Diretrizes
Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos (DNEJA), pelo Governo Federal,
elaboradas pelo Conselho Nacional de Educação, através da Câmara de Educação
Básica (Parecer CEB nº 11/2000). Este “[...] documento ressalta a EJA como direito,
deslocando a idéia de compensação e substituindo-a pelas de reparação e eqüidade”
(PAULO AFONSO/SEMED, 2005, p.19).
Os documentos produzidos em âmbito nacional e internacional representam
o esforço de uma ação orquestrada com os setores e países signatários, em busca da
educação como direito ao longo da vida. Para isto, a Declaração de Hamburgo continua
sendo o eixo fundamental que antecede e norteia os demais documentos, apontando na
seqüência a agenda de compromissos que não podem ser encarados como acordos
burocráticos ou mais uma lista de boas intenções. Ao contrário, o que se revela na
estratégia de continuidade da V CONFINTEA, é uma proposta de acompanhamento e
busca de efetividade nas ações assumidas pelos governos.

1.7 Dialogando com Referenciais Teóricos no Campo da EJA
As discussões sobre a EJA transcorridas neste trabalho alertam para a
necessidade de superar uma concepção aligeirada e submetida à lógica das estruturas
econômica e de mercado que mantém o caráter descontínuo, irregular, fragmentado e
compensatório para essa modalidade. Analisando brevemente o histórico da política
para EJA no Brasil, percebe-se que a Conferência Mundial de Educação para Todos
(Jomtien, 1990), a V Conferência Internacional de Educação de Adultos (Hamburgo,
1997) e o Parecer CEB n.º 11/200022 se apresentam como alguns dos principais marcos
de mudança de paradigma e definição das diretrizes e metas educativas adotadas pelo
Brasil para referendar as políticas de EJA.

22

A apreciação do Parecer CNE/CEB 11/2000, embora constitua documento produzido num período (ano
de 2000) que extrapola o recorte temporal desta pesquisa (décadas de 1940 a 1990), é uma opção
consciente e coerente, por ser o principal documento que regulamenta e normatiza a EJA no Brasil.

50
No Brasil foi a partir da Constituição Federal de 1988, como afirma Cury
(1992, p. 34), “[...] que a educação será privilegiada com um capítulo próprio, além de
várias referências em outros capítulos [...] Ela enfatiza a relação dever do Estado e
direito do cidadão”. Entre nós, a EJA como direito está expressa no artigo 3º e, como
dever, no artigo 4º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996.
A partir destes marcos, a EJA passa a ser vista numa perspectiva de
educação ao longo da vida, superando as idéias de suprimento e de educação
compensatória, ganhando reconhecimento como modalidade de ensino e como direito.
Ao inserir neste estudo um diálogo com tais referenciais no contexto da EJA, buscamos
refletir sobre o processo que tanto o Estado quanto os sujeitos sociais sobretudo os
professores de EJA, devem percorrer quando da definição de prioridades para as ações
políticas e atividades educativas.

1.7.1. Direito de Todos à Educação
Na Constituição Federal de 1988 e nas Leis Complementares, a garantia do
ensino fundamental público e gratuito à população jovem e adulta é dever do Estado e
direito público subjetivo dos cidadãos, independente de idade, gênero, etnia, condição
socioeconômica, convicção religiosa, política e cultural. Também é dever do Estado
ampliar significativamente o atendimento à demanda por EJA sob formas diversas e
flexíveis, assegurando a continuidade de estudos e eliminando simultaneamente os
problemas de evasão e repetência, até que sejam alcançadas as metas de superação do
analfabetismo e universalização do ensino fundamental. Ainda, de acordo com a
Constituição, é indispensável que se cumpra o que estabelece o artigo 208, ou seja, o
reconhecimento da EJA como educação básica, o que exige políticas e ações que
assegurem a participação na gestão democrática das unidades escolares, o acesso aos
recursos financeiros e físicos adequados, aos programas complementares de merenda e
livro didático, saúde e transporte escolar, esporte e lazer, etc. Sendo assim, a política
nacional de educação de jovens e adultos deve, primordialmente, garantir o direito
constitucional ao ensino fundamental através da oferta pública de boa qualidade e
gratuita de escolarização para todos os jovens e adultos que a ela não tiveram acesso ou
não concluíram esse nível de ensino, levando em conta a especificidade do contexto em
que se desenvolvem, respeitando as identidades sociais e étnico-raciais.
Para Soares (2001, p. 203),

51

A Constituição de 1988 representou algumas conquistas legais para o
campo das políticas públicas, entre as quais a educação. O Estado
passou a ter o dever de garantir a educação para todos àqueles que a
ela não tiveram acesso, independentemente da faixa etária.

A proposta constitucional reconhece as distorções na oferta de
oportunidades educacionais à população. Na visão de Haddad (2000, p.112) a
Constituição de 1988
[...] destinou 50% dos recursos para fazer frente ao analfabetismo e
universalizar o ensino fundamental, estabelecendo, para isto, um prazo
de dez anos. Apesar das dificuldades e do grande esforço necessário
para cumprir tal meta, a legislação firmou uma intencionalidade
política, estabeleceu uma meta, reconhecendo a necessidade de se
instalar no plano dos direitos um caminho para superar uma injustiça
no plano social.

Por sua vez, Di Pierro (2003) adverte que embora a Constituição assegure o
ensino fundamental público e gratuito em qualquer idade, a oferta de serviços de
escolarização de jovens e adultos é reduzida, situando-se em patamares muito inferiores
à demanda potencial.
A Constituição de 1988, trazendo de volta à história brasileira a conquista
da educação para todos como direito, passa, em tese, a incluir o largo contingente de
analfabetos e analfabetos funcionais jovens e adultos que o país produzira, mesmo
convivendo com sucessivas propostas alfabetizadoras, expressões até mesmo de
políticas públicas, ampliando- se para a perspectiva de direito público subjetivo.
Segundo Bobbio (1992), o problema mais grave na atualidade, em relação à
conquista de direitos, não é o de sua fundamentação, mas de como protegê-los. Para a
população que luta por direito à educação, é clara a idéia de que a luta é cotidiana, que
se luta hoje para conquistar amanhã, mas que se não houver vigilância, o direito pode se
perder, e então é preciso voltar a lutar. A luta cansa, mas também ensina, e esta é, pois,
uma grande aprendizagem da luta. (SPOSITO, 1993; PAIVA, 2000).
Nas lutas travadas pela educação durante os trabalhos da Constituinte, o
Fórum Nacional da Educação na Constituinte em Defesa da Escola Pública significou
uma forma de participação democrática inédita, que se prorrogou, como movimento,
durante os trabalhos de discussão até a aprovação da LDB e se perpetuou até os dias

52
atuais, passando pelo Plano Nacional de Educação e, atualmente, pelo Fundo Nacional
para o Desenvolvimento da Educação Básica – FUNDEB.
Cury, Baia Horta, Fávero (2001, p. 26) ainda ressaltam:
O grau de participação da sociedade civil na elaboração da
Constituição de 1988 traduziu esta concepção ascendente e, talvez
por isso, ela seja reinventora de novos direitos sociais, aí
compreendida a própria educação. Ela incluiu novos direitos a fim de
possibilitar uma situação de maior participação para aqueles que
foram historicamente excluídos do acesso aos bens sociais.

Afirmando que um dos passos da proteção ao direito à educação se dá
quando ela é definida como direito público subjetivo, Baia Horta (1998) diz ainda que
embora venha sendo defendido desde 1930 por juristas, só em 1988 foi proclamado. O
que se entende por direito público subjetivo é o poder de ação de uma pessoa para
proteger ou defender um bem inalienável, e ao mesmo tempo legalmente constituído, e
os dispositivos jurídicos desse poder traduzem-se pela ação popular, ação civil pública,
mandato de segurança coletivo e mandato de injunção — todos previstos e
regulamentados pela Constituição Federal de 1988 (PAIVA, s.d, s.n).
Todos os esforços realizados ao longo da história da educação de adultos no
país, no sentido de assegurar a educação aos que não usufruíram da chamada escola
regular quando crianças não conseguiram alcançar a universalização do atendimento,
nem sequer o êxito na tarefa, ou seja, fazer ler e escrever com competência os que se
encontram à margem do domínio do código. Campanhas, instituições, políticas
funcionaram em sua maioria na mesma perspectiva do estigma, do alívio ao
analfabetismo, poucas vezes pela razão do direito de iguais. A ferida, a chaga;
erradicação, extirpar o mal, mancha negra, vergonha nacional são muitas das expressões
que acompanham não apenas o imaginário social, mas estão postas em planos,
legislações, cartas magnas, até mesmo em trabalhos acadêmicos da área.
Quanto à questão do direito, Paiva (2005, p. 182) faz uma análise adicional,
argumentando que
A alfabetização, tomada como oferta de atendimento para jovens e
adultos, em muitas campanhas e programas no Brasil, foi a medida do
que se entendia como educação de adultos. Em alguns casos, estendiase essa medida até o nível das quatro primeiras séries, oferecidas em
tempos e com conteúdos reduzidos, no que se chamou de pósalfabetização. Sob a guarda da atual Constituição, no entanto, que
expressa o dever do Estado com a educação em nível de ensino

53
fundamental, qualquer proposta menor do que a correspondência a
este nível de ensino não cumpre o preceito da Carta Magna. Assim,
defender projetos de alfabetização, ou o objetivo de alfabetizar não dá
conta do compromisso e do dever que o Estado brasileiro precisa ter
com a EJA.

A Constituição Federal de 1988, postulando o direito ao ensino fundamental
para todos, independente da idade, por meio do art. 208 inciso I, representara um
avanço. Na prática, no entanto, começava a ser negado. Alterado o Art. 208, pela
Emenda Constitucional nº. 14/96, propugnou-se, a partir de então, que o ensino
fundamental fosse uma possibilidade para jovens e adultos, e não mais obrigatoriedade,
por se entender que não se pode obrigar adultos e jovens além dos 14 anos a irem à
escola, se não o fizeram na chamada idade própria.
Di Pierro (2000) questiona esta expressão “idade própria”, perguntando-se o
que significa, diante dos marcos epistemológicos que sustentam o aprender por toda a
vida. Se por um lado pode parecer razoável que o legislador tenha tido este cuidado,
para não criar um preceito não exeqüível na prática, por outro pode estar em jogo o fato
de a nova redação sustentar mais uma forma de desresponsabilização do Estado em
relação à oferta da EJA, criando, sem explicitação, prioridade para a tal “idade própria”.
O que se coloca em risco, talvez mais do que em jogo, é a perspectiva de esgarçar o
ainda frágil direito, que muito embora tenha sido conquistado constitucionalmente,
passa a adotar uma formulação ambígua, capaz de admitir o não-dever do Estado com o
direito, e outras possíveis interpretações dele decorrentes.
Pautada na Constituição Federal, a LDB nº. 9.394/1996, por sua vez,
confirmou a conquista do direito dos jovens e adultos à educação pública gratuita e
dedicou os artigos 37 e 38 exclusivamente à EJA nos seguintes termos:
Art. 37 A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não
tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e
médio na idade própria.
§ 1º - Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e
adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular,
oportunidades
educacionais
apropriadas,
consideradas
as
características do alunado, seus interesses, condições de vida e de
trabalho, mediante cursos e exames.
§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a
permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e
complementares entre si.
Art. 38 Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos,
que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando
ao prosseguimento de estudos em caráter regular.

54
§ 1º - Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:
I – no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de
quinze anos;
II – no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de
dezoito anos.
§ 2º - Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por
meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames.

Além dos artigos mencionados, a LDB de 1996, regulamenta, ainda, a
modalidade de EJA incorporada às determinações que definem a garantia de acesso e
permanência do estudante e a organização e estrutura do ensino básico. Refere-se à
educação vinculada ao mundo do trabalho, garantia de oportunidades de acesso e
permanência do aluno trabalhador na escola, oferta de ensino noturno, flexibilidade na
organização dos cursos, ensino a distância, possibilidade de aproveitamento de estudos
e valorização da experiência extracurricular.
Sobre o currículo a ser trabalhado na EJA o artigo 26 da LDB em vigor,
assim determina:
Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base
nacional comum a ser complementada em cada sistema de ensino e
estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas
características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia
e da clientela.

Com relação à temática do currículo na EJA, o IV Encontro Nacional de
Educação de Jovens e Adultos (ENEJA)23 apresenta a seguinte posição:
Tem-se um novo olhar sobre esses sujeitos. A preocupação não é
apenas com a trajetória escolar, mas principalmente com as trajetórias
pessoais e humanas, como homens, como mulheres, indígenas, negros
e negras, do trabalho, da construção social (Relatório-Síntese, 2002, p.
2).

Desse modo, ficou evidenciada a necessidade de que o atendimento
curricular para jovens e adultos contemple o estabelecimento de relações com o mundo
do trabalho, com os saberes produzidos nas práticas sociais e cotidianas e o
envolvimento de todos com esse mundo e seus saberes formais, seja como
trabalhadores, empregados ou desempregados. É imprescindível que os currículos, a
23

O ENEJA, realizado anualmente desde 1999, é uma reunião dos fóruns estaduais de EJA, sediado e
coordenado, a cada ano, pelo Fórum de um dos estados brasileiros. O IV ENEJA realizou-se no ano de
2002, em Minas Gerais, com o tema “EJA: cenários em mudança”.

55
organização dos tempos e espaços educativos, a formação dos educadores e os materiais
didáticos considerem adequadamente as condições singulares de vida e trabalho de
homens e mulheres, de jovens e idosos, bem como a pluralidade étnica e cultural que
caracteriza a população brasileira.
Conforme já apontamos, a LDB 9.9394/96 destaca a importância de que
sejam asseguradas “oportunidades educacionais apropriadas, considerando as
características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante
cursos e exames” (Art. 37, § 1). Sendo uma modalidade da educação básica, a EJA
deverá obedecer aos componentes curriculares e às diretrizes curriculares nacionais para
o ensino fundamental e médio apresentadas nos artigos 26, 27, 28, 32 e 36 da LDB.
Entretanto, cabe nesse momento questionar se o que está proclamado na
LDB é realmente cumprido pelas escolas e pelas secretarias de educação. A questão
levantada decorre da nossa inserção nesse contexto, ao percebemos propostas de
atividades e estratégias didáticas sendo desenvolvidas a partir de uma visão
“inferiorizada” de aluno, que insiste em identificá-los como “coitadinhos”. Sem o
devido conhecimento das potencialidades do aluno e do trabalho na EJA, os professores
freqüentemente ressaltam supostas incapacidades de aprendizagem e interesse,
justificadas pelo argumentando de que a presença desses alunos nessa modalidade de
ensino seria apenas para aprender a ler e receber a certificação da escola com vistas ao
mercado de trabalho.
1.7.2 Reafirmando o Direito à Educação
O Parecer CNE/CEB 11/2000 – relatado por Carlos Roberto Jamil Cury e
homologado pelo Ministro da Educação em 07 de julho de 2000 – instituiu as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a EJA. A Resolução CNE/CEB 1/2000 apresenta 25 artigos
que normatizam, em âmbito nacional, a educação de pessoas jovens e adultas em todas
as suas modalidades. A função desse documento é estabelecer diretrizes nacionais que
devem, obrigatoriamente, ser observadas na oferta da EJA, nas etapas fundamental e
média, em instituições que integrem a organização da educação nacional, considerando
o caráter próprio desta modalidade de educação.
No texto do Parecer CNE/CEB 11/2000 o relator apresenta as seguintes
funções da EJA: a função reparadora, a função equalizadora e a função qualificadora,
esta última apontada como o próprio sentido da EJA.

56
A função reparadora é justificada, no Parecer, pelo alto número de
analfabetos existente no Brasil e, se apresenta como possibilidade de restauração de um
direito negado e de reconhecimento da igualdade ontológica de todo e qualquer ser
humano, além de propiciadora do ingresso no mercado de trabalho por se constituir em
uma oportunidade de atender à atual exigência das competências requeridas pela vida
cidadã e produtiva. O argumento do Parecer é que o desemprego, o subemprego, o
desemprego estrutural e o trabalho informal, decorrentes de mudanças nos atuais
processos de produção, podem produzir nos indivíduos a sensação de instabilidade,
sendo muito mais atingidos aqueles que são desprovidos da capacidade de ler e escrever
(BRASIL, 2000, p. 36).
A função equalizadora articula-se com os interesses daqueles que tiveram
sua trajetória escolar interrompida e representa a viabilização de um novo ponto de
partida para a igualdade de oportunidades. Argumenta o documento que, voltando à
escola, o jovem e o adulto podem “[...] retomar seu potencial, desenvolver suas
habilidades, confirmar competências adquiridas na educação extra-escolar e na própria
vida e, possibilitar um nível técnico e profissional mais qualificado” (BRASIL, 2000, p.
40).
Partindo do princípio da discriminação positiva, a função equalizadora se
traduz em dar maiores oportunidades aos que precisam mais. Nesse ponto, o Parecer
traz argumentos de que a EJA não pode ser vista apenas como alfabetização, é preciso
trabalhar as múltiplas linguagens visuais e juntamente com elas as dimensões da
cidadania e do trabalho; e completa que a função equalizadora pauta-se pela garantia da
eqüidade, que é definida no Parecer como a forma pela qual se distribuem os bens
sociais de modo a garantir uma redistribuição e alocação em vista de mais igualdade,
consideradas as situações específicas.
Quanto à função qualificadora, relaciona-se com a tarefa de levar a todos a
atualização de conhecimentos por toda a vida. De acordo com o Parecer CNE/CEB
11/2000, mais do que uma função permanente da EJA, essa função é o seu próprio
sentido. A função qualificadora procura levar o jovem e o adulto a se atualizarem em
quadros escolares ou não-escolares. Aqui se torna claro o “[...] apelo para a educação
permanente e criação de uma sociedade educada para o universalismo, a solidariedade, a
igualdade e a diversidade” (BRASIL, 2000, p. 41).
Justifica o Parecer que por essa função a pessoa pode se qualificar,
requalificar e “[...] descobrir novos campos de atuação da descoberta de uma vocação

