Abdizia Maria Alves Barros
Título da dissertação: "A formação das professoras que alfabetizam Jovens e adultos: uma demanda (re)velada".
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Abdizia Maria Alves Barros
A FORMAÇÃO DAS PROFESSORAS QUE ALFABETIZAM JOVENS E ADULTOS:
uma demanda (re) velada
Maceió, 2003
Abdizia Maria Alves Barros
A FORMAÇÃO DAS PROFESORAS QUE ALFABETIZAM JOVENS E ADULTOS:
uma demanda (re) velada
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-GraduaçãoMestrado em Educação Brasileira da Universidade
Federal de Alagoas, como requisito parcial à obtenção do
título de Mestre em Educação, sob a orientação da Profª.
Drª. Tânia Maria de Melo Moura.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS – UFAL
CENTRO DE EDUCAÇÃO – CEDU
MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Maceió, 2003
Banca Examinadora
____________________________________
Profª. Drª. Tânia Maria de Melo Moura
Universidade Federal de Alagoas
Orientadora
_________________________________________
Prof. Dr. Timothy Ireland
Universidade Federal da Paraíba
Examinador
_________________________________________
Profª. Drª. Maisa Gomes Brandão Kullok
Universidade Federal de Alagoas
Examinadora
DEDICATÓRIA
Aos meus pais Antonio e Terezinha (em memória),
pelos sacrifícios e renúncias para que
chegássemos à escola.
Á Professora Doutora Tânia Maria de Melo Moura,
pelo trabalho e luta incansáveis em favor da educação
de jovens e adultos no Estado de Alagoas.
AGRADECIMENTOS
Às companheiras professoras alfabetizadoras da educação de jovens e adultos da rede pública
estadual e municipal da cidade de Maceió, protagonistas desta caminhada pela grande
contribuição. Sem elas esta pesquisa não se concretizaria.
Às coordenadoras dos cursos de Pedagogia do CESMAC, FUNESA, UFAL e do Ensino
Médio Modalidade Normal da SEE, pela acolhida, disponibilidade e valiosíssima
colaboração.
Às Equipes de Coordenação Pedagógica de Educação de Jovens e Adultos, da Secretaria
Executiva de Educação do Estado – SEE e da Secretaria Municipal de Educação DEJA –
SEMED, especialmente a Profª. Silvia Costa, pelas importantes informações, contribuindo
significativamente para a construção deste trabalho.
Aos professores que estiveram na Banca de Qualificação: Profª. Drª. Maisa Gomes Brandão
Kullok e Prof. Dr. Timothy Ireland, pelas valiosas contribuições que nos permitiram um novo
olhar para o trabalho e para nossa vida pessoal e profissional.
À Profª. Drª. Tânia Moura, pela competente orientação e constante acompanhamento,
contribuindo de forma considerável para o nosso processo de crescimento e amadurecimento,
pessoal e profissional.
À companheira Cibele Costa, que no momento da angústia estendeu a mão amiga e
profissional.
À Profª. Drª. Marinaide Queiroz, nossa fiel e sempre formadora no campo da EJA.
À Profª. Nadja Naira, pela presença amiga e contribuição na fase final deste trabalho
A todos que comigo compartilharam do grande aprendizado durante o Projeto de
Alfabetização de Jovens e Adultos no Programa Xingó, principalmente, Verinha, Marta,
Sandra, Meyre, Elzinha e Edméa.
Aos alunos do curso de Pedagogia UFAL - CEDU, por entenderem, apoiarem e aguardarem
nosso retorno.
A todos os colegas do CEDU, principalmente do MTE e do NEPEAL, pelo incentivo,
amizade e torcida.
Aos professores, coordenadores e funcionários do Mestrado CEDU - UFAL, pela colaboração
no nosso processo formativo.
Aos colegas do Mestrado, pelos momentos de troca, respeito e amizade.
A toda minha família, pelo incentivo, apoio e respeito as minhas ausências e silêncios.
A Luiz Carlos, pela paciência, compreensão e incentivo.
A Isabelly e Ieda, pelo apoio e socorro, na hora certa.
A Isabel, pela competência e carinho com que organizou a apresentação desse trabalho.
RESUMO
Neste trabalho trazemos respostas para as questões fundamentais em torno da
formação dos professores que estão alfabetizando jovens e adultos na rede pública estadual e
municipal da cidade de Maceió, a saber: os cursos de formação de professores do Estado de
Alagoas têm em suas estruturas curriculares disciplinas específicas que dêem conta da
formação profissional de professores para alfabetizar pessoas jovens e adultas? Onde os
professores da rede pública estadual e municipal estão se formando para alfabetizar pessoas
jovens e adultas? Como os professores que estão alfabetizando vêem o seu próprio processo
de formação e que concepções permeiam esse processo? Para realizá-lo, lançamos mão da
pesquisa qualitativa, através dos procedimentos da pesquisa bibliográfica, da análise
documental e da investigação de campo. Esta última foi realizada por meio de entrevista semiestruturada e da aplicação de questionários com 13,4% das professoras alfabetizadoras da rede
estadual e 15,38% das professoras alfabetizadoras da rede municipal de Maceió. O tratamento
e análise das categorias selecionadas (formação inicial e formação continuada) e concepções a
elas subjacentes, foram possíveis através da fundamentação teórica realizada. O caminho
metodológico percorrido nos possibilitou atingir o objetivo geral da pesquisa: resgatar o
processo de formação das professoras que estão alfabetizando pessoas jovens e adultas na
rede pública de ensino de Maceió; e os objetivos específicos: 1) Produzir um quadro
conceitual em torno das concepções de formação inicial e continuada, que norteiam o
processo de formação de professores alfabetizadores de pessoas jovens e adultas; 2)
Identificar as bases legais e institucionais que sustentam o silêncio no campo da formação
inicial das professoras alfabetizadoras de pessoas jovens e adultas; 3) Analisar os principais
espaços de formação continuada, apontados pelas professoras alfabetizadoras, identificando as
concepções subjacentes; 4) Estabelecer uma comparação entre o processo de formação
continuada das professoras alfabetizadoras da rede estadual e da rede municipal de ensino de
Maceió. O resultado da investigação, ao tempo que mostra a dicotomia entre o processo de
formação e as concepções das professoras alfabetizadoras da rede estadual e da rede
municipal, revela a necessidade de uma política de formação inicial e continuada para o
professor alfabetizador de jovens e adultos, enquanto política de Estado e como um processo
coletivo e mobilizador de vários autores, capazes de gerar um novo paradigma de formação
para o alfabetizador de jovens e adultos em Alagoas. Por outro lado, abre espaços para a
continuidade dos estudos na área.
Palavras - chave: Formação - Jovens e Adultos - Educação
Résumé
Ce travail apporte des réponses à des questions fondamentales pour la formation des
professeurs qui sont en train d’ alphabétiser des jeunes et des adultes du réseau d’
enseignement public de l’ Etat de l’ Alagoas et du réseau municipal de la ville de Maceió. Les
questions suivantes sont proposées: Les cours de formation de professeurs de l’ Alagoas ontils sur l’ ensemble de leur curricula des disciplines qui prennent en compte la formation
professionnelle des professeurs chargés de l’ alphabétisation des jeunes et des adultes? Où les
professeurs des réseaux mentionnés reçoivent-ils une formation pour alphabétiser lesdites
personnes? Comment ces professeurs perçoivent-ils leur processus de formation et quelles
perceptions recouvrent ce processus? Pour réaliser ce travail, nous nous sommes appuyés sur
une recherche qualitative menée à travers des procédures de recherche bibliographique, d’
analyse documentale et d’ investigations dans le champ. Cette dernière recherche a été
réalisée au moyen d’ une interview mi-structurée et de questionnaires appliqués sur 13,4% des
professeurs du réseau de l’ Etat et sur 15,38% des professeurs du réseau municipal. Le
traitement et l’ analyse des catégories séléctionnées (formation initiale et formation continue)
ainsi que les conceptions qui leur sont sous-jacentes ont été possibles par l’appui des
fondements théoriques surlesquels nous nous sommes basés. Le chemin méthodologique
parcouru nous a rendu possible d’atteindre l’objectif général de la présente recherche: faire
apparaître le processus de formation des professeurs engagés dans l’ alphabétisation des
jeunes et adultes. Cette méthodologie nous a permis aussi d’ atteindre les buts spécifiques
visés, à savoir: 1)Produire un tableau conceptuel à partir des conceptions de formation initiale
et formation continue lesquelles orientent le processus de formation des professeurs qui
prennent en charge l’ alphabétisation des personnes jeunes et des adultes; 2) Identifier les
dispositifs légaux et les cadres institutionnels qui tiennent à garder le silence sur la formation
du corps enseignant mentionné;3) Analyser les espaces principaux de la formation continue
signalés par les professeurs en identifant les conceptions sous-jacentes; 4) Établir une
comparaison entre le processus de formation continue des professeurs du réseau de l’ Etat et
celui du corps enseignant du réseau municipal de Maceió. En même temps qu’il montre la
dicotomie entre le processus de formation et les conceptions du corps professoral du réseau de
l’ Etat et du réseau municipal, le résultat de notre investigation nous a conduits à nous
interroger sur la nécessité de la mise en place d’ une politique de formation initiale et
continue, orientée vers les professeurs qui prennent en charge l’ alphabétisation de jeunes et
adultes, en tant qu’ une politique menée par l’ Etat et un processus collectif qui est l’ oeuvre
de plusieurs acteurs, générateurs probables d’ un nouveau paradigme de formation pour le
professeur alphabétisateur de jeunes et adultes dans l’ Alagoas. En outre, ce travail ouvre de
nouvelles voies pour que d’autres études soient pousuivies dans le domaine considéré.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 11
Capítulo I ................................................................................................................................ 19
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR: CONCEPÇÃO E TENDÊNCIA
1.1 Concepções e Tendências no Campo da Formação .................................................. 19
Formação Inicial ................................................................................................... 20
Formação continuada ............................................................................................. 23
1.2 A Formação do Professor Alfabetizador de Pessoas Jovens e Adultos ..................... 30
A formação dos professsores para alfabetizar jovens e adultos ............................ 32
O processo de formação do professor alfabetizador e as especificidades dos
sujeitos ................................................................................................................... 34
Capítulo II .............................................................................................................................. 37
A FORMAÇÃO INICIAL DOS PROFESSORES QUE ALFABETIZAM
JOVENS E ADULTOS – O Silêncio Permitido
2.1 Formação inicial das professoras alfabetizadoras ..................................................... 37
2.2 Instituições formadoras em Alagoas .......................................................................... 41
2.3 Bases legais que sustentaram os cursos formadores das professoras alfabetizadoras ..... 45
2.4 Anúncios e buscas no sentido de romper o silêncio na formação inicial das
alfabetizadoras ............................................................................................................ 49
Capítulo III ............................................................................................................................. 53
FORMAÇÃO CONTINUADA DAS PROFESSORAS ALFABETIZADORAS
DE JOVENS E ADULTOS E AS CONCEPÇÕES SUBJACENTES
3.1 A formação continuada a partir da visão das professoras alfabetizadoras da rede
pública estadual ......................................................................................................... 53
3.1.1 Descrição do processo de formação ................................................................ 54
3.1.2 Concepções de prática e das categorias relacionadas à mesma ...................... 56
Concepção de Prática Pedagógica .................................................................. 56
Concepção de Planejamento ........................................................................... 59
Concepção de Alfabetização ........................................................................... 60
Concepção de Pessoa ...................................................................................... 62
Concepção de Mundo ..................................................................................... 63
3.2 A formação continuada a partir da visão das professoras alfabetizadoras da rede
pública municipal ....................................................................................................... 64
3.2.1 Descrição do processo de formação ............................................................... 65
3.2.2 Concepções de prática e das categorias relacionadas à mesma ...................... 68
Concepção de Prática Pedagógica .................................................................. 68
Concepção de Planejamento ........................................................................... 71
Concepção de Alfabetização ........................................................................... 73
Concepção de Pessoa ...................................................................................... 74
Concepção de Mundo ..................................................................................... 77
3.3 Um olhar comparativo em torno das concepções apresentadas ................................. 77
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 82
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CITADAS ................................................................... 89
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS CONSULTADAS ....................................................... 93
ANEXOS .................................................................................................................................. 96
INTRODUÇÃO
O interesse pelo tema acompanha toda nossa trajetória profissional, que tem inicio na
década de 70, como professora – de Educação Infantil, do 1º grau – hoje, Ensino Fundamental
– em escola pública do interior, e se estende ao longo das três últimas décadas, como
professora do 2º grau, curso de Magistério – hoje Ensino Médio Modalidade Normal – e do
Ensino Superior. Em toda essa trajetória, sempre tivemos como preocupação básica o
processo de formação dos educadores, principalmente no que diz respeito ao alfabetizador.
Esse interesse vai se transformando em curiosidade epistemológica a partir da nossa
inserção no Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão sobre Alfabetização - NEPEAL1. O
referido Núcleo mantém parcerias com várias entidades e instituições, assessorando no
desenvolvimento de projetos e programas de alfabetização como: Programa Alfabetização
Solidária (PAS), vinculado ao Programa Comunidade Solidária; Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária (PRONERA) e o Programa Xingó – Área Temática Educação
(AT-Educação).
Neste último programa atuamos diretamente como coordenadora pedagógica do
Projeto de Educação de Jovens e Adultos em municípios de abrangência do Programa Xingó2.
O referido Projeto veio no sentido de desencadear o processo de escolarização e
qualificação profissional de jovens e adultos trabalhadores, sem discriminação de idade,
residentes nos municípios localizados na área de abrangência do Programa Xingó, na
perspectiva de melhoria da qualidade de vida. Como também para desencadear um processo
de sensibilização/organização da coletividade envolvida criando alternativas de ocupação e
renda.
Para o desenvolvimento das ações do Projeto, tornou-se imprescindível a parceria com
as Prefeituras Municipais e Secretarias de Educação dos municípios envolvidos, ficando a
cargo dos municípios selecionar os coordenadores locais a desencadear o processo de seleção
para os monitores alfabetizadores.
1 Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão sobre Alfabetização da Universidade Federal de Alagoas - UFAL,
localizado no Centro de Educação – CEDU –, que tem como objetivo assessorar, acompanhar trabalhos,
estudos e pesquisas em alfabetização, especialmente ações no campo da alfabetização de pessoas jovens e
adultas.
2 O referido projeto é desenvolvido em parceria com a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste
(SUDENE), Companhia Hidro-Elétrica do São Francisco (CHESF), Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), Centro Federal de Educação Tecnológico de Alagoas
(CEFET/AL),Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal de Sergipe (UFS), Universidade Estadual de Feira de
Santana (UEFS) e Universidade Estadual da Bahia (UNEB).
12
Inicialmente, o pré-requisito básico para a seleção dos monitores alfabetizadores era
que todos fossem habilitados em Magistério, hoje Curso Normal de Nível Médio. No entanto,
a realidade existente apontou para a necessidade, em alguns municípios, de selecionar
monitores alfabetizadores sem habilitação, ou seja, “professores leigos”.
Diante da realidade de não qualificação de alfabetizadores para o trabalho de educação
para jovens e adultos, o Projeto oferecia a todos os selecionados uma capacitação inicial de
120 horas/aula, para que assumissem as classes de alfabetização.
O curso de capacitação inicial acontecia no povoado de Xingó, em um período de 15
dias, com a participação de todos os monitores-alfabetizadores, coordenadores locais,
coordenadores das IES e os bolsistas. A continuidade desse curso se dava no processo de
acompanhamento pedagógico realizado sistematicamente nos municípios pelos coordenadores
locais, coordenadores das IES, bolsistas das IES e bolsistas residentes.
Esse acompanhamento tinha um caráter de formação continuada. Envolvia momentos
de socialização de experiências e oficinas pedagógicas onde eram trabalhadas temáticas
sugeridas pelos monitores alfabetizadores e temáticas sugeridas pelos coordenadores,
oriundas das necessidades evidenciadas nas observações da prática dos alfabetizadores
durante as visitas pedagógicas. Esses acompanhamentos permitiam identificar algumas
“lacunas” teóricas. Dentre elas, as dificuldades de os alfabetizadores conseguirem estabelecer
a relação (ou a transposição) do conteúdo trabalhado no material didático3 com a realidade de
vida dos alfabetizandos. Percebemos também uma resistência dos alfabetizadores em
trabalhar determinados conteúdos de determinadas áreas do conhecimento4.
Dentre os problemas identificados durante o acompanhamento do cotidiano das classes
de alfabetização do projeto que coordenávamos, o que nos chamou mais atenção foi: tanto os
monitores alfabetizadores habilitados5 em magistério como os “leigos” apresentavam uma
postura dicotômica: do ponto de vista metodológico, conseguiam desenvolver atividades
didáticas com criatividade e dinamicidade, porém, nos momentos de discussão e de
3
4
5
Material elaborado por Equipe de Especialista do Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação de
Jovens e Adultos e em Educação Popular (NUPEP).
Essa resistência pode ser exemplificada quando os monitores alfabetizadores trabalhavam, na área de
ciências, as unidades didáticas sobre a evolução humana. Insistiam em defender a teoria criacionista,
ignorando a evolucionista. Percebia-se a falta de fundamentação teórica, associada à manutenção de valores
baseados no senso comum e no misticismo religioso e cultural.
Profissional habilitado segundo a Nova LDB Art. 62. Profissionais habilitados são “docentes que para atuar
na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena em
Universidades e Institutos superiores de educação, admitidas, como formação mínima para o exercício do
magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental e oferecida em nível
médio na modalidade normal”.
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socialização das experiências e vivências, desenvolvidas na prática cotidiana, da sala de aula,
demonstravam a falta de uma sustentação teórico-metodológica, dificultando um maior
aprofundamento em torno dos conhecimentos, dos saberes necessários para atuar na área.
Percebíamos também a falta de conhecimentos para estabelecer a relação da teoria
adquirida no processo de formação continuada com os conhecimentos e experiência trazida
pelos alfabetizandos, ou seja, sentiam dificuldades em estabelecer a relação teoria-prática.
Os monitores alfabetizadores apresentavam, ainda, dificuldades em desenvolver uma
prática pedagógica fundamentada em uma metodologia de trabalho que tivesse como
pressuposto básico a contextualização, a problematização e a resolução de problemas.
Percebíamos a dificuldade dos monitores alfabetizadores em transformar os conhecimentos
científicos em conhecimentos escolares. Traduzimos isto como a falta de formação específica
para esta modalidade educativa, ferindo a nova LDB 9394/96.
Justificávamos a realidade observada a partir do argumento de que eram monitores
alfabetizadores, a maioria jovens sem experiência, “improvisados” para a função do
magistério, recrutados para assumirem a prática pedagógica em Projetos/Programas
governamentais e não governamentais, com tempo e espaços definidos, nas comunidades em
que residiam.
Estas dificuldades observadas aguçaram nossa curiosidade em torno da formação dos
professores que estão alfabetizando na rede pública. Nossa curiosidade desencadeou algumas
questões fundamentais: Os cursos de formação de professores do Estado de Alagoas têm em
suas estruturas curriculares disciplinas específicas que dêem conta da formação profissional
de professores para alfabetizar pessoas jovens e adultas? Onde os professores da rede pública
– estadual e municipal – estão se formando para alfabetizar pessoas jovens e adultas? Como
os professores que estão alfabetizando vêem o seu próprio processo de formação e que
concepções permeiam esse processo?
Para responder as questões, levantamos algumas suspeitas: em primeiro lugar,
supomos que os professores que alfabetizam não têm uma formação básica específica para tal.
Os cursos de magistério que os formaram estão estruturados a partir de uma legislação que
não possibilita essa formação inicial.
A segunda suspeita que levantamos foi a de que, na ausência da formação inicial, os
professores que alfabetizam buscam suprir as lacunas teórico-metodológicas através da
formação continuada. Partindo do nosso conhecimento prévio sobre as duas redes de ensino
público, ousamos imaginar que para uns a formação deve estar ocorrendo em cursos,
acompanhamentos, encontros etc.; para outros, essa formação está sendo buscada através da
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própria prática, dos seus “saberes docentes” (CANDAU, 1998) e dos modelos de professores,
que repetem.
Levantamos essas duas primeiras suspeitas baseadas em Moura (2000, p.98), quando
denuncia que não existe política de formação de alfabetizadores e não se dá nenhuma
prioridade para a formação continuada destes profissionais; os professores que se propõem a
alfabetizar não possuem nenhuma qualificação, comprometendo assim um processo que exige
conhecimento e formação específica, contrariando os estudos de Ferreiro (1986) e Vigotsky
(1991,1994), comprovando que alfabetizar é um ato de conhecimento e, portanto, tarefa
complexa.
Por outro lado, essas duas suspeitas nos levaram a uma terceira: qualquer que seja o
processo formativo que os professores vivenciam, eles estão construindo concepções que
interferem na própria formação e, conseqüentemente, na prática pedagógica.
Para encontrar respostas às nossas inquietações, e comprovar ou não nossas suspeitas,
entendemos que a melhor forma de buscar as respostas seria através da investigação teórico empírica priorizando ouvir os próprios sujeitos envolvidos: os professores que estão
alfabetizando. Para realizar a investigação, optamos pela pesquisa qualitativa.
Buscamos em Ludke e André (1986, p.11) que a pesquisa qualitativa se trata de um
estudo “naturalístico”, uma vez que os problemas estudados não sofrem nenhuma
manipulação intencional do pesquisador. Portanto, presta-se à natureza do estudo que
realizamos.
Consideramos a pesquisa qualitativa importante para o nosso estudo por possuir
características básicas e fundamentais dando sustentação metodológica para a pesquisa: a
pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador
como seu principal instrumento; os dados coletados são predominantemente descritivos; a
preocupação com o processo será muito maior do que com o produto; o “significado” que as
pessoas dão às coisas e à sua vida passará a ser foco de atenção especial do pesquisador e a
análise dos dados tende a seguir um processo indutivo.
Entendemos desta forma que a pesquisa qualitativa apresenta características que são
freqüentemente definidas como descritivas ou exploratórias (MAZZOTTI/GEWANDSZNAJDER,
2001, p.151).
Diante das características dos fatos analisados e investigados de forma descritiva e
contextualizada, focalizando a realidade da formação do professor alfabetizador de pessoas
jovens e adultas, consideramos que este trabalho se inscreve dentro de um estudo
exploratório.
15
A partir dessa definição utilizamos como procedimentos:
1. A pesquisa bibliográfica como fundamentação básica da investigação: no campo da
formação em Nóvoa (1991, l995), Canário (1994), Sacristán (1991, 2000), Schon (1995,
2000), Elliott (1991), Demailly (1995), Ott (1998), Zeichner (1992, 1995), Thurler (2002),
Cró (1998), Cavaco (1991), Candau (1998), Pimenta (2002); e no campo da alfabetização das
pessoas jovens e adultas, em Ribeiro (1999), Gadotti (2000), Romão (2000), Haddad (2000),
Ferreiro (1992), Souza (1996), Moura (1999, 2001), Soares (2002 a e b), Torres (1990).
2. Análise documental
A) Da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN 9394/96.
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental – Parecer CEB Nº 04/98,
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em
nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena – Parecer Nº CNE/CP 009/2001,
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos – Parecer CEB Nº
11/2000. Relatórios dos Encontros Nacionais de Educação para Jovens e Adultos - ENEJAS.
Boletins da Associação Nacional de Formação de Professores - ANFOPE Propostas
Curriculares e relatórios das instâncias formadoras de professores do Estado de Alagoas:
Universidade Federal de Alagoas - UFAL, Centro de estudos Superiores de Maceió CESMAC, Fundação Universitária de Ensino - FUNESA, e Secretaria Executiva da Educação
- SEE (Coordenação do Curso Médio Modalidade Normal), com o objetivo de avaliar a oferta
de disciplina e/ou estudos específicos no campo da EJA.
B) Do cadastro dos professores alfabetizadores das Secretarias Estadual e Municipal
de Educação, através das fichas disponibilizadas pelo setor de recursos humanos6. No
levantamento identificamos cinqüenta e duas (52) professoras que estavam alfabetizando na
rede municipal e sessenta e nove (69) na rede estadual.
A análise dos cadastros nos levou à definição de uma amostra de 10% do total de
professores por rede. No entanto, durante a coleta conseguimos 15,38% (8) do total de
alfabetizadoras da rede municipal e 13,4% (9) do total da rede estadual. A amostra utilizada
obedeceu aos critérios definidos.
Na seleção da amostra procuramos contemplar os seguintes critérios: professoras que
estavam alfabetizando e que concluíram o Curso de Magistério, hoje Curso Médio
modalidade normal; professoras formadas em Pedagogia; professoras formadas em outras
licenciaturas; e professoras com Curso de Especialização.
