Ivon José Guimarães da Costa
Título da dissertação: REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO GOVERNO FHC (1994 -2002): O DECRETO 2.208/97 E O CEFET-PE
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
IVON JOSE GUIMARÃES DA COSTA
REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
NO GOVERNO FHC (1994 -2002): O DECRETO 2.208/97 E O CEFET-PE
MACEIÓ-AL
2012
IVON JOSÉ GUIMARÃES DA COSTA
REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO
GOVERNO FHC (1994 -2002): O DECRETO 2.208/97 E O CEFETPE
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal de Alagoas, como
requisito parcial para obtenção do grau de
Mestre em Educação.
Orientadora: Profª Drª Adriana Almeida Sales
de Melo
MACEIÓ
2012
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecária Responsável: Helena Cristina Pimentel do Vale
C837r
Costa, Ivon Jose Guimarães da.
Reestruturação produtiva e reforma da educação profissional no governo
FHC (1994 -2002): o decreto 2.208/97 e o CEFET-PE / Ivon Jose Guimarães da
Costa. – 2012.
131 f. : il.
Orientadora: Adriana Almeida Sales de Melo.
Dissertação (Mestrado em Educação Brasileira) – Universidade Federal de
Alagoas. Centro de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação
Brasileira. Maceió, 2012.
Bibliografia: f. 123-131.
1. Ensino técnico. 2. Brasil – Política e governo – 1994-2002. 3. Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco. I. Título.
CDU: 373.6
IVON JOSÉ GUIMARÃES DA COSTA
REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
NO GOVERNO FHC (1994 – 2002): O DECRETO 2.208/97 E O CEFETPE
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Programa de Pós-graduação da
Universidade federal de Alagoas, como requisito parcial à obtenção do título de mestre
em Educação Brasileira.
COMISSÃO EXAMINADORA
_________________________________
Profª Drª Adriana Almeida Sales de Melo
Universidade Federal de Alagoas
_________________________________
Profª Drª Inalda Maria dos Santos
Universidade Federal de Alagoas
_________________________________
Profº Dr. Moacir Martins Machado
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco
A Ivon Neto, pelo tempo de convívio subtraído
numa fase tão bela e fascinante de sua existência
A Anthenor, primeiro rebento, emanação de tantas
alegrias
A Euricélia, companheira de jornada, com quem
compartilho quimeras, projetos...e já que não se
pode subtrair, desassossegos.
A meus pais, porto seguro a abrigar-me nas
adversidades da vida.
AGRADECIMENTOS
A Profª Drª Adriana Almeida Sales de Melo, pela erudição, solicitude e paciência
inabalável.
A Prof ª Drª Inalda Maria dos Santos, pela sapiência, simplicidade e diligência.
Ao Profº Dr. Moacir Martins Machado, pela obsequiosa e esmerada contribuição.
A todos os amigos, coparticipes dessa odisseia Minter IFPE/UFAL.
Aos amigos ifteanos que me apoiaram direta ou indiretamente nessa empreitada
intelectual e emocional.
A todos aqueles, com os quais convivi na UFAL, que deixaram gratas lembranças.
“É preciso ter utopia, pois nela reside a esperança de um novo
modo de fazer a aventura humana”
Gaudêncio Frigotto
“Não há utopia verdadeira fora da tensão entre a denúncia de um
presente tornando-se cada vez mais intolerável e o anúncio de
um futuro a ser criado, construído, política, estética e eticamente,
por nós, homens e mulheres.”
Paulo Freire
RESUMO
A pesquisa procurou investigar as mudanças na materialidade e subjetividade históricas,
sobretudo, as ressignificações do Estado em seu sentido amplo e suas atribuições, em
particular, na educação, notadamente a educação profissional, e mais especificamente no
Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco (CEFETPE). Examinamos como o
governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) esteve atrelado a um projeto societário
neoliberal, em que as políticas educacionais estavam vinculadas às políticas
macroeconômicas, não de forma mecanicista, mas só podendo ser compreendidas a partir
desse cenário. Abordamos as diferentes visões e representações sobre o trabalho, construídas
historicamente, as quais refletiram, consequentemente, no papel social da escola, além de
apresentar a história do ensino profissional no Brasil. Objetivamos auscultar qual o papel
atribuído à educação profissional, considerando a inserção do Brasil como uma economia
capitalista periférica, marcada por um modelo excludente e com um passado escravocrata.