57
pessoal” (BRASIL, 2000, p. 41), tarefa até então obstaculizada “[...] por uma sociedade
onde o imperativo do sobreviver comprime os espaços da estética, da igualdade e da
liberdade”.
Argumenta que o desemprego e o avanço tecnológico aplicado aos
processos produtivos têm gerado um tempo liberado. Muitos “[...] jovens ainda não
empregados, desempregados, empregados em ocupações precárias e vacilantes [...]”
podem encontrar na EJA, em suas funções de reparação e de equalização, ou
qualificação, “[...] um lugar de melhor capacitação para o mundo do trabalho e para a
atribuição de significados às experiências sócio-culturais trazidas por eles” (BRASIL,
2000, p. 42).
Em outras palavras, a função qualificadora, ou permanente, clarifica que a
EJA possui a tarefa de propiciar a atualização de conhecimentos por toda a vida. Toma
como base o caráter incompleto do ser humano, cujo potencial de desenvolvimento e de
adequação pode se atualizar em quadros escolares ou não. Destacamos que embora não
oposta a ela, a função qualificadora não se identifica com a qualificação profissional
(nível técnico) tal como posta no Parecer CNE/CEB n.º 16/99. Essa é muito mais um
apelo para a educação permanente e para a criação de uma sociedade educada para a
solidariedade, a igualdade e a diversidade.
Cabe, nesse ponto, um comentário adicional quanto ao termo competência
citado em várias ocasiões no Parecer CNE/CEB 11/2000. A noção de competência
parece surgir num contexto de resignificação dos termos relativos à formação
profissional no contexto do “trabalho incerto” (FRANCO, 1998). Brandão (1999)
discute a relação entre educação básica de jovens e adultos e o trabalho com base, em
parte, nessa noção, apontando-a como palavra-chave na discussão atual acerca da
educação profissional.
O surgimento da noção de competência é elucidado por Machado (1998,
1999) e Hirata (1984). Machado (1999) afirma que essa não é uma noção nova, sendo
sua atual utilização, na verdade, uma recuperação, cujas intencionalidades devemos
buscar desvendar. Ainda segundo Machado (1998), a adoção atual do termo
competência insere-se em uma reposição da relação educação, trabalho e
desenvolvimento pelos debates atuais acerca da reestruturação produtiva, nos moldes da
teoria do capital humano. Segundo Hirata (1994), a noção de competência tem origem
no discurso empresarial. Essa ligação com o mundo empresarial é confirmada por
Machado (1999), para quem o conceito de competência "[...] pretende fazer a

58
representação de um conjunto das práticas sociais que têm definido o modo através do
qual as empresas e o mercado de trabalho têm feito a gestão da força de trabalho" (1999,
p. 80). A autora assinala a utilização da noção de competência como uma tradução das
demandas impostas aos trabalhadores por um mercado altamente seletivo, em um
contexto de escassez de emprego. De modelo de gestão da força de trabalho, essa noção
passou a "[...] paradigma para as decisões de política educacional e de reforma
curricular". (MACHADO, 1999, p. 83).
A imprecisão do conceito é uma característica apontada por Ropé e
Tanguy (1997), o que faz com que a noção de competência possa ser utilizada em
contextos diversos. Ainda segundo essas autoras, a noção de competência tende a
substituir a noção de saberes e conhecimentos na esfera educativa e de qualificação na
esfera do trabalho. A comparação entre os conceitos de qualificação e competência nos
fornece elementos para a compreensão dos alcances e significados do último. Hirata
(1994, p. 132–133) afirma que o conceito de qualificação possui uma acepção
multidimensional, o que permite inclusive sua compreensão como uma relação social,
como "[...] resultado, sempre cambiante, de uma correlação de forças capital-trabalho".
Essa característica estaria ausente, segundo a autora, na noção de competência. Esse
aspecto é discutido também por Isambert-Jamati (1997), que aponta que a competência
é tratada como uma aquisição individual, não pertencendo a nenhuma categoria
formalizada. Essa possibilidade podia existir, segundo a autora, em relação à noção de
qualificação, o que possibilitava a solidariedade entre os membros de uma mesma
categoria de qualificação.
A contribuição dessas autoras remete à necessidade da compreensão da
função dos novos termos empregados em determinados contextos, questionando as
direções em que apontam.
É, portanto necessário, como afirma Machado (1999) conhecer os
fundamentos do modelo de competências. Apresentando esses fundamentos, conclui
que o modelo enfatiza a dimensão da subjetividade, do modo de ser, "[...] especialmente
referidos às formas através das quais se dá a inserção de cada indivíduo na construção
coletiva dos processos de trabalho" (MACHADO, 1999, p. 83). A autora aponta as
"novas competências" exigidas, entre as quais ressaltamos a presença do "contínuo
aperfeiçoamento" e da construção do novo "saber-ser", como noções compartilhadas por
parte da produção referente à educação permanente.

59
A análise de alguns autores a respeito da noção de competência leva a um
alerta acerca da utilização de "novos" termos. Para Brandão (1999), ela segue a tradição
liberal focando-se no indivíduo, valoriza a adaptação às relações de trabalho capitalistas
e naturaliza as relações sociais desse sistema. De acordo com Machado (1998), a noção
de competência é pragmática e utilitarista, e pressupõe a adaptação da educação à lógica
mercantil, reduzindo os trabalhadores a instrumentos do capital, além de estar ligada a
uma concepção individualista e competitiva de sujeito.
Ropé e Tanguy (1997) analisam a noção da competência nas esferas
educativa e do trabalho, e pode-se concluir de suas reflexões que essa noção serve como
elo entre as duas esferas. Segundo as autoras, a atividade de formação "[...] deslocou-se
de lugares especializados nessa função - como a escola - para outros lugares e em
especial para as empresas [...]" (p. 18). Ao mesmo tempo, as idéias acerca dos
conteúdos, métodos e avaliação do sistema educativo têm sido influenciadas pela lógica
empresarial. As autoras acrescentam que a ênfase do modelo de competência na
resolução de situações concretas e específicas faz com que seja outorgado à empresa o
papel de validar os saberes adquiridos na escola. Isambert-Jamati (1997) ressalta que, no
discurso empresarial, a aquisição das competências não está ligada à formação inicial.
Essa idéia aparece também em Stroobants (1997, p 141), que afirma que, nesse
contexto, "[...] o conhecimento parece nascer da situação profissional”.
Dessa forma, percebemos que a utilização do termo competência traz
consigo determinadas concepções acerca da educação fortemente influenciadas por
modelos de gestão da força de trabalho. É, portanto a partir do referencial do setor
produtivo que passam a ser concebidas as disposições para a educação. Pensamos que
essa reflexão pode ser feita também em relação à noção de educação permanente. Que
idéias estariam servindo de guia à utilização atual do termo?
Outro aspecto que merece atenção é que o parecer (BRASIL, 2000, p. 36 –
40) relaciona o termo competência aos saberes adquiridos na vida extra-escolar, quando
diz que, na EJA, o jovem e o adulto podem “[...] desenvolver habilidades e confirmar
competências”. A nosso ver, o caráter de confirmação dos saberes extra-escolares tem
representado, no contexto pesquisado, a idéia supletiva da EJA, uma vez que a aquisição
dos saberes fora da escolarização formal torna a passagem pela escola mais rápida ou
até mesmo desnecessária.
Enfim, as funções atribuídas à EJA constituem-se em tarefas abrangentes,
em uma sociedade em que as diferenças sociais não decorrem da situação educacional

60
dos indivíduos, e sim, da propriedade privada dos meios de produção. A EJA torna-se
uma promessa de inclusão escolar e social, mediante investimento pessoal na educação.
Assim, a promessa de qualificação e o desenvolvimento de competências aos jovens e
adultos não se vinculam a uma atividade profissional específica, mas ao
desenvolvimento de competências mais gerais, visando à constituição de pessoas aptas a
assimilar as constantes mudanças introduzidas pela inovação tecnológica.
A conclusão é que, seja-se jovem ou adulto, em qualquer idade e em
qualquer época da vida, “[...] é possível se formar, se desenvolver e constituir
conhecimentos, habilidades, competências e valores que transcendam os espaços
formais da escolaridade e conduzam à realização de si e ao reconhecimento do outro
como sujeito” (BRASIL, 2000, p. 43).
1.7.3 Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem
Em âmbito internacional, na década de 1990, foi promovida “uma série de
iniciativas em que o ser humano voltou a ocupar o eixo central do conceito de
desenvolvimento. Começando com a Conferência de Jomtien (1990) sobre Educação
para Todos [...] (IRELAND, 2003, p. 6).
A Conferência de Jomtien, na Tailândia, é chamada para março de 1990
(Ano Internacional de Alfabetização), tendo com meta primordial a revitalização do
compromisso mundial de educar todos os cidadãos do planeta. A Conferência, que
contou com a presença de representantes de 155 governos de diferentes países, teve
como patrocinadores e financiadores quatro organismos internacionais: a Organização
das Nações Unidas para a Educação (UNESCO); o Fundo das Nações Unidas para a
Infância (UNICEF); o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD);
e o Banco Mundial (BID).
Gadotti (2000) destaca as posições, diferentes e complementares ao mesmo
tempo, assumidas pelos organismos internacionais ao longo do processo preparatório e
durante a Conferência:
“[...] A Unesco destacou a diversidade e as minorias – por exemplo, o
analfabetismo da mulher. Uma categoria nova aparece no discurso
pedagógico: a eqüidade. Até 90, falava-se muito na igualdade de
oportunidades. A partir daí, passa-se a trabalhar com a categoria de
eqüidade. O contrário de igualdade é desigualdade e de eqüidade é
iniqüidade[...].

61
[...] O Unicef enfatizou a educação integral e suas necessidades
básicas. O novo enfoque da conferência de Jomtien passou a ser a
educação não mais identificada como escolaridade. [...] o Unicef
tentou dar uma conotação mais qualitativa, abordando qualidade de
vida, de nutrição e de saúde das crianças.
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)
realçou a idéia de que a melhoria dos índices de educação acabaria
produzindo melhor crescimento econômico. O Banco Mundial esteve
mais preocupado com o gerenciamento dos recursos, batendo na tecla
de que há recursos para a educação, mas são mal-aproveitados”
(GADOTTI, 2000, p. 28 - 29).

Estas posições, cabe ressaltar, diferentes e complementares, juntamente com
as contribuições advindas das reuniões preparatórias e dos debates realizados na própria
Conferência, deram origem a Declaração Mundial sobre Educação para Todos:
Satisfação das necessidades básicas de aprendizagem e ao Plano de Ação para
Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem.
As principais motivações para a realização da Conferência, tanto do ponto
de vista econômico quanto educacional, são apresentadas no preâmbulo do documento.
Ressalta que apesar de passados mais de quarenta anos da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, cujo documento afirma que toda pessoa tem direito à educação, na
realidade a educação ainda não é de acesso para todos. Os dados levantados apontavam
que um grande índice de crianças, principalmente meninas, não tem acesso ao ensino
primário e 960 milhões de adultos eram analfabetos, dos quais, dois terços constituíamse de mulheres.
A isso se acrescenta o analfabetismo funcional, presente principalmente nos
países industrializados ou em desenvolvimento e a falta de acesso ao conhecimento
impresso, às novas habilidades e tecnologias. Associados a esses dados, soma-se o
aumento da dívida de muitos países, ao aumento da população, à discrepância
econômica entre as nações e dentro delas, bem como as guerras, ocupações, lutas civis e
violência. Durante a década de 1980 essas dificuldades impediram o avanço da
educação básica em países pouco desenvolvidos. Portanto, a Declaração de Jomtien
relembra que

A educação é um direito fundamental de todos, mulheres e homens, de
todas as idades, no mundo inteiro, cada pessoa - criança, jovem ou
adulto – deve estar em condições de aproveitar as oportunidades
educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de
aprendizagem (BRASIL, 1993, p. 87)

62
Diante do exposto, do avanço das informações e da comunicação na
atualidade, como inovações, pesquisas, e o progresso em educação de muitos países,
segundo o documento citado, a educação básica para todos é uma meta viável e que
pode contribuir para um mundo mais seguro, com maior tolerância; isso por meio de
uma educação de melhor qualidade.
Para tanto, o documento é dividido em dez artigos que apresentam os
principais objetivos que serão brevemente explanados.
O primeiro artigo trata de satisfazer as necessidades básicas de
aprendizagem tanto em relação à aquisição de “[...] instrumentos essenciais para a
aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de
problemas), quanto aos conteúdos básicos da aprendizagem (como conhecimentos,
habilidades, valores e atitudes)” (UNESCO, 1990, p.3).
Dentre os demais objetivos apresentados, destacam-se a expansão do
enfoque. Isso se dá através da universalização ao acesso à educação, à promoção da
eqüidade, atenção à aprendizagem, além de ampliar os meios de ação da educação
básica por meio do fortalecimento de alianças, este último é expresso no artigo sétimo.
Fortalecer as alianças significa dizer que “as autoridades responsáveis pela
educação aos níveis nacional, estadual e municipal têm a obrigação prioritária de
proporcionar educação básica para todos’’ (UNESCO, 1990, p.6). Porém, essas
instâncias não são responsáveis em suprir todos os requisitos da educação, portanto são
necessárias articulações e alianças de todos os níveis:
entre as organizações governamentais e não-governamentais, com o
setor privado, com as comunidades locais, com os grupos religiosos,
com as famílias. É particularmente importante reconhecer o papel vital
dos educadores e das famílias” (UNESCO, 1990, p.7).

Os requisitos para garantir uma educação para todos incluem o
desenvolvimento de uma política contextualizada de apoio, apresentada no oitavo
artigo, e de uma mobilização de recursos, apresentados no nono artigo. O primeiro
ponto, que diz respeito às políticas de apoio, refere-se ao setor social, cultural e
econômico que servem para concretização da educação básica e para a elevação
individual e social. Assim, o avanço da educação básica está amarrado a um ajuste
político confirmado por reformas na política educacional, política essa vinculada com a
economia, comércio, trabalho, emprego e saúde.

63
Em relação a mobilização de recursos, diz respeito aos recursos humanos,
públicos, privados e voluntários. Logo, toda a sociedade tem responsabilidade com a
educação básica e o papel do setor público, por sua vez, é
atrair recursos de todos os órgãos governamentais responsáveis pelo
desenvolvimento humano, mediante o aumento em valores absolutos e
relativos, das dotações orçamentárias aos serviços de educação básica
(UNESCO, 1990, p.7-8).

O último artigo é referente ao fortalecimento da solidariedade internacional,
pois, é uma responsabilidade comum e universal a todos os países, incluindo a
solidariedade internacional para corrigir as disparidades econômicas. Para isso é preciso
um avanço substancial dos recursos destinados à educação básica dos organismos e
instituições intergovernamentais. Essas organizações são encarregadas de abrandar as
barreiras que impedem alguns países de atingirem a meta da educação para todos. Deste
modo, de acordo com o documento, é tarefa de todas as nações agirem em conjunto para
solucionar conflitos e garantir o atendimento das necessidades básicas de aprendizagem
(UNESCO, 1990).
Nesse contexto, os participantes da Conferência Mundial sobre Educação
para Todos defendem o direito de todos à educação, por meio de uma ação individual e
coletiva. Os participantes comprometem-se a cooperar adotando as medidas necessárias
para propiciar a educação para todos. Dentre as estratégias definidas na Conferência
destacamos os compromissos:
Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem de todos –
crianças, jovens e adultos – reconhecendo que têm necessidades de
aprendizagem diferentes, e isso exige conteúdos, métodos e
modalidades de ensino e aprendizagem também diferentes. Dar
prioridade a meninas e mulheres, eliminando os obstáculos que as
impedem de ter acesso à educação, assim como toda forma de
discriminação no âmbito educativo. Concentrar a atenção mais na
aprendizagem que em aspectos formais, como número de anos de
escolaridade ou certificados, garantindo que crianças, jovens e adultas
realmente aprendam [...] (TORRES, 2001, p. 21)

Reconhecer que as pessoas dependendo, inclusive da idade, apresentam
diferenças em seus processos de aprendizagem e têm o direito de ter suas necessidades
atendidas pode ser considerado um grande avanço. Tal reconhecimento, por parte dos
governos, implica na adoção de políticas que levem em consideração tais
especificidades para garantir a aprendizagem. Porém, um dos riscos que se apresentam é

64
o da adoção de políticas de aligeiramento que não levam em conta a aprendizagem
efetiva das pessoas envolvidas.
1.7.4 Aprendizagem ao Longo da Vida
Outro grande evento de relevante importância para o processo de reformas
educacionais implementados no Brasil, a partir dos anos 1990, foi a V CONFINTEA.
Para Ireland (2003), a V Conferência Internacional de Educação de Adultos
(V CONFINTEA), realizada em Hamburgo, na Alemanha, em 1997, foi permeada pela
mesma lógica da Conferência de Jomtien de 1990, isto é, pela centralidade do ser
humano no desenvolvimento.
O autor afirma que embora a Conferência de Hamburgo estivesse
especificamente dedicada à EJA, ambas exigiam uma importante participação da EJA
para alcançar as suas metas, dentre elas, “a efetiva participação de homens e mulheres
em cada esfera da vida [como] requisito fundamental para a humanidade sobreviver e
enfrentar os desafios do futuro” (IRELAND, 2003, p. 6),
A Conferência Internacional de Educação de Adultos (CONFINTEA) é
convocada periodicamente pela UNESCO desde 1949, dois anos depois da sua criação.
Com intervalos de doze anos em média e com a finalidade de fazer um balanço mundial
do setor, estabelecer novos programas e metas e promover a educação ao longo da vida
(Lifelong Education), houve, até o momento, seis Conferências: I – Dinamarca, 1949; II
– Canadá, 1960; III – Japão, 1972; IV – França, 1985; V – Alemanha, 1997 e a VI –
Brasil, em 200924.
A I CONFINTEA concebeu a educação de adultos como uma espécie de
educação moral. A educação formal, a escola, não havia conseguido evitar a barbárie da
guerra. Ela não havia dado conta de formar o homem para a paz. Por isso se fazia
necessária uma educação "paralela", fora da escola, “alternativa”, cujo objetivo seria
contribuir para com o respeito aos direitos humanos e para a construção de uma paz
duradoura, que seria uma educação continuada para jovens e adultos, mesmo depois da
escola (GADOTTI, 2000).

24

Embora o estudo da VI CONFINTEA extrapole o recorte temporal desta pesquisa, é oportuno dizer
que esta conferência ocorreu no período de 1 a 4 de dezembro de 2009, em Belém do Pará, marcando a
primeira vez de sua edição na América Latina e sediada pelo Brasil.