6
O levantamento dos cadastros nos mostrou que todas as classes de alfabetização estavam sendo assumidas
por mulheres.
16
3. Investigação de campo:
A) Seleção dos sujeitos
Os sujeitos selecionados foram professoras alfabetizadoras concursadas da SEE - e da
SEMED. A definição das duas instâncias empregadoras deveu-se aos seguintes critérios: as
duas instâncias somente aceitam nos seus quadros professores concursados e habilitados para
o magistério – eles devem ter no mínimo o curso de Magistério, hoje, ensino Médio na
modalidade normal; as duas instâncias oferecem a Educação de Jovens e Adultos em
consonância com a LDB e as Diretrizes Curriculares de EJA e têm na alfabetização a fase
inicial desse processo de escolarização; a SEMED - Secretaria Municipal de Educação,
através do Departamento de Educação de Jovens e Adultos – DEJA – tem uma política de
formação continuada para todos os professores de jovens e adultos; e a SEE - Secretaria
Executiva de Educação não tem, oficializada, uma política de formação continuada
B) Adotamos como instrumentos de coleta de dados questionários e entrevistas.
O primeiro instrumento utilizado foi o questionário com o objetivo de
caracterizar os sujeitos e colher algumas concepções necessárias ao estudo. O
questionário serviu de instrumento piloto para a elaboração de um roteiro de
questões que foram utilizadas durante as entrevistas.
Realizamos Entrevistas semi-estruturadas – gravadas em fita cassete com as
professoras alfabetizadoras, realizadas no próprio local de trabalho. Através dela
colhemos: a história de vida dos sujeitos; o nível de formação inicial das
professoras alfabetizadoras; como vem se dando o processo de formação
continuada e as concepções que as professoras alfabetizadoras têm sobre
alfabetização, formação, prática, planejamento, pessoa e mundo. Entrevistamos,
também as coordenadoras do Departamento de Educação de Jovens e Adultos da
SEMED7.
4. Análise dos dados:
Para analisar as entrevistas e questionários, tomamos como base as duas categorias
principais do estudo: formação inicial e formação continuada.
Para analisar a formação inicial, montamos um quadro em que listamos os
níveis/cursos de cada professora alfabetizadora investigada de acordo com a rede de ensino.
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Decidimos entrevistar as coordenadoras do DEJA-SEMED, depois que as entrevistas com as professoras
alfabetizadoras nos mostraram como espaço predominante de formação continuada os cursos e
acompanhamento desenvolvidos pelo DEJA.
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Para a análise da formação continuada, tomamos o conteúdo das falas colhidas nas
entrevistas desdobrando-as em subcategorias subjacentes à formação: concepções de prática,
planejamento, alfabetização, sujeito e mundo.
A partir da análise das falas fizemos o mapeamento (transformado em quadro) dos
espaços de formação identificados por cada professora alfabetizadora.
Para resguardar a identidade das entrevistadas, atribuímos uma letra do alfabeto para
cada uma, repetindo a letra nas duas redes de ensino.
Elaborados os quadros-sínteses, fizemos a análise das falas procurando manter uma
interlocução entre as entrevistadas, a pesquisadora e os autores estudados.
O caminho metodológico possibilitou que atingíssemos o objetivo geral da pesquisa:
Resgatar o processo de formação das professoras que estão alfabetizando pessoas jovens e
adultas na rede pública de Maceió, e os objetivos específicos: 1) Produzir um quadro
conceitual em torno das concepções de formação inicial e continuada que norteiam o processo
de formação de professores alfabetizadores de pessoas jovens e adultas; 2) Identificar as bases
legais e institucionais que sustentam o silêncio no campo da formação inicial das professoras
alfabetizadoras de pessoas jovens e adultas; 3) Analisar os principais espaços de formação
continuada, apontados pelas professoras alfabetizadoras, identificando as concepções
subjacentes; 4) Estabelecer uma comparação entre o processo de formação continuada das
professoras alfabetizadoras da rede estadual e da rede municipal de ensino de Maceió.
O caminho teórico - metodológico da pesquisa culminou com essa produção, que se
encontra assim organizada:
No primeiro capítulo procuramos explicitar conceitos, concepções básicas e tendências
no campo da formação; formação inicial e formação continuada, necessárias ao
desenvolvimento do estudo sobre a formação dos professores alfabetizadores de jovens e
adultos.
No segundo capítulo abordamos o processo de formação inicial dos professores
alfabetizadores de jovens e adultos, onde detectamos um silêncio ainda permitido pela falta de
políticas públicas para esta área específica. Neste capítulo avaliamos por que existe o silêncio
e o que se anuncia para que o processo deixe de ser silencioso.
No terceiro capítulo oportunizamos o conhecimento do processo de formação
continuada dos professores alfabetizadores de jovens e adultos a partir da visão das próprias
alfabetizadoras. Neste capítulo procuramos resposta para o questionamento, como vem se
dando a formação continuada das professoras alfabetizadoras que estão na rede estadual e
municipal da cidade de Maceió, na ausência da formação inicial, e que concepções norteiam o
18
processo de formação? Concluímos o capítulo com um olhar comparativo em torno do
processo de formação continuada e as concepções apontadas pelas professoras alfabetizadoras
investigadas das duas redes de ensino.
Encerra-se o trabalho com algumas considerações em torno dos resultados obtidos que
não representarão o fim dos estudos e análises, mas sim, abrirão perspectivas de novos olhares
acerca do tema abordado, por conta de toda uma complexidade e desafio no contexto atual,
que é a formação do professor alfabetizador para a educação de pessoas jovens e adultas.
CAPÍTULO I
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES: CONCEPÇÕES E TENDÊNCIAS
Quanto mais seriamente você está comprometido com a busca da
transformação, mais rigoroso você deve ser, mais você tem de buscar o
conhecimento, mais você tem de estimular os estudantes a se prepararem
científica e tecnicamente para a sociedade real na qual eles ainda vivem
Freire (1986, p.86).
Neste capítulo procuramos explicitar algumas concepções em torno das categorias
chaves do objeto estudado: a formação de professores e a formação dos professores para
alfabetizar pessoas jovens e adultas.
Trazemos, a princípio, uma discussão em torno do referencial sobre a formação inicial
e continuada de professor, escolhido como pano de fundo para analisar o objeto estudado. Em
seguida, refletimos em torno da formação do professor para alfabetizar pessoas jovens e
adultas diante da complexidade do processo de alfabetização.
1.1 Concepções e tendências no campo da formação
O tema Formação de Professores assume no Brasil, nos últimos anos, uma importância
crucial, como nos mostram os estudos de Candau (1998), Libâneo (1999), Masetto (1998),
Freire (1999), Brzezinski (2002), Pimenta (2002), Kullock (1999), e tantos outros. Todos
entendem, como Nóvoa (1992, p.2), que “não há ensino de qualidade, nem reforma educativa,
nem inovação pedagógica, sem uma adequada formação de professores.”
Por formação entendemos um processo de reflexão, considerando a possibilidade do
desenvolvimento do pensamento e da ação, ou seja, um movimento de “reflexão na ação”;
“reflexão sobre a ação”; “reflexão na e sobre a ação” Zeichener (1995, p.126, In: NÓVOA:
1995). Nesse sentido o processo formativo passará a adquirir as formas de um
desenvolvimento individual, de construção da pessoa do professor, sem a ruptura das práticas
ou acontecimentos passados, mas com a reapropriação crítica desse passado e dessa
experiência. A formação passará a ser processo de auto conhecimento (CANÁRIO,1994,
p.22).
Esse processo formativo deve se dar em dois momentos: na formação inicial e na
formação continuada.
20
A formação inicial deverá favorecer o futuro profissional da educação nas
competências básicas8, para saber atuar e enfrentar toda a complexidade da tarefa educativa,
de forma reflexiva, crítica, questionadora, autônoma, mas, acima de tudo, comprometido com
o processo de ensinar e aprender.
A formação continuada permitirá o desenvolvimento profissional do professor,
proporcionando conhecimentos profissionais que lhe assegurem: avaliar as inovações
pedagógicas surgidas no cotidiano da prática; desenvolver competências e habilidades 9 para
planejar, diagnosticar e avaliar, buscando novas alternativas que sejam capazes de transformar
a prática pedagógica num eterno “continuum”, respeitando as diversidades, a realidade dos
alunos, comprometendo-se com a transformação social.
Buscando entendimento e ampliação da visão e do paradigma de formação, Garcia (In:
NÓVOA, 1995) nos leva a refletir, com André De Peretti (1987, p.97, apud GARCIA, 1995,
p.55), que, se pretendemos a manutenção da qualidade do ensino, faz-se necessária a criação
de uma cadeia coerente de aperfeiçoamento, em que o primeiro nível seria a formação inicial.
Formação inicial
Cró (1998, p.31) define que, por princípio, a formação inicial dos educadores e dos
professores deverá ser o que fará deles aquilo que esperam os sistemas educativos de hoje, ou
seja, tem a ver com a concepção de educação, pedagogia etc., face a uma certa concepção de
homem e de sociedade.
Essa definição nos faz refletir sobre o papel da formação inicial, em que os professores
buscarão subsídios para sua atuação frente aos sistemas educativos e às concepções que
nortearão o seu fazer pedagógico, objetivando, desta forma, possibilitar ao professor a tomada
de consciência do seu valor profissional, fornecendo-lhe meios e mecanismos de ação,
permitindo-lhe perceber que a sua formação poderá ocorrer sempre de forma continuada, com
perspectivas para além da inicial.
Entendemos que a formação inicial acontecerá em função de tarefas que são
específicas e esperadas pela própria atividade profissional do professor.
8
9
Entendemos por competência básica um saber empenhado que impulsiona os sujeitos cognoscentes a
executar com convicção ações que traduzem o seu conhecimento, adquirindo um domínio preciso. Numa tal
ótica, as atividades de educação tornam-se competências na medida em que manifestam um saber teórico
sólido e pessoalmente vivido. Cf. Cró (1998, p.53).
Por habilidades, entendemos serem decorrentes das competências adquiridas e referem-se ao plano imediato
do “saber fazer”. Por meio das ações e operações, as habilidades aperfeiçoam-se e articulam-se,
possibilitando nova reorganização das competências (Brasil. Ministério da Educação. ENEM: documento
básico 2000. Brasília. 1999, p.7).
21
Esta formação deverá ser a mais humana possível , oferecendo à sociedade uma nova
geração de profissionais da educação que possam responder de forma adequada aos novos
desafios e expectativas da profissão do professor no mundo contemporâneo.
Para que estas expectativas e desafios da formação inicial respondam aos
questionamentos, como ensinar? E para que ensinar? Cró (1998) nos aponta três aspectos que
consideramos significativos no processo de formação inicial do professor:
1º Formação intelectual , em que a ênfase recai nos aspectos cognitivos;
2º Formação social, com a ênfase na aquisição das competências de ordem afetiva, de
colaboração e de trabalho em equipe;
3º Formação para a auto-formação, com a ênfase nas qualidades de organização, de
estruturação, de invenção e criatividade.
Ao nosso ver estes aspectos permitirão ao professor a possibilidade de desempenhar o
seu papel com toda a sua vontade, toda a sua arte e toda a sua competência trabalhando na
perspectiva de realização de um projeto político-pedagógico, através de um trabalho coletivo,
envolvendo todos os implicados no processo, sabendo aproveitar e otimizar os recursos
materiais, humanos e tecnológicos em favor de um processo pedagógico eficaz,
potencializando ações de estudo e de reflexão com vistas a uma educação de qualidade.
O processo de formação inicial, segundo Cró (1998), suscita algumas exigências
relativas a uma formação desejável para os professores, levando-se em consideração a
complexidade do processo ensino-aprendizagem. Primeira exigência: a formação deverá partir
da concepção de um ensino interdisciplinar e transdisciplinar; esta concepção precisará ser
posta em prática durante os processos de formação. O que se tem presenciado atualmente é
uma formação oferecida através de saberes disciplinares fragmentados, sem estabelecer
nenhuma relação entre si, dificultando desta forma a compreensão e a transposição para a
interdisciplinaridade.
Segunda exigência: formação nas teorias e na prática da avaliação diagnóstica. Esta
exigência permitirá ao professor observar o processo ensino-aprendizagem, sugerindo
mecanismos e instrumentos que proporcionarão a melhoria da ação de ensinar e,
conseqüentemente, dos resultados do rendimento escolar dos alunos. Ultrapassa, desta forma,
as discussões que permeiam a desafiante questão dos instrumentos de medida.
Terceira exigência: o professor deverá realizar avaliação de uma relação. Avaliação
dos alunos, avaliação do professor. Os professores serão formados para uma intervenção na
prática pedagógica cotidiana. Para tanto, o professor poderá se utilizar de etapas para
desenvolver seu trabalho, como: observação do desenvolvimento de cada criança e do grupo,
22
decidindo qual a melhor intervenção, avaliando também sua própria atuação pedagógica;
planejando possíveis intervenções em função do coletivo ou de cada aluno individualmente;
executando o plano de intervenção mais adequado ao contexto; avaliando os resultados das
ações pedagógicas para reorientações e replanejamentos, caso surjam necessidades. Passa a
avaliação a fazer parte de todo o processo e ato pedagógico, e especificamente, do processo
formativo dos futuros professores.
Quarta exigência: na mudança pedagógica, a disponibilidade para a mudança será uma
das qualidades a ser exigida ao professor.
Diante disso, tomamos consciência de que toda a reforma pedagógica poderá partir dos
professores, porque de nada adiantará se pensar em novos currículos, novos métodos,
financiamento, planos de cargo e salários, plano de valorização do magistério, se não for
possibilitada aos professores uma mudança de postura e de concepção.
Para que as mudanças pedagógicas possam ocorrer, Cró (1998, p.39) nos aponta três
tipos de preparação que se encontram em vigor nas instituições de formação de professores e
que se caracterizam em tendências atuais: a preparação fundada nos traços e atitudes que
tipificam o bom professor; a preparação fundada sobre as maneiras de ensinar – processo de
ensino; a preparação fundada nas competências ou saber-fazer, a construir e a desenvolver.
Cró (ibidem) defende que o movimento atual, em favor da formação de professores
baseando-se na concepção de construção de competências, será um caminho lógico que
culminará com as teorias construtivistas da inteligência e das aprendizagens humanas.
Competências estas que serão melhoradas e diversificadas ao longo da carreira profissional do
professor, através da formação continuada.
Nessa perspectiva, podemos compreender que o processo de formação inicial, para
além da finalidade de conferir uma habilitação legal para o exercício profissional docente,
passa a formar o professor, ou seja, colabora para o exercício da atividade docente,
considerando que esta atividade profissional do professor não se trata de uma atividade
burocrática, em que se venha a adquirir conhecimentos e habilidades que envolvam os
aspectos técnico e mecânico.
Entendemos que o trabalho docente, tem por natureza e essência básica o ensinar,
como uma possibilidade de contribuir para o processo de humanização dos alunos enquanto
sujeitos situados e datados. Esperamos, com isto, que o processo formativo do professor
possibilite a construção dos seus saberes e fazeres, tendo como ponto de partida e referência
as necessidades, os desafios e as problematizações que o processo de ensino enquanto prática
social aponta no dia-a-dia da prática docente.
23
Compreendemos, ainda, que a formação do professor como possibilidade ou elemento
mobilizador dos mais diversos e variados conhecimentos da teoria da educação tornar-se-á
imprescindível para a compreensão do ensino como uma realidade social, desenvolvendo nos
professores a capacidade de refletir e investigar a própria atividade, na qual possam construir
e transformar os seus saberes e fazeres de professor num processo contínuo de ressignificação
e construção de sua identidade profissional, principalmente enquanto professor alfabetizador
de pessoas jovens e adultas.
É preciso, portanto, entender, como Hargreaves, que a “formação de professores
precisa ser recuperada e reestruturada como um todo, abrangendo as dimensões de formação
inicial, de formação continuada” (HARGREAVES, 1991, apud NÓVOA, 1991, p.24). Nesta
perspectiva, passaremos a analisar o processo de formação continuada procurando a
explicação e a compreensão do seu processo histórico, e as discussões atuais em torno do
novo paradigma que se propõe para o atual contexto.
Formação continuada
A partir dos anos noventa diversas reflexões e discussões vêm sendo desenvolvidas a
respeito da formação continuada de professores, trazendo no seu bojo críticas às
denominações de treinamento, capacitação, reciclagem e aperfeiçoamento, propondo-se novos
paradigmas de formação e inserindo-se a expressão formação continuada como uma crítica
aos termos anteriormente utilizados. Termos estes que não permitiam a construção da
autonomia intelectual dos professores, tomando como referência as propostas de formação
continuada, elaboradas previamente10. Estas propostas eram apresentadas e implantadas nas
salas de aula sem nenhuma discussão ou reflexão junto aos professores.
Destarte, precisamos lançar um olhar para o processo de formação continuada que vem
se dando no desenvolvimento de ações educativas, e suas implicações na formação do
professor. Levando-se em consideração a existência das várias concepções que envolvem o
processo, remetemo-nos à análise das diferentes terminologias utilizadas historicamente, como:
Reciclagem – Este termo aparece em dicionários com dois significados: o primeiro,
amplo, buscamos em Silva (1983), que trata da reciclagem como reaproveitamento de
material. O segundo, mais específico, voltado para a escola, buscamos em Ferreira (1986,
10
A exemplo dos “pacotes prontos” de formação continuada elaborados e implementados pelo Ministério da
Educação/ MEC.
24
p.1462), que trata da reciclagem como atualização pedagógica, cultural, para se obterem
melhores resultados.
Analisando esse termo, Marin (1995) nos levou a refletir sobre a inadequação da sua
utilização com os profissionais da educação, em razão de não se poder fazer “tabula rasa” dos
seus conhecimentos. Lembramos que a adoção deste termo permitiu a utilização de encontros
esporádicos, aligeirados, descontextualizados, onde as questões da educação eram abordadas
de forma superficial. O uso desse termo reciclagem, ainda presente em alguns discursos
voltados à educação, tende a desaparecer pelo reduzido uso da terminologia no atual contexto.
Treinamento – O termo treinamento ainda é muito presente no contexto educacional.
Buscamos o sentido da palavra treinamento e encontramos em Ferreira (1986, p.1708) que é
tornar apto, habilitar, adestrar, exercitar-se para jogos esportivos.
Os significados aplicados ao termo, para Marin (1995), implicam ações que
independem do uso da inteligência e sim de automatismos, ou seja, passam a depender da
modelagem de comportamentos em que a utilização de moldes e padrões são pré-fixados,
permanecendo durante todo o processo. Entendemos que este pensamento, esta postura, não
deve se adequar às atividades educativas que possam envolver os processos de formação
continuada, quando se pensa em exercer funções pautadas pelo uso da inteligência.
Capacitação – Consultando mais uma vez as citações de Ferreira (1986, p.340),
percebe-se que existem dois sentidos que não são compatíveis para o termo capacitação. O
primeiro: tornar capaz, habilitar. O segundo: convencer, persuadir. Marin (1995) defende o
primeiro sentido, por considerá-lo coerente com a idéia de formação continuada, acreditando
que os professores necessitam adquirir condições para o exercício da profissão. O segundo
sentido, no entanto, não parece compatível com a idéia de formação continuada, pois
estaríamos subestimando a capacidade dos professores quando não se permite a utilização da
razão. A ação de simplesmente convencer ou persuadir não se encaminha para um
crescimento profissional, transformando a capacitação em inculcação.
Aperfeiçoamento – Encontramos estes significados, ato ou efeito de aperfeiçoar-(se),
tornar perfeito ou mais perfeito, em Ferreira (1986, p.141), para o termo aperfeiçoamento.
Marin (1995) chama a atenção para a inadequação dos termos no que se refere ao processo
educativo de todos os envolvidos, destacando ser impossível o desejo de perfeição em
educação, porque assim sendo, haveria a negação da própria essência, da raiz do ato
educativo, ou seja, a idéia de educabilidade da pessoa humana.
Convivemos na atividade educativa com a concepção de tentativa de acertos ou
fracassos, em que a perfeição não permite falha, o que se torna praticamente impossível e
25
incoerente nos processos de formação continuada, uma vez que diferentes fatores
intervenientes, que permeiam a educação, estarão sempre presentes.
O referencial teórico utilizado para a análise e reflexão dos termos acima citados
demonstra que, dependendo do contexto das necessidades e das circunstâncias, podemos fazer
uso de vários termos e concepções, caso possamos constatar os diversos significados num
processo educativo continuado. No entanto, entendemos que a expressão formação continuada
é a que melhor se adequa a esse processo, por utilizar uma abordagem mais ampla envolvendo
todas as noções anteriores: reciclagem, treinamento, capacitação e aperfeiçoamento,
ressaltando os diversos aspectos focalizados no processo educativo.
Segundo Cró (1998, p.130), a formação continuada deve visar uma aprendizagem do
professor, educador que integre uma mudança das suas práticas educativas. Essa mudança
passa, segundo diversos autores já citados, Schon (1995), Zeichner (1995), Candau (1998),
pela reflexão na ação, a partir da ação e depois da ação.
Compreendemos, através da explicitação da autora, que a formação continuada é um
processo continuum e será fundamental que venha a ocorrer ao longo da vida profissional do
professor, permitindo-lhe a reorganização de seus conceitos interpretativos e que possa
vislumbrar possibilidades e alternativas para um ressignificar da sua prática, ou seja, que
possa ocorrer uma mudança de prática na educação e na intervenção educativa.
Nessa perspectiva, a formação continuada visaria desenvolver habilidades do professor
através da reflexão sobre a sua prática.
Para Thurler (2002, p.97-98), os sistemas escolares mais avançados vêm pesquisando
possibilidades de desenvolvimento profissional que possam permitir ao professor o
desenvolvimento de competências profissionais indispensáveis para o enfrentamento dos
desafios dos sistemas sociais em evolução. Assim sendo, não se investirá e não se persistirá
em uma formação continuada que seja obrigatória, centrada em deficiências, contentando-se
em preencher as lacunas do professor. Desta feita, serão priorizadas as condutas mais
exigentes e realmente profissionalizantes, em que os professores, através desses processos de
formação continuada, estarão capacitados para a utilização de maneira eficaz dos novos
saberes no campo de ensino-aprendizagem.
Buscando as contribuições das intervenções exteriores, Thurler (ibidem) destaca uma
nova proposta de desenvolvimento profissional, na qual os professores serão os principais
atores e responsáveis pelo seu processo de formação continuada, decidindo de maneira
autônoma seus objetivos e seus planejamentos.
26
Os professores lançarão mão da formação continuada no sentido de sua autoformação,
negociando suas contribuições em função das suas necessidades, ou seja, surgirá um novo tipo
de profissionalismo em que o desenvolvimento profissional e o desenvolvimento institucional
serão caracterizados por novos valores, novas práticas e uma nova cultura dos professores e a
cultura do individualismo dará lugar à cooperação; as relações hierárquicas serão substituídas
pelo trabalho em equipe; os cursos de reciclagem recuam diante da popularidade do
desenvolvimento profissional; a abordagem contratual negociada entre parceiros substituirá as
decisões autoritárias (WOODS et al., 1997, p.158, apud THURLER 2002, p.98).
Na medida em que se propõe uma ação pedagógica mais eficaz, em que o professor,
frente à heterogeneidade dos alunos e à complexidade do contexto profissional, não deverá ter
estratégias de ensino-aprendizagem prontas e acabadas para o uso; deverá ter novas
possibilidades de estratégias de ensino-aprendizagem que sejam construídas e assumidas com
autonomia adquirida no processo de formação continuada enquanto desenvolvimento
profissional no sentido da articulação teoria-prática.
Ampliando a discussão em torno da formação continuada, Demailly (1995) apresenta
quatro modelos de formação continuada de professores, considerados pela autora
diferenciados uns dos outros, não pelos cenários concretos, mas pela relação simbólica
fundamental que vamos encontrar no interior da “forma” dos modelos.
A forma universitária – na qual a finalidade essencial é a transmissão do saber e da
teoria. Tem caráter voluntário não obrigatório. Nesta forma,o mestre, o formador é o produtor
direto do saber.
A forma escolar – nesta forma, todos os “cursos” se encontram organizados por um
poder legítimo que é exterior (nação, Estado ou igreja), a escolaridade é obrigatória, os
formadores não são responsáveis pelos programas ou posição definidos por um programa
oficial.
A forma contratual – caracteriza-se esta forma por uma negociação entre diferentes
parceiros, ligados por uma relação contratual do programa pretendido e das modalidades
materiais e pedagógicas da aprendizagem.
A forma interativa-reflexiva – esta forma está presente nas iniciativas de formação
ligadas à resolução de problemas reais, com ajuda mútua dos formandos e que estão
relacionados com uma situação de trabalho.