Foram analisadas as políticas educacionais implementadas no período FHC, particularmente,
o Decreto-Lei n.º 2.208/1997, destacando o papel do Programa de Expansão da Educação
Profissional (PROEP) na adequação do CEFETPE aos moldes do que preconizava a Nova
LDB (Lei 9.394/96) e ao referido decreto, o qual materializou reformas no ensino
profissionalizante, mormente, o CEFETPE, reforçando o dualismo educacional já existente
nessa instituição. Tal dualismo engendrou desdobramentos que promoveram um aumento da
participação de egressos da escola particular em detrimento daqueles provenientes da escola
pública no perfil dos discentes no referido Centro. Analisamos como as referidas mudanças se
impuseram sem a participação dos segmentos que compõem a instituição objeto das
metamorfoses, e de como contribuíram para desestruturar o ensino na rede federal de ensino
técnico, mormente o CEFETPE. A metodologia empregada foi a da análise documental,
tomando como foco o Decreto nº 2.208/97 e legislações correlatas, sendo necessário
incursionar pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, pareceres do Conselho Nacional de
educação (CNE), Constituição Federal de 1988, relatórios de Gestão (semestrais), Anuário
Estatístico, relatórios de Questionários socioeconômicos dos vestibulares e outros
documentos, todos emitidos pelo CEFETPE. Concomitantemente, analisamos outros que
versaram sobre o tema, assim como a leitura de dados do Instituto Nacional de Pesquisa
Educacional Anízio Teixeira (INEP) e do Instituto brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
Palavras-Chave: Educação Profissional. Dualismo Educacional. Taylorismo-Fordismo.
Reestruturação
Produtiva.
Neoliberalismo.
Desenvolvimento do Ensino Profissional).
PROEP(Programa
de
ABSTRACT
The research sought to investigate the changes in historical materiality and subjectivity,
especially, the reinterpretation of the State in its comprehensive sense and its responsibilities,
particularly in education, especially vocational education, and more specifically at the Centro
Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco (CEFETPE .) We examined how the
government of Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) was linked to a corporate neoliberal
project, in which educational policies were linked to macroeconomic policies, not in a
mechanistic way, but only being understood from this scenario. We discussed the different
views and representations on the work, historically constructed, which reflected accordingly
in the school social role, along with presenting the history of vocational education in Brazil.
We aimed to discern what the role assigned to vocational education was, considering the
inclusion of Brazil as a peripheral capitalist economy, marked by an exclusionary model and
with a slave past. We analyzed the educational policies implemented during FHC period,
particularly, the Decree-Law no. 2.208/1997, highlighting the role of the Programa de
Expansão da Educação Profissional (PROEP) in the adequacy of the CEFETPE to the frame
called for by the New LDB (Law 9.394/96) and that decree, which materialized reforms in
vocational education, especially the CEFETPE, reinforcing the educational dualism existing
in this institution. Such a dualism engendered developments that promoted increased
participation of private school graduates over those from public schools in the profile of
students in the Centre. We analyzed how these changes have been imposed without the
participation of the segments that make up the institution, object of transformations, and also
how they have contributed to disrupt education in the federal system of technical education,
especially the CEFETPE, reinforcing the dualism existing in this educational institution. The
methodology used was documentary analysis, focusing the Decree 2.208/97 and related laws,
requiring incursion by the Law of Guidelines and Bases of Education, Verdict of the National
Education (CNE), the Federal Constitution of 1988, Management (semestral) reports,
Statistical Yearbook, reports of vestibular socioeconomic questionnaires and other documents,
all issued by CEFETPE. Concomitantly, we analyzed others which were about the topic, as
well as reading data from the National Institute of Educational Research Anízio Teixeira
(INEP) and the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE).