65
Na II CONFINTEA aparecem dois enfoques distintos: a educação de
adultos concebida como uma continuação da educação formal, como educação
permanente, e, de outro lado, a educação de base ou educação comunitária
(GADOTTI, 2000). Em Montreal participaram 51 países que debateram o tema “A
educação de adultos num mundo em transformação” (GUSMÃO; MARQUES, 1978, p.
3), cujo foco central foi a relação entre desenvolvimento econômico e a educação de
adultos.
A III CONFINTEA abordou “A Educação de Adultos no contexto da
aprendizagem contínua”. A partir dessa Conferência desponta no debate internacional,
como forma de resposta à crise da escola, uma concepção de educação focada na
aprendizagem como algo global e contínuo. Assim, o campo da educação de adultos
“viria a conhecer um momento culminante com a afirmação, no início dos anos 70, do
movimento de educação permanente. [...] numa perspectiva de valorização e
centralidade da pessoa humana, no âmbito dos processos educativos” (CANÁRIO,
2006, p. 3). De acordo com Gusmão e Marques (1978, p. 3), a principal idéia expressa
nas conclusões dessa CONFINTEA foi a de que:
[...] é urgente desenvolver as possibilidades da educação de adultos no
contexto de sistemas integrados de educação; a educação deve
responder às necessidades e aspirações do homem contemporâneo, e,
por isso, deve passar de institucional a funcional; este objetivo só se
poderá atingir favorecendo a execução de um sistema funcional de
educação permanente.

Essa concepção ampla, “quer no sentido temporal, quer na diversidade de
formas possíveis” (CANÁRIO, 2006, p. 3) está expressa na Conferência Geral da
UNESCO, de 1976, em Nairobi, que registra a abrangência do termo educação de
adulto, a qual:

[...] designa a totalidade dos processos organizados de educação, seja
qual for seu conteúdo, o nível ou o método, sejam formais ou não
formais, ou seja, que prolonguem ou re-iniciem a educação inicial
dispensada nas escolas e universidades e na forma de aprendizagem
profissional, graças às quais as pessoas, consideradas como adulto
pela sociedade a que pertencem, desenvolvem suas atitudes,
enriquecem seus conhecimentos, melhoram suas competências e
técnicas profissionais ou lhes dão nova orientação, e fazem evoluir
suas atitudes ou o seu comportamento na dupla perspectiva de um
enriquecimento integral do homem e uma participação em um

66
desenvolvimento socioeconômico e
independente. (UNESCO, 2005, n. p.)

cultural

equilibrado

e

A IV CONFINTEA, destaca em sua declaração a importância do “direito a
aprender”. Seu documento final recorda o conceito de educação de adultos da
Conferência Geral da Unesco de Nairobi, acima transcrito. A IV CONFINTEA reafirma
a perspectiva da educação permanente e recomenda o desenvolvimento da educação de
adultos a partir de um conceito que abranja sua realização social.
É evidente também o estímulo para que fossem realizados programas
especialmente destinados a “necessidades particulares de determinados grupos:
mulheres, jovens, pessoas de idade, minorias, trabalhadores imigrantes, populações
ameaçadas pela fome”25. Na perspectiva de Gadotti (2000), a IV CONFINTEA
caracterizou-se pela articulação de uma variedade de temas, relacionando a educação de
adultos com as educações cooperativa, vocacional, rural, de saúde e nutrição,
comunitária, da mulher, familiar etc., ou seja, pela pluralidade de conceitos. “Dessa
forma, a Conferência de Paris “implodiu” o conceito de educação de adultos”
(GADOTTI, 2000, p. 34, grifo do autor). A Declaração dessa Conferência elege o
direito a aprender como o principal desafio, e ressalta:
Como derecho humano fundamental su legitimidad es universal. Por
tanto, no se podría limitar en la práctica su reconocimiento a solo
parte de la humanidad: a los hombres, a los países industrializados, o
sólo a las clases pudientes, o los jóvenes que han tenido el privilegio
de ir a la escuela. La Conferencia de Paris invita a todos los países a
que logren el reconocimiento real de este derecho, creando lãs
condiciones necesarias para su ejercicio efectivo universal,
consagrándole todos los recursos humanos y materiales necesarios,
revisando la concepción de los sistemas educacionales a fin de
redistribuir más equitativamente los bienes educativos y culturales y,
por último, apelando a los recursos creados por las distintas
comunidades.26

A V CONFINTEA (Hamburgo, Alemanha, 1997) teve como principal
perspectiva conceber a educação de adultos dentro do contexto da educação continuada
ao longo de toda a vida. Cabe destacar que, na avaliação da UNESCO (2007, n.p), esta
Conferência é considerada especial: “La CONFINTEA V, considerada una conferencia

25

Art. II, p.7. Disponível em: <http://www.unesco.org/education/uie/confintea/paris_s.pdf> Acesso em:
30 ago de 2008.
26
Disponível em: http://www.unesco.org/education/uie/confintea/paris_s.pdf Acesso em: 2 set. de 2008.

67
hito, planteó uma visión global del apredizaje y la educación de adultos en la
perspectiva Del aprendizaje a lo largo de toda la vida”.
A V CONFINTEA, sob o título Aprendizagem de Pessoas Adultas - Uma
Chave para o Século XXI, ressaltou a defesa de duas vertentes complementares: a
escolarização e a educação continuada. A Conferência culminou com a elaboração de
dois documentos: a Declaração de Hamburgo e a Agenda para o Futuro (UNESCO,
1997), que sistematizaram e divulgaram os conceitos de educação continuada ao longo
da vida e de necessidades de aprendizagem, calcados nas perspectivas da cooperação e a
solidariedade internacionais para um novo conceito da educação de adultos.
Assim, a Agenda para o Futuro da Educação de Adultos da Declaração de
Hamburgo assinala:

A cooperação e a solidariedade internacionais devem consolidar uma
nova concepção de educação de adultos, a qual é, a um tempo,
holística, para cobrir todos os aspectos da vida, e multissetorial, para
englobar todos os domínios da atividade cultural, social e econômica.
[...] O diálogo, a partilha, a consulta e a vontade de instruir-se por uma
escuta mútua são as bases da cooperação que deve passar pelo respeito
à diversidade. (Tema X)

Dessa forma, segundo a Declaração de Hamburgo (1997), o conceito
contemporâneo da educação de adultos:
Engloba todo o processo de aprendizagem, formal ou informal, onde
pessoas consideradas “adultas” pela sociedade desenvolvem suas
habilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas
qualificações técnicas ou profissionais, direcionando-as para a
satisfação de suas necessidades e as de sua sociedade. A educação de
adultos inclui a educação formal, a educação não-formal e o espectro
da aprendizagem informal e incidental disponível numa sociedade
multicultural, onde os estudos baseados na teoria e na prática devem
ser reconhecidos”. (Art. 3)
Educação Básica para todos significa dar às pessoas, independente da
idade, a oportunidade de desenvolver seu potencial, coletivo ou
individualmente. [...] É fundamental que o reconhecimento do direito
à educação continuada durante a vida seja acompanhada de medidas
que garantam as condições necessárias para o exercício desse direito.
(Art. 9).
O reconhecimento do “Direito à Educação” e do “Direito a Aprender
por toda a vida” é, mais do que nunca, uma necessidade. (Art. 12)

Em estudo sobre o balanço intermediário da V CONFINTEA, Ireland
(2003) destaca que na Conferência de Hamburgo mais de 1.500 participantes, incluindo
representantes políticos, e, pela primeira vez, representantes das Organizações Não-

68
Governamentais (ONGs), sem voto, mas com direito a voz, afirmaram a sua
compreensão da educação como direito humano básico, para jovens e adultos de todas
as idades.
Declararam o seu entendimento da aprendizagem e formação de
adultos como chave para o século XXI e para a nova sociedade da
informação, e como processo que acompanha a vida toda. Frisaram,
através da Declaração de Hamburgo, o potencial da aprendizagem e
formação de adultos para “fomentar o desenvolvimento
ecologicamente sustentável, para promover a democracia, a justiça, a
igualdade entre mulheres e homens e o desenvolvimento científico,
social e econômico, bem como para construir um mundo em que os
conflitos violentos sejam substituídos pelo diálogo e por uma cultura
de paz (IRELAND, 2003, p. 2)

Percebemos, portanto, que a V CONFINTEA nos deixou muitas lições,
entre elas podemos destacar: a) reconhecer o papel indispensável do educador bem
formado; b) reconhecer e reafirmar a diversidade de experiências; c) assumir o caráter
público da EJA; d) ter um enfoque intercultural e transversal; e) a importância da EJA
para a cidadania, o trabalho e a renda numa era de desemprego crescente; f)
reconheceram a importância da articulação de ações locais; g) reconceituar a EJA como
um processo permanente de aprendizagem do adulto; h) reafirmar a responsabilidade
inegável do Estado diante da EJA; i) fortalecer a sociedade civil; j) integrar a EJA como
uma modalidade da educação básica; l) resgatar a tradição de luta política da EJA pela
democracia e justiça social; m) criar uma agenda própria da EJA; n) sistematizar e
difundir experiências relevantes. Enfim, qualquer visão prospectiva hoje, no campo da
EJA, deve levar em conta as numerosas lições deixadas pela V CONFINTEA.
A V CONFINTEA reafirmou a necessidade de alargar o conceito de
educação de adultos para além da questão da escolarização, destacou que a
alfabetização deve ser tratada como a primeira etapa da educação básica, ressaltando
que esta não pode ser separada da pós-alfabetização; enfim, discutiu o conceito de
educação de adultos como um direito, que é associado à possibilidade de processos
formais e informais de aprendizagem e à educação contínua.
Essa nova concepção de Educação de Adultos questiona, segundo a
Declaração de Hamburgo, as práticas atualmente desenvolvidas na área e preconiza a
conexão entre os sistemas formal e não formal de educação, a criatividade e a
flexibilidade. Seu objetivo final é a construção de uma "sociedade educativa".

69
Dentre os temas abordados com prioridade pela Agenda para o Futuro
aprovada na Conferência, consta a aprendizagem das pessoas adultas e as
transformações no mundo do trabalho. O documento apresenta a mundialização, as
novas tecnologias, a precariedade do emprego e o aumento do desemprego como os
novos desafios para a Educação de Adultos, ressaltando a importância da educação
profissional no processo de aprendizagem permanente. Foram assumidos os seguintes
compromissos em relação a essa temática: a promoção do direito ao trabalho e à
Educação de Adultos relacionada ao trabalho, a facilitação do acesso dos diferentes
grupos e a diversificação dos conteúdos dessa educação. Para a realização desses
compromissos, o documento preconiza o reconhecimento de atitudes e conhecimentos
adquiridos em um contexto não formal, a integração dos processos não formais de
aprendizagem e a formação de competências e atitudes específicas para a incorporação
ao mercado de trabalho.
Em relação a esse tema Hobart, assessor da UNESCO em Berlim, aponta a
necessidade de que a EJA leve em consideração as transformações no mundo do
trabalho a fim de assegurar a implementação da aprendizagem e do desenvolvimento ao
longo da vida. O autor lembra, entretanto, que em muitas regiões do mundo nem os
conteúdos nem os programas educacionais estão adequadamente desenvolvidos para
isso (HOBART, 1997).
Já na discussão da temática A aprendizagem das pessoas adultas e os
desafios do século XXI, Korsgaard, pesquisador da Escola Dinamarquesa de Estudos
Educacionais, abordou a emergência da concepção de educação e aprendizagem ao
longo da vida como uma das chaves para o século XXI. Para o autor, a educação, que
até pouco tempo estava ligada a certa fase da vida, agora se converteu em uma
necessidade que cobre toda a vida. A EJA passa agora a ser integrante da educação
contínua e da aprendizagem ao longo da vida (KORSGAARD, 1997).
Percebemos nos debates da V CONFINTEA ora apresentados que a
educação permanente aparece como a nova orientação para a área, capaz de atender às
demandas colocadas pelas transformações sociais em curso, sendo a não formalidade de
conteúdos e processos uma de suas características. Essa concepção está ligada a ideais
de participação e cidadania e prevê a valorização da EJA nas políticas educacionais. A
educação profissional é entendida como um dos elementos da educação permanente e
tem como meta a formação de competências para incorporação ao mercado de trabalho.

70
Os documentos e textos analisados anteriormente mostram a presença da
noção de educação permanente em reflexões realizadas em nível mundial. Ela aparece
também em textos relativos à EJA na América Latina, como mostra o documento
resultante da Conferência Preparatória para a V CONFINTEA, realizada em Brasília,
em janeiro de 1997, sob o título As aprendizagens globais para o século XXI - Novos
desafios para a Educação de Pessoas Jovens e Adultas na América Latina.
A educação permanente é abordada como um componente central da vida
social. Preconizando mudanças que acompanhem as transformações societárias atuais, o
referido documento propõe que a concepção da "educação compensatória" na EJA seja
substituída por um enfoque que possibilite a formação de capacidades e competências
habilitantes para uma aprendizagem contínua durante toda a vida (UNESCO-CEAL,
1997).
Para isso são requeridos atualmente mecanismos flexíveis que permitam as
pessoas aprender permanentemente, versus o enfoque que estimava que os mesmos
conhecimentos serviam para toda a vida. Dizendo de outro modo, antes se dava
demasiada importância ao que se ensinava, hoje em dia, se trata de ensinar a aprender
em diferentes contextos e durante toda a vida (UNESCO-CEAL, 1997).
A necessidade de que a Educação de Adultos na América Latina esteja
inserida em um processo de educação contínua para responder às atuais transformações
da região é apontada também por Osorio (1996). O autor relaciona a EJA à criação de
capacidades e competências que possibilitem aos atores sociais o exercício de seus
direitos e uma atuação transformadora na sociedade. Ela buscaria desenvolver
indivíduos capazes de operar códigos modernos de informação e expressão, julgar
criticamente e exercer direitos de participação, trabalho e democracia. Caracterizando o
que chama de uma nova visão em EJA, Osorio afirma que a educação básica deve agora
ser entendida como aquisição de “destrezas culturais básicas” e a noção de
escolarização ser substituída pela de “domínio de competências”. Muda também o
sentido da Educação de Adultos: de bem social ela se transforma em equipamento para
a ação do indivíduo, sendo marcante nas afirmações de Osorio a valorização da
apropriação individual da educação.
Novamente no âmbito internacional, mas sem as ligações dos autores
anteriormente citados com a UNESCO, abordamos a contribuição do pesquisador
francês Gerard Malglaive, que adota as noções de formação inicial e formação contínua.
Segundo Malglaive (1995), por um lado, as transformações societárias apresentam à

71
educação demandas às quais as estruturas tradicionalmente encarregadas da formação
inicial não conseguem responder. Por outro lado desenvolveram-se, muitas vezes em
simbiose com essas estruturas tradicionais, novas estruturas marcadas pela flexibilidade,
que buscam possibilitar a formação contínua. A articulação entre as duas modalidades
de formação promove a educação permanente. Entretanto, elas possuem finalidades e
processos diferenciados, constituindo, segundo o autor, "duas maneiras diferentes de
organizar a formação, de decidir os seus conteúdos e os seus objectivos, de ordenar os
meios materiais e pedagógicos". (MALGLAIVE, 1995, p.15). Diferentemente da
formação inicial, orientada pela necessidade social de formação das novas gerações, a
formação de adultos, segundo o autor, orienta-se pela configuração de necessidades
específicas. Assim, a principal característica da formação contínua dos adultos é a "[...]
vocação para satisfazer novas necessidades ligadas às múltiplas evoluções da sociedade
e aos itinerários pessoais dos indivíduos que têm de as enfrentar" (idem, 1995, p. 21).
Ela é, assim, orientada por finalidades.
Recorremos finalmente às contribuições de dois outros autores, procurando
precisar as características da educação permanente. Rivero (1997) divide as práticas da
EJA em educação formal e educação e formação contínua. Para caracterizar a segunda
fala

de

amplidão

e

heterogeneidade,

variedade

de

ações

educativas,

não

condicionamento às regras escolares, multiplicidade de propósitos. Afirma ainda que
seu público é variado e ela pode ser ofertada por diferentes instituições, não
necessariamente escolares. O autor opõe a educação contínua e permanente à educação
compensatória e primária de adultos.
Flecha (1997) abordando as mudanças da EJA propõe também uma
concepção diferente da educação compensatória. Nessa visão as demandas por EJA não
se fazem por insuficiência da escolarização passada, mas por exigências atuais de
renovação contínua dos saberes. Ela deve ser vista como um componente essencial do
desenvolvimento, não mais como um apêndice pouco importante do sistema escolar.
Por isso, segundo o autor, todas as idades são apropriadas para a aprendizagem, sendo
necessário o desenvolvimento de metodologias e currículos adequados para os adultos.
Analisamos até o momento diferentes contribuições que nos levam a
concluir acerca de um movimento de compreensão da EJA como um processo de
educação permanente. Destacamos agora algumas idéias que se apresentaram como
básicas nessa concepção. A primeira refere-se à necessidade de uma aquisição e
readaptação contínua dos conhecimentos, demandada pela transformação das

72
sociedades contemporâneas. A segunda diz respeito à diversidade das características e
necessidades do público adulto. Para atendê-lo, a EJA não pode se manter presa aos
modelos escolares tradicionais, devendo adotar conteúdos e metodologias adequadas às
necessidades de seu público, ou seja, suas estruturas devem ser flexíveis. Dessa advém
uma terceira idéia, relativa à diversidade das instituições que devem oferecer a EJA, as
quais não se restringem mais às instituições escolares.
Após analisar alguns dos significados atuais da noção de educação
permanente, voltamos nossa atenção para questionamentos e alertas em relação a sua
utilização. Essa reflexão é importante para que não se faça uma adoção acrítica da
noção, desconhecendo suas relações com diferentes concepções educacionais. É
necessário reafirmar o caráter muitas vezes inovador da noção de educação permanente,
em relação à de educação compensatória. Entretanto, é importante situar aspectos
conservadores que podem estar a ela acoplados.
A preconização da flexibilização é outro ponto que se destaca quando
analisamos as noções de educação permanente e competência. Foi possível observar que
a concepção de EJA inserida em um processo de educação permanente advoga a adoção
de conteúdos e processos educativos não formais, não se prendendo às tradicionais
formas escolares de ensino e aprendizagem – nesse sentido é interessante prestar
atenção à freqüente utilização do termo aprendizagem no lugar de educação, entre as
referências analisadas.
A discussão da flexibilidade na EJA deve ser feita também de forma
cautelosa. Ela apresenta indubitavelmente um lado inovador, na medida em que propõe
uma maior liberdade na escolha de métodos e conteúdos de ensino. Pode possibilitar,
por exemplo, uma maior adaptação do processo às necessidades e à cultura do educando
jovem e adulto e uma valorização da criatividade e da autonomia do educador.
Entretanto, pode estar próxima também de um sucateamento do processo educativo, o
qual passa a admitir qualquer tipo de prática. Pode refletir-se, desse modo, como uma
desvalorização da EJA: o discurso da flexibilidade e da criatividade nos processos
educativos pode passar a justificar, por exemplo, a falta de financiamento e de formação
de educadores.
Uma terceira questão pode ser deduzida das discussões. Refere-se à
aproximação entre a formação de pessoas jovens e adultas e a resolução de problemas
práticos. Em algumas das idéias acerca da EJA relacionada à educação permanente
discutidas neste tópico, esse aspecto foi ressaltado, o que também ocorreu na discussão

73
acerca da noção de competência: a EJA está voltada para a resolução de questões
específicas, nas quais os atores estão envolvidos.
Novamente, essa é uma questão que deve ser analisada com prudência. Ela
envolve discussões relacionadas a teorias pedagógicas, merecendo ser melhor avaliada.
Podemos apontar aqui que a "orientação por finalidades" pode significar uma adequação
aos interesses dos educandos, valorizando sua capacidade de fazer escolhas acerca de
seu processo educativo. Entretanto, devemos atentar para a possibilidade de uma
redução dos objetivos e possibilidades da EJA.
Essas três questões são fruto de uma análise conjunta das noções de
educação permanente e competência. Todas fazem o mesmo convite: uma reflexão
ampla acerca das concepções que informam nossas pesquisas e práticas educativas.