Esses modelos apresentados, segundo Demailly (1995), não se encontram nunca no
estado puro, mas são possíveis e ideais para se aplicar na formação continuada do professor.
Ressalta ainda que a forma universitária parece ser mais eficiente no plano de trabalho
27
individual, mas no plano coletivo o modelo interativo reflexivo será o mais eficaz, permitindo
menor resistência por parte dos formandos e maior prazer e autonomia ao criar novos saberes
profissionais.
Esses modelos apontam para algumas formas do processo de formação continuada dos
professores entrevistados durante nossa pesquisa, evidenciando a forma interativa-reflexiva
como a mais presente, embora não tenhamos percebido clareza ou conhecimento destes
modelos pelas professoras alfabetizadoras entrevistadas, conforme discutiremos no capítulo II.
Ainda em relação à formação continuada, Candau (1998) nos convida a uma reflexão
sobre os caminhos para um adequado desenvolvimento da formação continuada, tendo
presente as diferentes etapas do desenvolvimento profissional do magistério.
Para isso, focaliza três importantes teses que sintetizam os principais eixos de
investigação que vêm conquistando, cada vez mais, o consenso entre os profissionais da
educação.
1ªTese - A escola: lócus da formação continuada
Considerar a escola como lócus de formação continuada vem a ser uma afirmativa
fundamental na superação do modelo clássico de formação continuada. Significa construir um
novo paradigma, uma nova perspectiva na área de formação continuada. Este não é um
objetivo fácil de se alcançar, nem acontecerá de forma espontânea, porque não é pelo simples
fato de se estar na escola e de se desenvolver uma prática escolar no cotidiano que se define
ou garante a presença das condições mobilizadoras de um processo formativo. Práticas
repetitivas, práticas mecânicas não favorecem esse processo. Para que o processo aconteça, é
importante que essa prática seja reflexiva, capaz de identificar os problemas e solucioná-los.
Consideramos significativo este alerta de Candau (1998, p.58), ao considerar a escola como o
lócus privilegiado da formação continuada.
Esta prática deverá ser coletiva e construída por grupos de professores, ou envolvendo
todo o corpo docente de uma determinada instituição escolar. O reconhecimento da escola
como lócus de formação continuada traz algumas implicações, como trabalhar com o corpo
docente de determinada instituição escolar favorecendo processos coletivos de reflexão e
intervenção na prática pedagógica concreta, oferecendo espaços e tempos institucionalizados,
criando sistemas de incentivo à sistematização das práticas pedagógicas dos professores.
Este processo deverá ser iniciado a partir das reais necessidades dos professores, dos
problemas que envolvem o seu cotidiano, favorecendo os processos de pesquisa-ação.
2ª Tese - A valorização do saber docente
28
No processo de formação continuada é fundamental ressaltar a importância do
reconhecimento e a valorização do saber docente, de modo especial os saberes da experiência,
considerados núcleo vital do saber docente. São estes saberes que brotam da experiência e são
por ela validados. São estes saberes que permitem aos professores julgar a formação que
adquiriram, como também a pertinência e o realismo dos planos e das reformas que lhes são
propostas (CANDAU,1998, p.59).
Muitos professores universitários mantêm uma resistência ao reconhecimento e
valorização do saber do professor. Muitas vezes os professores em processo de formação são
tratados como se não possuíssem um saber construído ao longo de sua carreira profissional,
principalmente um saber da experiência, saber este que quase sempre entra em conflito com
os saberes academicamente produzidos.
Esses saberes constituem hoje a cultura docente em ação. É muito importante que
saibamos reconhecer essa cultura docente em ação, entendendo que ela não poderá ser
reduzida apenas ao nível cognitivo.
3ª Tese - O ciclo de vida dos professores
Para um adequado desenvolvimento da formação continuada de professores, na ótica
de um paradigma mais abrangente e unitário que permite a ruptura da visão dicotômica do
modelo clássico, a reflexão sobre o ciclo de vida dos professores vem contribuindo de forma
extremamente interessante e importante.
Tornar-se-á imprescindível em um processo de formação continuada o reconhecimento
das diferentes etapas do desenvolvimento profissional do professor, uma vez que as
necessidades, os problemas e as buscas dos professores não são os mesmos nos diferentes
momentos do exercício profissional. Destarte, não podemos tratar um professor que possui
ampla experiência profissional, da mesma forma que um professor iniciante ou um professor
que está próximo da aposentadoria. Os processos de formação continuada não poderão ignorar
essa constatação, enfrentando o desafio da ruptura com modelos padronizados e homogêneos,
criando sistemas diferenciados, permitindo aos professores explorar e trabalhar os diferentes
momentos de seu desenvolvimento profissional, de acordo com suas necessidades e
especificidades próprias.
Nessa perspectiva entendemos, como Nias (1991, apud NÓVOA 1995, p.25), que “o
professor é a pessoa, e uma parte importante da pessoa é o professor”. Por isso, Nóvoa chama
a nossa atenção para se “[...] (re) encontrar espaços de interação entre as dimensões pessoais e
profissionais, permitindo aos professores apropriar-se dos seus espaços de formação e darlhes um sentido no quadro de suas histórias de vida”.
29
Acrescenta ainda,
a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou
de técnicas), mas, sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre
as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal. Por
isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da
experiência.
Nóvoa (1995, p.25) vai mais além quando, apoiado em Elliott (1991, p.310) nos
afirma que os modelos profissionais de formação de professores devem integrar
conceptualizações aos seguintes “níveis: 1 – Contexto ocupacional; 2 – Natureza do papel
profissional; 3 – Competência profissional; 4 – Saber profissional; 5 – Natureza do
aprendizado profissional; 6 – Currículo e pedagogia.
Esta preocupação de Nóvoa (1991) com os modelos profissionais de formação de
professores aponta para a necessidade de se levar em consideração as concepções e os níveis,
apontados por Elliott (1991, p.310, apud NÓVOA, 1991, p.24), que poderão integrar os
programas de formação de professores. Chama a nossa atenção para a necessidade de
organização e articulação entre as universidades e as escolas, uma vez que o repensar do
processo formativo nesses níveis, acima apontados, passa pela definição de novos paradigmas
profissionais, como também pela valorização dos espaços da prática e da reflexão sobre a
prática (ZAICHNER,1992).
As concepções do profissional da educação enquanto sujeito reflexivo deverão se
inserir na tendência, que define a prática pedagógica como o local de produção e construção
de um saber profissional, pautada em uma consciência crítico-reflexiva e de ações e posturas
competentes.
Os níveis de formação, acima descritos por Elliott (1990), procuram estimular uma
atitude investigativa, consolidando as bases teóricas e conceptuais no âmbito do processo
formativo dos professores, na perspectiva de uma prática formativa que contemple a
formação-ação e formação-investigação (NÓVOA, 1991, p.24).
Para sedimentação dessas idéias, baseamo-nos na Associação Nacional pela Formação
dos Profissionais da Educação - ANFOPE (1998), que nos aponta para uma formação
continuada que deve tratar da formação profissional, proporcionando novas reflexões sobre a
ação profissional e os novos meios para desenvolver o trabalho pedagógico. Nessa direção, a
formação continuada passa a ser considerada como um processo permanente do conhecimento
e desenvolvimento profissional.
30
Ainda para a ANFOPE, a formação continuada, tendo como ponto de partida a
formação inicial, passa a ser vista como uma proposta mais ampla, na qual a pessoa humana
na sua integralidade, no seu todo, produz-se a si mesma, como também em interação com os
outros, num processo coletivo para se assumir a melhoria da qualidade do ensino através de
uma articulação entre formação básica, condições de trabalho e formação continuada.
A constante busca de uma escola com qualidade de ensino e comprometida com a
formação do sujeito para a cidadania vem exigindo um repensar e um ressignificar da
formação desses profissionais da educação. Considerando-se as inúmeras exigências que o
século vigente faz aos professores, o seu processo de formação tornou-se insuficiente e
inadequado para o atendimento das atuais demandas profissionais. Diante disso, evidencia-se
a necessidade de um processo de formação que seja sistematizado, planejado e decidido como
política educacional, correspondendo e atendendo às reais necessidades e prioridades da
escola, dos professores, de todos os profissionais da educação e dos alunos.
1.2 A formação do professor alfabetizador de pessoas jovens e adultas
Em se tratando da especificidade da formação do professor alfabetizador, sentimos
necessidade de iniciar a discussão tratando da concepção de educação de pessoas jovens e
adultas, para um melhor esclarecimento e entendimento desta modalidade educativa e suas
peculiaridades.
Nas ultimas décadas desencadeou-se uma preocupação envolvendo organizações
nacionais e internacionais, que vêm discutindo e propondo possibilidades de transformações
nessa modalidade de educação escolarizada, a exemplo da Conferência de Hamburgo (V
CONFINTEA), promovida pela UNESCO em 1997. A V CONFINTEA representou um
marco importante na medida em que estabeleceu e vinculou a educação de adultos com o
desenvolvimento sustentável e eqüitativo da humanidade, objetivando refletir e avaliar a
realidade posta na educação de adultos e, conseqüentemente, o processo de alfabetização da
qual faz parte, propondo novos paradigmas, novos encaminhamentos de soluções que
atendam às exigências e necessidades do contexto atual.
O relatório da Conferência redimensiona essa modalidade de educação ao afirmar que:
O novo conceito de Educação de Jovens e Adultos apresenta novos desafios
às práticas existentes, devido à exigência de um maior relacionamento entre
os sistemas formais e os não formais e de inovações, além de criatividade e
flexibilidade. Tais desafios devem ser encarados mediante novos enfoques,
31
dentro do contexto da educação continuada durante a vida. Promover a
educação de adultos, usar a mídia e a publicidade local e oferecer orientação
imparcial é responsabilidade de governos e de toda a sociedade civil. O
objetivo principal deve ser a criação de uma sociedade instruída e
comprometida com a justiça social e o bem-estar geral (Declaração de
Hamburgo – Agenda para o futuro, 1999, p.23).
A educação de jovens e adultos vem representando, ao longo da história da educação
brasileira, uma dívida social não reparadora para todos aqueles que não tiveram o acesso e o
domínio da leitura e da escrita como bens sociais, oferecidos na escola ou fora dela.
A partir da nova LDB 9394/96, a educação de pessoas jovens e adultas consta da
organização e da estrutura da Educação Nacional, com finalidades e funções específicas. Essa
modalidade de educação vem tomando seu lugar de destaque no cenário nacional,
principalmente após a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA, apontando
para uma nova formulação legal no interior da Educação Básica como modalidade do Ensino
Fundamental e sua inclusão na ótica do direito, como direito público subjetivo. Nessa
perspectiva, poderá tornar-se uma grande conquista e um grande avanço, como política
pública, representando um caminho no âmbito da colaboração, da reciprocidade e da
necessidade de políticas integradas (Parecer CEB Nº 11/2000).
Segundo as Diretrizes Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, a EJA é uma
modalidade de Educação Básica que tem especificidade própria, devendo cumprir as funções:
Reparadora, Equalizadora e Qualificadora.
Função Reparadora de um direito de acesso negado a uma escola de qualidade, de
reconhecimento de uma igualdade ontológica de toda e qualquer pessoa humana. Negação
esta, de acesso e permanência, evidente em todo o processo histórico da sociedade brasileira.
A função Equalizadora, para que a pessoa humana que tem a sua formação
interrompida, por qualquer que tenha sido a razão, readquira a oportunidade de acesso ao
saber sistematizado, que a colocará em pé de igualdade diante da convivência e da
participação social. Constata-se a necessidade de se oportunizar mais vagas para o
atendimento dos “novos” alunos e alunas demandantes desta oportunidade de equalização.
A função Qualificadora, que é um apelo para a educação permanente e criação de uma
sociedade educada para o universalismo, a solidariedade, a igualdade e a diversidade; mais do
que uma função, ela é o próprio sentido da educação de jovens e adultos (Parecer CEB Nº
11/2000).
32
Observa-se que a amplitude da definição e das funções que são atribuídas à EJA não
encontram respostas no âmbito das políticas que garantam a sua oferta de qualidade. Mesmo
tendo-se o entendimento de que uma das condições para se oferecer um ensino de qualidade
consiste na definição e execução de uma política de formação de professores adequada ao
atual contexto, ainda é patente a pobreza tanto em relação às políticas de formação, como em
relação às pesquisas e produção de conhecimentos na e para a área, tal como nos mostra
Haddad (2000) e Moura (1999 e 2001).
A formação dos professores para alfabetizar jovens e adultos
Quando se pensa em discutir especificamente a formação dos profissionais para a
Educação de Jovens e Adultos, aos problemas já existentes, segundo Ribeiro (1998), podemos
agregar mais um, considerado e postulado como uma tradução sintética dos demais: a falta de
uma formação específica dos educadores que atuam ou deverão atuar na área, resultando
numa transposição inadequada do modelo consagrado ao ensino fundamental de crianças e
adolescentes.
Na avaliação de Moura (2001, p.98):
Os professores que se propõem a ou se impõem alfabetizar, não têm
qualificação especial para tal. São, em sua maioria, professores
improvisados. Vão contra o princípio de Emília Ferreiro e Vygotsky de que
alfabetizar é um ato de conhecimento e, portanto, uma tarefa complexa,
demorada e exige uma competência e compromisso de profissionais
preparados para tal.
Sem a devida qualificação, os professores passam a desenvolver a prática pedagógica
ignorando as especificidades e peculiaridades dos sujeitos em processo de escolarização.
Utilizam atividades sem nenhum significado, desconsiderando o contexto e a historicidade
desses sujeitos.
Na maioria das vezes os professores utilizam o mecanismo da reprodução do seu
processo de escolarização/alfabetização para determinar a metodologia de trabalho nas salas
de EJA. Não possuem os fundamentos teórico-metodológicos, onde possam incluir os novos
referenciais teóricos. Esses novos referenciais que estão sendo anunciados têm formulações,
indicações e proposições das contribuições da psicogênese da leitura e da escrita e da teoria
histórico-cultural, que vêm pautando-se principalmente nas idéias de Ferreiro e Vygotsky
(Moura, 1999).
Estes referenciais teóricos possibilitarão ao alfabetizador a compreensão do ato de
alfabetizar, permitindo que não mais se ignore a complexidade do processo para o qual
33
necessitará de conhecimentos específicos que o permitam ter a compreensão das
características e especificidades do aluno/alfabetizando nos aspectos antropológico, filosófico,
psicológico, sociolingüístico e que possa entender e colocar na sua prática cotidiana questões
e problematizações dos conteúdos das áreas específicas como matemática e lingüística,
criando e desenvolvendo, junto com os alfabetizandos, numa perspectiva de mediação,
processos metodológicos inovadores que possibilitem aos sujeitos a apropriação das
habilidades básicas e essenciais de leitura e escrita.
Esses comportamentos são resultantes do que nos explica Torres (1990, p.5):
Na verdade continua arraigada a idéia de que qualquer pessoa que saiba ler e
escrever pode se converter em alfabetizador, assim como a idéia de que
qualquer educador o é automaticamente – pelo fato de sê-lo um educador de
adultos. É típico que se passe a ver o professor da escola como depositário
natural da tarefa de alfabetizar adultos.
Nega-se ou desconsidera-se que o processo de formação dos alfabetizadores para a
Educação de Jovens e Adultos continua a ser um dos maiores desafios para a educação
brasileira e principalmente para os próprios educadores, não se dando ouvidos a alertas como
o de Moura (2001, p.105), quando afirma que
não é possível continuar improvisando educadores e alfabetizadores de
Jovens e Adultos. Não é possível continuarmos “zarolhos”, olhando
enviesados como se a Educação e Alfabetização de Jovens e Adultos fossem
uma prática extemporânea e passageira.
Continuamos a conviver com a falta de preocupação e prioridade em relação às políticas e as
ações governamentais que venham a suprir as lacunas e os vazios quanto a esta modalidade
de ensino. Provocando as discussões e denúncias dos estudiosos da área, tal como alerta
Moura (1999, p.41):
A inconsistência e pobreza teórica, aliadas à pobreza das políticas e ações,
vêm impedindo aos alfabetizadores de se apropriarem de um ideário
pedagógico, influenciando negativamente em suas formas de concepção em
relação a si mesmos como profissionais, em relação às maneiras como
entendem os alfabetizandos e os tratam, enfim, afetando o desenvolvimento
das práticas pedagógicas, transformando-as em atividades pobres em todos
os aspectos, causando prejuízos para aqueles que a procuram.
Pensar na formação do educador/alfabetizador de jovens e adultos no atual contexto
socioeconômico, político e cultural exige uma avaliação e uma revisão da prática educativa e
34
da formação inicial e continuada desses educadores, principalmente se considerarmos as
especificidades e particularidades dos sujeitos-alunos-trabalhadores.
Desta feita, olhando a realidade nacional encontramos em Souza (1998, p.3) reflexões
em torno da inexistência de instâncias que pensam a formação de educadores, principalmente
do alfabetizador de jovens e adultos neste país onde a maioria das experiências acontece de
forma pontual através de seminários, de cursos que são até significativos; no entanto, a
questão da formação não poderá acontecer de forma meramente pontual.
O Processo de formação do professor alfabetizador e as especificidades dos sujeitos
Estudos como os de Ribeiro (1999), Oliveira (2001), Haddad (2000), Moura (1999),
Romão (2000), Gadotti (2000), Ireland (2002), Piconez (2002), entre outros, mostram as
especificidades cognitivas, afetivas e socioeconômicas dos alunos da EJA que desafiam os
professores a buscar uma postura e uma prática pedagógica que os tornem capazes de
perceber que o processo de aprendizagem dos alunos jovens e adultos é um processo
complexo. Exige domínio de conteúdo e de saberes específicos, necessários a sua formação
enquanto educadores/alfabetizadores.
Desta forma, Ribeiro (1999, p.90) destaca a necessidade de se ter elementos que
devem fazer parte de temas que precisam ser vistos e visitados por educadores de jovens e
adultos em processo de formação inicial e continuada, na perspectiva de sua
instrumentalização com conhecimentos significativos para essa modalidade educativa.
Ainda nos apoiando em Ribeiro (idem, p.190), percebemos que esses estudos
poderiam contribuir para a sistematização de conhecimentos no plano teórico, para a
constituição desse campo pedagógico e, conseqüentemente, para a formação dos educadores.
Partindo desse pressuposto, vimos o quanto seria necessário à ampliação das
possibilidades de atuação e da percepção dos alfabetizadores para a EJA. Na tentativa peculiar
e imprescindível de se construir esta identidade para a EJA, Jóia et. al (In: RIBEIRO 1999,
p.191) identificaram três idéias forças que desencadearam as tentativas para a construção
desta identidade.
A primeira consiste no reconhecimento dos jovens e adultos a quem essa modalidade
de educação se destina como membro das classes populares excluídas e marginalizadas, não
só do sistema regular de ensino, como também de outras instâncias de exercício de poder e
acumulação de recursos. A ênfase dada nesta idéia é de uma educação de adultos como
prática política, visando o engajamento dos grupos populares em ações transformadoras das
estruturas sociais produtoras das desigualdades e da marginalização. Esta foi a idéia mais
desenvolvida do ponto de vista teórico; tem como ponto relevante na construção da identidade
35
de EJA as influências das obras de Freire, que trazia como princípio básico a educação
dialógica.
A segunda idéia baseia-se no enfoque privilegiado às necessidades de aprendizagem,
características da idade adulta e da condição de trabalhadores para o exercício da cidadania,
para a promoção da qualidade de vida e do convívio na comunidade e na família. O contexto e
o universo cotidiano emergem como foro central a ser equacionado.
A terceira idéia refere-se à especificidade do modo de aprender dos jovens e adultos,
pois estes a apresentam em grau muito mais elevado do que as crianças, pois já dispõem de
um amplo número de conhecimentos práticos e concepções mais ou menos cristalizadas sobre
os vários aspectos da realidade.
Analisando estas idéias propostas, percebemos o quanto é desafiante a busca desta
identidade da EJA, remetendo-nos a um repensar e um ressignificar de todo um processo
formativo do alfabetizador. Como nos aponta Schliemann e Carraher (1998, In: RIBEIRO,
1999), os desafios postos para a formação dos educadores são imensos, pois, para que se
possa promover um trabalho integrado e produtivo, necessário se faz um alto grau de
compreensão da estrutura dos conteúdos escolares, como também dos procedimentos mentais
dos quais os jovens e adultos lançam mão para resolver seus problemas da vida cotidiana, e
como explicam os fenômenos que os rodeiam.
Percebemos, com estas reflexões, a necessidade de um aprofundamento e um
amadurecimento de todo o processo formativo do alfabetizador, uma vez que em toda a
proposta dos cursos de formação é a psicologia do desenvolvimento infantil que fundamenta
as propostas pedagógicas, deixando desta feita a lacuna quanto ao atendimento das
peculiaridades e demandas da Educação para Jovens e Adultos.
O processo formativo do alfabetizador de jovens e adultos necessitará de uma proposta
de psicologia com o amadurecimento para atender às demandas cognitivas e motivacional do
jovem e adulto, superando a tradicional concepção de desenvolvimento humano que ocorre no
plano biológico (infância e adolescência). Ênfase dada em todos os cursos de formação de
profissionais da educação, desconsiderando as características, especificidades e peculiaridades
de outras fases da vida e os efeitos do processo de aprendizagem que podem ocorrer também
no período de vida adulta.
Essas questões abordadas nos remetem para a possibilidade de superação das práticas
pedagógicas que infantilizam ou descaracterizam a educação de jovens e adultos. Mostra a
necessidade de proporcionar aos educadores desses sujeitos estudos de formação inicial e
continuada que poderão subsidiar sua ação pedagógica na direção de entenderem e
36
compreenderem que existe toda uma especificidade do conhecimento prático ou espontâneo,
contrapondo-se aos conhecimentos teóricos, científicos ou escolares. Vigotsky (1996, apud
MAZZEU, 1998) aponta desta forma para a compreensão do desenvolvimento do processo
ensino-aprendizagem do jovem e adulto, sobretudo, diferenciando-o do processo de ensino e
aprendizagem de crianças.
A superação e enfrentamento destes desafios requerem a aquisição de um instrumental
teórico que venha a subsidiar os educadores, tornando-os capazes de construir uma prática
pedagógica fundamentada e caracterizada nas reais necessidades de aprendizagem das pessoas
jovens e adultas.
Outro aspecto importante e desafiante para a formação do educador de jovens e
adultos é adquirir competências para lidar com as novas formas de organização do espaço e
tempo escolar, na tentativa de superação do modelo tradicional, da exposição oral dos
conteúdos pelo professor, da avaliação somativa, do planejamento unilateral e demais formas
de pensar e fazer o cotidiano da sala de aula.
O desafio posto para o alfabetizador de jovens e adultos é repensar formas alternativas
de superação deste modelo com capacidade ética e competência profissional para reorganizar
e reestruturar a organização curricular disciplinar e de seriação, permitindo aos jovens e
adultos a realização e a concretização do seu percurso formativo diversificado e propício as
suas mais reais necessidades e condição de vida, superando todas as formas de aprendizagem
que os excluíram e os impediram de avançar, no período próprio de suas vidas, em seu
processo de escolaridade.
Para atender a estes desafios e demandas, as pesquisas analisadas por Haddad (2000,
p.15) recomendam que
A formação Continuada de professores deve ser feita numa estreita relação
com a prática cotidiana, com acompanhamento sistemático do professor,
para que se possa garantir algum retorno desta ação ao trabalho efetivo em
sala de aula. Os “treinamentos” esporádicos, os cursos aligeirados e os
programas de alfabetização sem continuidade garantida são avaliados nas
pesquisas como instrumentos de desserviço à EJA, pois criam expectativas
que não serão correspondidas, frustram alunos e professores, reforçam a
concepção negativa de que não há o que fazer nesta modalidade de ensino.
Essas recomendações nos encaminham para buscar, através dos sujeitos investigados,
como se deu o processo de formação inicial. É do que trataremos no próximo capítulo.
CAPÍTULO II
A FORMAÇÃO INICAL DAS PROFESSORAS QUE ALFABETIZAM
PESSOAS JOVENS E ADULTAS: “O Silêncio Permitido” 11
A formação não é concebida como “algo a mais” que se acrescenta ao
nosso trabalho diário, mas como parte deste
Ramos ( 2001, p.24)
Este capítulo nos permitirá uma reflexão acerca do como e onde vem ocorrendo o
processo de formação inicial das professoras alfabetizadoras envolvidas na pesquisa. Após
análise das entrevistas e questionários aplicados, organizamos um quadro onde caracterizamos
cada espaço formativo.