KEY-WORDS: Professional Education. Neoliberalism. PROEP. Educational Dualism.
Taylorism-Fordism.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Situação dos Jovens Entre 15 a 24 anos no Brasil............................................
94
Gráfico 2 – Matrícula, em 25/03/1998, no Ensino Médio, por Dependência
Administrativa – 1998 – Brasil.........................................................................
98
Gráfico 3 – Matricula, em 25/03/1998, no Ensino Médio, por Dependência
Administrativa – 1998 – Nordeste...................................................................
99
Gráfico 4 – Alunos que aspiram a Concorrer à Universidade............................................. 103
Gráfico 5 – Alunos do Curso Especial que participaram da Seleção à Universidade......... 104
Gráfico 6 – Alunos dos Cursos Especiais (Pós-Médio) que Estudam na ETFPE
e na Universidade Simultaneamente................................................................. 105
Gráfico 7 – Alunos dos Cursos Especial cuja Área de Estudo é a Mesma do Curso
Superior............................................................................................................. 106
Gráfico 8 – Escola de Origem dos Candidatos – Curso Regular......................................... 107
Gráfico 9 – Escola de Origem dos Candidatos – Curso Especial........................................ 108
Gráfico 10 – Motivo da Escolha pela ETFPE – Curso Regular.......................................... 108
Gráfico 11 – Motivo da Escolha pela ETFPE – Curso Especial.......................................... 109
Gráfico 12 – Participação em Cursos Preparatórios para a ETFPE – Curso Regular......... 110
Gráfico 13 – Participação em Cursos Preparatórios para a ETFPE – Curso Especial......... 110
Gráfico 14 – Número de vezes que o Aluno Concorreu ao Processo Seletivo –
Curso Regular................................................................................................. 111
Gráfico 15 – Número de vezes que o Aluno Concorreu ao Processo Seletivo –
Curso Especial................................................................................................ 111
Gráfico 16 – Alunos que Trabalham – Curso Regular......................................................... 112
Gráfico 17 – Alunos que Trabalham- Curso Especial.......................................................... 113
Gráfico 18 – Matrículas nos Cursos Normais e Especiais................................................... 113
LISTA DE SIGLAS
BID
Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD
Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento
BM
Banco Mundial
CEFET
Centro Federal de Educação Tecnológica
CEFETPE
Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco
CEPAL
Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CNE
Conselho Nacional de Educação
CNI
Confederação Nacional das Indústrias
CREA
Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura
EAD
Educação a Distância
EAF
Escolas Agrotécnicas federais
EJA
Educação de Jovens e Adultos
ENEM
Exame Nacional do Ensino Médio
ETFPE
Escola Técnica Federal de Pernambuco
ETFs
Escolas Técnicas Federais
EU
União Europeia
FAT
Fundo de Amparo ao Trabalhador
FHC
Fernando Henrique Cardoso.
FMI
Fundo Monetário Internacional
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IF
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia
IFPE
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco
INEP
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
LDB
Lei de Diretrizes e Bases
MEC
Ministério da Educação
Mtb
Ministério do Trabalho
OCDE
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OIT
Organização Internacional do Trabalho
ONGs
Organizações Não-Governamentais
ONU
Organização das Nações Unidas
PISA
Programa Internacional avaliação de estudantes
PL
Projeto de Lei
PLANFOR
Programa Nacional de Formação Profissional
PROEP
Programa de Expansão da Educação Profissional
Saeb
Sistema de Avaliação da Educação Básica
SEBRAE
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SEMTEC
Secretaria de Educação Média e Tecnológica
SENAC
Serviço Nacional de Aprendizagem comercial
SENAI
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAR
Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
SENAT
Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte
SENET
Secretaria Nacional de educação Tecnológica
SESC
Serviço Social do Comércio
SESI
Serviço Social da Indústria
SEST
Serviço Social do Transporte
SETEC
Secretaria de educação Tecnológica
UNESCO
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
URSS
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
USAID
Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................
14
1
CAPÍTULO – TRABALHO E FORMAÇÃO HISTÓRICA ..............................