74

II O CAMINHO DA PESQUISA
2.1 Descrição do Estudo

Esta investigação teve como principal objetivo analisar as concepções de
educação de jovens e adultos que fundamentam a prática pedagógica dos professores
que atuam de 1ª a 8ª séries do ensino fundamental da EJA da rede pública do município
de Paulo Afonso-BA. Ao ampliarmos o foco para o saber docente, é necessário
compreendermos o que é esse saber docente, como é constituído e como pode ser
percebido ao informar a ação. O tópico que trata das concepções e práticas docentes,
discutido no primeiro capítulo deste trabalho, sinaliza que as concepções do professor
estão integradas e filtradas pelos valores e crenças pessoais, constituindo, assim, um
saber que orienta a sua prática profissional. Portanto, a referida investigação buscou,
dentre outras finalidades mapear as compreensões dos professores sobre a EJA a fim de
ser possível examinar suas filiações, à luz do estudo teórico. Na sua centralidade o
estudo analisou se as concepções dos professores abarcam os conceitos e sentidos que
configuram a EJA, na atualidade, como um direito de todos à educação ao longo da
vida.
O aporte metodológico desse trabalho se dá nos referenciais da pesquisa
qualitativa utilizando o grupo focal como técnica para a coleta de dados. Minayo (1999)
diz que a abordagem qualitativa não pode pretender o alcance da verdade, com o que é
certo ou errado; deve ter como preocupação primeira a compreensão da lógica que
permeia a prática que se dá na realidade, buscando uma compreensão humana
direcionada por uma abordagem sócio-histórica. Ressalta-se que a pesquisa qualitativa
reconhece a necessidade de compreender os valores, crenças, motivações e sentimentos
humanos na perspectiva de um contexto social historicamente datado e construído, pois
a compreensão só pode ocorrer se a ação é colocada dentro de um contexto de
significado (GOLDENBERG, 1998), portanto, apropriada para o estudo em pauta.
De acordo com Bogdan (apud Ludke; André, 1986), a pesquisa qualitativa é
descritiva; o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida é a preocupação
essencial do investigador; os pesquisadores utilizam o enfoque indutivo na análise de
seus dados e; os pesquisadores qualitativos estão preocupados com o processo e não
simplesmente com os resultados e o produto.

75
A análise qualitativa ancora sua escolha de universo amostral segundo
critérios distintos dos da metodologia quantitativa (critério de representatividade
estatística). A amostragem qualitativa privilegia os sujeitos sociais, neste caso, os
professores do ensino fundamental da EJA da rede pública municipal de ensino de
Paulo Afonso, que possuem os atributos que o pesquisador deseja conhecer, portanto,
sua escolha é proposital e não aleatória. Tal amostragem busca incluir um número
suficiente de depoimentos com o objetivo principal de garantir certa reincidência das
informações e perspectivas, viabilizando o exercício interpretativo. Contudo, não ignora
as informações ímpares cujo potencial explicativo deve ser levado em conta (MINAYO,
1999). Finalmente, entende que o conjunto de informantes escolhido deve contemplar
uma diversidade representativa das experiências do grupo analisado, possibilitando a
apreensão de semelhanças e diferenças. Ainda é Minayo (1999) quem nos esclarece que
segundo a tradição compreensivista das Ciências Sociais, a fala dos sujeitos
entrevistados é reveladora de condições estruturais, de sistemas de valores bem como
das suas vivências particulares, numa dinâmica, em que o macro e o micro convergem e
interagem.
2.2 O Contexto da Pesquisa
A EJA ofertada nas 22 escolas27 da Rede Municipal de Ensino de Paulo
Afonso corresponde ao 1º e 2º Segmento do Ensino Fundamental (1ª à 8ª série), com
avaliação no processo e estruturada em cinco Estágios com séries equivalentes.
Conforme nos informa a Proposta Pedagógica de Educação de Jovens e Adultos da rede
municipal28, os estágios garantem a continuidade dos estudos dos alunos de forma
seqüenciada e anual e cada estágio corresponde a um ano letivo, assim organizado:
EJA I - abrange 03(três) estágios que correspondem às séries iniciais do
Ensino Fundamental (1ª a 4ª séries);

27

Incluindo as localizadas na área urbana e rural, A EJA - Ensino Fundamental I e II é ofertada nas
seguintes escolas públicas municipais: 15 de Novembro, Alves de Souza, Amâncio Pereira, Árgus de
Lima, Jovino de Carvalho, Padre Lourenço Tori, Rita Gomes de Sá, Casa da Criança I, Casa da Criança
II, Casa da Criança III, Casa da Criança V, Georgina Alves de Carvalho, Guiomar Pereira de Melo, José
Geraldo, Manoel Almeida, Manoel Neto, Reunidas Severino Alves, Rivadalva de Carvalho, São José, São
Vicente de Paulo, João Bosco e Vinícius de Morais.
28
Proposta elaborada no ano de 2005, permanecendo em vigor em agosto de 2008, época em que foram
coletados os dados desta pesquisa.

76
EJA II - abrange 02(dois) estágios que correspondem às séries finais do
Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries).
No quadro a seguir, demonstramos a síntese das equivalências
estágios/séries no ensino fundamental da EJA em Paulo Afonso. Vale ressaltar que nas
localidades em que o número de alunos seja insuficiente para formar turma por estágio,
as escolas poderão constituir classes multisseriadas (SEMEC, Paulo Afonso, 2005)

Quadro I – Estrutura do Ensino Fundamental na
Modalidade EJA do município de Paulo Afonso-BA

PRIMEIRO SEGMENTO
EJA I

SEGUNDO SEGMENTO
EJA II

ESTÁGIO

EQUIVALÊNCIA

I
II
III

1ª série
2ª e 3ª séries
4ª série

ESTÁGIO

EQUIVALÊNCIA

IV
V

5ª e 6ª séries
7ª e 8ª séries

Fonte: Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Paulo Afonso, 2008.

De acordo com a Proposta de EJA, o ensino fundamental, como parte
integrante da educação básica de jovens e adultos, visa ao atendimento de um
imperativo respaldado na LDB nº 9394/1996 e nas Diretrizes Curriculares da EJA
(2000), que tratam a educação como um direito público subjetivo para todo e qualquer
cidadão, cabendo, portanto ao Governo Municipal cumprir o preceito constitucional que
garante a educação para todos, reparando assim, o direito que lhes foi negado.
Para o cumprimento dos preceitos constitucionais mencionados acima, a
referida Proposta atribui importância fundamental ao trabalho pedagógico do professor,
concebendo a atuação deste como um educador que “ensina o homem a transcender no
contexto e a transitar pelas dimensões do espaço, do tempo e das operações com o
próprio conhecimento” (PCN em Ação EJA, apud SEMEC/Paulo Afonso, 2005, p. 9).
Com base nos pressupostos teóricos da Proposta, podemos dizer que a
concepção de EJA norteadora das intenções educativas, parte do reconhecimento que
seus destinatários são pessoas cujos direitos têm sido historicamente negados. Nessa

77
perspectiva, cabe às políticas municipais de EJA considerar a marca da marginalidade
neste público a fim de contemplar os sujeitos de direito com uma educação fora do
“padrão” (SEMEC/Paulo Afonso, 2005, p. 9), entretanto, a diferenciação educativa que
se pretende para a EJA não deve ser confundida com uma educação para “carentes
passivos da assistência do favor alheio” (idem, p. 11). A Proposta defende que o novo
paradigma em que deve se assentar a educação de pessoas jovens e adultas inclui a
adequação da escola e do trabalho pedagógico do professor à vida e às necessidades do
aluno adulto, que são diferentes da criança e do adolescente; o reconhecimento e a
valorização dos alunos como sujeitos, capazes não só de aprender, mas de administrar
sua vida e sua sobrevivência pessoal e familiar, participar ativamente da comunidade e,
ainda; as atividades pedagógicas praticadas na sala de aula devem influenciar
diretamente no envolvimento dos alunos com a aprendizagem e na superação de suas
dificuldades, desafiando-os positivamente a aprender e incentivando-os a querer
retornar todos os dias.
Os fundamentos teóricos que embasam a Proposta, “pressupõem um aluno
jovem e adulto já trabalhador e cidadão que, precariamente, está inserido na sociedade
contemporânea altamente letrada, burocratizada e informatizada” (SEMEC, Paulo
Afonso, 2005, p. 12). Assim, orientam que as ações pedagógicas tomem as experiências
de vida e temas do cotidiano dos alunos como elementos desencadeadores do ensinar e
aprender.
Ressaltam, ainda, que o processo avaliativo considere aspectos qualitativos
e quantitativos. Os primeiros são elencados da seguinte forma: presença na sala de aula,
participação e interesse dos alunos nas atividades, como também, nos eventos da escola,
além das habilidades desenvolvidas durante o percurso. Quanto aos aspectos
quantitativos, estão incluídas as diversas produções escritas e orais, resultantes de
atividades individuais e em grupo.
Por fim, a Proposta de Ensino Fundamental na Modalidade EJA de Paulo
Afonso, informa que esta referenciada pelos educadores Paulo Freire, pelo que
representa à história da EJA, sobretudo por defender uma concepção de educação como
formação do cidadão crítico; e Emília Ferreiro, por trazer contribuições acerca do
processo de aquisição da leitura e da escrita.
Neste momento, cabe observar que estudos sobre as concepções de
alfabetização em Freire e Ferreiro, a exemplo de Moura (2004), identificam pontos de
aproximações e distanciamentos que devem ser levados em consideração quando se

78
busca definir o ponto de partida do processo de alfabetização. Embora mereça um
tratamento aprofundado, a discussão desse tema será retomada no terceiro capítulo, por
ocasião das análises dos conteúdos das falas dos professores pesquisados.
2.3 Amostra do Estudo
Ao discutir a questão da amostragem na pesquisa qualitativa, Minayo (1999)
afirma que nesta há uma preocupação menor com a generalização. Na verdade há a
necessidade de um maior aprofundamento e abrangência da compreensão. Então, para
esta abordagem, o critério fundamental não é o quantitativo, mas sua possibilidade de
incursão. Ou seja, é essencial que o pesquisador seja capaz de compreender o objeto de
estudo.
Nesse sentido, a composição do universo amostral envolveu a participação
de oito professores do quadro efetivo da rede pública municipal de Paulo Afonso, com
experiências docentes, acima de dois anos, no ensino fundamental da modalidade EJA
(etapas I e II/1ª a 8ª série).
O processo que culminou com a formação do grupo amostral teve início
com o levantamento das unidades escolares que ofertavam a EJA. A etapa seguinte
correspondeu à pré-seleção das escolas que seriam visitadas para a apresentação do
estudo e conseqüente convite aos docentes para integrarem o grupo focal. Cabe destacar
que a oferta do ensino fundamental na modalidade EJA (etapas I e II/1ª a 8ª série)
consistiu no critério de seleção das escolas visitadas; dentre essas, selecionamos as que
congregavam maior número de turmas de EJA. Esse critério possibilitou uma amostra
composta por professores com vivências pedagógicas no ensino fundamental de EJA
extensivo aos cinco estágios/séries equivalentes, conforme configurado na Proposta
Pedagógica (Vide Quadro I, p. 76).
2.4 Coleta de Dados
Buscando compreender uma situação específica em nível de ensino
fundamental baseada nas experiências dos educadores que constroem o cotidiano
escolar da EJA e se constroem como sujeitos históricos nesse processo, optou-se por um
caminho alternativo de investigação: o grupo focal.
O grupo focal é uma técnica de coleta de dados qualitativos que se dá por
meio de entrevista grupal, apropriada para estudos que buscam entender atitudes,

79
preferências, necessidades e sentimentos. A escolha da técnica de grupo focal
fundamenta-se em sua própria definição: “é um conjunto de pessoas selecionadas e
reunidas por pesquisadores para discutir e comentar um tema, que é o objeto de
pesquisa, a partir de sua experiência pessoal” (KITZINGER apud GATTI, 2005, p. 7).
A referida técnica enfatiza a interação entre os participantes permitindo
emergir várias opiniões e sentimentos, os quais nos dão a conhecer as “representações,
percepções, crenças, hábitos, valores, restrições, preconceitos, linguagens e simbologias
prevalentes no trato de uma questão por pessoas que partilham alguns traços em
comum” (GATTI, 2005, p. 11), possibilitando-nos compreender significados que seriam
difíceis de manifestar em outra técnica.
No âmbito das abordagens qualitativas em pesquisa social e no campo da
educação, o grupo focal vem sendo cada vez mais utilizado. Os sujeitos participantes da
pesquisa encontram no grupo focal liberdade de expressão, que é favorecida pelo
ambiente, levando a uma participação efetiva.
No dizer de Gatti (2005, p. 9), ao se fazer uso do grupo focal, “há interesse
não somente no que as pessoas pensam e expressam, mas também em como elas
pensam e por que pensam”. Assim, justifica-se o uso do grupo focal neste estudo por
concebermos os sujeitos pesquisados como artífices da história, como tal, sofrem
influência do meio social, portanto, desvelar esse “como” e “por que” pensam torna-se
condição fundamental na busca de novas compreensões e de novos “olhares” sobre as
questões investigadas.
2.5 Características e Operacionalização do Grupo Focal
A utilização da técnica de grupo focal requer algumas condições para a sua
efetivação. Gatti (2005, p. 22) afirma que a quantidade de participantes deve ser
determinada em função dos objetivos do estudo, entretanto, “[...] cada grupo focal não
pode ser grande, mas também não pode ser excessivamente pequeno, ficando sua
dimensão preferencialmente entre 6 a 12 pessoas”.
Outras condições apontadas pela autora dizem respeito ao tempo de duração
do encontro e ao perfil do grupo. Em relação ao primeiro aspecto, não se deve
ultrapassar de uma hora e meia a duas horas, para evitar prejuízo em função do cansaço
e desgaste mental. Quanto ao segundo, as características do grupo focal devem garantir
elementos comuns e variacionais entre os integrantes a fim de que sejam evidenciadas

80
as necessárias compreensões das diferenças e divergências, contraposições e
contradições.
Na esteira dessas orientações, o grupo foi formado por oito docentes do
ensino fundamental da EJA (etapas I e II) da rede pública municipal de Paulo Afonso,
todos do sexo feminino, graduados em pedagogia, com idades entre 28 a 51 anos; a
maioria é especialista em psicopedagogia e já participou de cursos de aperfeiçoamento
em EJA, a exemplo dos oferecidos pelo Programa Xingó29, Sesc Ler30 e pela Secretaria
Municipal de Educação; suas trajetórias profissionais em EJA variam de 2,8 a 11 anos.
Do ponto de vista da sua operacionalização, o grupo focal deve ser
constituído de um facilitador e um observador. O facilitador tem o papel de manter o
foco da discussão e encorajar os participantes a se expressarem. Ao observador cabe
apreender as informações verbais e não verbais expressas pelos participantes. Ao final
da reunião, a gravação realizada precisa ser transcrita e, posteriormente, analisada
qualitativamente (WESTPHAL; BÓGUS; FARIA, 1996).
Como é uma técnica que se produz pela dinâmica interacional de um grupo
com a presença de um facilitador, seu uso exige cuidados metodológicos. Assim, o foco
no assunto precisa ser mantido, bem como é necessário que se crie um clima de abertura
às discussões, possibilitando que os participantes se sintam confiantes para a expressão
de suas idéias e sentimentos (GATTI, 2005).
A equipe de trabalho desta pesquisa foi composta por três pessoas: uma
facilitadora, uma observadora e um apoio técnico. Coube à facilitadora – nesse caso
foi uma pesquisadora com larga experiência no uso da técnica – manter-se atenta,
acompanhando as discussões, propondo novas questões pertinentes a partir das que
trouxerem os professores, possibilitando esclarecimento de pontos de vista
convergentes e divergentes, mantendo sempre o foco da discussão nas concepções
dos docentes sobre a EJA.
Já a observadora, que nessa ocasião foi a autora da pesquisa, registrou os
acontecimentos no decorrer dos encontros considerando os aspectos verbais e não
verbais31 e, para isto, contou a capacidade de observação, síntese e conhecimento dos
objetivos e objeto da pesquisa. Estas características permitiram que a observadora

29

Conferir referência no capítulo introdutório
Criado em 1999, o projeto atua em 69 municípios e 18 estados oferecendo a educação de jovens e
adultos, além de seminários e cursos de atualização em EJA para professores da rede pública e privada.
31
Entretanto, os aspectos não verbais, embora importantes, não constituem objeto de análise neste estudo.
30