Passamos, à explicação e identificação de cada curso apresentado pelas entrevistadas,
considerando que as evidências apontam que o seu processo de formação inicial vem
acontecendo em um silêncio permitido. A partir desta evidência, aventuramo-nos para a
descoberta do porquê deste silêncio. Para isto, lançamos mão das informações obtidas através
das instâncias formadoras de profissionais da educação em Alagoas, e das Bases Legais que
sustentaram os cursos que formaram as professoras alfabetizadoras, envolvidas na pesquisa.
Encontramos subsídios que nos permitiram apontar evidências do porquê do silêncio
permitido, ao mesmo tempo que localizamos proposições e anúncios de uma possível ruptura
do atual paradigma do processo de formação inicial dos professores alfabetizadores de
educação para jovens e adultos.
Neste sentido, convidamos para um mergulho nestas páginas, a fim de encontrar a
resposta para o questionamento: por que o silêncio ainda é permitido e quais as proposições
que se anunciam para a superação deste silêncio?
Através das entrevistas realizadas e dos questionários aplicados, procuramos analisar
os espaços de formação inicial das professoras alfabetizadoras das duas redes de ensino,
Estadual e Municipal, a partir delas mesmas.
2.1 Formação inicial das professoras alfabetizadoras
Os dados dos dois quadros indicados (próxima página) mostram que todas as
professoras alfabetizadoras investigadas, tanto da rede estadual quanto da rede municipal de
ensino, apresentam os requisitos exigidos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional - LDB - 9394/96 para o exercício do magistério no 1º segmento do Ensino
11
Esse termo foi utilizado por Moura (1996), em palestra proferida em seminário de educação de jovens e
adultos.
38
Fundamental. Observa-se, inclusive, que a situação de formação inicial das alfabetizadoras
extrapola as exigências legais: a grande maioria possui habilitação em nível superior e na rede
municipal, três delas, são portadoras do título de Pós-Graduação lato sensu.
Quadro 1. Nível de formação inicial das alfabetizadoras de EJA investigadas – Rede
Estadual – 2002.
Professoras Alfabetizadoras
Nível/Cursos
A
2º grau - Magistério e Científico /
Licenciatura em Pedagogia
B
2º grau - Magistério
C
Licenciatura em Pedagogia
D
2º grau - Magistério
E
2º grau - Magistério / Licenciatura Curta em
Letras / Cursando Licenciatura em
Pedagogia
F
Licenciatura em Pedagogia
G
2º grau - Magistério / Cursando Licenciatura
em Pedagogia
H
2º grau - Magistério
I
2º grau - Magistério
Quadro 2. Nível de Formação Inicial das alfabetizadoras - Rede Municipal –2002.
Professoras Alfabetizadoras
Nível/Cursos
A
Licenciatura em Pedagogia
B
2º grau - Magistério
C
Licenciatura em Pedagogia e Especialização em
Educação de Jovens e Adultos
D
Licenciatura em Pedagogia/ Licenciatura Curta
em Educação Artística e Especialização em
Formação de Professores para a Educação
Básica
E
2º grau - Magistério e Graduação em Relações
Públicas
F
Licenciatura em Pedagogia
G
Licenciatura em Pedagogia e Especialização em
Coordenação Pedagógica
H
Licenciatura em Letras
Se tomarmos como parâmetro a situação do quadro de professoras alfabetizadoras não
habilitadas que historicamente vêm atuando nos Programas, Projetos e Campanhas e nas
39
ações promovidas pelas Organizações Não Governamentais e pelos movimentos populares em
todo o Brasil, e particularmente em Alagoas, este quadro que identificamos poderia ser
considerado como privilegiado.
No entanto procuramos, por meio das entrevistas, entender de que forma as
professoras alfabetizadoras percebiam o processo formativo que vivenciaram, a natureza de
como se deu a formação inicial recebida no que se refere às especificidades da área em que
estavam atuando: alfabetização de pessoas jovens e adultas. Obtivemos os seguintes
depoimentos12:
Minha formação do Curso de Pedagogia da UFAL, ela me dá uma
orientação, me dá uma direção para minha prática na sala de aula, me dá
uma formação acadêmica, mas a prática mesmo da sala de aula de EJA, a
minha formação, eu digo com convicção que é a prática do dia-a-dia, são as
situações que eu também enquanto pessoa vivencio e que com isso eu
contextualizo os conteúdos em sala de aula, porque assim fica bem mais fácil
de trabalhar (Professora Alfabetizadora A – Rede pública estadual).
Como não tive oportunidade, por diversos motivos, de fazer um curso de
graduação na área de educação, eu busco sempre pesquisar o que tem de
novidade nessa modalidade de ensino, através de livros, revistas, seminários
e cursos. A formação que recebi não me dá condições para valorizar o
trabalho com EJA no dia - a - dia da sala de aula, porque fui preparada para
ensinar crianças (Professora Alfabetizadora “B” – Rede pública estadual).
Evidencia-se na fala da professora alfabetizadora “A” que a sua formação em curso de
nível superior não lhe proporcionou as devidas competências para atuar na área de educação
de jovens e adultos, dando-lhe apenas conhecimentos teóricos que não lhe permitem a
articulação teoria-prática. A teoria recebida academicamente não se articula com a prática
cotidiana da sala de aula; estas evidencias demonstram que as instâncias formadores em nível
superior mantêm um modelo de formação que não atende às especificidades da prática
cotidiana da professora alfabetizadora de jovens e adultos.
A professora alfabetizadora “B” deixa evidente na sua fala que a formação inicial
recebida na agência formadora não lhe permite desenvolver uma prática pedagógica eficiente
e que de fato venha a atender às especificidades da área. Fica evidente também, na fala da
12
Os textos das falas que serão apresentados em todo o trabalho são uma transcrição na integra dos
depoimentos gravados durante as entrevistas.
40
professora “B”, que a transposição didática que faz na sala de aula relaciona-se a seu processo
formativo para ensinar crianças.
Nesse sentido, Ribeiro (1999, p.188) mostra que a perspectiva assistencialista e
infantilizadora da educação de jovens e adultos é um fator que prejudica a constituição do
campo, limitando as condições de se oferecer aos professores alfabetizadores uma formação
adequada que leve em consideração as especificidades do público - alvo dessa modalidade de
ensino; muitas vezes o professor alfabetizador transpõe intuitivamente para a educação de
jovens e adultos um conhecimento adquirido em experiências prévias de educação infantil,
que já tenha vivenciado, ou experienciado no papel de aluno enquanto criança ou enquanto
professor adulto.
A professora alfabetizadora D em seu depoimento revela que
A formação profissional recebida, diria que inicialmente não me deu
condições para atuar em EJA, até porque as áreas de estudo e as políticas
públicas governamentais estavam restritas a algumas áreas da Educação
Básica, ou seja, fui preparada inicialmente para ensinar crianças. Os
trabalhos com adultos eram feitos com programas governamentais, paliativos
e alheios à vida do trabalhador adulto (Professora Alfabetizadora D – Rede
pública municipal).
Observamos neste depoimento que, quando a professora alfabetizadora se refere às
especificidades da EJA, argumenta que a formação inicial, seja ao nível do Ensino Médio
Magistério ou em nível de Graduação, não instrumentaliza, não qualifica o professor para
atuar na área específica da EJA. Esse reconhecimento pode ser percebido e relacionado com a
perspectiva apontada por Cró (1998, p.75) quando nos indica que, apesar de todo esforço de
renovação e inovação da formação inicial, sobretudo nas instituições de ensino superior, a
verdade é que os futuros professores e educadores saem despreparados para se confrontar com
a realidade e para resolver problemas que as suas práticas lhes põem no dia-a-dia da
formação.
A professora alfabetizadora E, tentando resgatar o processo de formação inicial, revela
que “Minha formação se deu no curso de magistério”. Logo em seguida reflete e refaz a fala:
O curso que nos é oferecido no magistério nos orienta basicamente, não
especificamente a jovens e adultos. Adquirimos experiência na prática do
dia-a-dia, passando para eles o meu conhecimento conforme a realidade de
cada um (Professora Alfabetizadora E – Rede pública municipal).
41
Complementa, desabafando: “em relação à formação continuada, nós desta escola não
fomos contemplados”.
Quando a alfabetizadora E identifica o curso de Magistério como formador e
imediatamente reavalia esse espaço de formação, deixa evidente e confirma a nossa análise
anterior de que os conhecimentos adquiridos nos cursos de formação de professores em nível
médio não atendem às demandas da EJA. Toda a estrutura curricular do curso é planejada e
desenvolvida para “formar” o professor que trabalhará com crianças e adolescentes. Desta
forma, ao assumirem turmas de jovens e adultos há uma transposição didático-metodológica
mal feita, evidenciando-se assim o que as pesquisas (Beisegel, 1979), (Moura, 1999),
(Ribeiro, 1999), vêm confirmando sobre o processo de infantilização que poderá ocorrer no
tratamento dado aos alfabetizandos da educação de adultos.
A partir dessa avaliação, fomos buscar as instituições formadoras no Estado para
avaliar o que elas oferecem em nível de formação inicial para essas e outras professoras que
assumem a tarefa de alfabetizar pessoas jovens e adultas.
2.2 Instituições Formadoras em Alagoas
Voltando nosso olhar para a realidade de Alagoas, apoiamo-nos em Moura (1999), que
faz um balanço da situação dos cursos de formação de professores no âmbito da UFAL.
Mostra que a preocupação com o alto índice de analfabetismo no Estado levou o Colegiado do
Curso de Pedagogia a elaborar em 1987 uma proposta de inclusão de estudos na área de
educação de adultos.
Cinco anos depois, em 1992, teve início um trabalho na área de ensino, pesquisa e
extensão, envolvendo os alunos do curso de pedagogia para a reflexão e produção de
conhecimentos neste campo. Em relação ao ensino de graduação passaram a ser ofertadas três
disciplinas específicas à área, totalizando 180 horas. A partir de 1997, houve uma
reformulação no currículo do curso, extinguindo-se a área de educação de adultos. Com isso a
oferta para a área ficou reduzida a uma disciplina eletiva de apenas 60 horas por semestre e,
atualmente, 80 horas por ano. A partir da extinção da área, propunha-se que esses estudos
fossem aprofundados em nível de Pós-graduação.
Em 2002 foi ofertado o primeiro curso de Especialização para professores do Ensino
Fundamental de Jovens e Adultos – 1º segmento. Também em 2002, com a implantação do
Mestrado em Educação Brasileira do Centro de Educação, passaram a ser ofertadas duas
42
vagas – por ano – para ingresso de alunos que desejam realizar estudos e pesquisas na área de
EJA.
Avaliando os demais cursos de licenciatura da UFAL, a exemplo das Licenciaturas em
Letras, História, Matemática, Geografia, Física, Química, Ciências Sociais, constatamos, tal
como afirma Moura (1999), que não existe nos currículos qualquer disciplina que trate das
questões de educação ou alfabetização de jovens e adultos.
Analisamos o Currículo Pleno do Curso de Pedagogia do CESMAC - que através da
Faculdade de Filosofia e Letras de Maceió oferece vários licenciaturas – Pedagogia, Letras,
História, entre outros. Entrevistamos a Coordenadora das licenciaturas, verificamos não
existir disciplina específica em Educação ou alfabetização de pessoas jovens e adultas.
Localizamos uma disciplina no Curso de Pedagogia denominada “Magistério para
Classes de Alfabetização”, com apenas 2 horas aulas semanais, que trata das questões de
alfabetização de forma ampla, incluindo a Educação para Jovens e Adultos. Como os cursos
funcionam somente à noite, os alunos fazem um estágio de observação nas classes de
Educação de Jovens e Adultos das redes estadual ou municipal com o objetivo de fazer um
confronto da teoria e da prática.
Analisando os Currículos Plenos da Fundação Universidade Estadual de Alagoas FUNESA - que oferece várias licenciaturas, identificamos, na proposta que está sendo
aprovada atualmente pelo CEE (Conselho Estadual de Educação), uma disciplina chamada
“Processo de Alfabetização”. A respectiva disciplina não faz nenhuma referência à Educação
de Jovens e Adultos. Ao analisar uma proposta de anos anteriores, encontramos a disciplina
Educação de Adultos. Surgiu a curiosidade em torno do conteúdo desenvolvido na disciplina
e de como era a sua oferta; buscamos resposta através da coordenadora do curso de
Pedagogia.
Segundo a referida coordenadora, a partir da implantação do Curso de Pedagogia em
1996 surgiu a preocupação com a educação de jovens e adultos. Dessa forma, somente na
proposta do curso de Pedagogia a disciplina Educação de Adultos passou a ser ofertada em
caráter obrigatório; as demais licenciaturas não se envolveram na discussão.
Em 2002, iniciou-se a discussão de reforma do curso de Pedagogia. Nesta nova
proposta a disciplina Educação de Adultos deixou de ser obrigatória e passou a ser uma
disciplina eletiva com a denominação de Processos de Alfabetização, devendo tornar-se
obrigatória se for escolhida pelo consenso da maioria dos alunos a partir do 6º período do
curso. Isto porque cada ano o curso oferece quatro modalidades de áreas de estudos para
serem escolhidas pelos alunos: Educação Infantil, Educação Especial, Educação Indígena e
43
Educação de Jovens e Adultos. A modalidade que for selecionada pelo consenso dos alunos
será incluída na disciplina Processos de Alfabetização. Nessa perspectiva, a questão da
alfabetização é trabalhada de forma abrangente, não havendo especificidade para a educação
de jovens e adultos.
Em relação à proposta de trabalho da disciplina, existe uma parte teórica e outra
prática: os alunos fazem observação em escolas que oferecem educação de jovens e adultos,
fazem levantamento de problemas para serem discutidos e confrontados em sala da aula. O
curso oferece ainda uma modalidade de estudos independentes – que são temas escolhidos
pelos alunos para serem trabalhados em seminários; um dos temas que mais chama a atenção
e é selecionado refere-se à educação de jovens e adultos.
Durante a investigação procuramos analisar as instituições de 2º grau, hoje Ensino
Médio modalidade normal, onde as professoras alfabetizadoras realizaram a formação inicial.
Entrevistando as técnicas da equipe de coordenação do atual Ensino Médio modalidade
Normal da SEE13, atentamos para a oferta de EJA nesta modalidade educativa.
Percebemos que a própria legislação diz que a escola, de acordo com a sua realidade,
aprofundará as questões de EJA no quarto ano, ou seja no final do curso Médio Normal. Desta
feita essa modalidade será ofertada, mas sem a característica de obrigatoriedade ou de estar
vinculada a uma proposta pedagógica mais consistente. Esta modalidade de ensino deverá ser
trabalhada, em forma de seminários ou palestras, vinculada à disciplina Didática Geral e
Prática de Ensino, sem uma sistematização própria. Ou seja, não existe identidade como
disciplina; ela será ofertada como as demais modalidades de ensino. Será tratada na
perspectiva de que os alunos obtenham as informações mínimas sobre a existência da área,
não lhes sendo possibilitado pensar e se apropriar dos fundamentos teóricos e práticos que
explicam a teoria e as práticas pedagógicas da educação de jovens e adultos.
Constata-se que, apesar das discussões de reforma do Ensino Normal – Habilitação
Magistério – para o Ensino Médio Modalidade Normal, previsto pela LDB 9394/96, o modelo
que vem se delineando ainda não atenderá às modalidades de ensino, principalmente a EJA,
levando-se em consideração a realidade e os índices de analfabetismo que persistem no
Estado. Confirmando o que Moura (2001, p.103-104) já vem revelando: “Os cursos normais
não ventilam, em hipótese alguma, trabalhos direcionados para o contato dos seus alunos com
experiências práticas, voltadas para a Educação de Jovens e Adultos”.
13
Ao mesmo tempo que participamos, como consultora, das discussões e acompanhamos a elaboração da
PCEMN – Proposta Curricular para o Ensino Médio Normal.
44
Segundo as Coordenadoras do Ensino Médio modalidade Normal, a Coordenadoria de
Ensino da SEE, em consonância com a proposta do Governo Federal de Combate ao
Analfabetismo, priorizou três linhas de atuação para o ano em curso (2003): Alfabetização,
Currículo e Avaliação. Convocando desta feita a Coordenação do Ensino Médio modalidade
Normal para atuar em uma ação de contribuição à proposta de combate ao analfabetismo, em
que se propõe ampliar as linhas de discussões das modalidades de Educação Infantil e
Educação para Jovens e Adultos, dando ênfase às questões da alfabetização. Definindo-se
como contribuição ao programa, a implementação de seminários e palestras sobre a educação
de jovens e adultos de forma mais sistematizada, neste período mais forte de implementação
da proposta no Estado.
Fica explícito, nas propostas das instituições analisadas, que as instâncias formadoras
em nível de Estado não possuem projeto pedagógico nem disciplina curricular que
proporcione a formação inicial básica do professor alfabetizador para a EJA. Ficou claro
também, na análise, que as disciplinas ofertadas proporcionam um conhecimento “superficial”
sobre a área, na perspectiva de apenas fazer com que os profissionais da educação, ao
concluírem seus cursos de formação, saibam que existe esta modalidade de ensino. Esta
realidade desvelada nos deixa um questionamento: será que só recebendo informações sobre a
área, os professores alfabetizadores de jovens e adultos estarão preparados para atuar em tão
complexa atividade de ensino?
Identificamos apenas em uma das instâncias – CEDU/UFAL – uma proposta
diferenciada de oferta, mas que ainda não atende à especificidade e à complexidade da prática
na área. Apesar de o referido centro possuir um Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão sobre
Alfabetização - NEPEAL, o número de alunos – futuros professores – que participam das
atividades é ainda muito limitado. Por outro lado, mesmo já tendo oferecido um curso de
especialização para professores de EJA, ainda não consegue dar conta das lacunas existentes
na graduação: primeiro, porque não são ofertadas disciplinas específicas para a área, como
alfabetização, metodologias, lingüística, sociolingüística e psicolingüística; segundo, porque o
curso de Pedagogia do turno noturno apresenta uma grande dicotomia: os alunos são
preparados profissionalmente para atuar como professores do Ensino Fundamental de crianças
– séries iniciais de 1ª a 4ª série; no entanto, quando chegam ao 4° ano, realizam seus estágios
de Prática de Ensino em turmas de EJA. Os desabafos dos alunos revelam claramente a
dicotomia: “como é difícil, minha cabeça, meu corpo, todo o meu ser foi preparado para atuar
com crianças e hoje me sinto perdido. Planejo para adultos pensando em crianças, até porque
cursei a disciplina eletiva Educação Infantil, e não Educação de Adultos”.
45
O “silêncio permitido” por parte das instituições de ensino superior e de ensino médio
em relação à formação inicial básica de profissionais para a alfabetização e a educação de
pessoas jovens e adultas é decorrente de um modelo que não contempla uma formação para o
professor alfabetizador de jovens e adultos. Essa realidade leva a que as instituições
governamentais e entidades e organizações não governamentais empregadoras desenvolvam
projetos de formação continuada, tentando suprir os vazios e superar as lacunas de
conhecimentos e experiências apresentados pelos seus profissionais.
A própria preparação para alfabetizar crianças ocorre de forma precária frente às novas
exigências do processo de alfabetização, que hoje apresenta novos referenciais teóricometodológicos, tendo como suporte básico o repensar da construção da base alfabética e
trazendo um grande diferencial ao tratamento que deve ser dispensado às crianças.
2.3. Bases legais que sustentaram os cursos formadores das professoras alfabetizadoras
Para o entendimento do silêncio permitido na formação das alfabetizadoras de jovens e
adultos fomos aos fundamentos legais que nortearam as estruturas dos cursos de formação
inicial dos professores no país, e no caso em estudo, em Alagoas, quando ainda não se tinha
em vigor a nova LDB 9394/96. As leis que embasaram os cursos das entrevistadas foram
particularmente as Leis 5692/71 e a 7044/82.
Compreendemos que uma nova legislação poderá reorientar para novas perspectivas;
no entanto, seu impacto total poderá levar anos para ser percebido no dia-a-dia dos sistemas.
Além disso, existem certos aspectos no cotidiano da escola que poderão escapar a qualquer
legislação. Desta feita, qualquer mudança ou transformação dependerá de quem faz a
educação na sala de aula (GATTI, 1997).
Partindo deste pressuposto, nossa análise dos cursos de formação inicial das
professoras alfabetizadoras entrevistadas passa pela antiga legislação, uma vez que,
considerando o contexto legal no qual o atual sistema foi gerado, nos reportamos à
constituição do próprio sistema.
A Lei 5692/71, no seu Art. 29, fixava que:
A formação de professores e especialistas para o ensino de 1º e 2º Graus será
feita em níveis que se elevem progressivamente, ajustando-se às diferenças
culturais de cada região do País, e com orientação que atende aos objetivos
específicos de cada Grau, às características das disciplinas, áreas de estudos
e as fases de desenvolvimento dos educandos.
46
Este artigo vem nos mostrar a flexibilidade nas estruturas de formação, sua adequação
para as eventuais diferenças regionais, tendo em vista a elevação desse nível de formação no
tempo. Percebe-se que muito pouco ou nada do que propunha foi concretizado; verificamos
que o que ocorreu foi a burocratização pelas normatizações – quer em nível federal, quer em
nível estadual. Quando se explicitava “adequação”, isto não ocorria; o que de fato se
presenciava era a prescrição da lei; desta feita não havia espaço para se pensar ou discutir
questões pertinentes, como, por exemplo a formação do professor alfabetizador, muito menos
do professor alfabetizador para a EJA.
A Lei 7044/82 surgiu para a alteração do art. 30 da Lei 5692/71.
Exigia-se como formação mínima para o exercício do magistério: a) no
ensino de 1º grau, de 1ª a 4ª série, habilitação de 2º grau; b) no ensino de
1ºgrau, da 1ª a 8ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de
graduação, representada por licenciatura de 1º grau, obtida em curso de
curta duração; c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica
obtida em curso superior correspondente à licenciatura plena.
A própria LDB 5692/71 nos Arts. 77 e 78 previa, em caráter suplementar, várias
possibilidades de suprir a falta de docente adequadamente formado. Mantendo-se em vigor os
esquemas emergenciais de habilitação ao magistério, os conhecidos esquemas 1 e 2.
Pressupõe-se que a falta de uma política de formação mais explícita poderia ter suscitado o
surgimento e a permissão do silêncio nos processos de formação, baseando-se no princípio de
se suprir a falta do docente, mesmo não possuindo a habilitação específica para a área. Esta é
uma suposição frente à realidade do nosso estudo em foco.
Na vigência da estrutura das licenciaturas curtas, que eram polivalentes, para o ensino
do 1º grau, o CFE definiu algumas orientações normativas para a plenificação dessas
licenciaturas com o intuito de que progressivamente estas habilitações viessem a se tornar
plenas. A Lei 9394/96 extingue as licenciaturas curtas.
Este curto passeio, que nos permitimos fazer, nas antigas legislações de ensino, no que
se refere ao processo de formação dos professores nos favoreceu: em primeiro lugar, a
compreensão do significado dos cursos, que se evidenciou nos quadros que caracterizam a
formação inicial das professoras alfabetizadoras entrevistadas, tanto da rede estadual como
municipal da cidade de Maceió. Essa explicitação encontramos detalhadamente na Lei
7044/82, no sentido de alterar o art. 30 da Lei 5692/71, definindo claramente o âmbito e
significado de cada curso: Magistério – Habilitação mínima em nível de 2º grau, para atuar no
ensino de 1º grau de 1ª a 4ª série; Pedagogia – Habilitação específica obtida em curso
47
superior, correspondente à licenciatura plena; Letras e Educação Artística – Habilitação
específica de grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1º grau,
obtida em cursos de curta e/ou plena duração. Em seguida, o passeio nos permitiu maior
aprofundamento e fundamentação para a reflexão acerca do entendimento do porquê ainda
existe um silêncio permitido para a formação do professor alfabetizador para jovens e adultos.
Observamos que os modelos, os paradigmas da formação de todas as alfabetizadoras
entrevistadas pautaram-se na legislação apresentada; neste sentido não percebemos a
preocupação ou a necessidade de se formar para alfabetizar a pessoa jovem adulta. Todo o
processo formativo explicitado na legislação era de uma formação totalmente voltada para o
Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série – ou seja, um atendimento específico para as séries
iniciais, como também para as séries finais do 1º grau de 1ª a 8ª série.
Com base nessas análises, verifica-se que o Curso de Pedagogia e as demais
licenciaturas ainda se mantêm na sua forma clássica, tradicional dos anos 60, em que
podemos encontrar a separação das disciplinas de fundamentos da educação das disciplinas
didático-metodológicas, e das disciplinas das habilitações específicas; a separação teoriaprática que decorre da fragmentação das disciplinas e da desarticulação entre o estágio da
prática de ensino com as demais disciplinas do curso, apesar de a nova legislação já se
encontrar em pleno vigor.