19
2
CAPÍTULO – O CONTEXTO HISTÓRICO DAS REFORMAS
NEOLIBERAIS.......................................................................................................
30
2.1
A Derrocada do Comunismo Real: o Reverso da Utopia.....................................
30
2.2
O Estado de Bem-Estar Social................................................................................
32
2.3
O Desenvolvimento das Forças Produtivas (do Fordismo ao Toyotismo)...........
36
2.4
Neoliberalismo: a Revanche do Capital.................................................................
42
3
CAPÍTULO – EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL: UM REFORÇO
À DUALIDADE......................................................................................................
51
3.1
Breve Histórico da Educação Profissional no Brasil Colônia e Império.............
52
3.2
Breve Histórico da Educação Profissional no Brasil República..........................
55
4
CAPÍTULO – REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO GOVERNO
FHC...........................................................................................................................
4.1
64
Breve Histórico do Cenário Nacional em que se Contextualizou a
(Contra)Reforma ....................................................................................................
64
4.2
As Agência Internacionais, o PROEP e a Cefetização da ETFPE......................
73
4.3
Os Novos Paradigmas Conceituais da Reforma da Educação Profissional .......
81
4.4
Consequências da Separação do Ensino Médio Integrado à Educação
Profissional no CEFETPE......................................................................................
87
4.5
A Reforma e o Perfil Discente da ETFPE/CEFETPE.........................................
101
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................
115
REFERÊNCIAS...................................................................................................... 123
14
INTRODUÇÃO
A década de 1990, no Brasil, sinalizou um retrocesso das conquistas sociais no país,
que foram herdadas historicamente pelas lutas dos movimentos sociais, no contexto de
redemocratização pós-ditadura: conquistas consubstanciadas na Constituição Federal de 1988.
No bojo dessas conquistas encontram-se os direitos sociais, cuja inspiração remonta à
construção do Estado de Bem-Estar Social, direitos como o da educação foram minimizados e
submetidos à lógica do capital, moldando-os a um tipo de sociabilidade que naturaliza a
exclusão e a miséria social, época em que se consolidou o neoliberalismo no Brasil.
Com a emergência do neoliberalismo, os direitos sociais atribuídos pela política do
Estado de Bem-Estar Social, dentre estes a educação, converteram-se em serviços. O que
antes era visto como um direito, sob a responsabilidade do Estado, ainda que em muitos casos
apenas formalmente, deslocou-se aos poucos para a esfera privada.
Num contexto anterior à implementação das políticas neoliberais, fomos testemunha
ocular, “observador-participante”, do processo de lutas pela redemocratização do país, dos
embates e disputas na constituinte, da promulgação da Constituição de 1988; exercemos o
direito de voto na primeira eleição direta para presidente da República pós-ditadura, a qual
consagrou Fernando Collor de Melo como presidente; do mesmo modo, vislumbramos o
impeachment deste último em 1992, o plano Real, a eleição para presidente da república do
sociólogo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e a hegemonia avassaladora do neoliberalismo.
No plano internacional, foram inúmeras as mudanças, a mais emblemática foi a queda do
muro de Berlim, ícone da guerra fria, seguida do desmoronamento do comunismo real, a
revolução da microeletrônica, bioengenharia, dentre tantas outras.
Com o ingresso na docência, na década de 1990, vivenciamos as transformações
impingidas às escolas da rede federal de ensino profissional, atreladas às reformas
macroeconômicas do Estado, transformações que atingiram diretamente a escola, sua atuação
e seu financiamento como consequência de uma nova concepção de Estado: para os Centros
Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (CEFET), e no caso particular da escola de
Pernambuco - a citada desregulamentação forçou o estabelecimento de contratos de gestão de
serviços públicos por provedores privados, além da mudança de mentalidade, introduzindo o
Ethos privado do mercado na gestão e funcionamento dos Centros Tecnológicos.
15
Como docente do Centro Federal de Pernambuco (CEFET-PE), experimentamos esse
processo de desmonte e precarização da escola pública, o que suscitou inquietações e
premente necessidade de aprofundamento do tema, o qual é objeto de pesquisa da presente
dissertação.