81
atuasse conjuntamente com a facilitadora de forma harmônica. Tanto a facilitadora
como a observadora precisaram demonstrar segurança e transparência na comunicação
para conduzir o grupo e apresentar objetivos claros e bem definidos.
Alguns cuidados quanto ao ambiente permearam toda a sessão. Na sala
havia boa iluminação, ventilação, cadeiras dispostas em círculo e espaço adequado para
a realização da técnica. Sua localização possibilitou um encontro sem interferências
externas, além da privacidade e do fácil acesso.
Outro recurso importante foi a utilização do guia temático como norteador
das discussões; este guia auxiliou na focalização do propósito do estudo por trazer
problematizações pertinentes ao objeto da pesquisa. Para a apreensão das concepções
docentes sobre a EJA foram elaboradas 12 questões abertas (vide anexo nº 1) buscando
abordar aspectos vinculados aos conceitos e sentidos relativos à modalidade, aos alunos
e ao processo educativo.
A sessão foi organizada da seguinte forma: apresentação dos participantes;
em seguida foram explicitados o tema e os objetivos do trabalho; esclarecimentos sobre
a técnica do grupo focal, abordando as questões de natureza ética que envolve o uso do
recurso de gravação de voz.
Com a orientação das questões do guia temático, as perguntas eram
formuladas das mais genéricas, buscando-se chegar as mais especificas. Esse diálogo
durou aproximadamente uma hora e vinte minutos, distribuídos conforme o nível de
complexidade de cada tema a ser discutido.
Essa breve descrição da dinâmica de composição e desenvolvimento do
grupo focal objetivou, em primeiro lugar, traçar o perfil dos sujeitos que constituíram o
universo amostral deste estudo; em segundo, delinear as condições de produção dos
dados, cujo processo de análise será descrito a seguir.
2.6 Tratamento e Análise de Dados
A análise de dados é “o trabalhar todo o material obtido durante a pesquisa
[...] organizar, dividir, relacionar e procurar neste, tendências e padrões relevantes”
(LUDKE e ANDRÉ, 1986, p.45). Os depoimentos obtidos, como resultado da dinâmica
de grupo participativa foram organizados e analisados consoantes a orientação da
análise de conteúdo, referida por Bardin (2009, p. 11) como “um conjunto de
instrumentos metodológicos cada vez mais sutis em constante aperfeiçoamento, que se

82
aplicam a “discursos” (conteúdos e continentes) extremamente diversificados”. (Grifo
do autor).
Enquanto esforço de interpretação, a análise de conteúdo
oscila entre o rigor da objetividade e a fecundidade da
subjetividade. Absolve e cauciona o investigador por esta
atração pelo escondido, o latente, o não-aparente, o potencial de
inédito (do não-dito), retido por qualquer mensagem (BARDIN,
2009, p. 11).
Entre os diferentes sistemas de categorização possibilitados pela análise de
conteúdo, incluímos a modalidade de análise temática para atingir os significados
manifestos e latentes das entrevistas em profundidade com docentes que vivem o
universo da EJA. Segundo Bardin (2009, p. 199), a investigação dos temas, ou análise
temática, “funciona por operações de desmembramento do texto em unidades, em
categorias segundo reagrupamentos analógicos”. Em outras palavras, o corpus é
constituído através do recorte, por categorias, dos conteúdos do conjunto dos discursos,
desconsiderando-se a dinâmica e a organização, levando-se em conta a freqüência dos
temas extraídos, estes, considerados dados segmentáveis e comparáveis.
Para apreender as concepções dos docentes sobre a educação de jovens e
adultos, seguiram-se três etapas cronológicas da análise de conteúdo, conforme Bardin
(2009):

a

primeira,

denominada

“Pré-análise”,

constituiu-se

da

organização

propriamente dita. Nesta fase organizou-se o material a ser analisado, objetivando-se a
operacionalização e sistematização das idéias iniciais. Após a transcrição32 integral da
entrevista do grupo Focal, realizou-se a leitura flutuante, ou seja, os primeiros contatos
com os documentos para conhecer o texto a ser analisado e constituir o corpus.
Posteriormente, procedeu-se a releitura, intercalando a escuta do material gravado com
a leitura do material transcrito. Essa postura atenta possibilitou acompanhar o
encadeamento de associações na entrevista, permitiu, ainda, o funcionamento da
associação mais livre possível a qualquer elemento do discurso.
A segunda etapa cronológica foi a exploração do material. Nesta, ocorreu a
definição das unidades de registro e de contexto, além da definição dos sistemas e das
categorias: conceitos e sentidos da EJA, o aluno jovem e adulto e o processo ensino e
aprendizagem. Por meio de nova re-leitura, textos originais foram grifados,
32

Optamos pela transcrição adaptada (não literal), de forma a facilitar a leitura e compreensão por parte
do leitor desta pesquisa.

83
identificando-se as convergências. Esse procedimento foi realizado em toda a
transcrição para se obter o primeiro recorte categórico da entrevista. Dando
continuidade, procedeu-se nova re-leitura desses textos e outra vez, realizou-se um
segundo recorte para fazer emergir seus significados e sentidos. Cumprida esta etapa,
buscou-se identificar as convergências entre todas as falas para a construção dos grupos
temáticos.
A última etapa metodológica da análise consistiu no tratamento dos resultados, a
inferência e a interpretação. Nesse momento, “o analista tira partido do tratamento das
mensagens que manipula para [...] deduzir de maneira lógica conhecimentos sobre o
emissor da mensagem ou sobre o seu meio, por exemplo,” (BARDIN, 2009, p. 41).
A análise de conteúdo implicou, conseqüentemente, a formulação e
explicitação do “ponto de vista” e da “perspectiva”, em função dos quais se perscrutou e
esquadrinhou o material, de modo à dele se extrair a informação que permitiu responder
às questões que se colocaram à investigação. Importou, portanto, clarificar o objetivo de
estudo, a perspectiva de investigação e o modelo teórico que enquadrou e fundamentou
as questões.
Importou para esta investigação desvelar as concepções de docentes sobre a
educação de jovens e adultos. Para efeito da análise de conteúdo descrita neste trabalho
foram

consideradas

três

categorias

temáticas

resultantes

do

processo

de

desmembramento e reagrupamento de texto do grupo focal: conceitos e sentidos da
EJA, o educando jovem e adulto e o processo educativo.
No final da análise, os fatos deduzidos logicamente a partir de certos
indícios selecionados e fornecidos pela fase descritiva da análise de conteúdo
procederam de natureza muito diversa. Alguns autores franceses chamam-lhes
condições de produção. Concordamos com P. Henry e S. Moscovici (apud Bardin,
2009, p. 42) quando afirmam que
Qualquer análise de conteúdo visa, não o estudo da língua ou da
linguagem, mas sim a determinação mais ou menos parcial do que
chamaremos as condições de produção dos textos que são o seu
objeto. O que tentamos caracterizar são estas condições de produção e
não os próprios textos (grifo nosso).

Por fim, a leitura efetuada pelo analista do conteúdo, não é, ou não é
unicamente, uma leitura “à letra”, mas, antes o realçar de um sentido que se encontra em
segundo plano. Essa abordagem tem por finalidade efetuar deduções lógicas e

84
justificadas, referentes à origem das mensagens tomadas em consideração, ou seja, o
emissor e o seu contexto, ou, eventualmente, os efeitos dessa mensagem.

85

III CONCEPÇÕES DE EJA NAS VOZES DOS DOCENTES

Nesse capítulo faremos uma discussão sobre as concepções de EJA
mobilizadas pelos professores dessa modalidade educativa da rede pública de ensino do
município de Paulo Afonso. O mapeamento das concepções foi possível graças às falas
dos docentes que atuam no ensino fundamental da EJA (1ª à 8ª séries), obtidas por meio
da técnica do grupo focal. Constitui-se objetivo deste capítulo analisar as concepções de
EJA dos professores à luz dos referenciais que a reconhecem como um modo de efetivar
o direito de todos à educação, independente da idade, bem como, das formulações
teórico-conceituais que a configuram como um processo de formação permanente que
se estende ao longo da vida. Para tanto, as questões norteadoras das discussões, giraram
em torno de aspectos característicos da Educação de Jovens e Adultos e os dados
produzidos na entrevista coletiva foram analisados com utilização da técnica de análise
de conteúdo, na perspectiva da análise temática, segundo Bardin (2009), elegendo como
unidade de registro a frase. A análise foi procedida com a exploração do corpus,
constituído das respostas a oito perguntas de um total de doze formuladas aos sujeitos,
agrupadas as respostas, com o objetivo de fazer emergir o modo como os professores
concebem os seguintes elementos: conceitos e sentidos da EJA, o aluno jovem e adulto
e as mediações nesse processo. A análise categorial permitiu a organização dos achados
da pesquisa em três temáticas: Conceitos e Sentidos da EJA nos Dizeres dos
Professores, Dizeres dos Professores Sobre seus Alunos e Mediações Didáticas na
EJA.
O enfoque nas compreensões teórico-conceituais dos professores ancora-se
no entendimento de que “o conceito aparece como ferramenta que ajuda a aprofundar o
conhecimento do real, e não a fazer dele uma mera abstração” (FREI BETO, 1996,
p.77). Nesse sentido, os dados apresentados no primeiro tema são resultantes da análise
das respostas dos docentes às seguintes questões: o que entendem por EJA? Como a
definem? A quem se destina?
Na segunda temática, os dados decorreram da análise das interações
coletivas em torno das perguntas: quem são os alunos da EJA? O que buscam esses
alunos?
As discussões apresentadas no terceiro tema partiram de problematizações
sobre como os sujeitos pesquisados concebem suas práticas educativas? Em que se

86
diferenciam dos professores de outras modalidades?

Em relação aos conteúdos e

estratégias de ensino, o que diferencia a EJA das outras modalidades da educação
básica?
Dois conceitos importantes foram tomados como referência para as análises
empreendidas neste capítulo: o primeiro é o da educação como um direito de todos,
estabelecido na nossa Constituição de 1988 e reforçado internacionalmente na
Declaração Mundial de Educação para Todos (Jomtien, 1990); o segundo é o da
educação como uma multiplicidade de processos formal, não formal e informal que
ocorrem ao longo da vida (Declaração de Hamburgo de 1997). Este conceito
fundamenta-se

tanto

na

importância

da

garantia

de

acesso

à

educação,

independentemente de idade, etc., quanto na capacidade da pessoa humana aprender em
qualquer momento e ciclo da vida (IRELAND, s.d, s.n).
É oportuno salientar que toda a análise dos dados partiu do pressuposto que
o ser humano é dotado de capacidades únicas, provenientes do interacionismo social
possibilitado pela linguagem, esta, entendida como a prática humana de demarcar,
nomear, significar, comunicar; como sistema significante em que se faz, e se desfaz, o
sujeito falante.

2.7 Conceitos e Sentidos da EJA nos Dizeres dos Professores

A correta compreensão do que representa a EJA perpassa, primeiramente,
pela definição das concepções sobre educação, as quais representam o arcabouço teórico
de quem a interpreta (SILVA, 2001). Ou seja, de que educação se está falando? Definir
isto representa demarcar o lugar de onde se fala a respeito da EJA. Com esse objetivo,
iniciamos com o grupo de professores o exercício de pensar uma definição conceitual
para a modalidade. Tal atividade pareceu um desafio inusitado. Contudo, dada a
insistência na questão, os participantes fizeram uma pausa reflexiva e, reconhecendo a
complexidade da tarefa, concluíram:
É difícil pensar assim um conceito... Porque a EJA é assim...33

33

Na literatura sobre análise dos dados coletados com o uso da técnica do grupo focal, não há consenso se
as falas dos participantes devem ser identificadas de forma individual ou coletiva. Neste estudo optamos
por nos referir coletivamente às falas do grupo sem menção individual e apresentá-las no texto com a
escrita em formato itálico.

87
É difícil pra a gente conceituar. Eu acho que seria mais fácil se você
pegasse tudo que a gente falou aqui e depois conceituasse.

Brandão (1984, apud PAIVA, 2005) ajuda-nos a entender a dificuldade do
grupo em relação ao conceito de EJA por conta da profusão de nomes, não inocentes,
que trazem imbricados, sentidos e significados de marcas ideológicas, que
historicamente orientaram projetos e atividades de processos educativos de jovens e
adultos no Brasil.
Refazendo o caminho dessa história, apreendemos variadas formas de
nomear e significar a educação de adultos das classes populares, o que dificulta uma
definição consensual do que ela é na atualidade, visto que se revestiu de um arcabouço
teórico, ideológico, e metodológico, conforme as correntes e forças do contexto sócioeconômico e cultural de cada período. Esse dado deve ser considerado ante as
inquietações dos professores:
A gente não conseguiu definir porque é um monte de coisa que vem e
a gente precisa captar tudo aquilo, operacionalizar, e termina que a
mente fica como um liquidificador.
Eu sei fazer. Eu aprendi. A teoria me ajudou muito, mas, às vezes eu
não sei falar.

Na tentativa de responder ao conflito demandado pela questão, o grupo foi
esboçando uma concepção de EJA que a aproxima da sua marca mais forte no
imaginário social, isto é, uma compreensão ligada à volta à escola, para fazer, no tempo
presente, o que não foi feito no tempo da infância (PAIVA, 2005), definindo-a na
perspectiva de uma segunda chance:
A EJA é uma oportunidade de recuperar todo esse tempo que eles [os
jovens e adultos] perderam

Na seqüência, os docentes reforçam a idéia da nova oportunidade, ressaltam
as perdas, para dizerem que a EJA é
Uma nova oportunidade para aqueles que se perderam, por motivo de
trabalho, ou mesmo porque o pai dizia: você não vai estudar não...
Uma outra oportunidade pra essas pessoas que perderam... Que não
tiveram oportunidade quando eram crianças, devido também ao
trabalho.

88
A compreensão de que a EJA deve favorecer a retomada dos estudos com
vistas a recuperação do tempo perdido é assim justificada pelo grupo:
[...] por terem perdido muito tempo sem estudar por ‘n’ motivos –
alguns desistiram porque não se interessaram; outros por causa do
trabalho – voltam a estudar quando eles se vêem dentro de uma
sociedade em que estão ficando pra trás (grifo nosso).

Ao enfatizarem a desistência dos alunos da escola, por não se interessarem
ou por causa do trabalho, o grupo incorpora ao seu discurso, implicitamente, antigas
questões disseminadas há muito tempo acerca dos sujeitos não escolarizados e que até
hoje habitam o imaginário de alunos e professores: a “culpa” por todo esse tempo que
eles perderam sem estudar. Com base nos dizeres do grupo, a EJA representa uma
segunda chance para os jovens e adultos equacionarem seus déficits de escolarização,
pois se vêem dentro de uma sociedade em que estão ficando pra trás. Para os docentes a
EJA representa, então, a alternativa para aqueles que não “valorizaram a escola” na
época devida, e hoje “estão desesperados da vida, acham que não têm mais jeito, que
eles não vão conseguir mais nada”.
De acordo com Senna (2003, p. 54), a fala dos professores pode ser
caracterizada como síntese de um dito popular, segundo o qual é preciso “‘ir à escola
para ser gente na vida’, aludindo-se, dessa forma, aos não escolarizados como nãogente, como sujeitos desprovidos de Razão, como os outros”. Esse olhar, refém do
determinismo educacional, ainda é muito forte no imaginário coletivo da EJA, e reflete
a visão do senso comum ao afirmar que sem educação não são ninguém, não são
cidadãos ou não sabem se relacionar.
Ao situarem o atendimento dos jovens e adultos como segunda
oportunidade de escolarização, ou à escolaridade perdida na idade própria, o grupo
expressa a noção de titularidade de direito à educação apenas aos que estão na faixa
etária dos 6 aos 14 anos, considerando-se o ensino fundamental de nove anos. No
âmbito das políticas públicas e dos encaminhamentos escolares, essa perspectiva remete
a uma concepção de EJA em que a formação dos educandos jovens e adultos não é
assumida como uma educação permanente, mas apenas como uma ação temporária de
suplência, sustentada, freqüentemente, em modos inadequados, não raro, com conteúdos
preconceituosos em relação ao analfabeto adulto.
Essa concepção emerge também de uma lógica do senso comum, segundo a
qual existe uma idade própria para aprender – na infância/adolescência. Concebidas

89
dessa forma, essas ações, de cunho assistencialista e muitas vezes baseada no
voluntariado, não reconhecem a educação de adultos como direito. O não
reconhecimento do direito à educação para as pessoas jovens e adultas aliado à idéia de
compensação são responsáveis, entre outros, por uma visão de aluno muito equivocada,
que tem estado presente na maior parte das escolas de EJA há dezenas de anos.
Paiva (1997, p. 98) posicionando-se sobre o assunto denuncia que a
concepção de suplência foi instaurada pela visão de educação compensatória que, por
sua vez, “na contramão da história, desconsiderava a condição de aprendizes por toda a
vida dos sujeitos adultos, e continuava a considerá-los escolares que voltavam para
cumprir as etapas da escola básica, não cursadas na chamada ‘idade própria’”.
Outro aspecto a ser apontado nas falas dos professores é que percebem a
EJA como sendo diferente de outras modalidades.
A gente sabe que a EJA é uma modalidade diferente da educação
infantil.
Eu não trabalho com alunos de classes regulares como eu trabalho
com EJA [...] por eles terem perdido muito tempo sem estudar”.