Destarte, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 5692/71, o curso normal
transforma-se em ensino profissionalizante, Habilitação Magistério. Neste sentido,
observamos que a formação oferecida é totalmente voltada para o ensino das séries iniciais do
Ensino Fundamental, não existindo nenhuma preocupação com as outras modalidades de
ensino. Os cursos de nível superior têm toda a sua atenção voltada para as habilitações –
Administração, Supervisão, Orientação e Inspeção Escolar, ou mesmo para a Coordenação
Pedagógica - mantendo e reforçando cada vez mais a tão questionada divisão e a
fragmentação do trabalho escolar. Os especialistas passaram a ser os que pensam, definem e
determinam aquilo que caberá tão - somente aos professores executar.
Desta feita, se o processo de formação dos professores brasileiros era preocupante,
com este modelo de trabalho dividido e fragmentado passará a ser um agravante, uma vez que
sentimos que a sua forte marca ainda permeia os ambientes escolares até o presente momento.
Este modelo de formação nos reporta a pensar na educação, na sociedade, no contexto
onde vem ocorrendo, e quais as implicações práticas para os professores e alunos,
principalmente no que se refere ao atendimento às especificidades e modalidades de ensino
que existem hoje e estão presentes no contexto escolar, a exemplo da EJA.
48
Constatamos que, apesar dos esforços de renovação e inovação da formação inicial,
principalmente nas Instituições de Ensino Superior, os futuros professores ainda saem
despreparados para se confrontar com a realidade educacional, principalmente para enfrentar
e resolver os problemas que a prática pedagógica cotidiana lhes impõe, e que, neste modelo de
formação inicial que ainda se encontra presente no processo formativo do professor, os
saberes poderão estar sendo apresentados de forma desconexa, fragmentados, sem uma prática
interdisciplinar. Sendo assim, a prática, que acreditamos ser por essência interdisciplinar, não
estará contribuindo de forma mais efetiva na formação do professor.
Considerando a importância da área e dos desafios reais quanto ao processo de
formação dos profissionais da EJA, concordamos com Nóvoa (1991, p.24) quando afirma:
“parece evidente que, tanto as Universidades como as escolas, são incapazes isoladamente de
responder a estas necessidades”.
Essa reflexão apresentada por Nóvoa (ibidem) vem chamar a nossa atenção para as
dificuldades encontradas hoje por todos os envolvidos na EJA e no processo de formação
continuada desses profissionais educadores/alfabetizadores. Identificamos na nossa realidade
a ausência da formação básica específica, deixando dificuldades “instransponíveis” para a
formação continuada, como nos explica Ramalho (1993, p.25):
Uma prática profissional complexa como a docência exige uma qualificação
que deve ser desenvolvida num processo de formação inicial que, mesmo
não garantindo, por si só, um alto grau de profissionalização, é a instância
específica para a aquisição das competências mínimas para exercício
profissional, servindo de base para outras modalidades formativas, como a
atualização e a formação permanente.
Partindo desse pressuposto, evidencia-se que a formação inicial dos professores de
EJA como política pública de formação não vem acontecendo nas Instituições de Ensino
Superior e nas Escolas de Nível Médio, levando à percepção do quanto ainda é necessário
fazer para a superação de dificuldades conceituais, conceptuais e metodológicas, pois, como
nos aponta Perrenoud (1993, p.15):
Só é possível pensar a formação dos professores pensando e repensando
constantemente à luz das ciências humanas – de todas as ciências humanas –
as práticas pedagógicas e o funcionamento dos estabelecimentos de ensino e
dos setores educativos.
Neste sentido, surgem inquietações de que a formação inicial recebida torna-se
inadequada para a realidade, o que poderá submeter os profissionais da educação,
49
principalmente os professores alfabetizadores de EJA, a buscarem, no silêncio permitido, as
possibilidades e alternativas para o saber da prática, processo este que poderá se dar coletiva
ou solitariamente.
2.4 Anúncios e buscas no sentido de romper o silêncio na formação inicial dos
professores alfabetizadores
Pautando-nos nas novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação,
percebemos que este silêncio poderá deixar de existir uma vez que o Parecer CNE/CP
009/2000, que vem tratar da Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior,
curso de licenciatura, de graduação plena, apoiada na Nova LDB 9394/96, aponta para uma
nova proposta de formação de professores.
Considerando que as características gerais da formação de professores deverão ser
adaptadas ou adequadas aos diferentes níveis e modalidades de ensino, assim como a cada faixa
etária, destaca-se que a educação básica deverá se constituir como referência para a formação
dos profissionais da educação. E que os objetivos e conteúdos de todo e qualquer curso ou
programa de formação inicial ou continuada de professores deverão tomar como referência os
artigos 22, 27, 29, 32, 35 e 36 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, por
determinarem as finalidades gerais da educação; os objetivos da educação infantil e do ensino
fundamental e médio; como, também, as Normas Nacionais instituídas pelo MEC - Ministério
da Educação e Cultura e pelo CNE - Conselho Nacional de Educação.
Percebe-se nos textos legais uma preocupação em se pensar uma formação de
professores, com atenção voltada para as modalidades de ensino, entre elas a EJA, o que não
havia sido explicitado nas legislações por nós analisadas anteriormente, podendo assim suscitar
uma ruptura com um paradigma de formação que não mais atende às demandas sociais e
profissionais, surgindo então uma nova possibilidade de formação de profissionais da educação.
Quando se explicita, no Parecer CNE/CP 009/2001, que a LDB 9394/96, ao definir as
incumbências dos professores, não se refere à nenhuma etapa da escolaridade básica. Traça o
perfil profissional, que independe do tipo de docência: multidisciplinar ou especializada, por
área de conhecimento ou disciplina, para crianças, jovens e adultos.
O parecer demonstra ainda a persistência de questões que deverão ser enfrentadas no
processo de formação de professores, como por exemplo: os moldes tradicionais dos cursos
de licenciaturas – bacharelado versus licenciatura; as deficiências da estrutura curricular,
principalmente no que diz respeito à abreviação dos cursos, nas formas de licenciaturas
curtas; a ausência de um projeto institucional que focalize os problemas e as especificidades
50
das diferentes modalidades da educação básica. Persiste ainda a discussão para estabelecer
equilíbrio entre o domínio dos conteúdos e a sua adequação à realidade pedagógica, como
também a revisão do processo de formação inicial de professores, que terá de ser enfrentada
no campo institucional e no campo curricular.
O parecer nos deixa com uma grande expectativa quando aponta para a possibilidade
de ampliação das condições para a formação de professor, com a atenção voltada para as
diversas modalidades de ensino. É quando tornamos à questão: deixará de ser silenciosa a
formação do professor alfabetizador de jovens e adultos?
Considerando que seria oportuno se rever e se repensar as políticas públicas para o
atendimento da área, os planos de cargos e salários, os planos de formação básica inicial e
continuada, incluindo o educador/alfabetizador de jovens e adultos, Nóvoa (1995, p.23) nos
leva à reflexão de que precisamos reconhecer que os programas atuais de formação de
professores apresentam deficiências científicas e pobreza conceitual. E situa as nossas
reflexões para além das clivagens tradicionais, ou seja, componente científico versus
componente pedagógico, disciplina teórica versus disciplina metodológica etc., sugerindo-nos
novas possibilidades para pensar a problemática da formação do professor e, especificamente,
para a formação do professor alfabetizador de EJA.
Percebe-se a necessidade de se definir propostas e de se tomar decisões políticas sérias
que contribuam com o processo de escolarização de todos os sujeitos cidadãos inseridos neste
contexto, como também com o processo formativo dos profissionais que atuam na área,
especificamente. Com essas preocupações, a partir da década de 90, educadores do Brasil,
representando suas instituições e entidades da sociedade civil, têm se organizado em torno da
constituição de Fóruns estaduais, através dos quais são realizadas discussões e
encaminhamentos levados aos Encontros Nacionais de Educação de Jovens e Adultos
(ENEJA)14. Esses encontros possibilitam discussões e tomada de decisões para a área,
constituindo-se em espaços de deliberação e aprovação de propostas de mudanças
significativas, oportunizando debates que poderão fazer parte dos cursos de formação para
alfabetizadores de EJA, onde se poderá tomar conhecimento das novas proposições para a área.
Em relação às recomendações em torno da formação dos educadores de EJA,
recomendam-se programas com maior duração, com currículos repensados, exigência de
14
Estes encontros ocorreram em cidades e em períodos diferenciados: em 1999 ocorreu o I ENEJA no Rio de
Janeiro; o II ENEJA ocorreu na cidade de Campina Grande-PB em 2000; o III ENEJA ocorreu na cidade de
São Paulo em 2001 e o IV ENEJA ocorreu na cidade de Belo Horizonte em 2002.
51
qualidade na formação e profissionalização dos educadores e melhorias nos materiais e
equipamentos.
Em se tratando de Diretrizes para a Formação do Professor, o IV ENEJA também
discutiu e propôs Diretrizes e Bases para a EJA, reconhecendo todo o avanço e o direito dos
jovens e adultos à educação, e como dever do Estado, ofertar educação para uma população
específica – a não escolarizada e marginalizada.
O ENEJA 2002 vislumbrou um cenário de mudanças, principalmente no que se refere
ao reconhecimento do direito de jovens e adultos à educação, definindo como uma de suas
diretrizes a formação inicial e continuada de professores de jovens e adultos, realizando
concursos públicos específicos para professores com qualificação na área (Relatório síntese
do IV ENEJA, 2002).
Já a ANFOPE (1998) delineia um perfil de formação de professores em nosso país que
se presta para todos os professores que atuam em qualquer nível ou modalidade de ensino,
dentre estes, os professores alfabetizadores que atuam na EJA. Eis o desafio lançado para o
repensar e ressignificar as bases desta formação específica.
Propõe também a ANFOPE (1998) as competências e as áreas de atuação dos
Profissionais da Educação, que terão em todos os Cursos uma base comum nacional,
proporcionando as competências necessárias para exercer sua prática educativa. Propõe ainda
que os cursos deverão oferecer formação específica para os professores atuarem nas diversas
áreas da Educação Básica, dentre elas a Educação de Jovens e Adultos.
Estas proposições da Associação vêm fortalecer o papel da formação dos profissionais
da educação, permitindo-nos enfocar a importância e a necessidade de se voltar a atenção para
a especificidade da formação para a EJA, quando propõe uma base comum nacional como
elemento de luta e de defesa contra a degradação da profissão, permitindo a unificação da
categoria em nível nacional, em busca do reconhecimento e do valor social dos profissionais
da educação em nosso país, na tentativa de se repensar a escola pública de qualidade que
defende a necessidade de se ter condições materiais para se desenvolver o trabalho enquanto
educador/alfabetizador e refletindo a importância de se construir uma Política Pública Global
de Formação do Educador.
Esta preocupação não é nova, mas adverte para a necessidade de se acionar os
mecanismos legais e institucionais, a exemplo do que vêm fazendo os Fóruns de Educação,
para que se dê tratamento e atenção à questão, se abra uma ampla discussão no âmbito das
instâncias formadoras e se elaborem projetos concretos de formação nesta área tratada.
52
Do ponto de vista legal, o Conselho Nacional de Educação, através da Resolução
CEB/CNE, de 29 de janeiro de 1999, instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Formação de Docentes da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, em
nível médio, na modalidade normal. No que se refere à formação de professores para a EJA, o
Art. 9, Inciso IV, estabelece que
As escolas de formação de professores em nível médio, na modalidade
normal, poderão organizar, no exercício da sua autonomia e considerando as
realidades específicas, propostas pedagógicas que preparem os docentes para
as seguintes áreas de atuação, conjugadas ou não.
-------------------------------------------------------------------------------------------IV – Educação de Jovens e Adultos.
Apoiada nessa resolução foram elaboradas e aprovadas pelo Conselho Nacional, em
2000, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA. Essas diretrizes explicitam princípios
de contextualização, do reconhecimento de identidades pessoais, das diversidades coletivas,
respondendo e levando-se em consideração uma alteridade, especificidades e a
heterogeneidade de atendimento a educação para jovens e adultos. Segundo Cury (2000), as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultas têm o princípio no
direito de o aluno aprender dentro do Estado Democrático de Direito.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA garantem mais do que um direito para
esta modalidade educativa; elas contribuem de forma significativa para o esclarecimento dos
direitos constitucionais traduzidos como política não só de governo, mas também política de
Estado, e institucionaliza a EJA na perspectiva de romper com todas estas práticas, pontuais e
improvisadas, de se oferecer formação para os professores alfabetizadores.
Estas proposições são reconhecidas em todo o país e são pontos de referência para as
Instituições de Ensino Superior elaborarem as propostas curriculares para os cursos de
formação.
Nessa tentativa, algumas instituições estabelecem parcerias com a universidade, na
tentativa de planejar cursos sistematizados a partir das reais necessidades e peculiaridades da
área dos professores alfabetizadores.
Face às discussões apresentadas a partir dos estudos de especialistas e grupos
organizados, e os anúncios legais dirigidos para o processo formativo de educadores da EJA,
procuraremos resposta para a questão: Como vem se dando a formação continuada das
professoras que alfabetizam jovens e adultos no município de Maceió? É do que trataremos
no próximo capítulo.
53
CAPÍTULO III
A FORMAÇÃO CONTINUADA DAS PROFESSORAS ALFABETIZADORAS
DE JOVENS E ADULTOS E AS CONCEPÇÕES SUBJACENTES
Este capítulo tem como objetivo oferecer respostas para o nosso questionamento
principal: como vem acontecendo a formação continuada das professoras alfabetizadoras de
jovens e adultos na rede pública estadual e municipal da cidade de Maceió, na ausência da
formação inicial?
A partir da identificação dos níveis de formação inicial e da constatação de que as
professoras alfabetizadoras investigadas não possuem uma formação inicial específica para a
área de atuação que ofereça os elementos necessários à prática pedagógica com pessoas
jovens e adultas, fomos buscar através delas mesmas, onde consideram que estão se formando
para alfabetizar, como vem se dando o processo de formação continuada e quais as
concepções subjacentes no processo formativo
A análise dos questionários e das entrevistas nos levou aos quadros abaixo:
3.1. A formação continuada a partir da visão das professoras alfabetizadoras da rede
pública estadual
Quadro 3. Espaço de formação continuada
Professora
Espaços de formação continuada
A
Prática desenvolvida na sala de aula: a sala de aula como laboratório.
B
Prática desenvolvida na sala de aula: o dia-a-dia do trabalho docente.
C
Formação inicial, novos cursos de aperfeiçoamento.
D
E
Prática desenvolvida na sala de aula.
Formação inicial – magistério.
Prática de sala de aula: experiência do dia-a-dia.
F
Cursos de formação continuada.
G
Prática desenvolvida na sala de aula.
H
Prática desenvolvida na sala de aula: com os alunos.
I
Prática desenvolvida na sala de aula.
Observando o quadro acima, verifica-se que o espaço privilegiado de formação
continuada das professoras alfabetizadoras de educação para pessoas jovens e adultos da rede
estadual se constitui basicamente da prática desenvolvida na sala de aula. Para explicitar as
54
opções das entrevistadas, trazemos seus depoimentos, procurando ilustrá-los com o suporte
teórico que utilizamos. Estabelecendo uma conversa a três.
Á medida que analisamos seus depoimentos, fomos traduzindo suas concepções sobre
os espaços de formação e as categorias que os envolvem: formação, prática, planejamento,
alfabetização e as concepções de pessoa e mundo que permeiam essas categorias.
3.1.1 Descrição do processo de formação
A partir da identificação dos níveis de formação inicial das professoras
alfabetizadoras, buscamos em seus depoimentos como se dá a formação continuada e quais as
concepções subjacentes ao processo de formação e à prática pedagógica desenvolvida.
A professora alfabetizadora A declara que é a sua própria experiência com os alunos
que lhe dá o suporte para desenvolver o trabalho em sala de aula. Vejamos o que diz:
Então, eu posso dizer que a formação do professor de jovens e adultos é a
própria prática de sala de aula, juntamente com as experiências dos alunos
que são tratadas nessa relação de professor e aluno que dão esse suporte. A
UFAL, ela me dá uma orientação geral, de formação acadêmica (Professora
Alfabetizadora A - Rede pública estadual).
Evidencia-se que a professora alfabetizadora caracteriza o seu saber prático e a sua
experiência como se fossem originários da própria prática cotidiana da profissão,considerando
que a instância formadora lhe oferece apenas fundamentos teóricos que não lhe dão
sustentação para articular teoria e prática no atendimento das especificidades da educação de
jovens e adultos. Nesta perspectiva, Candau (1998, p.59) vem chamar a nossa atenção para a
compreensão de que é fundamental se considerar a importância do reconhecimento e
valorização do saber docente no âmbito das práticas de formação continuada, principalmente
os saberes que se fundam no trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio, ou seja,
ressalta-se a importância dos saberes construídos na prática.
A professora alfabetizadora B também caminha nessa mesma direção, quando diz:
Procuro instrumentos metodológicos com a própria turma, com a dinâmica
do grupo, no dia-a-dia da sala de aula. Não tem muita coisa estabelecida, não
tem muita coisa pronta, não dá para ter, até porque as experiências práticas
de EJA nos cursos de capacitação não existem. O que existe é uma
fundamentação teórica que permite entender o que é EJA, mas na prática, o
ensinar, o como fazer não foi dado nem pela Universidade e nem pelos
55
próprios cursos oferecidos pela Secretaria (Professora alfabetizadora B –
Rede pública estadual).
Esta fala da professora alfabetizadora revela e reforça a questão da falta de formação
continuada proporcionada pela instância empregadora, para sua atuação no cotidiano da sala
de aula, deixando claro que os instrumentos metodológicos utilizados são pensados e
definidos com os alunos. Subentendemos que seja de acordo com a realidade dos alunos
jovens e adultos. Percebemos que a professora alfabetizadora não realiza sua atividade
docente sozinha, demonstrando que existe uma interação com os alunos e que a atividade
educativa poderá acontecer objetivamente por meio de interações com outras pessoas, ou seja,
em um contexto onde o elemento humano possa ser determinante e dominante, principalmente
se o espaço educativo assim o permitir. A fala também evidencia a falta de fundamentos que
venham subsidiar a sua prática cotidiana, ou seja, percebe-se a falta da formação continuada e
da formação inicial em instâncias formadoras.
Candau (1998, p.75) e Cró (1998) nos levam à constatação de que realmente uma
grande parte dos docentes saem das universidades com uma formação predominantemente
científica, não pedagógica e não orientada para o ensino, ou seja, despreparados,
principalmente para atuar na educação de jovens e adultos. Deixando de ser uma formação
para a ação e uma ação para a formação, isto fica explícito no depoimento da professora B.
Apenas uma professora alfabetizadora da rede estadual diz ser na formação
continuada, através dos cursos que fazem ou constroem sua formação.
Na escola X sempre estamos tendo cursos que nos ajudam a pensar sobre a
nossa profissão (prática). A formação profissional que recebi não me dá
condições para realizar o trabalho com educação de jovens e adultos, pois
quando me formei em Administração Escolar não tinha idéia do que fosse
trabalhar com EJA (Professora alfabetizadora F – Rede pública estadual).
No entanto, em momento algum deixa claro onde acontecem os cursos de formação
continuada e quem os proporciona. Deduzimos, através de conversas informais com outras
professoras alfabetizadoras e da nossa inserção na escola enquanto professora coordenadora
de estágio da prática de ensino da UFAL, convivendo no cotidiano da escola, que a
“formação” se reduz a encontros nos quais se discute questões de caráter administrativo, não
se tratando do fazer e do saber pedagógico.
56
A indicação da professora alfabetizadora F é apontada como uma situação isolada,
caracterizando-se como uma ação pontual da escola onde atua,15 que traz no bojo de sua
estrutura organizacional uma política de formação diferenciada das demais escolas da rede.
Esta escola se encontra em fase de experiência para a implementação da organização e
estruturação curricular em ciclos de formação, o que requer um repensar da formação dos
profissionais da educação para esta nova experiência.
Diante do reconhecimento da grande maioria das professoras alfabetizadoras da rede
estadual, de que a formação continuada estava se dando na prática pedagógica cotidiana,
fomos buscar suas concepções de prática e as concepções subjacentes às categorias
relacionadas à prática.
3.1.2 Concepções de prática e das categorias relacionadas à mesma
Concepção de Prática Pedagógica
Prática para a professora alfabetizadora F
é a experiência que você adquire com o passar dos anos. Envolve o que você
pensa sobre o seu trabalho e o que os alunos lhe transmitem no dia-a-dia
(Professora alfabetizadora F – Rede pública estadual).
Ela acredita que a prática pedagógica poderá ser incorporada, modificada e adaptada
de acordo com os momentos ou fases de sua carreira profissional ao longo dos anos,
evidenciando que o professor aprende a alfabetizar jovens e adultos realizando o seu trabalho
cotidiano, a partir do seu relacionamento com os alunos, como também através das suas
experiências adquiridas ao longo do seu ciclo docente.
Esta fala nos leva à reflexão de que pensar a educação oferecida nas instituições
escolares hoje, é também ter um olhar voltado para práticas educativas historicamente
oferecidas pela escola, como também perceber, observar e avaliar o fazer pedagógico, através
das relações sociais que se dão a partir das práticas educativas extra - escolares. Não podemos
mais pensar em práticas educativas, descoladas das práticas sociais, como nos lembra Libâneo
(1999, p.7), quando nos faz refletir que a prática educativa não é apenas uma exigência da
vida em sociedade, mas também o processo de promover os indivíduos dos conhecimentos e
experiências culturais que os tornem aptos a atuar no meio social e a transformá-lo.
15
A Escola pertence à rede estadual de Ensino, e vem em um processo de construção e implementação de uma
nova proposta de organização curricular através dos ciclos de formação.
57
Verificamos também, a partir deste depoimento, que o processo de ensino é uma
prática social, não só porque acontece na interação professor-aluno, mas, sobretudo, porque
reflete a cultura e os contextos sociais dos professores e dos alunos, que são complexos e ao
mesmo tempo diversificados, evidenciando que é importante o reconhecimento do ciclo de
vida dos professores (CANDAU,1998), na perspectiva de entender que o processo de
formação continuada não pode dispensar uma reflexão sobre esta realidade, diante dos
desafios, necessidades e problemas que envolvem as diferentes etapas do desenvolvimento
profissional do professor. A professora alfabetizadora nos chama a atenção para as
“experiências adquiridas com o passar dos anos”; isto só vem confirmar a nossa compreensão
da importância que devemos dar ao saber produzido na prática pelos saberes experienciais dos
professores/alfabetizadores.
Já a professora alfabetizadora A defende que
A prática é flexível, tem que ser flexível, criativa e tem que ser significativa
para eles, (os alfabetizandos), porque senão o cansaço vem, a falta de
interesse, a rotina, então você tem que estar buscando formas de ser criativa
e estar dinamizando suas aulas e fazer uma prática significativa e
contextualizada. Prática é o momento da própria sala de aula, é o fazer na
sala de aula (Professora Alfabetizadora A – Rede pública estadual).
Com esse depoimento, a professora alfabetizadora demonstra que a prática poderá ser
decorrente de habilidades que o professor adquire no exercício de suas atividades cotidianas,
como um saber adquirido no fazer. Aponta para os princípios da flexibilidade e da
criatividade, dando sentido às situações práticas, consideradas significativas dentro do
contexto.
Diante desta fala, buscamos em Nóvoa (1995) uma melhor compreensão da fala da
professora alfabetizadora quanto a sua concepção de prática. Ele nos ajuda na análise, ao
mostrar que existe o modelo de formação continuada de professores denominado de modelo
construtivista. Esse modelo parte de uma reflexão contextualizada para a montagem dos
dispositivos de formação continuada, no quadro de uma regulação permanente das práticas e
dos processos. Nóvoa (idem) ainda nos aponta que neste modelo poderemos encontrar o
modelo contratual e interativo-reflexivo de Demailly (1995).
Nesta mesma direção caminham as professoras alfabetizadoras G e D, quando
afirmam
58
Prática é o fazer pedagógico, é o modo de aplicar a teoria, é como eu uso o
que tenho disponível no momento. Na nossa escola temos poucos recursos
para melhorar a nossa prática, mas temos união e nos ajudamos quando
estamos precisando dos colegas (Professora alfabetizadora G – Rede pública
Estadual).
Prática é desenvolver o trabalho com segurança, é atuar respeitando o aluno
como cidadão. Segurança, habilidade, criatividade, interesse (Professora
alfabetizadora D – Rede pública estadual).
Percebe-se nas falas das professoras alfabetizadoras G e D uma concepção de prática
baseada na vivência e nas experiências do dia-a-dia escolar, demonstrando uma compreensão
e concepção de prática como aplicação de métodos e técnicas, em que muitas vezes são
determinadas ou meramente reproduzidas sem uma explicação do porquê e do como fazer.