No caso específico do CEFET-PE, interpela-se de que forma essas mudanças de
atribuições, tais como a separação do ensino técnico do propedêutico (promovidas pelo
Decreto nº 2.208/97), a criação de três níveis de ensino, a saber: o ensino médio, o pós-médio
técnico e o superior tecnológico e a avaliação por competências e habilidades interferiram no
papel social da instituição. Quais os desdobramentos, quais interesses prevalecem norteando
essas políticas? Que concepção de sociedade e de educação atende? Tais mudanças
contribuíram para democratizar ou reforçar o dualismo estrutural? Nossas pesquisas intentam
contribuir para a compreensão desse processo.
A metodologia empregada neste projeto aponta para uma pesquisa de análise
documental, tomando como foco o Decreto nº 2.208/97 e legislações correlatas, sendo
necessário incursionar pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), pareceres do
Conselho Nacional de educação (CNE), Constituição Federal de 1988, relatórios de Gestão
(semestrais), Anuário Estatístico, Questionários Socioeconômicos dos vestibulares e outros
documentos todos emitidos pelo CEFETPE, bem como outros documentos que versaram
sobre o tema, assim como a leitura de dados do Instituto Nacional de pesquisa Educacional
Anízio Teixeira (INEP) dos relatórios do Saeb, Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e
Programa Internacional de avaliação de estudantes (PISA) e do Instituto brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). Dando ênfase na análise dos dados catalogados dos
questionários socioeconômicos dos discentes ingressos no CEFEPE, cujo objetivo é traçar
um perfil do alunado e as possíveis variações engendradas com a reforma (separação).
No primeiro capítulo trazemos uma análise do conceito de trabalho, contemplando as
dimensões filosóficas e históricas, incursionando pelas variadas representações do trabalho, as
quais perpassam pela historia ocidental, desde aquelas vinculadas ao trabalho degradado,
associado à tortura, ao castigo, atribuição de seres e classes inferiores, até as concepções que
promovem o culto apologético do trabalho, procurando revelar que diferentes representações
do trabalho refletem materialidades e subjetividades de diferentes contextos históricos,
configurando-se estruturas econômicas, políticas, jurídicas e ideológicas específicas.
16
Ainda no primeiro capítulo, no subtítulo “A concepção filosófica e histórica do
trabalho”, focamos na transição das sociedades pré-capitalistas para a capitalista, apontando,
sucintamente, características que as diferenciam, tais como a formação do mercado de
trabalho livre no Brasil e o legado da cultura escravocrata, alicerce de uma ética degradada do
trabalho e do elemento nacional, nos quais a adoção da mão de obra branca imigrante
prevaleceu inicialmente. Concomitantemente, detecta-se a desconstrução da representação do
elemento nacional – tido como indolente, naturalmente preguiçoso, – sendo engendrada por
uma necessidade histórica de proletarização da força de trabalho nacional.
No segundo capítulo destacamos as reformas educacionais, as quais integraram um
processo mais amplo de reestruturação produtiva que implicaram na crise do Estado de BemEstar Social e a passagem do modelo de acumulação fordista para o modelo de acumulação
flexível sob a égide neoliberal. Será ainda apresentado um elenco de acontecimentos que
impulsionaram e nortearam as reformas aqui tratadas, dando ênfase à crise do Estado de BemEstar-Social e à emergência das teses neoliberais que convertem direitos sociais em serviços
(mercadorias) definidas pelo mercado.
Além disso, no segundo capítulo, discorremos sobre o modo como as reformas
encolhem o espaço público democrático dos direitos e ampliam o espaço privado do mercado,
apresentando-o como portador de uma racionalidade que o define como elemento regulador
das relações sociais.
Por sua vez, no terceiro capítulo, contextualizamos a história da educação profissional
no Brasil, mostrando como a escola não existe no vazio, e qual sua função social, vinculandoa às demandas sociais-históricas específicas. Ressaltou-se neste capítulo a dualidade do
sistema educacional brasileiro, particularmente, a educação profissional, vinculada por um
longo período de nossa história a um sistema assistencialista/compensatório dirigido às
classes subalternas, assim como a transição no processo de proletarização da força de
trabalho, concatenadas às novas demandas do capitalismo industrial.