Os dizeres do grupo expressam o argumento das “faltas” ou “lacunas” para
estabelecer a relação de diferenciação da EJA com a educação de crianças e
adolescentes. Contestando esta visão Arroyo (2006) adverte que a EJA não deve ser
reconhecida apenas pelas carências sociais do público que a ela freqüenta, nem sequer
pelas carências de um percurso escolar bem-sucedido. A versão que busca justificar o
modo diferenciado de atendimento a jovens e adultos por eles terem perdido muito
tempo sem estudar, representa a perspectiva do protagonismo pela negatividade. O autor
ressalta, que a EJA deve se diferenciar pelo protagonismo da presença positiva dos
jovens e adultos em áreas como a cultura, pressão social por outro tipo de sociedade e
outro projeto de campo, pelas lutas por seus direitos. Portanto, não se pode pretender
caracterizar a EJA pela concepção equivocada de recuperar um tempo perdido, pois,
quando seu público volta à escola, carregam um largo acúmulo de formação e de
aprendizagens.
Chama a atenção nas falas o uso da expressão alunos de classes regulares,
numa referência a esses educandos como estando em situação de regularidade
(correlação idade/série, escola diurna, tempo e processo de aprendizagem, etc.) em
relação aos das classes da EJA. Desse ponto de vista, o grupo associa a EJA à figura do

90
Ensino Supletivo, isto é, como um “ensino à parte do regular” destinado aos que não
seguiram ou concluíram os estudos dos 7 aos 14 anos, conforme prescrição da LDB
5692/71. Para estes, restava uma ação compensatória e assistencialista para recuperar o
atraso e reciclar o presente, com o objetivo de formar mão-de-obra que contribuísse no
esforço para o desenvolvimento nacional (HADDAD, 1991).
Foi no processo de redemocratização dos anos 1980 que a Constituição
brasileira deu um passo definitivo em direção a uma nova concepção de processo
formativo que inclue jovens e adultos, ao estabelecer no artigo 208 que “[...] a educação
é direito de todos e dever do Estado e da família” e ainda que é o “[...] ensino
fundamental obrigatório e gratuito, inclusive sua oferta garantida para todos os que a ele
não tiveram acesso na idade própria”.
Também a LDB 9394/96, nos seus artigos 37 e 38 gera, segundo Soares
(2002, p.12), uma mudança conceitual na EJA, passando a denominar ‘Educação de
Jovens e Adultos’ o que a Lei nº 5.692/71 chamava de ‘ensino supletivo’, destacando
que não se trata apenas de uma mudança de caráter vocabular34 mas de um alargamento
do conceito. Ao haver a mudança do termo de ensino para educação, possibilita a
compreensão, nesse processo, de diversos processos formativos voltados para sujeitos
jovens e adultos.
A compreensão da EJA na perspectiva do direito de todos à educação,
declarada na Constituição Federal, requer o abandono de qualquer lógica de
atendimento como “oportunidade” e “chance” outorgadas à população. EJA como
direito, pressupõe em sua práxis que o trabalho realizado garanta acesso, elaboração e
reconstrução de saberes que contribuam para a humanização e emancipação do ser
humano. O que é possível perceber, ouvindo os docentes, é que reconhecem a EJA
como uma modalidade diferente no interior da educação básica, porém, conferem
contornos valorativos a essa diferença; algo inferior, para cidadãos inferiores
(ARROYO, 2001).
Essa concepção se distancia dos princípios legais vigentes, nos quais, os
jovens e adultos são percebidos como sujeitos de direito. Atualmente, a EJA integra a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira como modalidade específica da
Educação Básica e, é estabelecida como direito público subjetivo na Etapa do Ensino
34

Trata-se de um caráter ampliado, o termo “jovens e adultos” representa todas as idades e em todas as
épocas da vida. A palavra suplência indicava a função de recuperação do tempo perdido.

91
Fundamental. Isto significa dizer que qualquer pessoa que não tenha tido acesso a
escolaridade neste nível de ensino, independente da idade, é titular desse direito e pode
exigir imediatamente o seu cumprimento. “[...] Na prática, isto significa que o titular de
um direito público subjetivo tem assegurada a defesa, a proteção e a efetivação imediata
do mesmo quando negado” (BRASIL, 2000, p. 20).
Ao longo do diálogo coletivo, observamos que os professores silenciavam
as circunstâncias que produzem a exclusão dos alunos do sistema escolar, uma vez que,
conforme Freire (1997, p. 10),
Na verdade, não há crianças se evadindo das escolas como não há
crianças fora das escolas como se não estivessem dentro só porque
não quisessem, mas crianças ora proibidas pelo sistema de entrar nas
escolas, ora de nelas permanecer. (FREIRE, 1997, p. 10)

Esse silenciamento favorece o eco de concepções e argumentos que
sustentam a consciência e as atitudes ingênuas relacionadas ao fenômeno (PINTO,
1991). Uma das formas ingênuas de conceber o insucesso escolar do educando é
considerá-lo responsável exclusivo “pela situação indesejável em que vive e que quer
superar. Se estivesse estudado não estaria assim ...” (CARLOS, 2008, p. 65).
Algumas das causas da evasão escolar, apontadas pela consciência ingênua,
são o descuido quanto a educação dos filhos e o “mau ambiente” moral que lhes são
oferecidos; a indolência ou a preguiça; a rebeldia aos bons hábitos; a falta de vontade ou
de perseverança da criança, e a pobreza familiar compreendida de forma isolada do
conceito de classe social. Outros apontam como causa a distância da casa à escola.
Enfim, todos os argumentos desse enfoque parecem incorrer em um mesmo problema
lógico, tomando a conseqüência (analfabetos/pouco escolarizados) como causa do
problema (analfabetismo/pouca escolarização), de modo que, em relação à cultura
letrada, a idéia de aluno se confunde com o próprio analfabetismo.
Por sua vez, o educando “nem de leve desconfia que vive em uma sociedade
de classes cujas relações interferem significativamente nos destinos individuais”
(CARLOS, 2008, p. 65). Por ser o analfabetismo identificado como vergonha e
incapacidade, os adultos não alfabetizados tendem a assumir a culpa e a conseqüência
do seu não saber ler, sentindo-se como incapazes e inferiores em relação aos outros no
país. Especialmente nos centros urbanos, eles estão normalmente retornando depois de
um período recente de sucessivas idas e vindas da escola. Têm, portanto, uma relação
mais conflituosa com as rotinas escolares. A não problematização dessas questões pode

92
contribuir para que os alunos legitimem a idéia de “que o sucesso ou fracasso é
resultado apenas do seu esforço individual” (CARLOS, 2008, p. 65), e experiências
passadas de fracasso produzem nos jovens e adultos uma auto-imagem negativa.
Outro aspecto que aparece de modo recorrente nos depoimentos do grupo é
a vinculação do atendimento educativo de jovens e adultos às necessidades demandadas
pelo mercado de trabalho. Essa incidência temática permite inferir que os professores
têm clareza que o público atendido pela EJA “tem interesse na formação para o campo
do trabalho”, pois, “vivem no mercado de trabalho, sem emprego”. O grupo entende
ser a EJA “a instrução que vai favorecer o ingresso deles [os jovens e adultos] de
forma mais qualificada neste mercado de trabalho, que hoje ta cobrando”. A EJA é
descrita, também, como “uma oportunidade pra essas pessoas que já estão no mercado
de trabalho, já estão numa empresa [...] de conseguir aprender; uma oportunidade de
melhorar no seu trabalho”.
Dada a convivência cotidiana dos professores com seus alunos, podemos
inferir que essas enunciações são uma expressão de apoio e reciprocidade aos reclames,
principalmente dos jovens, que se percebem pressionados pela demanda do mercado de
trabalho e por uma sociedade que valoriza cada vez a cultura letrada. Na esteira desse
raciocínio, podemos dizer que quando o grupo afirma que “o foco da Educação de
Jovens e Adultos é direcionado para o mercado de trabalho” e que a EJA “para
contribuir mais, teria de ter algo profissionalizante”, ocorre o ajustamento das
concepções dos professores às expectativas dos alunos.
Nessas falas é ressaltada uma concepção de EJA nos moldes da qualificação
profissional, na acepção dual de um sistema de formação: o ensino profissionalizante
aos menos favorecidos economicamente e, o propedêutico, às elites. Importa considerar
que, embora o Parecer CNE/CEB 11/2000 afirme a dimensão qualificadora como uma
função que aponta para o próprio sentido da EJA, esta, não se configura como
profissionalização, no sentido de preparação técnica para o trabalho, e sim, como
possibilidade de atualização de conhecimentos por toda a vida, baseada no caráter
incompleto do ser humano, cujo potencial pode se atualizar em quadros escolares ou
não escolares (BRASIL, 2000).
Para Ireland (2005), a relação entre educação e trabalho tem sido uma das
inquietações presentes na construção da EJA enquanto política pública, pois, ainda não
se equacionaram os problemas referentes às lacunas das propostas curriculares no que
tange ao distanciamento entre processo educativo e o mundo do trabalho. Não obstante

93
o Plano Nacional de Educação (PNE) e a LDB (Lei nº 9.394/96) explicitarem a
necessidade de vinculação do ensino fundamental para jovens e adultos à formação para
o trabalho, isso não tem ocorrido na prática. No máximo, o que se observa, com raras
exceções, são práticas aligeiradas de treinamento profissional, às vezes, vinculadas à
elevação de escolaridade.
Analisando esses desafios, Ireland (2005) manifesta sua preocupação,
alertando sobre os equívocos das concepções que tendem a reduzir essa relação à
perspectiva do emprego, a exemplo das visões do chamado Sistema S, inaugurado em
1940 e do Ensino Supletivo, na década de 1970; essas visões também são sinalizadas
nas vozes dos professores pesquisados:
O emprego onde eles trabalham exige também uma qualificação
melhor, e eles retornam através dessas coisas mesmo.

O autor prossegue argumentando que,
Esse reducionismo impede uma visão ontológica do trabalho, como
constituinte do sujeito na sua totalidade. Pensar as categorias
relacionadas ao trabalho no campo da EJA implica em desmistificar
concepções alienantes que colocam indivíduos na condição de meros
reprodutores. O lugar do trabalho na vida do jovem e adulto precisa
ser o lugar do ser, onde ele se realiza enquanto produtor de si mesmo e
produtor de cultura (IRELAND, 2005, p. 97)

Por sua vez,
Para que haja a efetiva integração entre EJA e o Mundo do Trabalho é
preciso que os educadores e os alunos se indaguem: Como introduzir
essa discussão nos currículos de EJA? Como fazer para que
professores compreendam o mundo do trabalho como eixo gerador da
produção de outros conhecimentos? Como contribuir para que o
campo da discussão do emprego, do subemprego e do desemprego
faça-se presente de forma efetiva na EJA? Nesse sentido, a educação
de jovens e adultos tem muito a aprender de sua interlocução e
convivência com instâncias das organizações e movimentos populares
e com os métodos desenvolvidos na educação popular [...]
(IRELAND, 2005, p. 97).

No paradigma da educação popular, citado por Ireland (2005), o objetivo da
relação entre educação e trabalho não pode ser o de contribuir para aliviar a pobreza e
tampouco de ajustar as “competências básicas” dos trabalhadores para que consigam
competir no mercado, desconsiderando as necessidades reais e imediatas das camadas

94
socialmente desfavorecidas. A educação popular, ao contrário da educação bancária
(FREIRE, 1975), tem como um de seus objetivos questionar a atual lógica excludente
do mercado e, como conseqüência, criar alternativas para ela.
Trilhando por esse caminho podemos encontrar uma concepção de educação
que aponta para “a emergência do sujeito” (PÉRES GOMES, 1997, p.62). Em lugar de
reduzir o processo educativo à mera preparação para o mundo do trabalho, podemos
avançar em direção a uma concepção mais ampla, que considere as demais dimensões
da educação: a emergência e o fortalecimento do sujeito situam-se como o objetivo
prioritário da prática educativa. A ênfase não deve se situar nem na assimilação da
cultura privilegiada, seus conhecimentos e seus métodos, nem na preparação para as
exigências do mundo do trabalho, e sim no enriquecimento do indivíduo, constituído
como sujeito de suas experiências, pensamentos, desejos e afetos (PÉRES GOMES,
1997). O sujeito passa a ser visto não mais como passivo no processo histórico, mas
capaz de converter-se em agente consciente de interpretação, criação e transformação.
Os esforços empreendidos neste tópico objetivaram apreender conceitos e
sentidos da EJA nas vozes dos professores. A análise assume a perspectiva, ou não, do
direito à educação, independente da idade. Ressaltamos que o reconhecimento desse
direito requer que sejam consideradas as singularidades constitutivas dessa modalidade
e a necessidade de atendimento educativo apropriado à fase particular da vida adulta.
Evidenciamos, assim, a necessidade da construção de outro olhar para a EJA que aponte
para a superação lógica de segunda chance de escolarização ou recuperação do tempo
perdido; reconheça os jovens e adultos em tempos e percursos de jovens e adultos e
como sujeitos dos direitos humanos; recupere a relação entre conhecimento e a prática
do trabalho que permita aos alunos compreenderem-se no mundo e ao mesmo tempo
compreendê-lo de forma a se prolongar por toda a vida.
2.8 Dizeres dos Professores sobre seus Alunos
Ao serem questionados sobre as motivações do educando jovem e adulto
que procura continuar seus estudos na modalidade EJA, os professores deixam claro que
a preocupação da maioria, nas turmas em que eu tenho trabalhado, é de querer ler e a
gente vê essa empolgação deles de ‘eu quero é ler’, ‘eu quero aprender a ler’, ‘não
quero passar de ano sem saber ler’. Para o grupo, esse desejo está vinculado à baixa
auto-estima dos alunos, pois, é como se ele não se sentisse nada, por não saber ler, por

95
não poder conviver na sociedade, não ser um cidadão, então, vêm à escola para
aprender a assinar o nome.
O relato dos docentes deixa claro que a expectativa mais freqüente,
sobretudo dos alunos adultos que buscam a EJA é satisfazer necessidades particulares
para se integrar à sociedade letrada da qual fazem parte por direito, mas da qual não
podem participar plenamente quando não dominam a leitura e a escrita, ainda que esse
domínio acene para o conceito de alfabetização apenas como aquisição dos rudimentos
mínimos do código escrito para aprender a assinar o nome.
Para compreendermos um pouco mais o que dizem os professores,
recorremos ao estudo de Soares (2004) para nele apreender a significação do ler e
escrever para adultos que se reconhecem analfabetos. Os primeiros indícios
esclarecedores remetem à questão do analfabetismo no Brasil como fato histórico que se
perpetua secularmente35. Outras pistas foram revelando os atributos definidores do ser
ou não ser analfabeto nos documentos censitários nacional. Para os Censos realizados
até 1940, se uma pessoa afirmasse saber assinar o nome, era considerada alfabetizada,
pois, a condição sócio-político-cultural da época requeria apenas esse nível de
conhecimento de grande parte da população.
A partir dos anos 50 e até o último Censo (2000), os questionários passaram
a indagar se a pessoa era capaz de “ler e escrever um bilhete simples”, o que já
evidencia uma ampliação do conceito de alfabetização: já não se considera alfabetizado
aquele que apenas declara saber ler e escrever, genericamente, mas aquele que sabe usar
a leitura e escrita para exercer uma prática social em que a escrita é necessária.
O conceito de alfabetização ganhou novas definições que dependem do
estágio em que o “alfabetizado” se encontra. Surge então a denominação “alfabetizado
funcional”, para nomear a pessoa que é capaz de utilizar a leitura e a escrita para fazer
frente às demandas de seu contexto social e usar essas habilidades para continuar
aprendendo e se desenvolvendo ao longo da vida.
Uma das conclusões a que chegamos a partir da evolução dos conceitos de
alfabetização é que, para não serem identificados como analfabetos, na atualidade, os
jovens e os adultos precisam desenvolver e confirmar cada vez mais habilidades e
competências lingüísticas. Não obstante, no imaginário social e principalmente no dos
alunos, uma pessoa analfabeta é freqüentemente associada à idéia de menos capaz. Isso

35

A história do analfabetismo no Brasil pode ser verificada em Ferraro (1985).

96
pode nos ajudar a entender a razão de o grupo dizer que é como se ele não se sentisse
nada por não saber ler; por não poder conviver na sociedade, não ser um cidadão.
Esse contexto de exclusão social a que foram submetidos os analfabetos no
Brasil, produziu uma fragilização da sua auto-imagem. Freire (2001, p. 15) denuncia
que “durante longas décadas, as pessoas que não sabiam ler e escrever foram vistas
como portadoras de um mal que precisava ser erradicado, atribuído à incapacidade do
povo ou mesmo à preguiça”. Essa representação do analfabeto permeou por longas
datas as campanhas de alfabetização de adultos no Brasil e ainda hoje se tem falado em
“erradicar o analfabetismo”, expressando-se com isso a idéia de que o analfabetismo é
uma doença a ser combatida, cujo portador é o analfabeto.
Diante do exposto, é possível justificar a empolgação do adulto analfabeto
em aprender a ler, quer dizer, sair da condição de analfabeto para a de alfabetizado, a
qual lhe confere o status de cidadão quando da aprendizagem da assinatura do próprio
nome.
A assinatura do próprio nome em documentos tem sido utilizada,
historicamente, como indicativa de alfabetização, e a assinatura com um xis (X), como
indicativa de analfabetismo (FERRARO, 2008). Esse fato coloca o indivíduo diante de
duas situações: ou ele assina o próprio nome ou faz aposição de um xis em lugar do
nome. Durante longos anos, quem não sabia escrever seu próprio nome, não podia votar. O
simples fato de assinar o nome já permitia ao cidadão tirar o título de eleitor, o que o
colocava em condições superiores aos demais, por dar-lhe o direito de votar. Vale dizer
que as pessoas analfabetas foram mantidas sem o direito de cidadania política, através
do voto, até meados de 1980.
Citando Goody (1987), o autor procura esclarecer o significado da
assinatura:
[...] o equivalente do juramento oral é a confissão assinada. A
assinatura torna-se efetivamente um substituto para a pessoa, pelo
menos no fundo de cheques. E acrescenta: Mas não se limita a ser um
cartão de identidade, tão individual como a impressão do dedo ou da
mão, sendo também a afirmação de verdade e de consentimento
(GOODY, apud FERRARO, 2004, p. 202).

Com efeito, a alfabetização, mesmo nesse sentido restrito, representa, de um
lado, a libertação das múltiplas formas de preconceito, rotulação e estigmatização ainda
vigentes em relação ao analfabeto, como se viu acima, e, de outro, a efetivação de um
dos aspectos que possibilita a satisfação das necessidades básicas de aprendizagem.

97
De acordo com a Conferência Mundial Sobre Educação para Todos,
realizada em Jomtien, na Tailândia, em 1990, em seu Art. 1º:
Cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deve estar em condições de
aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas
necessidades básicas de aprendizagem. Essas necessidades
compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem
(como leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de
problemas), quanto os conteúdos básicos de aprendizagem (como
conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que
os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas
potencialidades, viver e trabalhar com dignidade, participar
plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar
decisões fundamentais e continuar aprendendo.

A Conferência interpreta que satisfação das necessidades básicas de
aprendizagem é a compreensão de um direito inalienável de crianças, adolescentes,
jovens e adultos. É um direito histórico-cultural. Essas necessidades básicas de
aprendizagem, por serem diversificadas e ricas, devem se concretizar, pedagogicamente,
em suas dimensões constitutivas. Uma de caráter instrumental: a leitura, as expressões
escrita e oral, o cálculo e a solução de problemas. A outra de caráter substantivo, os seus
conteúdos básicos: conhecimentos, habilidades, valores, atitudes. Essa perspectiva é
retomada na V CONFINTEA, aplicando-se ao campo da Educação de Jovens e Adultos.
Decorre dessa perspectiva de atendimento educativo a compreensão de que
para os jovens e adultos que buscam os espaços de aprendizagem na modalidade da
EJA,
A alfabetização é tarefe inadiável, mas, não é suficiente, nem pode
satisfazer aos que há mais de uma década defendem o cumprimento da
educação básica para todos, assim como a perspectiva da educação
continuada, traduzida pelo aprender por toda a vida, exigência e
necessidade da sociedade contemporânea (V ENEJA, 2003).