Caracterizando-se em um conhecimento construído silenciosamente, permitindo aos
professores darem respostas muitas vezes evasivas, automáticas, sem uma reflexão do seu
saber fazer, nas situações cotidianas da prática profissional.
Nesta perspectiva, encontramos em Oliveira (1991, apud CANDAU, 1998) a reflexão
de que o professor deverá ser capaz de tornar-se um ser de comunicação, de estar no grupo, de
criar espaços para que este grupo possa se expressar integralmente, transformando os espaços
pedagógicos, dentro e fora da aula, em espaços de descoberta, espaços de prazer, de busca, de
criatividade e, acima de tudo, de troca e da partilha. Ainda buscando uma compreensão da
concepção de prática das professoras alfabetizadoras, encontramos em Freire (1991, apud
CANDAU, idem) que uma qualidade indispensável a um bom professor, e acima de tudo
professor alfabetizador, é ter a capacidade de começar sempre, ou seja, de fazer, de
reconstruir, de não se entregar, de recusar burocratizar-se mentalmente, de entender e de viver
como processo. O professor precisará de reviver, de renascer a cada momento de sua prática
docente.
No cotidiano da prática educativa, percebe-se a necessidade de desencadear um
processo de planejamento para a organização e articulação das ações a serem desenvolvidas
no contexto escolar, através da partilha e socialização dos saberes. Diante desta necessidade,
procuramos identificar a concepção de planejamento que permeia a prática das professoras
alfabetizadoras.
59
Concepção de Planejamento
Para a professora alfabetizadora A,
Planejar é um dos momentos mais difíceis, pela falta de recursos e estrutura.
Eu planejo semanalmente. Eu paro para planejar aqui na escola, segundafeira, 14h, sozinha, sem suporte pedagógico, sem nenhuma colega de
trabalho, apesar de ter três primeiras fases no mesmo turno. Planejo sozinha
com o material que a escola dispõe; infelizmente a troca não existe, não
existe socialização, planejo só (Professora alfabetizadora A – Rede pública
estadual).
Essa professora alfabetizadora demonstra que considera o processo de planejamento
uma atividade difícil, principalmente pela falta de recursos e estrutura organizacional do
sistema. Revela que a prática do planejamento ocorre de forma solitária, apesar do
funcionamento de três turmas de alfabetização no mesmo turno de trabalho, não existindo
momentos de socialização e troca de experiência entre as professoras alfabetizadoras para
definição de estratégias e possibilidades de ensino - aprendizagem mais sistematizada e
organizada coletivamente. Aponta também para a falta do acompanhamento pedagógico. A
professora alfabetizadora demonstra perceber a necessidade e a importância do trabalho
partilhado, apesar de não fazê-lo.
A professora alfabetizadora B reconhece que
O planejamento se dá individualmente, pois não existe uma articulação entre
os professores e entre os professores e o suporte pedagógico (Professora
alfabetizadora B – Rede pública estadual).
Revela a sua solidão no processo de planejamento das ações pedagógicas, não
ocorrendo articulação dos professores alfabetizadores entre si e com os coordenadores
pedagógicos e/ou suporte pedagógico. Apontando para a necessidade do planejamento com o
acompanhamento pedagógico, demonstrando que o planejamento não segue uma organização
e uma programação específica.
Uma outra professora alfabetizadora vai mais longe no desabafo:
Nas poucas horas que tenho em casa, procuro textos onde posso fazer uma
leitura dinâmica e desenvolver o pensamento crítico do aluno. Durante este
ano de 2002, se houve planejamento foi muito pouco, a escola não oferece
horário de departamento para nós do EJA. Procuro elaborar as aulas de
acordo com a realidade local do aluno (Professora alfabetizadora E – Rede
pública estadual).
60
Tanto a professora alfabetizadora E como as demais professoras alfabetizadoras
reconhecem que o processo de planejamento é solitário, ocorrendo em casa e não no contexto
escolar. Nesse ainda não são possibilitados espaço e horário específico para o departamento
dos professores alfabetizadores de EJA. Revelam, no entanto, que nas suas aulas o fazer
pedagógico ocorre a partir da realidade dos alunos.
Através desses depoimentos evidencia-se que a rede estadual não possui ainda uma
organização, uma estrutura para a socialização ou reflexão sobre a ação pedagógica cotidiana
das professoras alfabetizadoras de jovens e adultos, ficando a cargo de cada professora
alfabetizadora a busca de possibilidades educativas junto aos alfabetizandos. Reflete uma
concepção de planejamento “instrumental normativo”, no qual o processo de elaboração de
planos acontece desvinculado da prática efetiva do planejamento (OTT, 1994).
As análises dos depoimentos das professoras alfabetizadoras sobre seus processos de
formação continuada e as concepções de prática pedagógica e planejamento levaram-nos à
necessidade de identificar suas concepções sobre outras categorias fundamentais no processo:
alfabetização, sujeito e mundo. As falas das entrevistadas nos levaram à compreensão de que
a prática pedagógica necessitará ser bem articulada e planejada, para que todos os processos e
ações a serem desenvolvidas no cotidiano da escola e, principalmente, da sala de aula, sejam
coerentes com o contexto e possam atender às demandas sociais. Partindo desta compreensão,
fomos buscar junto às professoras alfabetizadoras sua concepção de alfabetização, enquanto
processo complexo, que aponta para a necessidade de uma ação refletida e planejada.
Concepção de Alfabetização
Para a professora alfabetizadora A, alfabetizar
É dar condições ao sujeito de se conhecer como cidadão participando do
mundo. Alfabetizar, para mim, é sair do livresco, sair da cartilha, é você
reconhecer uma quadrinha popular como um texto rico, texto que diz da vida
deles, é você reconhecer uma simpatia como coisa própria do sujeito que
está incluído naquele meio, às vezes rural, que teve que vir para a cidade por
conta do desemprego, toda essa história que a gente já conhece (Professora
alfabetizadora A –Rede pública estadual).
A professora alfabetizadora A vislumbra possibilidades de alfabetização para além da
cartilha. Propõe novas alternativas para desenvolver o trabalho com jovens e adultos,
evidenciando um conhecimento numa perspectiva construtivista, fugindo da artificialidade
61
dos textos das cartilhas para alfabetizar, aproveitando o conhecimento que os alfabetizandos
jovens e adultos trazem do mundo e da sua própria escrita, como também da sua própria vida.
As professoras alfabetizadoras B e C entendem que alfabetizar
É desempenhar um conjunto de atividades ao uso prático.
É fazer uma leitura do mundo (Professora alfabetizadora B – Rede pública
estadual).
É ensinar a ler e escrever, como também interpretar. Com isso ele aprende a
ter uma visão de mundo(Professora alfabetizadora C – Rede pública
estadual).
As duas professoras alfabetizadoras concebem o processo de alfabetização num misto
de tecnicismo e ato mecânico do ler e escrever, mas apontam para um processo de
interpretação e leitura de mundo, indícios de uma percepção de alfabetização como uma ação
de caráter político.
A professora alfabetizadora E afirma que,
Com certeza, alfabetizar para mim não é só ensinar a ler e escrever; é como
cuidar de uma planta, não podemos só jogar semente na terra, mas
precisamos regar esta planta e oferecer nutrientes para ela se desenvolver.
Devemos oferecer esses nutrientes aos nossos alunos, de modo que ninguém
possa destruí-los como sujeitos (Professora alfabetizadora E –Rede pública
estadual).
Sua fala apresenta indícios de uma visão do processo de alfabetização numa
perspectiva biológica/orgânica, como possibilidade de garantia da melhoria da qualidade de
vida dos sujeitos alfabetizandos e como uma tentativa de lhes oferecer condições para
enfrentar os problemas do mundo. Denota uma compreensão do processo de alfabetização
desvinculado do contexto socio-politico e econômico que o permeia.
Essas concepções das professoras da rede estadual ainda apresentam uma dicotomia
entre o alfabetizar numa perspectiva construtivista (FERREIRO, In: MOURA, 1999) e o
alfabetizar numa visão político-pedagógica (FREIRE, In: MOURA, 1999). Demonstra que
elas estão em fase de transição, construção e ressignificação do entendimento sobre
alfabetização.
Entendendo que a concepção de alfabetização traz implícito o entendimento do sujeito
do processo, procuramos identificar esse entendimento por parte das entrevistadas.
62
Concepção de Pessoa
Para a professora alfabetizadora A, os alfabetizandos
São pessoas humildes, a palavra é humilde, não é simples, eles são humildes,
eles têm uma história de vida de muito trabalho, eles são carentes
afetivamente, eles não têm auto - estima, a verdade é essa, não existe. Existe
uma vergonha muito grande de falar, de se expor, eles têm necessidade de
dizer que não sabe, que não vai conseguir, que já chegou onde tinha que
chegar. Mesmo assim, os que continuam são vencedores e devem ser
reconhecidos. O sistema exige que os reprovem porque não sabem ler
(Professora alfabetizadora A- Rede pública estadual).
Na visão da professora alfabetizadora, a pessoa do alfabetizando de educação de
jovens e adultos caracteriza-se pela sua humildade, reconhecendo porém que trazem uma
história de vida de muito trabalho, evidenciando que são carentes afetivamente e,
conseqüentemente, apresentam uma baixa auto-estima. Apresenta-os ainda como pessoas
envergonhadas e que não se expõem, e que por isso negam sua capacidade de aprender, como
se não fossem capazes de superar suas limitações. Na fala da professora alfabetizadora, há
implícita uma denúncia da falta de conhecimento, por parte do sistema educacional, da atual
legislação, 9394/96, e do Parecer CEN Nº 11/2000, sobre o processo de avaliação e promoção
dos alunos.
A professora alfabetizadora G diz o seguinte:
Essas pessoas chegam à escola esperando encontrar em nós, educadores, o
conhecimento que elas precisam; cabe a nós sabermos conduzi-las para
desenvolver suas potencialidades que estão escondidas. Sua baixa estima é
tão grande que dizem que não são capazes de aprender nada. Quando
descobrem que aprenderam algo a mais, ficam felizes, orgulhosos e
agradecidos a nós que despertamos o seu interesse para seu desenvolvimento
pessoal (Professora alfabetizadora G – Rede pública estadual).
A professora alfabetizadora G, assim como a professora alfabetizadora A, reconhece a
baixa auto - estima do alfabetizando, apontando indícios de que é preciso desenvolver sua
capacidade criativa e inventiva como possibilidade de superação da desmotivação e da falta
de estímulo para aprender. Na visão da professora alfabetizadora, os alfabetizandos ainda
apresentam características de dependência e de insegurança em si mesmos, necessitando
trabalhar o processo de autonomia e de auto estima junto aos alfabetizandos. A professora
alfabetizadora percebe que os alfabetizandos reconhecem a importância do trabalho do
63
alfabetizador, para que possam desenvolver o seu processo formativo enquanto pessoas
humanas.
Para a professora alfabetizadora B, o alfabetizando
É aquela pessoa que na infância não teve uma oportunidade na vida escolar,
pois tinha que trabalhar. É uma pessoa exilada socialmente, que começa na
escola e vai se configurando de diversas formas durante a sua vida: trabalho,
consumo, lazer, cultura (Professora Alfabetizadora – Rede pública estadual).
Com esse depoimento, ela reconhece os alfabetizandos enquanto pessoas trabalhadoras
que tiveram seu processo de escolarização interrompido pelas necessidades de sobrevivência.
Essas pessoas são excluídas dos bens sociais, como a escola, o trabalho, o lazer, a cultura,
dentre outros. A professora alfabetizadora demonstra a compreensão de pessoa, a quem os
direitos subjetivos garantidos constitucionalmente são negados.
A partir das diferentes concepções de pessoa identificadas, procuramos conferir nas
falas das entrevistadas como situavam esses sujeitos no mundo. Que mundo é esse em que
vivem e para que mundo eles deveriam ser alfabetizados.
Concepção de Mundo
A professora alfabetizadora B reconhece o mundo como desigual e excludente, quando
diz:
Vejo o mundo e a sociedade de uma maneira desigual, onde a camada social
predominante é a minoria, tem tudo e a maioria não tem quase nada. Não
tem trabalho, alimentação, moradia, saúde (Professora Alfabetizadora B –
Rede pública estadual).
Para a professora alfabetizadora, faltam condições para que a classe majoritária possa
sobreviver; isto fica evidenciado na sua fala, quando reconhece os alfabetizandos excluídos da
sociedade pela falta das mínimas condições de vida, indicando, com isso, a percepção de
mundo associada à percepção de pessoa sem alternativas de superação das condições de
exclusão em uma sociedade dividida em classes.
A professora alfabetizadora C reconhece:
A sociedade hoje está desigual economicamente, política e social; o mundo
avançando dia a dia sem que as classes menos favorecidas consigam
acompanhá-los (Professora alfabetizadora C – Rede pública estadual).
64
Encontramos também, na fala da professora alfabetizadora C, o reconhecimento do
mundo econômico, político e socialmente desigual, reconhecendo contudo os avanços e as
mudanças que ocorrem mundialmente sem que os benefícios desses avanços sejam
aproveitados e adquiridos pelas classes desfavorecidas, subentendendo-se estar fazendo parte
desta classe os alfabetizandos jovens e adultos.
A professora alfabetizadora D considera o mundo
Competitivo. Onde o professor, para ser valorizado, tem que ter diploma. Por
isso o aluno do EJA ainda é muito discriminado (Professora alfabetizadora D
–Rede pública estadual).
Essa fala revela uma angústia, um desabafo frente a um mundo considerado
competitivo e, ao mesmo tempo, excludente e desigual. Denuncia a falta de valorização do
professor por não ser portador de um diploma de graduação. Sente-se discriminada enquanto
categoria profissional, associando esta sua discriminação também ao alfabetizando jovem e
adulto. Aponta indícios de que, se o professor/alfabetizador é discriminado, mesmo sendo
portador de diploma de nível médio – Magistério, imagine-se o alfabetizando de educação de
adultos que, enquanto trabalhador, ainda não detém nenhuma certificação de escolaridade.
Demonstra, com isso, as dificuldades que deverão ser superadas pelo alfabetizando da EJA,
em um mundo competitivo, desigual e exigente de qualificação profissional.
3.2. A formação continuada a partir da visão das professoras alfabetizadoras da rede
pública municipal
Observando o quadro abaixo (outra página), verificamos que o espaço de formação
continuada, privilegiado pela maioria das professoras alfabetizadoras da rede municipal,
relaciona-se aos cursos oferecidos pelo DEJA-SEMED. Apontam também como espaço de
formação continuada a prática cotidiana de sala de aula e a troca de experiência com colegas e
alunos. Buscamos também, junto às professoras alfabetizadoras da rede municipal, a
explicitação de suas opções, através dos seus depoimentos, procurando ilustrá-los à luz do
referencial teórico consultado, mantendo a proposta de uma conversa a três. Assim como
procedemos na rede estadual, analisamos seus depoimentos traduzindo as concepções sobre
os espaços de formação e as categorias que os envolvem como: prática, planejamento e
alfabetização, e as concepções de pessoa e mundo que permeiam essas categorias.
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Quadro 4 – Espaços de formação continuada
Professora
A
Espaços de formação continuada
Cursos oferecidos pelo Departamento de Educação de Jovens e Adultos –
Secretaria Municipal de Educação- DEJA – SEMED.
Livros, pesquisas, troca de experiências com outros colegas.
Prática de sala de aula.
B
Cursos oferecidos pelo DEJA – SEMED.
Prática de sala de aula: experiência – cria uma metodologia.
C
Cursos oferecidos pelo DEJA.
Estudos realizados individualmente ou com grupo de pesquisa da UFAL.
D
Cursos oferecidos pelo DEJA.
Curso de especialização.
Prática de sala de aula.
E
F
G
Cursos oferecidos pelo DEJA.
Prática de sala de aula: cotidiano.
Prática de sala de aula: convívio diário com os alunos.
Prática de sala de aula: com os alunos.
Formações continuadas promovidas pelo DEJA.
Prática de sala de aula: ouvindo os alunos.
H
3.2.1. Descrição do processo de formação
Analisando os depoimentos das professoras alfabetizadoras da rede municipal sobre
como vem se dando a formação continuada, percebe-se que existe um diferencial bastante
significativo entre essas em comparação com as da rede estadual.
Enquanto na rede estadual apenas uma (1) professora alfabetizadora aponta “cursos de
formação continuada” como responsáveis pela formação, na rede municipal, das oito (8)
professoras alfabetizadoras entrevistadas, seis (6) reconhecem que o seu processo de
formação continuada, enquanto professoras alfabetizadoras, é responsabilidade dos cursos
oferecidos pelo DEJA, mesmo que associado a outras situações de formação, como prática,
pesquisa, troca de experiência.
Procuramos colher das professoras alfabetizadoras como se evidencia esse processo,
que concepção elas têm de formação continuada e que outras categorias compõem esse
processo formativo.
A professora alfabetizadora C revela:
A minha formação diária tem acontecido ora nos cursos que são oferecidos
pelo Departamento de Jovens e Adultos – DEJA, por ocasião dos finais de
semana; ora pelos estudos que realizo individualmente ou com o grupo de
pesquisa da UFAL (Professora Alfabetizadora C – Rede pública municipal).
66
Evidencia-se na sua fala que, apesar do reconhecimento da importância dos encontros
pedagógicos oferecidos pelo DEJA – SEMED, as necessidades básicas para atuar no dia-a-dia
da sala de aula, enquanto professora alfabetizadora, não são suficientemente supridas por estes
encontros, necessitando buscar outras alternativas de formação, como o estudo individualizado
e o estudo com o grupo de pesquisa da UFAL. Considere-se que esta é uma das alfabetizadoras
da rede que tem curso de pós - graduação em nível de especialização em EJA. A professora
alfabetizadora A vai mais além, quando declara:
Eu estou buscando, através dos cursos que o DEJA oferece dia de sábado.
Um sábado de cada mês na SEMED, assistimos aulas teóricas e práticas
também com professores da Universidade e pessoas do DEJA. Não são só os
curso, até porque os cursos só acontecem uma vez por mês. Então eu busco
através de livros, pesquisa, procuro também conversar com outras pessoas
que têm mais conhecimento, mais prática e maior vivência de trabalho com
EJA, converso como está o meu trabalho. Busco na própria prática, na busca
de experiência com amigas, na troca com amigas e minha própria
experiência (Professora alfabetizadora A – Rede pública municipal).
A professora alfabetizadora A revela que o seu processo de formação continuada se dá
de uma forma simultânea, reconhecendo o DEJA – SEMED como espaço privilegiado de sua
formação e, ao mesmo tempo, elegendo a sua própria prática cotidiana, o contexto escolar e as
trocas de experiências com os demais colegas e outras pessoas envolvidas com a área. A fala
da professora alfabetizadora aponta indícios de que o seu processo de formação continuada
para atuar na EJA ocorre a partir dos saberes adquiridos na formação profissional, nos saberes
disciplinares e curriculares. Denota-se, no entanto, que a ênfase maior, assim como as demais
professoras alfabetizadoras, recai em um processo que se dá basicamente a partir dos saberes
experienciais. Por outro lado, argumenta que a formação propiciada pelo DEJA é insuficiente,
não conseguindo dar conta das demandas dos professores, por conta da distância entre os
espaços de tempo em que ocorrem.
Tal como a professora alfabetizadora A, a professora D também aponta a
simultaneidade dos espaços e formas de como ocorre o seu processo formativo enquanto
desenvolvimento profissional: os cursos e encontros proporcionados pelo DEJA e a prática
pedagógica cotidiana.
Estou me formando no dia-a-dia, através dos cursos oferecidos pelo DEJA –
Departamento de Jovens e Adultos; com a conclusão do curso de
especialização e formalmente com conhecimentos adquiridos da própria
prática (Professora Alfabetizadora D – Rede pública municipal).
67
No entanto, não consegue deixar clara a articulação entre os dois espaços, ou seja, a
relação existente entre os cursos e a prática, e vice-versa. Demonstram, através das falas, que
apesar de reconhecerem a simultaneidade da formação, não articulam a formação continuada
oferecida pelo DEJA – SEMED com a prática desenvolvida no cotidiano da sala de aula.
Identificam as duas instâncias formadoras, mas apresentam concepções distintas das mesmas.
Estas falas denotam a contradição que ainda persiste, na cabeça de algumas professoras
alfabetizadoras, quanto à concepção de formação continuada e prática pedagógica cotidiana.
Percebe-se quase que uma reflexão mecânica do processo ensino-aprendizagem no cotidiano
da sala de aula, do fazer pedagógico, onde a teoria precisaria estar associada à prática.
Evidencia-se nas falas uma desarticulação da formação continuada com a prática,
comprometendo, desta forma, a organização curricular.
Desta feita, buscamos em Candau (1998, p.59) elementos que apontam para a
compreensão e reflexão das concepções das professoras alfabetizadoras, quando demonstra
ser fundamental ressaltar a importância do reconhecimento e da valorização do saber docente
no âmbito das práticas da formação continuada, especialmente os saberes oriundos da
experiência, considerada como núcleo vital do saber docente. Será a partir destes saberes
experienciais que os professores poderão dialogar com os saberes disciplinares e os saberes
curriculares. Vamos encontrar no processo formativo destas professoras alfabetizadoras
saberes adquiridos pelas instituições formadoras de professores; saberes desenvolvidos no
exercício de suas funções e práticas, tomando como referência sua prática cotidiana e o
conhecimento do contexto. Os saberes que são apresentados como programas curriculares, os
quais são considerados os saberes curriculares, poderão ser o ponto de partida para que as
instituições formadoras possam organizar e apresentar os saberes sociais que elas
determinaram como modelo da cultura erudita e de formação para a cultura erudita.
Diferentemente das professoras alfabetizadoras da rede estadual, apenas duas (2)
professoras alfabetizadoras, G e F, consideram como lócus de sua formação exclusivamente a
experiência prática ocorrida na sala de aula com os alunos.
Através de meus erros e acertos, acredito que meus alunos necessitam de
uma oportunidade verdadeira para mudar suas vidas. Por eles e com eles
tento melhorar minha prática, apesar de minha prática, apesar de poucas
condições em relação a suporte (Professora Alfabetizadora G - Rede pública
municipal)
68
O profissional desenvolve competências no convívio diário com seus alunos.
Fui aprendendo com o dia-a-dia quando me formei e assim faço, pois o
aprendizado é contínuo (Professora Alfabetizadora F – Rede pública
municipal).
Vamos encontrar explícito na fala das professoras alfabetizadoras G e F a
diversificação de um processo formativo que, segundo Candau (1998), se funda
exclusivamente nos saberes da experiência, da prática cotidiana e do conhecimento do meio.
São esses os saberes que surgem da experiência e que poderão ser incorporados à vivência
individual e coletiva, sob a forma de hábitos e de habilidades, de saber fazer e de saber ser.
Estes saberes proporcionarão aos professores julgar a formação adquirida ao longo da vida
profissional, a sua pertinência ou o realismo dos planos e das propostas de reforma que lhes
são apresentadas, concebendo os modelos de excelência profissional. Esses saberes
experienciais, segundo Candau (op. cit.), constituem hoje a cultura docente em ação, que não
deve ser reduzida apenas ao nível cognitivo.
Nesta perspectiva, buscamos junto às professoras alfabetizadoras as concepções
subjacentes à prática pedagógica e às categorias decorrentes.
3.2.2 Concepções de prática e das categorias relacionadas à mesma
Concepção de Prática pedagógica
A professora alfabetizadora A declara que
A prática é tudo que desenvolvo a partir da realidade do aluno, mas não
deixa também de ser, de se tornar a prática um exercício da teoria, dos
conhecimentos de leitura que a gente leva para a sala de aula (Professora
alfabetizadora A – Rede pública municipal).
Esta fala nos revela que a prática, para a professora alfabetizadora, constitui-se a partir
da realidade do aluno, ou seja, sua atividade docente encontra-se em interação com os
alfabetizandos, evidenciando que a prática exercita a teoria e que os conhecimentos
adquiridos fora do contexto escolar serão levados para a sala de aula, revelando indícios de
busca de conhecimentos que extrapolam o espaço educativo.
No entender da professora alfabetizadora B, “A prática é o conteúdo e a aprendizagem”
(Professora alfabetizadora B – Rede pública municipal - SEMED).
Essa definição demonstra uma visão de prática tratada apenas no contexto e no
cotidiano da sala de aula e da escola. Voltada apenas para o desenvolvimento do conteúdo que
será trabalhado com os alfabetizandos, sem evidências de uma fundamentação teórica,
69
apontando indícios de uma prática desenvolvida no interior da sala de aula como contexto
imediato da atividade pedagógica do ensinar para aprender, na qual a atividade do
alfabetizador e do alfabetizando ocupam a maior parte do tempo.