No último capítulo arrematamos a presente dissertação com os significados das
reformas do ensino profissional durante o governo FHC no CEFETPE, particularmente com a
Lei n.º 2.208/97, as quais refletiram em seu cerne a hegemonia do capital financeiro, atreladas
a um projeto societário neoliberal, em que as políticas educacionais estavam vinculadas às
políticas macroeconômicas, não de forma mecanicista, mas só podendo ser compreendidas a
17
partir desse cenário. Bem assim, incursionou-se pelas “novas” categorias conceituais
concatenadas ao ideário neoliberal, tais como “capital humano”, “empregabilidade”,
“certificações por competências”, “polivalências”, dentre outras, vinculadas ao contexto
histórico de hegemonia neoliberal.
O referido capítulo ainda tratou das reformas do CEFET/PE, destacando como a
separação entre o técnico e o propedêutico reforçou o dualismo, promovendo maior
participação de egressos da rede privada, que aumentou com a oferta do ensino médio,
(ressalve-se com previsão de oferta decrescente), e o aligeiramento e superficialidade do
profissional (sequencial) provocando, na prática, um desnivelamento acentuado entre os
discentes, marcado pela precariedade do ensino médio ofertado nas escolas públicas estaduais
e municipais, como revelaram os dados do INEP (SAEB, ENEM e PISA) e IBGE. Esses
dados demonstram que o aluno egresso dessas escolas, em sua grande maioria, não domina os
conteúdos científicos e humanísticos referentes ao ensino médio.
Ainda neste capítulo, abordou-se o discurso oficial que justificou a reforma, para o
governo a escola estaria desvirtuando sua função, sendo instrumentalizada por uma classe
média (?), como trampolim para a universidade, negligenciando sua função em formar para o
mercado, denotando com isto a preocupação de contenção de classes, consubstanciada no
tradicional dualismo de um ensino propedêutico dirigido às elites e camadas médias focado na
preparação ao ingresso no curso superior e um ensino profissional aligeirado, pontual e
superficial direcionado às camadas populares, voltado para o trabalho.
Destacar-se-á as contradições entre o que se prometia e o que se efetivou, como a
reforma promoveu uma situação de precarização, verdadeiro paradoxo face às promessas do
Programa de expansão da educação Profissional (PROEP), eis que se consumou uma escassez
de recursos para manutenção da instituição, corroborado pela não contratação de funcionários
(administrativos e docentes), mesmo diante de um quadro de aposentadorias em massa,
resultado das ameaças de perdas de direitos, congelamento de salários. Para o governo não
havia escassez de recursos, o imbróglio se cuidava de incapacidade de gerenciamento, uma
questão meramente técnica, explicitando a relação entre o discurso governamental e a
ofensiva do capital, promovendo um desmonte das políticas de direitos sociais do Estado
Providência, alicerçada no financiamento de um fundo público compulsório, implicando na
remercantilização e refilantropização de tais direitos, desresponsabilizando o estado e o
capital pelo financiamento dos mesmos.
18
A dicotomia promovida denotou a preocupação com a contenção de classe, no sentido
de reforçar o velho dualismo estrutural que perpassa a historia educacional brasileira,
configurando, referida separação, num óbice entre as classes, direcionando as camadas
populares à formação profissionalizante, básica e técnica, e o ensino superior para a formação
das elites.
Através da analise dos dados tabulados dos questionários socioeconômicos do alunado
CEFETPE construiu-se um perfil do discente, relacionando as possíveis mudanças
decorrentes da reforma. A análise dos dados apresentados pela Escola Técnica Federal de
Pernambuco não destoam dos dados apresentados pelo INEP, no que concerne a relação
educação versus trabalho.