E o processo de aprender por toda a vida, para além da alfabetização e da
pós-alfabetização, “será mais eficaz quando possibilita aos educandos o acesso a
conhecimentos fundamentais ao campo em que se formam e os desafiem a construir
uma compreensão crítica de sua presença no mundo” (FREIRE, 2000, p. 92).
Nos seus depoimentos, os docentes situam constantemente o fato de seus
alunos adultos estarem ligados ao mundo do trabalho. A análise dessas falas permite
inferir que estão conscientes que seus alunos querem porque querem aprender logo a
ler, tem vontade devido à necessidade, pois, o mercado tá cobrando a saída dele porque

98
ele não tem a qualificação necessária, além disso, quer tirar a carteira, quer conseguir
um emprego, [...].
Em relação ao desejo de aprender a ler dos alunos, devido à necessidade,
seja porque o mercado tá cobrando a saída dele ou para conseguir um emprego, o
grupo expressa uma compreensão solidária e justifica a prioridade no atendimento desse
desejo a partir dos seguintes fragmentos:
um senhor de 60 anos que [...] quer porque quer tirar a carteira de
motorista [...], aí, quando chegou lá, o rapaz disse: volte pra escola.

quantos a gente não ouve dizer: professora, eu perdi meu
emprego porque eu não tenho instrução, eu não sei ler [...].
Aprofundando ainda mais a discussão, buscamos apreender como os
professores percebem as atitudes dos alunos frente ao desejo de aprender. As respostas a
essa questão indicam um movimento dos alunos para a aprendizagem:
vão pra escola em busca da teoria, do conhecimento, [...] da
vontade de querer mais e mais.
vem naquela empolgação, faz algumas coisinhas e diz:
professora eu to muito cansado, será que eu posso ir embora?
Apontamos nessas falas que os professores reconhecem a empolgação
inicial do aluno, ou seja, ele chega à sala de aula movido pelo desejo de aprender; faz
um movimento para prover condições para o ato de conhecer, satisfazer a vontade de
saber mais e mais, como ação de “mobilização para”, de diálogo no sentido da
desmitificação da própria imagem de desvalorização de si mesmos, na sua própria
relação com o processo de aprendizagem desse saber. O provimento dessas condições
pode viabilizar uma outra relação com o saber. Eles chegam empolgados, mobilizados
porque percebem sentidos e significados nessas atividades para satisfazer necessidades.
Conforme Charlot (2000, p. 55), “mobilizar-se é também engajar-se em uma atividade
originada por móbiles, porque existem “boas razões” para “fazê-lo” (CHARLOT, 2000,
p.55).
Por sua vez, as atividades propostas pela escola precisam propiciar situações
de aprendizagem, relações dialógicas com o saber, de modo a confrontar os jovens e
adultos com suas necessidades de aprender e a presença de “saber” no mundo
(CHARLOT, 2000). É com esse olhar que Freire (1981, 1986, 1987, 1989, entre outros)

99
destaca a relevância da postura política do educador, ou seja, no momento em que o
conhecimento é resultante de apropriações sociais torna-se um objeto político, cujas
funções, que englobam a apreensão da realidade, integram a de exercer ação sobre esta
realidade e sobre o sujeito epistêmico que adquire os conhecimentos em integração com
a realidade e o próprio objeto conhecido.
Dito isto, o grande desafio que se apresenta para o grupo de docentes é o de
romper com a lógica de propostas de atividades como sendo o trabalho de fazer algumas
coisinhas, cujo termo carrega, implicitamente, a idéia de minimização e irrelevância da
tarefa e dos conteúdos. É desse modo que se tem visto surgir em todo o país, ao longo
de sua história, várias iniciativas que logo sucumbem, fato que nos leva a crer na
inadequação destas propostas ao seu público alvo, o que já foi objeto de reflexão de
muitos educadores, com destaque para as críticas apresentadas pelo pernambucano
Paulo Freire no Congresso de 1958.
Nesse sentido, é que Freire propõe uma educação centrada na dialogicidade,
na troca, na descoberta de si e do mundo, na tomada de consciência da dominação que
determina o lugar que ocupará cada elemento da sociedade, quem fará sucesso, quem
não o fará. Sobretudo os educadores precisam estar conscientes que o papel político de
sua ação pedagógica pode fazer a diferença quando do fortalecimento do aluno em sua
vontade de querer mais e mais aprender por toda a vida; ou da legitimação da escola
como um lugar estranho que não corresponde a essas expectativas, produzindo,
freqüentemente, estados de frustração e desânimo, razão pela qual se pode perguntar:
será que eu posso ir embora?
Concordamos com Fernandes (2002) quando diz que os professores, ao
construírem uma representação negativa dos seus alunos, também constroem,
conseqüentemente, uma expectativa negativa em relação ao sucesso destes. Por sua vez,
os alunos,
De tanto ouvirem de si mesmos que são incapazes, que não sabem
nada, que não podem saber, que são enfermos, indolentes, que não
produzem em virtude de tudo isto, terminam por se convencer de sua
‘incapacidade’[...]. Os critérios de saber que lhe são impostos são os
convencionais (FREIRE, 1975, p. 54).

Decorre daí, a importância de se compreender que o educando que está na
EJA tem o conhecimento, ele tem a prática; não negar a importância da questão do
certificado e ele precisa ter isso [...], mas, sobretudo propor atividades concebendo-as
como

100
um processo de busca, de criação, em que [...] são desafiados a
perceber a significação profunda da linguagem e da palavra. Os
alfabetizandos necessitam perceber a necessidade de um outro
aprendizado: o de escrever a sua vida, o de ler a sua realidade, o que
não será possível se não tomam a história nas mãos para, fazendo-a,
serem feitos e refeitos (FREIRE, 1976, p. 16).

A reflexão sobre os aspectos apontados pelos docentes nos encaminha a
pensar elementos importantes no processo de escolarização de jovens e adultos. Os
professores expressam, implicitamente, a compreensão de que a EJA é um
processo/espaço cuja preocupação deve ser ensinar a ler porque esse é o desejo dos
alunos e no caso do adulto, ele já tem um foco de vida e a gente tem de direcionar as
atividades para aquilo; uma vez que os alunos já sabem o que querem e, [...] sempre
vejo eles com a personalidade formada, e não faz sentido enfiar muito conteúdo no
jovem e adulto porque essa realidade não condiz com eles; os jovens e adultos têm mais
empolgação para ler mesmo; de modo que o professor tem de estar preparado pra
fazer com que ele permaneça nessa vontade, porque, você sabe: qualquer coisa tira a
vontade deles.
Das observações feitas pelo grupo, aquela que recomenda não enfiar muito
conteúdo no jovem e adulto parece indicar que existe um desinteresse intrínseco ou
limitação da capacidade de aprendizagem desses/nesses alunos. Outra possibilidade de
interpretação é dizer que, por se tratar de alunos adultos, os professores podem concluir
que já não há mais tempo para aprender aqueles conteúdos que são trabalhados nas
classes de crianças e adolescentes. Tanto numa quanto na outra, é possível inferir que
parte de uma concepção bancária de educação, para a qual os muitos conteúdos são
enfiados. Parte, também de uma visão social conservadora, na media em que os
conteúdos propostos devem estar conformados ao contexto sócio-cultural, condizer com
a realidade dos alunos e não a partir dela, para nela interferir. Isso implica limitar o
direito de ser e de se saber mais [...], na medida em que [porque] não aprenderam
enquanto eram crianças, não têm mais nem chance, nem capacidade para verem
concretizado esse sonho. Ou esse direito? (CAMPELLO, 1990, p. 35).
A discussão realizada nesta parte do trabalho perseguiu a compreensão do
olhar do professor de EJA para seus alunos a partir da reflexão acerca das motivações
destes ao retornarem aos espaços escolares. As visões possibilitadas pela análise, em
desencontro com as orientações de referência, focalizam a EJA, predominantemente,
pela perspectiva da alfabetização, no sentido da aquisição dos rudimentos da leitura e da

101
escrita. Sobre este aspecto, a Declaração de Jomtien (1990) entendeu a alfabetização de
Jovens e Adultos como a primeira etapa da Educação Básica, consagrando a idéia de
que a alfabetização não pode ser separada da pós-alfabetização. Por sua vez, a LDB de
1996 ampliou o alcance da EJA ao entendê-la como a forma adequada de que se
revestirá a educação básica ao ser oferecida a todas as pessoas não escolarizadas,
independente da idade. Também, de acordo com o Parecer CNE/CEB 11/2000, quando
um aluno entra em um curso de Educação de Jovens e Adultos, não estará apenas sendo
alfabetizado, porque isso é muito pouco para o conteúdo do direito à educação. Ainda, a
Declaração de Hamburgo (1997) traduziu a EJA como “educação ao longo da vida”. Na
perspectiva da educação permanente, a alfabetização é apenas o início do processo. O
conceito de educação como aprendizagem ao longo da vida vem sendo consolidado, assim como o direito de aprender, visto como “indispensável à própria sobrevivência da
humanidade” (VIEIRA, 2008, p. 17).
Em relação aos alunos, ressaltamos a importância de estes serem
visualizados como titulares de um direito público subjetivo, podendo lançar mão de
instrumentos legais para fazer valer esse direito. Identificamos através das vozes dos
professores que os alunos atitudes dos alunos que expressam um movimento para a
aprendizagem, permitindo a inferência de haver uma consciência embrionária do direito
a aprender por toda a vida. Quanto à oferta dos conteúdos na EJA, diferentemente do
posicionamento dos professores, a Declaração de Hamburgo, em seu artigo II, destaca
que “a educação ao longo da vida implica repensar o conteúdo que reflita certos fatores
como idade, igualdade entre os sexos, necessidades especiais, idioma, cultura e disparidades econômicas”, tornando-se fundamental para o exercício da cidadania e para o
processo de inclusão social.
O enfrentamento das questões educacionais relativas ao aluno da EJA, sua
inclusão e seu sucesso na cultura letrada, não encontram eco na realidade que é
vivenciada dentro das escolas. Há um estranhamento histórico, político, científico e
cultural que impede a inclusão e a utilização da escola como espaço de emancipação e
construção de alternativas para a problemática social da injustiça e da desigualdade.
Impede, sobretudo, que se pense a alfabetização e a escolarização na idade juvenil e
adulta como possibilidade de recriação e de potencialização de práticas já desenvolvidas
por esses sujeitos sociais que há muito tempo convivem em sua cultura com outras
alternativas e estratégias de sobrevivência na vida diária e no trabalho.

102
2.9 Os Professores e suas Estratégias para o Trabalho nas Salas de EJA
Um aspecto fundamental indicado por esta pesquisa refere-se ao modo
como os educadores de EJA estabelecem aproximações com o contexto da EJA e
constroem alternativas para lidar com os diferentes níveis de conhecimento e de ritmos
de aprendizagem no espaço da aula. Esses elementos foram evidenciados logo nos
primeiros minutos de interações com/dos professores no grupo focal, ao declararem:
Tenho uma afinidade muito grande com a Educação de Jovens e
Adultos.
A minha monografia na pós foi em cima da Educação de Jovens
e Adultos do Município. Meu mestrado... eu pretendo fazer
também na área de Educação de Jovens e Adultos.
Na seqüência expressam o desejo de se dedicarem exclusivamente ao
trabalho com turmas de EJA, o que é compartilhado por todos:
[...] seria interessante se pudesse ser 20h em sala de aula e 20h
de planejamento, só que essa realidade a gente almeja, mas
ainda não é.
[...] a gente devia trabalhar só numa modalidade, mas não é
isso o que acontece, porque com carga horária de 40 horas
semanais, acaba trabalhando com crianças ou com
adolescentes e com adulto.
A extensa jornada de trabalho dos professores implicando em atuações nos
diferentes níveis da educação básica tem sido tema de debates em encontros de
formação da área. O que se coloca, em linhas gerais é que, após um dia de trabalho os
professores chegam para mais um turno nas turmas de EJA, geralmente no noturno, e
desenvolvem propostas didáticas adaptadas do diurno. Esse quadro expõe também, as
condições de sobrevivência a que estão submetidos os professores, revelando as
condições objetivas da relação com o mundo do trabalho que aproxima o profissional
professor e do aluno trabalhador.
Ao responderem sobre as leituras e as metodologias norteadoras das suas
práticas em EJA, os docentes citam “o método Paulo Freire, por ser referência na
educação de adultos” e “a psicolingüística de Emília Ferreiro, por ajudar a entender o
processo de alfabetização”. Esse dado revela uma aproximação teórica entre Proposta
Pedagógica de EJA do município e a informada pelo grupo.

103
Ressaltamos, nesse ponto, que a referência a Paulo Freire limitou-se aos
aspectos

metodológico-práticos

freqüentemente

apontados

por

docentes

para

exemplificar procedimentos usuais no trabalho com adultos, tais como: “trabalhar a
realidade”, “temas geradores”, entre outros. Percebemos que esses discursos são
corriqueiros nos espaços educativos da EJA, contudo, nem sempre evidenciam a
dimensão político-pedagógica defendida pelo educador Paulo Freire, sem a qual,
funcionam como jargões pedagógicos, repetidos por quem lida com pessoas das classes
populares.
Neste momento, – conforme aventamos no capítulo metodológico deste
estudo – julgamos pertinente tecer considerações sobre conflitos epistemológicos entre
Freire e Ferreiro, uma vez que foram citados como referencias, na Proposta e pelos
professores, e, assim sendo, figuram como arcabouço teórico-conceitual das visões de
EJA do contexto investigado.
De acordo com Moura (2004), existe um distanciamento entre Freire e
Ferreiro quanto ao objeto de estudo da alfabetização. Embora ambos concebam a
alfabetização de adultos como ato de conhecimento, Freire amplia esta visão dando
mais prevalência ao aspecto político da alfabetização; além disso, distanciam-se
completamente no que se refere à concepção de conhecimento. Enquanto Ferreiro
entende que
a essência de toda mudança de comportamento, de todo
desenvolvimento psicológico e gnosiológico do sujeito está na relação
que ele estabelece com o conhecimento científico construído pela
humanidade ao longo de sua evolução histórica [...] (MOURA, 2004,
p. 182),

Freire, por sua vez, afirma que
todo conhecimento antes de ser científico foi um conhecimento da
‘experiência feita’, nenhum conhecimento nasceu sistematizado
epistemologicamente, mas foi antes de tudo experiências vivenciadas
pelos sujeitos, ‘molhados de curiosidades ingênua’ [...] (MOURA,
2004, p. 183).

Ao analisar as concepções de conhecimento em Freire e Ferreiro, Moura
(2004, p. 182) esclarece que o entendimento de Ferreiro é “que somente através dos
conhecimentos científicos é possível rever e reformular os conhecimentos espontâneos”.
Nessa perspectiva, o processo educativo deve primar pela formação dos conhecimentos

104
científicos; deve “partir não do conhecimento espontâneo [...], mas daqueles
conhecimentos que [o aluno] ainda não possui”.
Assim, uma implicação prática da concepção de Ferreiro para a
alfabetização de jovens e adultos é levantada por Moura (2004, p. 182) da seguinte
forma:

se o conhecimento que os adultos analfabetos não têm é o sistema de
linguagem escrita, cabe ao alfabetizador trabalhar esses
conhecimentos com eles, iniciando o processo de alfabetização pela
própria história da construção da escrita ao longo do processo
histórico (grifo nosso).

Comparativamente, a concepção de conhecimento em Freire implica fazer
um percurso diferente, ou seja, iniciar o processo de aprendizagem a partir do
conhecimento espontâneo para elevar-se ao conhecimento científico. Assim, no
processo de alfabetização de jovens e adultos, o ponto de partida para a formação dos
conhecimentos científicos é o conhecimento da realidade dos alfabetizandos e,
paulatinamente, ajudá-los na caminhada em direção ao conhecimento da linguagem
escrita (MOURA, 2004).
Ao trazermos à tona divergências epistemológicas entre Freire e Ferreiro,
não pretendemos com isso criar um embate de idéias que se excluem mutuamente ou
mesmo defender posição preferencial, mas, tão somente demarcar o lugar de onde se
fala quando se formulam propostas educativas que considerem os sujeitos das classes
populares com trajetórias escolares marcadas pelo insucesso, quer seja na entrada ou na
continuidade dos estudos. No trabalho pedagógico com o aluno da EJA o professor
precisa ter clareza do por onde começar e esta decisão sofre influência da sua
concepção de sujeito a quem deseja ajudar a educar-se (FREIRE, 1980).
Como contribuição para o debate sobre por onde iniciar o trabalho com
jovens e adultos, Pinto (1986, p. 73) encaminha a seguinte proposta:
O ponto de partida do processo formal da instrução não é a ignorância
do educando e sim, ao contrário, aquilo que ele sabe, a diferença de
procedimento pedagógico se origina da diferença no acervo cultural
que possuem a criança e o adulto no momento em que começam a ser
instruídos na escola. A distinção de idades se traduz pela distinção da
experiência acumulada, ou seja, de educação informal [...].

Concordamos com Moura (2004), quando ressalta que Freire e Ferreiro
compartilham as mesmas preocupações acerca das questões nodais da América Latina,

105
com destaque para os altos índices de analfabetismo, numa expressão da pobreza que
revela a face sombria de uma estrutura social desigual. Dessa forma, de acordo com
Moura (2004, p. 187), os dois se aproximam
quando defendem uma educação comprometida pedagógica e
politicamente com as classes populares ou com “a classe baixa”
(Ferreiro). Essa educação deve ser proporcionada através de uma
“prática pedagógica libertadora” (Freire) de uma “prática
alfabetizadora de qualidade” (Ferreiro) [...]. Essa prática pedagógica
deve ser assegurada através da atuação de um alfabetizador
competente, um “agente político” (Freire), [...].