No entender da professora alfabetizadora G,
Prática é o dia-a-dia do profissional, sua postura e forma de trabalhar. Tudo
isso depende da sua formação e dos estímulos que recebe durante sua
jornada de trabalho (Professora Alfabetizadora G – Rede pública municipal).
Percebe-se, nesta fala, o reconhecimento da professora alfabetizadora quanto ao
desenvolvimento da sua prática que vem ocorrendo no dia-a-dia da sala de aula e que o seu
processo formativo influencia na sua postura profissional e no seu fazer pedagógico.
Demonstra uma compreensão de formação enquanto desenvolvimento profissional, mas que
tudo isso dependerá dos estímulos recebidos para o desenvolvimento do seu trabalho
enquanto professora alfabetizadora. Neste sentido compreendemos que a alfabetizadora
percebe a necessidade de se repensar e se ressignificar o papel, o perfil e o comprometimento
dos profissionais da educação, especificamente dos alfabetizadores, frente às novas
possibilidades de construção da prática educativa como sujeitos de ação e reflexão, assumindo
seu fazer pedagógico como uma prática autônoma, ou seja, o professor que constrói sua ação
a partir da reflexão (SCHON, 1995).
A professora alfabetizadora H demonstra que a prática não pode se restringir apenas às
ações desenvolvidas no contexto da sala de aula e da escola, quando diz:
Prática é tudo que faço em sala de aula ou na escola, ou ainda fora dela, que
possa direta ou indiretamente influenciar o processo ensino - aprendizagem
(Professora alfabetizadora H – Rede pública municipal).
A professora alfabetizadora C, assim como a professora alfabetizadora H, também
revela uma compreensão ampliada de prática, que vai além da sala de aula e da interação
professor - aluno, envolvendo vários atores no processo, criando redes de interação e ação,
demonstrando uma certa reflexão em torno do reconhecimento da necessidade da relação
teoria - prática. Para ela,
Prática é o fazer pedagógico. No entanto, esta não se restringe à sala de aula.
Nesse sentido, a aula seria o ápice da prática, pois acredito que esta engloba
a preparação das aulas, a relação professor-aluno, aluno-aluno, a escola
como um todo e a comunidade da qual a escola faz parte (Professora
alfabetizadora C – Rede pública municipal).
70
Percebemos, nas falas das professoras alfabetizadora H e C, o reconhecimento e a
compreensão de que a prática extrapola o contexto da sala de aula, através das suas
descobertas e das suas buscas, dando um significado ou influenciando direta ou indiretamente
o processo ensino - aprendizagem, tanto no espaço educativo escolar como fora dele.
Evidenciam uma concepção de prática além do contexto escolar, realizando atividades
práticas que não são estritamente pedagógicas, ampliando desta feita o conceito de prática e
evitando a limitação que até então se fazia ao considerar prática apenas as atividades
desenvolvidas em sala de aula e ao domínio de metodologia. Sacristán (1991, p.69) nos ajuda
na compreensão de que a prática docente não se restringe apenas às ações do professor no
contexto da sala de aula e a sua sistematização poderá acontecer em vários contextos da sala
de aula, imbricados uns nos outros.
A professora alfabetizadora E revela uma compreensão de prática como um processo
de aplicação de técnicas para que aconteça o processo de aprendizagem:
Prática são as diferentes formas que o professor tem para atingir o
aprendizado do aluno; muitas vezes não conseguimos colocar em
prática as diversas teorias com semelhança a aprendizagem por conta
dos alunos não aceitarem... (Professora Alfabetizadora E – Rede
pública municipal).
Percebemos nesta fala evidências de que a professora alfabetizadora sente dificuldades
em desenvolver uma prática que seja inovadora e diversificada em sala de aula, de acordo
com as orientações adquiridas através das diversas teorias. Subentende-se que as orientações
tenham sido adquiridas através dos encontros pedagógicos oferecidos pelo DEJA-SEMED.
Caracteriza os alfabetizandos adultos como portadores de uma opinião contrária às propostas
de atividades desenvolvidas através de uma metodologia mais inovadora. Evidenciando uma
certa impotência para reagir ou tomar uma atitude frente ao problema surgido no contexto da
sala de aula, revela indícios de um processo formativo que limita a ação da professora frente
aos questionamentos e posicionamentos dos alfabetizandos.
O desenvolvimento da prática pedagógica desencadeia naturalmente a necessidade de
tomada de decisões, de desenvolver ações articuladas e planejadas. Partindo desta premissa,
buscamos identificar a concepção de planejamento que subjaz à prática das professoras
alfabetizadoras.
71
Concepção de Planejamento
Os depoimentos das professoras alfabetizadoras G e C sobre planejamento seguem na
seguinte direção:
Fiz o diagnóstico da minha turma, nas primeiras semanas dentro dos pontos
que deveriam ser abordados na minha fase, elaboro situações envolvendo a
realidade de vida e de trabalho dos meus alunos. Tudo isso faço em casa
sozinha (Professora Alfabetizadora G – Rede pública municipal).
Não temos na escola momentos onde o planejamento é realizado em
conjunto, exceto o planejamento geral (Professora alfabetizadora C – Rede
pública municipal).
A professora alfabetizadora G demonstra uma preocupação em planejar a partir do
diagnostico da turma, realizado nas primeiras semanas letivas, considerando a realidade dos
alfabetizandos jovens e adultos. No entanto, G e C revelam que não existe uma preocupação
institucional na realização de um trabalho mais voltado para o coletivo, com troca de
experiências e crescimento profissional. Declaram que o processo de planejamento ocorre de
forma solitária e não institucionalizada. Também revelam uma concepção de planejamento
“instumental – normativo” (OTT, 1984).
A professora alfabetizadora A avança na descrição do processo de planejamento,
quando afirma:
Nosso planejamento tem uma socialização, com grandes e pequenos
zonais16, onde a gente socializa o trabalho e através da socialização a gente
também vai pegando experiência, troca de experiência e aí a gente parte para
fazer nosso planejamento. Nós não temos dia de planejamento na escola, a
gente já pensou, mas ainda não tem, é para a gente fazer, mas a gente chega,
não tem tempo e vai direto para a sala, a gente planeja em casa. Estamos
pensando de no dia de sexta-feira soltar os alunos às 9h30min para sentar e
debater nossas necessidades (Professora alfabetizadora A – Rede pública
municipal).
16
São espaços de estudo, reflexão e socialização das experiências vivenciadas pelos professores, no cotidiano
da sala de aula, junto aos coordenadores do DEJA-SEMED, denominados de pequenos zonais. Os zonais são
organizados a partir das diferentes regiões do município de Maceió, onde funcionam escolas da rede
municipal que atendem a turmas de educação para jovens e adultos. Existem quatro zonais: Jacintinho,
Tabuleiro, Águas e um especificamente para o atendimento aos professores que possuem a carga horária de
trabalho semanal de 20h.
72
Para a professora alfabetizadora A, o processo de planejamento inicia-se a partir dos
encontros de socialização que ocorrem durante os grandes e pequenos zonais. Os encontros
são de grande importância para o desenvolvimento profissional enquanto espaço de troca de
experiência e ponto de partida para o planejamento das ações. No entanto, a fala deixa
evidente que no espaço escolar ainda não existe estrutura e organização para a socialização e
o planejamento coletivo, ocorrendo ainda de forma isolada, muitas vezes solitária e em casa.
Ou seja, a socialização e o pensar coletivo na escola, como reflexão e ação de continuidade do
trabalho de formação continuada, iniciado nos zonais, não acontecem.
Ampliando o depoimento anterior, a professora alfabetizadora D nos diz:
O meu fazer pedagógico acompanha as orientações curriculares do DEJA,
desde os conteúdos básicos até as concepções do homem, e do mundo,
dentro de uma visão principalmente freireana, que, somadas às teorias
lingüísticas atuais, procura esclarecer as desiguldades sociais existentes e das
condições de luta dos direitos sociais. Em relação à escola, esse processo de
planejamento é meio esfacelado, por não trabalharmos em conjunto, ainda,
tendo apenas quinzenalmente um coordenador geral que atende a várias
escolas no mesmo tempo (Professora alfabetizadora D – Rede pública
municipal).
A fala da professora alfabetizadora D reforça a realidade apresentada pela professora
alfabetizadora A, quanto à falta de espaço na escola para o desenvolvimento de um trabalho
coletivo, interativo entre os atores escolares, provocando ainda ações fragmentadas e
esfaceladas. No entanto, a professora revela, na sua fala, a importância das orientações
teórico-metodológicas e curriculares propostas pelo DEJA – SEMED, oportunizando um
melhor conhecimento dos conteúdos básicos a serem trabalhados com os alfabetizandos,
numa perspectiva mais inovadora. Percebemos, na análise da fala da professora, uma
concepção de planejamento como princípio prático. No entanto, avaliando, a partir das idéias
de Ott (1984), essa concepção ainda está relacionada à tendência tradicional de educação, na
qual o planejamento é elaborado sem grande preocupação de formalização pelo professor,
tendo como meta prioritária as tarefas a serem desenvolvidas em sala de aula.
Ao planejar e desenvolver a prática, as professoras têm uma concepção de
alfabetização subjacente. Procuramos identificar essa concepção.
73
Concepção de Alfabetização
A professora alfabetizadora A vê a alfabetização como
A aprendizagem da escrita e da leitura, para se chegar a esse processo inclui
muitos fatores e quanto mais ciente estiver o professor de como se dá o
processo de aquisição de conhecimento, de como o indivíduo se situa em
torno de conhecimento emocional da natureza da realidade lingüística, mais
condição terá esse professor de encaminhar de forma agradável e produtiva o
processo de aprendizagem (Professora alfabetizadora A – Rede pública
municipal).
Com esse depoimento, a professora revela um conhecimento, mesmo que ainda não
muito aprofundado, sobre a complexidade do processo de alfabetização. Demonstra a
necessidade de se reconhecer a realidade do aluno e o seu processo de aquisição da leitura e
da escrita de forma produtiva e agradável, em que o professor precisa ter conhecimentos
específicos sobre o alfabetizando e o processo de alfabetização. Denota uma concepção
construtivista, apontando para a necessidade de uma revisão dos objetivos da alfabetização
para jovens e adultos, que não é simplesmente decodificação de letras, mas sobretudo ensinar
o valor social da linguagem e como fazer uso dela.
O processo de alfabetização, nessa perspectiva, compreende não só a memorização das
relações entre letras/sons, mas a vivência, a experiência e a experimentação da escrita em
ação (SOARES, 2002, p.47).
Para a professora alfabetizadora B, alfabetizar “É transmitir conhecimento de acordo
com a capacidade de cada aluno”. Sua fala revela claramente que a metodologia de trabalho é
a transmissão de conhecimentos, não demonstrando uma preocupação com o processo
construtivo e interativo em sala de aula.
A professora alfabetizadora G amplia a concepção, ao dizer:
É muito mais do que ensinar a ler e escrever e contar. Vejo a alfabetização
como uma etapa de escolarização do sujeito que lhe abre portas no sentido
de lhe auxiliar no processo de leitura da realidade de uma forma crítica e
participativa (Professora alfabetizadora G – Rede pública municipal).
Ao definir alfabetização como um processo muito mais amplo e complexo do que o
simples ato de ensinar a ler, escrever e contar, e ao mesmo tempo o ponto de partida para a
aprendizagem de novos conhecimentos, a professora rompe com a visão mecanicista e
ufanista de alfabetização. Demonstra uma ampliação da visão do alfabetizando para a leitura
do mundo, da realidade, evidenciando uma concepção político - pedagógica da alfabetização.
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Para a professora alfabetizadora D,
Alfabetizar é um processo contínuo tanto de escolarização como de
formação cidadã. A oralidade é um marco na humanidade e precede a
escrita. A leitura de mundo é feita através de experiências vivenciadas de
cada um. Portanto, alfabetizar se engaja, se inclui nos diversos tipos de
letramento constituído pela sociedade e sistematizado pela escrita
(Professora Alfabetizadora D – Rede pública municipal).
Com essa fala ela demonstra reconhecer a importância do processo de alfabetização para a
formação do sujeito enquanto cidadão, percebendo a necessidade de o alfabetizando fazer o uso da
leitura e da escrita, ultrapassando o rudimentar uso do código escrito, experimentando e
experienciando um amplo campo de práticas de leitura e escrita na perspectiva e na concepção da
alfabetização como letramento.
A professora alfabetizadora E vai muito mais além, quando defende:
Alfabetizar é muito mais que ensinar uma pessoa a ler e escrever. É fazer
com que ela perceba que pode mudar as coisas ao seu redor, se ela assim o
desejar (Professora Alfabetizadora E – Rede pública municipal).
Na sua fala, demonstra a superação da concepção de alfabetização como ato mecânico
do ler e escrever, indicando uma percepção da alfabetização como um valor social. No
entanto, termina caindo numa visão ufanista quando acredita que o desejo de mudança que
fluirá no sujeito alfabetizando, por conta do seu processo de escolarização, deverá ocorrer a
partir de si próprio, se ele assim o desejar, sem a perspectiva da participação do alfabetizando
enquanto sujeito coletivo numa sociedade de classes.
Essa concepção reflete uma visão político - pedagógica ingênua, ou seja, que as
mudanças sociais dependem do próprio sujeito, desconsiderando as influências das estruturas
sociopolíticas, econômicas e culturais. Compreendemos que as mudanças só poderão ocorrer
com a implementação de políticas públicas nas diversas áreas de atendimento aos direitos
civis, e não simplesmente pelo desejo pessoal e individual da pessoa. É preciso, além de
vontade política, a organização da sociedade civil num processo coletivo e participativo.
Procuramos ver a relação das concepções anteriores com a visão de homem, do aluno
com quem elas trabalham.
Concepção de Pessoa
Para a professora alfabetizadora E,
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O aluno jovem e adulto muitas vezes não teve oportunidade para
estudar na época adequada e outras vezes não soube aproveitar o
período em que esteve na escola. São pessoas com diversos problemas,
problemas financeiros, existenciais, necessitam de atenção e carinho
(Professora alfabetizadora E – Rede pública municipal).
Ao reconhecer as duas condições para que o alfabetizando não tenha aproveitado o seu
período de escolarização, a professora demonstra uma visão de pessoa passiva. Pela sua fala,
poderíamos dizer que atribui a passividade aos problemas no âmbito financeiro e existencial
dos alunos. Aponta como solução para a superação dos problemas a atenção e o carinho da
professora, o que demonstra uma visão ingênua e maternal do processo.
Já a professora alfabetizadora F demonstra uma compreensão das características
peculiares do alfabetizando jovem e adulto enquanto sujeito trabalhador que vem lutando e
buscando a superação da sua condição de excluído, quando afirma:
O jovem e o adulto que estuda à noite é aquele que necessitou optar entre a
educação e a sobrevivência. É notável o esforço em vencer as dificuldades,
superar um dia cansativo de trabalho e ainda freqüentar as aulas. Este
público é carente de maiores atenções por parte da sociedade, precisa de
crédito para transformar a realidade em que vive e buscar mais horizontes
(Professora alfabetizadora F – Rede pública municipal).
Aponta como solução a necessidade de atenção e de tratamento específico para os
alunos adquirirem mecanismos para a superação de suas reais condições de vida, buscando
novas possibilidades como agentes de transformação da realidade.
Nesse mesma direção caminha a professora alfabetizadora A, quando reconhece que
os jovens e adultos
São pessoas sofridas, pessoas que vêm trabalhando com aquela sede de
aprender e chegar na sala e não encontrar professor...Aluno com sede de
aprender, com muita vontade e dependem de cada um de nós, professores
(Professora alfabetizadora A –Rede pública municipal).
Ao tempo que considera a trajetória de luta e de garra dos alunos enquanto
trabalhadores e acredita na escola como espaço de aprendizagem, denuncia a ausência do
professor alfabetizador em sala de aula. Ao fazer a denúncia do descompromisso do professor
em atender ás demandas e necesidades dos alunos, trazendo como conseqüências a
desmotivação e a desistência da escola, a professora alfabetizadora atribui a responsabilidade
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exclusivamente às questões pedagógicas e isenta a escola e o sistema de qualquer
responsabilidade.
Enquanto a professora alfabetizadora F demonstra uma concepção de pessoa
transformadora e lutadora por seus ideais, a professora alfabetizadora B revela apenas que os
alfabetizandos “passam uma esperança muito grande no amanhã”, mas não aponta indícios de
como isto poderá acontecer (Professora Alfabetizadora B – rede pública municipal).
Na visão da professora alfabetizadora C,
Os jovens e adultos são pessoas que se envolvem nas mais variadas práticas
sociais, são produtores de conhecimento, são sobretudo pessoas capazes de
aprender e de partilhar com os outros os seus saberes (Professora
Alfabetizadora C –Rede pública municipal).
Na concepção da referida professora, os alfabetizandos jovens e adultos são pessoas
que possuem diversos campos de interesse e de atuação, que vão desde a qualificação
profissional, a ação comunitária, o seu desenvolvimento cultural e, acima de tudo, a sua
participação enquanto cidadão que será capaz de aprender e partilhar com os outros os seus
saberes. Sua fala aponta para o avanço na compreensão da pessoa do alfabetizando jovem e
adulto, enquanto protagonista de sua história de vida.
Já a professora alfabetizadora C demonstra uma nova e ampla concepção das
características da pessoa do alfabetizando jovem e adulto. A professora alfabetizadora D
reconhece que:
O aluno jovem e adulto é uma pessoa que teve seus direitos excluídos da sua
vida, o sistema ainda escravagista em que vivemos transpõe para a sociedade
sua ideologia de que o rico tem que ser rico porque é bom e vai ajudar os
pobres porque Deus quer ou porque se inserem nos preconceitos raciais e
éticos. O aluno jovem e adulto carrega consigo esse estigma, a sua ascensão
profissional e escolar, segundo o mesmo, não depende das condições que o
sistema oferece, mas sim da sua e só da sua própria capacidade (Professora
Alfabetizadora D – Rede pública municipal).
Com isso, a professora alfabetizadora evidencia que a condição do alfabetizando
enquanto excluído não depende do sistema e de suas condições socioeconômicas e culturais, e
sim, exclusivamente, da própria capacidade do alfabetizando em buscar ou não essas
condições de sobrevivência.
A partir dessas diferentes falas, buscamos junto às professoras alfabetizadoras
entrevistadas as suas concepções de mundo.
77
Concepção de Mundo
No entender da professora alfabetizadora E, “mundo de hoje é repleto de pessoas injustas
e egoístas, que alguns só pensam em si e se tornam o centro das coisas”.
Essa fala evidencia uma compreensão de mundo fruto de uma sociedade onde as
pessoas são apenas figurantes e não partícipes do processo histórico e social, ou seja,
simplesmente uma pessoa no mundo, mundo este que não permite a participação de todos, só
existindo espaço para alguns. Com certeza, aqueles que detêm o poder econômico e político.
A professora alfabetizadora D amplia a fala anterior, quando desabafa: “ O mundo e a
sociedade são vistos como grandes paradoxos, como sociedades esquecidas pela humanidade-África”.
Entendemos que o paradoxo apontado pela professora tem como eixo central a
referência feita a situações sociais, como a do continente africano, demonstrando o
esquecimento e a falta de respeito dos países ricos pelos países pobres do Terceiro Mundo.
Sua fala aproxima-se da concepção de pessoa, enquanto considerados excluídos e
marginalizados por este mundo e esta sociedade, sem uma possibilidade de superação dos
problemas sociopolíticos, econômicos e culturais.
A professora alfabetizadora C denuncia:
Vejo o mundo como um emaranhado de problemas das mais diversas ordens
que podem ser superados desde que a sociedade civil se organize e vá à
busca da superação destes, pois acredito e sonho com dias melhores
(Professora Alfabetizadora C –Rede pública municipal).
No entanto, ela não se limita à denúncia. Aponta possibilidades de superação destes
problemas através da organização da sociedade civil, que poderá encontrar caminhos para a
ruptura desta sociedade excludente e tão desigual. A fala da professora, quanto à concepção
de mundo, amplia a compreensão que ela demonstra quanto à concepção de pessoa como
protagonista da história, que poderá, enquanto cidadão, tornar-se interventor no mundo.
3.3. Um olhar comparativo em torno das concepções apresentadas
Após a análise dos dados obtidos durante a pesquisa, lançamos um olhar comparativo
para a realidade vivenciada junto às professoras alfabetizadoras entrevistadas nas duas redes
de ensino.
Percebemos que alguns depoimentos ainda demonstram a contradição e a
desarticulação existente na concepção das professoras alfabetizadoras quanto ao processo de
78
formação e prática pedagógica, com uma compreensão ainda ingênua do seu fazer
pedagógico.
A maioria das falas aponta indícios da ausência de pensar o processo ensino aprendizagem de jovens e adultos de forma mais investigativa e problematizadora, através de
uma fundamentação teórica mais consistente. Nesta perspectiva, a prática poderá então se
constituir de uma atividade mais criativa, e não apenas de uma atividade meramente técnica,
em que se aplica produção externa e o fazer do professor alfabetizador de jovens e adultos não
será apenas ensinado, mas acima de tudo poderá ser aprendido, refletindo “na” e “sobre a
ação” (GÓMEZ,1995, p.112).
No nosso entendimento, esta falta de articulação é decorrente da própria dicotomia e
descontextualização entre prática e planejamento, teoria-prática, ensino-aprendizagem. Os
docentes não interferem nas organizações, nas estruturas e não justificam os motivos de sua
ação, o que ainda está muito presente no cotidiano das escolas, conseqüentemente,
decorrentes do processo formativo. Isto ficou explícito nas falas das professoras
alfabetizadoras entrevistadas quando perguntamos como elas percebiam o processo de
planejamento, e como se dava o processo em suas escolas/sala de aula.
As concepções de planejamento apresentadas confirmam várias questões e aspectos
analisados anteriormente, onde se comprova a falta de articulação entre o fazer e o pensar das
professoras alfabetizadoras. Percebe-se que o trabalho efetivo ainda é desprovido de atenção,
de organização. Em nenhuma fala ficou explícito que a escola pensa o seu fazer cotidiano
coletivamente. Isto reforça a tese de que, sem um trabalho coletivo efetivo, nenhum processo
de formação continuada terá sustentação no seu lócus privilegiado, que é a escola. Porque,
segundo Schon (1992, apud CANDAU, 1998), os responsáveis escolares que queiram
encorajar os professores a tornarem-se profissionais reflexivos, participativos que planejam
coletivamente, devem proporcionar a criação de espaços de liberdade tranqüila onde a
reflexão-na-ação seja possível, e que o “chão da escola” venha a ser o espaço preferencial de
formação e de socialização de saberes.
A análise comparativa dos depoimentos das professoras alfabetizadoras da rede
estadual e rede municipal, a primeira desprovida de uma política de formação, a segunda
fazendo um esforço de nove (9) anos para sua efetivação, revela diferenças pontuais quanto à
percepção e à concepção da importância do planejamento enquanto instrumento de
intervenção e organização do fazer pedagógico coletivamente. A maioria das professoras
alfabetizadoras reconhece como sendo o planejamento um instrumento utilizado na solidão,
no isolamento, contrariando a concepção de planejamento participativo. Contrariam a visão de
79
Ott (1984), para quem a consciência, a intencionalidade e a participação são fundamentais
para esta forma de perceber o planejamento enquanto processo de participação coletiva.
A concepção de planejamento participativo surge como uma possibilidade de ruptura
com o planejamento funcional ou normativo, em que as práticas e ações dos professores e das
escolas são desenvolvidas de forma fragmentada, sem considerar o contexto social. No
contexto do planejamento participativo, o processo passará a ser entendido e compreendido
como instrumento de intervenção da realidade na perspectiva da sua transformação, na busca
de uma sociedade justa, solidária e, acima de tudo, participativa.
Esta é a concepção de planejamento que acreditamos e gostaríamos de afirmar
como possível para o anúncio de uma estrutura educativa mais humana, compreendendo que
as diferentes e possíveis práticas de planejamento não acontecem de forma linear, podendo
conviver no mesmo contexto e na mesma pessoa. O que vale e será importante é a
possibilidade da tomada de consciência dessas várias concepções e suas influências na vida
cotidiana, e a definição de uma nova opção que possa vir a orientar e influenciar a prática do
planejamento.
A prática profissional dos professores alfabetizadores de educação para jovens e
adultos, pensada e refletida no espaço escolar de forma participativa, responsável,
comprometida, pautada em uma fundamentação teórica sólida e consistente, será capaz de
gerar a reflexão crítica que supera a visão ingênua e descomprometida com os saberes e
fazeres dos professores alfabetizadores e dos alfabetizandos, através de um processo de
construção coletiva.