Fica claro que nas idéias convergentes entre os dois autores Freire e Ferreiro
há um elemento central: o educando das classes populares que, por serem
“inconclusos”, são também sujeitos de direito à educação ao longo da vida. Por isso
mesmo, um dos aspectos mais importantes quando se discute o direito de todos à
educação permanente é o estilo de planejamento do processo formativo. De um modo
geral a oferta educativa parte de padrões únicos, os mesmos parâmetros da educação
escolar de crianças e adolescentes. Essa concepção de currículo padronizado e adaptável
se evidencia, também, nas falas dos professores ao explicarem o processo de
organização e seleção de conteúdos no processo de ensino e aprendizagem da EJA:
É o mesmo conteúdo, a grade curricular é a mesma, só que eu tenho
de adaptar o conteúdo às dificuldades que eles têm [...]. Eu não posso
aprofundar o conteúdo como se faz no ensino regular.
O mesmo conteúdo só que você não pode se aprofundar muito, porque
a dificuldade é grande, seria essa a diferença, mas os conteúdos são
os mesmos.
Se o conteúdo é muito extenso você tem que enxugar um pouquinho
[...].

Ao tratar desta questão, Di Pierro (2008), chama a atenção sobre a
polêmica que envolve a questão do currículo nas políticas de formação de jovens e
adultos, a partir do novo paradigma de educação continuada. Entretanto, a autora afirma
que numa revisão da literatura é possível encontrar algumas indicações mais ou menos
consensuais sobre os conteúdos a serem validados:
Os conteúdos propostos para a formação [devem valorizar] sobretudo
a horizontalidade do vínculo pedagógico, a comunicação
intersubjetiva e o reconhecimento multicultural. [...] há consenso de
que os currículos da educação de jovens e adultos necessitam
incorporar certos desafios éticos, políticos ou práticos da vida social

106
contemporânea, relacionados ao exercício da moderna cidadania. (p.
74, 75)

A análise dos discursos produzidos pelas professoras evidencia uma visão
do aluno adulto como portadores de dificuldade de aprendizagem, inferiores
intelectualmente. Podemos inferir, então, que, para ensinar os conteúdos padronizados
pela escola a alunos com “limitações” cognitivas, as docentes lançam mão de recursos
didáticos para “adaptar o conteúdo às dificuldades que eles têm [sem] aprofundar o
conteúdo como se faz no ensino regular”. Agindo dessa forma acreditam que estão
satisfazendo “as necessidades que eles têm”. Todavia, o argumento do respeito às
diferenças, parece legitimar as desigualdades e silenciar as especificidades.
Do exposto, ressaltamos a importância do professor da EJA conceber o
direito à educação de todos a partir do reconhecimento que o aluno trabalhador
necessita apropriar-se de saberes socialmente construídos e superar o estado de
ignorância relativa, que não se trata de uma deficiência individual, conforme explicita
Pinto (1986, p. 82):
O estado de ignorância relativa no qual se encontra é um índice social.
Revela apenas as condições exteriores da existência humana e os
efeitos destas circunstâncias sobre o ser do homem. Não significa que
se trate de indivíduos mal dotados, de preguiçosos, de rebeldes dos
estímulos coletivos, em suma, de atrasados.

Para tanto, uma questão fundamental se impõe: a constituição da docência
na Educação de Jovens e Adultos. De acordo com a política de EJA no contexto
investigado, a composição do quadro docente para a modalidade segue as orientações
preceituais do Parecer CNE/CEB 11/2000 e, descrevem um professor habilitado e
capacitado, pertencente ao quadro funcional de ensino da Prefeitura, que, informado e
participante da implantação do curso fizeram a sua opção, assumindo a proposta da
Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.
Sobre a referida “opção" pela modalidade, os professores entrevistados são
da opinião que muitos estão na EJA “[...] não porque querem trabalhar com jovens e
adultos, no interesse de ver essa realidade... não é por querer... já é pra se livrar das
crianças que são bem danadas”.
Nessas falas há indícios de que o motivo das ”escolhas” pelo trabalho em
EJA tomam a idade adulta como critério por representar uma alternativa de trabalho em
que pesam questões de indisciplina das crianças que são bem danadas. Portanto, tais

107
escolhas são orientadas pela idéia de “ser mais fácil” o manejo da sala de EJA. Neste
caso, a diferença da EJA em relação à escolarização de crianças e adolescentes remete
apenas a questão de especificidade etária, silenciando-se a especificidade sóciohistórico-cultural.
A situação denunciada pelo grupo é indicativa da necessidade de que sejam
repensados processos de formação de professores de EJA, (a exemplo dos que
desenvolvemos como professora universitária e em projetos de extensão) a fim de que
esforços sejam demandados para o abandono da idéia de que qualquer pessoa pode ser
educador de jovens e adultos pelo simples fato de estar trabalhando em sala de EJA.
Na opinião dos sujeitos pesquisados é preciso
tentar capacitar o máximo possível essas pessoas [os professores]
para, dentro dos objetivos da EJA, numa percepção mais apropriada
para aquela modalidade, a cada momento, as pessoas [os
professores] poderem ser e sentir mais firmeza”.

Ainda foi possível verificar através dos diálogos a existência de professores
tidos como sem “aptidão” para o trabalho na EJA. Por outro lado, os docentes
reconhecem haver um grupo de pessoas [professores] interessadas na EJA... que tem
paixão... porque eu acho que a gente tem de fazer educação por paixão [...].
Tomar a “paixão” como a expressão do interesse pela EJA, denota uma
compreensão romântica de educação. Nesse entendimento, são silenciadas as dimensões
técnica e política, inerentes ao processo. O discurso da “paixão”, da “satisfação
pessoal”, vocação e outros adjetivos do gênero é freqüentemente veiculado por
professores que mantêm posições do senso comum acerca trabalho docente, sobretudo
na EJA. Tais visões carecem problematizar a profissionalização docente, cujo tema deve
integrar o elenco de questões a serem debatidas em processos formativos de professores,
de modo que, não devemos continuar improvisando educadores de EJA (MOURA,
2001) nem conceber professores que não se questionem sobre as razões subjacentes às
suas decisões educativas (ALARCÃO, 2001).

108

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fazendo uma retrospectiva do percurso inicial até a chegada ao final deste
estudo, revelamos que as nossas experiências em projetos e processos formativos de
professores da EJA no município de Paulo Afonso, fizeram emergir a necessidade de
problematizar a prática pedagógica desses contextos. A idéia que permaneceu firme foi
o desejo de conhecermos as concepções de EJA que orientam as práticas dos
professores desse modo de ensino, reconhecendo tais práticas como um espaço de
produção de saberes na medida em que são constituídos no exercício da prática
cotidiana da profissão e a ela constitui (TARDIF et al, 1991).
Assim, os conceitos e referências foram surgindo e se afirmando à medida
que nos aprofundávamos nos estudos e quando decidimos deter nosso olhar, de forma
precisa, para um foco específico. Dessa caminhada, certezas e incertezas surgem, e
saídas são definidas e redefinidas. Das certezas, sobreviveu o primeiro desafio a ser
enfrentado: categorizar as concepções de EJA mobilizadas pelos professores, visto que é
um campo de estudo com poucas pesquisas no Brasil.
Procuramos, então, perceber as concepções dos professores a partir dos
conteúdos implícitos e explícitos nas falas dos docentes, com base nos pressupostos
teóricos de Moron e Brito (2001); Canavarro (1994) e Ponte (1992) que a definiram
como o conjunto de posicionamentos que o professor possui, acerca dos saberes
científicos, disciplinares e pedagógicos referentes à sua prática profissional e, por via de
conseqüência, referentes à sua disciplina. E, naturalmente, inclui-se nesta definição o
modelo metodológico particular que cada professor emprega na condução de suas aulas,
enfim, na sua prática pedagógica. Essa visão permite uma aproximação concreta com a
experiência educativa docente e, além disso, evidencia como se manifesta essa
experiência nas práticas escolares reflexivas desse profissional.
O foco desta pesquisa não se dirigiu a formação dos docentes da EJA,
porém, dela não se desviou posto que colocou em relevo perspectivas teóricometodológicas

envolvidas

nas

práticas

dos

professores

dessa

modalidade,

problematizando os saberes experenciais que “são saberes que brotam da experiência e
são por ela validados. Incorporam-se à vivência individual e coletiva sob a forma de
habitus e de habilidades, de saber fazer e de saber ser” (TARDIF et al, 1991, p. 220).
Portanto, o aspecto da formação dos professores da EJA, neste estudo, foi delimitado
pela possibilidade de a prática docente ser tomada como espaço de problematização e

109
mobilização de saberes que incluem visões de mundo, de educação, do aluno jovem e
adulto, das motivações e interesses na área; numa perspectiva de ação-reflexão sobre a
prática, na medida em que formar professor implica, também, orientá-lo a pensar, falar e
submeter sua prática à crítica.
O instrumento de coleta utilizado por nós neste trabalho, – o grupo focal –
possibilitou fazer emergir o modo como os professores compreendem a EJA, como a
definem e como suas idéias e opiniões se encontram associadas a esta modalidade. Uma
das principais contribuições do estudo das concepções dos professores é o momento da
descoberta, do levantamento e da discussão dos sentidos atribuídos por estes sujeitos
aos seus fazeres cotidianos, o que poderá ser de grande valia para pensarmos processos
de formação continuada pela reflexão da prática, em que as vozes dos professores são
consideradas e respeitadas.
Temos consciência clara que, por ser um estudo sobre concepções dos
professores, os achados dessa pesquisa não são construções permanentes, são variáveis,
seja pela sua condição processual, seja pela sua condição temporal, não obstante, os
resultados deste estudo corroboraram com nossas expectativas.
A síntese a seguir compreende o que foi possível apreender da pesquisa.
Focalizamos um ponto de vista, mas reconhecemos que, sobre o estudo, poderão
vislumbrar-se outros olhares. Essa é a síntese possível do nosso olhar e do nosso
caminho percorrido.
Este estudo nos permitiu aprofundar conhecimentos no campo da EJA
através de uma abordagem história dos seus conceitos, buscando entender sua
complexidade, enquanto área de estudo, suas configurações e elementos constitutivos
peculiares, no Brasil República, sobretudo nas décadas de 1940 a 1990.
Penetrando ainda mais na literatura, direcionamos nosso olhar para as ações
pedagógicas na EJA e as visões de educação, homem e sociedade que as sustentam.
Assim, procuramos refletir sobre objetivos, as estratégias que tendem a superficializar a
EJA e as relações destas com o modo de ver dos professores, por considerarmos que a
forma como agimos sempre está relacionada a determinadas teorias ou visões de
mundo.
No caminhar da história da formação de jovens e adultos, está subjacente a
relação que existe entre os diversos momentos políticos, econômicos e sociais e as
diversas concepções do que seja esse processo educativo. Assim sendo, são relatadas a
seguir reflexões derivadas e formuladas a partir deste estudo. Teceremos reflexões mais

110
gerais sobre as concepções que configuraram a educação de jovens e adultos no período
delimitado, e, na seqüência, delinearemos as concepções dos professores dessa
modalidade na rede de ensino municipal de Paulo Afonso.
Na esteira deste trabalho, evidenciaram-se três categorias de análise:
conceitos e sentidos da EJA, o aluno jovem e adulto e as mediações didáticas na EJA,
sobre as quais teceremos algumas considerações.
Os dizeres dos professores possibilitaram a compreensão do quanto é
imprescindível discutir um referencial próprio para a EJA, rompendo tanto com a lógica
da adaptação do aluno a uma escola não projetada para ele, quanto com a lógica da
suplência, de recuperação rápida nos moldes do supletivo. Parece urgente no contexto
pesquisado, instaurar, ainda, um amplo processo de avaliação sobre o que é realizado,
fazendo-se indispensável superar concepções que por muito tempo aprisionaram a
educação de jovens e adultos aos limites do ensino supletivo, como recuperação de um
tempo perdido.
Uma das grandes questões que se apresenta nas falas dos professores é a
idéia de que a EJA se diferencia das outras modalidades pelas “falta” ou “carências”, o
que contribui de um modo geral para pensá-la como educação qualitativamente inferior,
em currículos, tempos e não raro, em seu público. É preciso compreender e admitir a
possibilidade de existência de outros saberes, outras alternativas e estratégias, outras
linguagens capazes de registrar e divulgar a expressão criativa de um determinado grupo
social de direito.
Outra questão a ser enfrentada diz respeito à desconstrução do imaginário
social desse grupo, que implicitamente responsabilizam seus alunos pela falta de
oportunidades escolares, sem o reconhecimento da ideologia imposta pelo sistema
capitalista que os fazem acreditar que essa culpa remete apenas ao indivíduo e não ao
social.
As análises dos dizeres também evidenciam o estabelecimento de uma
relação direta entre educação e a garantia de uma vida melhor, tentando atribuir à escola
um poder que ela efetivamente não tem: de ser a solução definitiva para os problemas
da humanidade, e em especial das classes trabalhadoras. Naturalmente, as falas dos
professores decorrem das queixas dos alunos em relação às pressões demandadas pelo
mercado de trabalho e pelos critérios de uma sociedade onde o saber letrado é altamente
valorizado. Entretanto, ainda que a educação, por si só, tivesse o poder de facilitar o
ingresso no mercado de trabalho, ela não garantiria o emprego, dada a dinâmica

111
capitalista deste mercado que vê a capacidade de trabalho como uma mercadoria
flutuante. Assinalamos, portanto, que em lugar de reduzir a EJA à mera preparação para
o mercado de trabalho, é possível avançar em direção a uma concepção mais ampla, que
considere, entre outros aspectos, a dimensão da emancipação humana.
Se a EJA acena com a possibilidade de extensão da educação escolar a todas
as classes, o momento que se avizinha é de um embate no intuito de refutar uma escola
limitada, precária, fragmentada e aligeirada. Devemos lutar para conquistar uma escola
que “compense” o prejuízo do descaso histórico do sistema educacional, o que só é
possível através de uma educação que aproxime o educando do “processo formador da
vida e do conhecimento, do trabalho e das técnicas produtivas, e onde se atinja a
liberdade pessoal que passe pela coletividade” (ARROYO, 1998, p. 143).
Além disso, é preciso romper com a idéia de educação compensatória que
prevaleceu por muitos anos. A EJA deve deixar de ser restringida à compensação da
educação básica, não adquirida no passado, para responder às múltiplas necessidades
formativas que os indivíduos têm no presente e terão no futuro. É necessário que o
professor conheça a especificidade do seu público, a dimensão da educação na fase
particular da vida adulta. A EJA deve ser pensada para o jovem e o adulto. Significa
dizer não infantilização e superação de práticas educativas desqualificadoras das
potencialidades dos educandos. É necessário, ainda, lembrar que a EJA não se resume à
aquisição do código escolar; ela vai mais além. Os sujeitos da prática devem ser
compreendidos como sujeitos sociais, ativos e autônomos.
A investigação remete também ao anúncio da concepção de EJA restrita ao
ensino e aprendizagem da leitura e escrita. Uma a abordagem mais aprofundada dessa
questão requer o olhar específico em torno das concepções de alfabetização, aspecto não
contemplado nesta pesquisa, dada a abrangência do seu objeto de estudo. Tendo em
vista a possibilidade de outros olhares sobre esse aspecto, apontamos para a necessidade
da escola de jovens e adultos realizar uma reflexão sobre o verdadeiro valor da leitura e
da escrita numa sociedade que está totalmente permeada por elas e permanece incólume
aos problemas da violência, intolerância, fome, miséria, entre outros. Para além do lugar
da alfabetização jovens e adultos, no sentido de ensinar a ler e escrever, a EJA precisa
ser um espaço de fortalecimento de um grupo social que tem sido alvo da exclusão, do
preconceito e, principalmente, de uma política de negação dos direitos.
Ressaltamos, assim, que o reconhecimento da EJA como a efetivação de um
direito público subjetivo exige repensar gestos, normas, regras, currículos, maneiras de

112
agir e de pensar no espaço escolar, entre outros. Compreender que todo trabalho
pedagógico com jovens e adultos deve partir do universo cultural em que se inscrevem
as frações da classe trabalhadora que convergem para a escola. Tomar a cultura, e as
formas de compreensão do mundo dos educandos como ponto de partida (reconhecer,
incorporar, ampliar).
Uma constatação relevante na pesquisa é que apesar de em diversos
momentos, eventos e debates, seja enfatizado a necessidade de se conhecer e de se fazer
conhecido os fundamentos da EJA (históricos, legais, pedagógicos, etc.) percebemos
que, na prática, com algumas exceções, essa necessidade não é atendida. O fato dos
docentes não conhecerem a trajetória histórica, os objetivos, os sujeitos e a relação da
alfabetização e do letramento com esta modalidade de ensino, favorece a manutenção de
ações pedagógicas baseada em concepções que o curso da história já alterou, pelo
menos no plano das intenções e princípios. É importante deixar claro que não estamos
generalizando, pois, a investigação incidiu sobre uma de oito professores do ensino
fundamental de um determinado contexto, mas cremos que esta situação pode ser
reflexo do que vem ocorrendo em vários outros locais.
Os avanços nos conceitos e sentidos da EJA, nos princípios legais e
orientações de referência para a área, devem estar coadunados com as práticas de gestão
e pedagógicas nas espaços da EJA. Não podemos deixar de considerar que a educação
de jovens e adultos se situa no debate ético-político da exclusão social e na luta pela
educação pública e gratuita para todos, com um ensino de boa qualidade e democrático.
A EJA reivindica a clareza de uma concepção de educação que não se vê neutra. Mesmo
sem descuidar da preparação técnico-profissional dos grupos populares, não aceita a
posição de neutralidade política, acolhe esta demanda social excluída, almeja algo mais
que a certificação. Almeja, então, algo mais para seus partícipes.
Ao encerrar, é preciso lembrar que numa visão prospectiva de educação
mais digna e que perceba o ser humano em sua totalidade de crescimento ao longo da
vida, cabe a cada educador, também como ser humano em desenvolvimento constante,
buscar sua formação continuada, para não representar no palco da vida escolar, modelos
não mais aceitos em qualquer instância educativa.

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120
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121

ANEXO

122
GUIA TEMÁTICO GRUPO FOCAL

- O que você entende por Educação de Jovens e Adultos?
- O que já leu sobre EJA?
- Onde você leu sobre EJA?
- Como é sua prática de ensino?
- A quem se destina a EJA?
- Quem são os alunos da EJA?
- O que buscam os alunos da EJA?
- Quais as possibilidades de melhoria na formação dos professores?
- Qual é o objetivo da EJA?
- Que contribuição efetiva a EJA dá a vida dos alunos?
- O que diferencia a EJA da educação dita “regular”?
- Quais as diferenciações em termos de conteúdos trabalhados?
- Quais as diferenciações em termos de metodologias empregadas?