Avaliando os depoimentos das professoras alfabetizadoras da rede estadual,
percebemos, por um lado, a existência de resquícios de uma visão mecanicista de
alfabetização como conseqüência da ausência do processo de formação inicial específica
enquanto professoras de educação para jovens e adultos. Por outro lado, percebem-se indícios
de uma compreensão de alfabetização de caráter mais político, com uma perspectiva e
vontade de transição para a busca de um novo paradigma de alfabetização.
As professoras alfabetizadoras da rede municipal, em suas falas, evidenciam
concepções de alfabetização que avançam mais, em comparação as professoras da rede
estadual. Demonstram uma perspectiva voltada para o processo que venha a ultrapassar a
aprendizagem dos rudimentos da linguagem escrita, os tradicionais métodos alfabéticos e
silábicos. Percebe-se nas falas o desejo de formar um alfabetizando usuário da linguagem
escrita para diversos fins.
80
Observa-se, no entanto, que as definições ainda se apresentam de forma contraditória,
diferenciada, de acordo com a realidade das professoras alfabetizadoras e com o contexto da
rede de ensino da qual fazem parte. Detectamos resquícios de concepções que vão da simples
ação mecânica (BARBOSA, In: MOURA, 1999), passam pela análise político-pedagógica
(FREIRE, In: MOURA, 1999) e chegam a uma perspectiva de letramento (SOARES, 2002).
Nossa análise diante dos fatos aponta que algumas professoras alfabetizadoras ainda
têm a visão e a compreensão de que alfabetizar é coisa fácil e que qualquer pessoa pode fazêlo, mesmo desprovida do conhecimento específico da área.
Essa visão contradiz a concepção que demonstram ter sobre os sujeitos do processo de
alfabetização. Quando solicitamos que nos falassem um pouco sobre a pessoa humana, qual a
concepção de pessoa / alfabetizando da educação de jovens e adultos que elas possuíam,
percebemos que as professoras alfabetizadoras , em sua grande maioria oriundas das duas
redes de ensino, demonstram uma visão dos alunos jovens e adultos como sujeitos carentes,
afetivamente, socialmente e economicamente.
Apresentam ainda um perfil contraditório dos alfabetizandos, em que apontam um
sujeito que tem vergonha de si mesmo, de sua própria condição. Para elas, os alunos
acreditam que a sua ascensão profissional advém da própria capacidade pessoal e não das
condições socioeconômicas que lhe são ou não oferecidas, desvelando uma concepção
político - pedagógica ainda carregada de ingenuidade. No entanto, percebemos na fala de
algumas professoras alfabetizadoras indícios da visão de um novo perfil do aluno jovem
adulto alfabetizando, na perspectiva do trabalhador que luta em busca da superação das
condições de vida, condições essas que se constituem na raiz do problema do analfabetismo.
Considerando ainda os alfabetizandos como seres pensantes, portadores de idéias e produtores
de cultura.
Neste sentido, Moura (1999, p.213) nos leva à reflexão de que é através da relação
dialógica que os professores alfabetizadores e alfabetizandos interagem, conhecem, trocam
impressões e experiências, reconhecem-se trabalhadores que, mesmo possuindo objetivos e
interesses diferenciados, são seres sujeitos cognoscentes e aprendizes, são sujeitos em
constante ação e em permanente movimento, em práxis, por ser ação reflexiva e criativa,
precisando que o professor conheça a gênese e os interesses dos alfabetizandos, os seus
motivos e as suas necessidades de alfabetização.
Desta feita, sentimos necessidade de buscar junto às professoras entrevistadas as suas
concepções de mundo, para melhor compreender a sua relação com os alfabetizandos jovens e
adultos, ou seja, sua concepção e compreensão de pessoa / mundo.
81
Para uma melhor compreensão das concepções de mundo apontadas pelas
entrevistadas, percebemos que, segundo Sacristán (2000), o mundo continua sendo
direcionado por idéias e valores do individualismo e do poder. Portanto, dentro deste
contexto, a proposta de educação que não esteja com uma orientação clara e com um forte
determinismo, não terá sentido nas novas condições e exigências sociais e culturais. Desta
feita, os profissionais da educação terão que desenvolver um trabalho voltado para a reflexão
destas transformações sociais, políticas e econômicas, no século atual, buscando respostas
para questões com: o projeto moderno ainda tem sentido? Ele foi esvaziado de conteúdo? Já
se realizou e agora é preciso procura-lo em outra direção? Qual? Há espaço para pedir algum
projeto nas condições da pós-modernidade?
Percebemos, nas entrevistas realizadas, indícios de que algumas professoras
alfabetizadoras ainda apresentam uma concepção de mundo competitivo, excludente e
desigual, não demonstrando avanço e superação nas relações das pessoas e do mundo em que
vivem; outras professoras alfabetizadoras demonstram avanços nas concepções de pessoa e de
mundo. Esses avanços são identificados principalmente entre as professoras alfabetizadoras
da rede municipal, o que nos leva a crer que se deve ao processo formativo que estão
vivenciando.
As análises das entrevistas demonstram ainda a compreensão de que, por conta das
lacunas deixadas pelo processo formativo inicial e continuado, as professoras alfabetizadoras
evidenciam em suas falas concepções contraditórias, que devem perpassar a prática
pedagógica, passando a serem compreendidas como resultado de um projeto social do mundo
da modernidade. Um mundo que se apresenta problemático, sem solução, incutindo nas
pessoas um sentimento de inércia, de manutenção ou de reprodução, diante das condições
impostas pelo sistema, que paulatinamente influencia a escola e conseqüentemente a prática, o
fazer do professor. No entanto, as entrevistas também revelaram possibilidades de superação,
desde que haja a organização das pessoas.
Essa constatação aponta para a garantia de um espaço, de um lócus de formação que
permita aos professores alfabetizadores construírem sua prática, a partir de suas opções, mas
que sejam pautadas por uma consciência crítica que possibilite compreender que o seu aluno
alfabetizando jovem e adulto está aprendendo da mesma forma que ele, enquanto professor,
foi educado, com as mesmas concepções, atitudes e posturas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo em foco nos permitiu o aprofundamento em torno da literatura sobre o
processo formativo dos profissionais da educação, principalmente no que se refere à formação
inicial e formação continuada.
Destacamos o processo formativo dos professores alfabetizadores de jovens e adultos,
compreendendo
as
peculiaridades
desta
modalidade
educativa,
considerando
as
especificidades dos sujeitos do processo, os alfabetizandos, envolvendo os aspectos
cognitivos, afetivos e socioeconômicos.
Destarte, compreendemos o quanto se torna significativo e ao mesmo tempo
desafiante, a formação do alfabetizador para atuar com jovens e adultos, com a possibilidade
do desenvolvimento e da revisão da postura, das políticas e das práticas pedagógicas, para o
enfrentamento das incertezas, das dúvidas e das especificidades do complexo processo de
alfabetização. Para tal é necessária ao professor a aquisição de competências e habilidades
que o capacitem para atuar e intervir no processo. Esta capacitação será viabilizada através de
um sólido processo de formação inicial e continuada.
Consideramos a formação inicial a condição básica, através da qual os professores
poderão definir o seu papel profissional como possível de ser desempenhado. Os estudos
sobre a formação continuada nos remeteram a uma reflexão em torno das concepções e
tendências. Através delas observamos que todos os conceitos e modalidades analisadas
representaram avanços e recuos. Entendemos que as reflexões em torno desse processo
formativo podem suscitar reformas, especificamente no que se refere às políticas de formação
continuada, porque os paradigmas utilizados com as denominações de reciclagem,
treinamento, capacitação e aperfeiçoamento, demonstraram, através do estudo, que não
permitiram, não proporcionaram a construção da autonomia intelectual do professor. Portanto,
tornar-se-á necessária a redefinição do processo enquanto formação continuada na perspectiva
do desenvolvimento profissional.
Analisando o processo de formação inicial das professoras alfabetizadoras envolvidas
no estudo, os resultados revelaram que este processo ainda se encontra por se desenvolver.
Consideramos um silêncio permitido pelas instâncias formadoras, devido a toda uma estrutura
de um sistema e de uma conjuntura política de formação alicerçada e sedimentada nas antigas
legislações de ensino e nos modelos clássicos de formação. As instâncias formadoras não
trazem no bojo de suas proposições e definições nenhuma proposta de formação para o
83
professor alfabetizador de educação de jovens e adultos, ficando explicitada esta falta de
formação na fala das próprias professoras alfabetizadoras entrevistadas, tanto da rede estadual
como da rede municipal da cidade de Maceió. As professoras alfabetizadoras reconhecem a
ausência da formação inicial para exercerem a função específica de alfabetizadoras de pessoas
jovens e adultas.
No entanto, os estudos apontaram para possibilidades de ruptura e superação desta
forma silenciosa de se fazer e se pensar a política de formação inicial oferecida até então.
Analisando a nova LDB 9394/96 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Básica de Jovens e Adultos, e as Diretrizes Nacionais para a Formação de Professores da
Educação Básica, em nível superior, cursos de licenciatura, de graduação plena, percebemos
que indicam avanços significativos, evidenciados na prática cotidiana, permitindo que a
educação de jovens e adultos possa ser tratada como uma modalidade educativa, onde o
processo de formação inicial dos alfabetizadores, e dos professores como um todo, seja
reconhecido em todas as modalidades de ensino nas mais diversas instâncias formadoras, e
que o direito de acesso de todos a esta modalidade educativa seja garantido, respeitando-se os
princípios básicos da Educação Nacional.
No que se refere ao processo de formação continuada, foco do nosso estudo, em que
buscamos respostas para compreensão de como acontecia este processo na ausência de uma
política de formação inicial, reconhecemos na análise das entrevistas que as professoras
alfabetizadoras envolvidas no estudo apresentam posições diferenciadas quanto ao seu
processo de formação continuada.
As professoras alfabetizadoras da rede estadual afirmam em suas falas que a formação
continuada ocorre totalmente na prática docente, ou seja, no seu dia-a-dia, na sala de aula, na
relação com seus alunos. Não percebemos nas falas a relação com outras companheiras
professoras alfabetizadoras. Evidencia-se, nessa perspectiva de formação continuada das
professoras alfabetizadoras da rede estadual, uma prática docente construída a partir da
concepção dos saberes da experiência, apontada por Tardif (2000), enquanto prática do
contexto e da ação tendo como referência básica sua prática cotidiana. No entanto, também
encontramos na fala de outras professoras alfabetizadoras da rede um processo formativo
quase que solitário em que as professoras alfabetizadoras vão construindo seus saberes a partir
de suas reais condições e necessidades práticas. Acreditamos que este será um processo
transitório, diante da perspectiva de implantação de uma política de formação continuada na
área, frente às demandas percebidas no Estado no que se refere aos índices de analfabetismo
apontados pelas pesquisas e já evidenciados anteriormente.
84
As professoras alfabetizadoras da rede municipal da cidade de Maceió, expõem em
suas falas o seu processo de formação continuada, ocorrendo em duas direções.
Primeiro, a grande maioria afirma, como espaços privilegiados de formação continuada,
os cursos oferecidos pelo DEJA – SEMED. Segundo, a minoria das professoras alfabetizadoras
considera como espaço de formação apenas a prática cotidiana, ou seja, o dia-a-dia da sala de
aula, a troca de experiências com outros companheiros de trabalho e com os próprios alunos.
As professoras alfabetizadoras demonstraram uma característica de simultaneidade ao
reconhecerem como vem acontecendo o seu processo formativo continuado na rede, como
ficou claro na fala da alfabetizadora “D”, percebendo como possibilidade de formação os dois
espaços formativos. No entanto, os estudos nos conduzem para a reflexão de que, apesar do
reconhecimento da simultaneidade dos processos formativos por parte das professoras
alfabetizadoras, não identificamos nas falas das entrevistadas, a compreensão e a percepção
de que o processo formativo oferecido pelo DEJA poderá fomentar e enriquecer os processos
construídos através dos saberes, mobilizados e empregados na prática cotidiana. Percebemos
ser ainda um processo dual e desarticulado, fruto de todo um processo formativo, recebido e
construído ao longo da história profissional, e de uma prática desvinculada e deslocada da
teoria e de um saber determinado, resultante de um fazer fragmentado.
Isto ficou evidente na fala de uma das coordenadoras pedagógicas do DEJA –
SEMED, quando relatou que:
além da formação não poder ser pontual, improvisada, o principal local onde
deveria acontecer a formação é a escola. Então não adianta você estar tirando
professor da sala de aula, trazendo para uma secretaria, para um hotel, para
onde for, se esta formação não vai conseguir ser refletida na escola,
considerando as dificuldades que as alfabetizadoras encontram para
estabelecer a unidade teoria - prática. O problema tem origem na formação
inicial, responsável pelo processo formativo dicotômico e fragmentado do
professor, chegando com muita força na cabeça e na prática do professor. O
curso que aparentemente dá resultados, é um curso prático, prático no
sentido utilitário que eu possa usar imediatamente na sala de aula
(Coordenadora DEJA – SEMED).
Apesar de toda a caminhada das professoras alfabetizadoras da rede municipal em
relação às professoras alfabetizadoras da rede estadual, encontramos em seus depoimentos
histórias de formação e concepções semelhantes. Mesmo as professoras alfabetizadoras da
rede municipal, que revelam uma capacidade reflexiva mais aguçada, ainda precisarão do
85
desenvolvimento da capacidade de teorização na relação ação- reflexão-ação. No entanto, já
revelam indícios de uma vontade de mudança e o desejo de conseguirem estabelecer a relação
- teoria prática. As concepções das professoras alfabetizadoras da rede municipal revelam
uma relação entre os saberes oriundos do seu processo formativo, os sabres disciplinares, os
saberes curriculares e a relação e a interação com os seus saberes experienciais, que
precisariam ser compreendidos pelas professoras alfabetizadoras através de um processo de
formação inicial e continuada, para a efetivação da relação teoria - prática no cotidiano da
ação docente.
O estudo nos permitiu buscar, junto às professoras alfabetizadoras, concepções que
consideramos serem pertinentes e importantes para a compreensão e análise do fazer
pedagógico das professoras alfabetizadoras frente ao processo formativo , o que deixamos
evidente no capítulo III. Percebemos que muitas das concepções apresentadas pelas
professoras alfabetizadoras são frutos dos valores e das visões que permeiam o mundo
capitalista de concepções neoliberais, onde o individualismo, a fragmentação e a competição
são tidos como valores essenciais para a manutenção do que está posto. Por outro lado,
evidenciamos concepções com uma perspectiva de mudança, em que o coletivo e as
participações são essenciais.
Consideramos que as professoras alfabetizadoras da rede municipal evidenciaram uma
maior compreensão dessas concepções, decorrente da tentativa de nove anos de
implementação de uma política de formação continuada na rede, o que fica explícito na fala
das coordenadoras do DEJA – SEMED, quando entrevistadas, demonstrando ainda uma
preocupação quanto à forma de se oferecer e se planejar este processo formativo,
reconhecendo a necessidade de um redimensionamento e uma reorganização institucional,
revelando que
com todos os avanços e os recursos que nós temos na nossa formação
continuada, eu considero significativo, porque a formação inicial não dá
conta, e não dando conta é na formação continuada que a gente consegue,
em vez de avançar, voltar um pouco pra formação inicial e ter um trabalho
acadêmico de pesquisa participante que possa refletir a nossa prática, que
mostrou os seus recuos e que deu um novo caminho a nossa formação
continuada. Então eu acho que ela é importante, a gente ainda precisa
avançar bastante; é por isso que esse ano a gente volta a repensar a formação
e querendo colocá-la no seu espaço devido que é a escola (Coordenadora
DEJA – SEMED).
86
Nesta caminhada, reconhecemos a grande importância e o respeito que se deve dar aos
saberes produzidos e construídos pelas professoras alfabetizadoras nos processos de formação
continuada, onde a “troca de experiência e a partilha de saberes consolidam espaços de
formação mútua, nos quais cada professor é chamado a desempenhar, simultaneamente, o
papel de formador e de formando” (NÓVOA, 1995, p.26).
Para tanto, será de fundamental importância que se criem espaços para o
diálogo e a troca de experiência entre os professores, na perspectiva da consolidação desses
saberes oriundos da prática profissional. Acreditamos ser a escola o espaço privilegiado e
fundamental para o processo de formação continuada onde pensar o professor profissional
alfabetizador de jovens e adultos, diante das exigências, das inovações e das mudanças no
contexto. Pensar na construção de sua identidade profissional, respeitando e valorizando seus
saberes docentes, compreendendo o seu ciclo de vida profissional, por ser estes fatores
essenciais e extremamente significativos no processo de desenvolvimento profissional dos
professores, particularmente no que diz respeito aos professores alfabetizadores para pessoas
jovens e adultas.
A profissão do professor exige dos seus profissionais alteração, flexibilidade,
incertezas e imprevisibilidade. Não existem modelos e experiências educativas prontas para
ser simplesmente aplicadas. Os profissionais da educação acumulam experiências como uma
referência e não como padrão pronto e acabado. O processo de reflexão dos profissionais da
educação, de forma individual ou coletiva, poderá ser o ponto de partida e a base de
sustentação para que se efetivem ações pautadas em princípios norteadores, e nunca em
modelos pré-estabelecidos.
As políticas de formação inicial e continuada do professor, se bem definidas e
assumidas como compromisso e decisão política, poderão ser o caminho, a possibilidade da
autonomia profissional do professor enquanto ator e autor do processo, favorecendo-lhe a
possibilidade de autocrítica que poderá ser o início de uma maturidade profissional, superando
e rompendo com as práticas imediatistas e utilitárias, construindo uma teoria emancipatória
em que o professor tornar-se-á sujeito da sua própria história profissional, implementando
concepções e novas possibilidades diante do grande desafio de ser professor. E, muito mais
instigante, na nossa compreensão, é ser professor alfabetizador de pesssoas jovens e adultas.
Principalmente quando se considera que a educação de jovens e adultos sempre foi vista em
todo seu processo histórico como uma modalidade de ensino que não requer de seus
professores estudo nem especialização, como um campo eminentemente ligado à boavontade. Portanto, raros são os professores alfabetizadores especificamente capacitados para a
87
área. Continua-se pensando que qualquer pessoa que venha a ter o domínio da leitura e da
escrita poderá ser professor alfabetizador dessa modalidade educativa. Por isso ainda se
encontraram professores alfabetizadores leigos atuando nesta área.
Consideramos necessário que se proporcione alto investimento nos processos de
formação dos professores alfabetizadores de jovens e adultos, a fim de que os saberes
oriundos de sua prática, da sua experiência de vida, sejam trabalhados e fundamentados a
partir de valores e concepções teóricas que proporcionem um suporte teórico - metodológico
para a sua atuação no contexto da sala de aula, ou além deste, com as competências
necessárias para a superação dos desafios e problemas oriundos da própria prática, porque,
segundo Schon (1990), “os problemas da prática profissional docente não são meramente
instrumentais, todos eles comportam situações problemáticas que obrigam a decisões num
terreno de grande complexidade, incerteza, singularidade e de conflito de valores”.
O pensar e o fazer pedagógico são tarefas extremamente complexas e desafiantes para
o professor reflexivo de educação de jovens e adultos, exigindo um processo de formação
sistematizado para a superação das velhas formas tradicionais de planejamento e organização
escolar, diante dos limites e das possibilidades para se adquirir competência pedagógica e
considerando a diversidade e as especificidades características do aluno/alfabetizando da
Educação Básicos para jovens e adultos. Segundo Ribeiro (1999, p.197), transformações de
tal ordem na qualidade das práticas de Educação de Jovens e adultos só se darão, é certo, à
medida que se profissionalize o pessoal dedicado a essa área.
Portanto, é necessário se pensar uma formação diferenciada para os professores
alfabetizadores da educação de jovens e adultos, porque a sua atuação profissional é
extremamente complexa diante da realidade dos alunos trabalhadores.
Neste repensar, acreditamos e apostamos que os cursos de formação de professores, a
partir das novas demandas desta área, especificamente no Estado de Alagoas, passem a
contemplar em seus currículos plenos disciplinas específicas para a educação de jovens e
adultos, e que esta modalidade educativa não seja mais tratada apenas como apêndice dos
cursos, como disciplina meramente eletiva ou como um simples seminário. É necessário que
as instâncias formadoras e empregadoras no Estado de Alagoas acreditem na possibilidade de
uma política efetiva de formação continuada para a área, e compromisso político e ético com
as classes menos favorecidas.
A elaboração de uma política pública para a educação de jovens e adultos não será
frutífera e não se consolidará se for elaborada na solidão ou apenas por meio do desejo e de
esforços individuais. Consideramos que a SEMED possui uma política de formação
88
continuada, no entanto esta não se caracteriza como uma política pública de Estado, mas
como uma proposta gerada e nascida do desejo de um grupo de profissionais comprometidos
e esperançosos com a causa da EJA em nosso Estado. A consolidação de uma política de
Estado será um desafio e uma tarefa que irá requerer atores coletivos, capazes de elaborar um
outro discurso e que possam também universalizá-lo e consolidá-lo de forma hegemônica,
através da mobilização e da parceria de todas as pessoas, homens e mulheres, organizações
governamentais e não governamentais, buscando, através de fóruns de discussões, propostas
políticas sérias e comprometidas com a coletividade, romper com as iniciativas
individualizadas. Assim poderemos celebrar um novo horizonte para a EJA em Alagoas.
Considerando-nos como seres inconclusos, seria contraditório afirmar que chegamos
ao fim, que concluímos, colocando ponto final num processo que ainda está em construção.
Portanto, é nessa perspectiva que hoje, enquanto pessoa em processo de formação, passamos a
compreender que, quanto mais se estuda ou se ensina, mais se aprende sobre o que se está
fazendo, e é com esta reflexão que chegamos ao entendimento de que ainda falta muito por
fazer e para compreender da formação e da prática docente do professor Alfabetizador de
Jovens e Adultos, principalmente no que se refere, à definição de uma política pública voltada
para a área. Por outro lado, esta pesquisa nos leva à compreensão de que este processo
investigativo precisa de continuidade, despertando em nós o desejo de buscar o papel da
prática pedagógica, na formação e na atuação cotidiana do professor de educação para jovens
e adultos. Este será o nosso futuro desafio a ser enfrentado como compromisso político e
contribuição para a educação de jovens e adultos.
O futuro deixou de ser problemático para ser inexorável. Ou seja: o
que vem, vem mesmo. Não é assim. O futuro não está ali na
esquina às escondidas, esperando pela nossa chegada, para nos
surpreender e para nos fazer dizer “Olha o fato aqui! Estava se
escondendo de mim”. O futuro só vem se a gente o construir. Se a
gente transformar o presente com vistas ao perfil, ao sonho ou à
utopia.
Freire (1998, p.45)
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ANEXO 1
Roteiro do questionário aplicado com as professoras alfabetizadoras
I- IDENTIFICAÇAO:
1. Nome completo __________________________________________________________
__________________________________________________________________________
2. Endereço Pessoal _________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
Profissional _______________________________________________________________
__________________________________________________________________________
3. Que fase você leciona em EJA ________________________________________________
4. Pretende continuar lecionando esta fase no ano letivo de 2003 _______________________
5. Qual a sua formação? Que curso fez ___________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
6. Fale um pouco de sua vida profissional, colocando de onde vem seu interesse pela
Educação para Jovens e Adultos. Ou seja, por que você é professor (a) de EJA? ___________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
7. Para você o que significa formação?____________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
8. Como você está se formando no dia a dia para exercer sua profissão? E por quem você está
se formando ________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
_____________ __________________________________________________ ___________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
97
9. A formação profissional que você recebeu, lhe dá condições para realizar o trabalho com
Educação de Jovens e Adultos no dia-a-dia da sala de aula? ( )Sim ( )Não
Por que? ___________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
______________________________________ __________________________________ __
10. Para você o que é Alfabetizar? _______________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
11. Como você vê hoje o mundo e a sociedade? ____________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
12. Qual a sua visão sobre a pessoa, principalmente a pessoa do aluno Jovem e Adulto?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
13 Como você planeja seu fazer pedagógico? Como se dá o processo de Planejamento na
escola? A partir do que você planeja? ____________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
________________________________ __________________________________ ________
14. Para você o que significa Prática? O que envolve a Prática? ________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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ANEXO 2
Quadro de Análise
A formação inicial e continuada das professoras alfabetizadoras de EJA e as concepções subjacentes
Rede _______________________Nº de Entrevistados ____Total de Professores de EJA 1a Fase____ Ano ____________
CONCEPÇÕES
ENTREVISTADOS
FORMAÇÃO
FORMAÇÃO
ALFABETIZAÇÃO
MUNDO
SUJEITO/EJA
PLANEJAMENTO
PRÁTICA
INTERESSE/EJA