Partindo de tudo o quanto foi exposto, tem-se que o objetivo da dissertação é entender
o contexto e os interesses que prevaleceram no Decreto Lei n.º 2.208/97 e seus
desdobramentos na rede federal de ensino profissional, mormente o Centro Federal de
Educação Tecnológica de Pernambuco, partindo da hipótese de que as modificações
suscitadas pelo referido decreto contribuíram para desestruturar o CEFETPE e reforçar o
dualismo histórico que perpassa a educação deste país, eis que as reformas ratificaram a
divisão social, técnica e internacional do trabalho, com escolas diferenciadas para classe
distintas, tendo, outrossim, papéis diferenciados para países diferentes
19
1
CAPÍTULO – TRABALHO E FORMAÇÃO HUMANA
“o movimento da realidade é sempre de mão dupla, nunca unilateral e
mecanicista. […] não funciona de forma simples e linear” (SIQUEIRA,
2005, p. 108).
É fato que o homem não nasce humano, torna-se humano e para tal é imprescindível a
socialização; nesse processo, o trabalho é o elemento central, pois é através do trabalho que o
ser humano assume as características ditas humanas e modifica a natureza, ao mesmo tempo
em que é por meio dele que atende a necessidade primeira de toda sociedade: a produção dos
meios de produção e de subsistência, sem os quais a vida social não poderia existir. O trabalho
é a forma mediante a qual o homem produz suas condições de existência, passando à condição
de sujeito histórico.
O trabalho não se processa no vazio, em abstrato, pois é na produção material de sua
existência que os homens estabelecem relações sociais, políticas, ideológicas, jurídicas e
econômicas, tudo isso se materializando em uma totalidade de fenômenos sociais
interconectados; eis que “as relações econômicas são, antes de tudo, relações sociais e,
enquanto tais enquadram todas as demais. O ser humano que atua na reprodução de sua vida
material o faz enquanto totalidade psicofísica, política, ideológica” (FRIGOTTO,1996, p. 31),
inserido numa materialidade objetiva e subjetiva.
O trabalho, para o homem, é teleologicamente posto, ou seja, é orientado por uma
finalidade que responde às necessidades e às possibilidades históricas de cada momento
(idealização e objetivação), correspondendo a um determinado grau de desenvolvimento de
suas forças produtivas e a uma configuração específica das relações de produção.
É pelo trabalho (processo teleológico) que o homem se diferencia frente às demais
espécies, sendo capaz de projetar idealmente os resultados, antes de efetivamente materializálos, abrindo possibilidades para se chegar a um objetivo desejado; nesse sentido, o homem
está condenado a liberdade, pois é responsável pelo seu itinerário histórico.
Nessa perspectiva, o trabalho apresenta-se como meio criador de valores de uso e por
isso, é condição de existência do homem, independente de todas as formas de sociedade,
impõe-se como “eterna necessidade natural de mediação do metabolismo entre homem e
natureza e, portanto da vida humana” (MARX, 1978, p. 178). O trabalho no plano ontológico
apresenta-se como condição de emancipação humana, pois é através dele que o homem
20
transforma a natureza e nesse processo transforma a si mesmo, desenvolvendo suas
potencialidades e suscitando possibilidades que transcendem a determinações genéticas ou
ambientais. Como salienta Lessa:
esta transformação da natureza e dos indivíduos permite a constante construção de
novas situações, de novas relações sociais, de novos conhecimentos e habilidades,
num processo de acumulação constante (e contraditório). É este processo de
acumulação de novas situações e de novos conhecimentos – o que significa, de
novas necessidades e possibilidades de desenvolvimento – o que faz com que o
movimento do ser social seja ontologicamente (isto é, no plano do ser) distinto da
natureza. (LESSA, 2007, p. 145).
De fato, em se tratando de humanidade, não há caminho feito, herdado e/ou
padronizado, por exemplo, pela hereditariedade, como na maioria dos animais. Para nós não
há modelo de conduta definitivo e imutável, mas sim, um processo contínuo de
estabelecimento de valores e itinerários. O homem como ser histórico é um ser de mutação, de
projeto que se faz à medida que transcende a sua própria existência.
É importante ressaltar, entretanto que, historicamente, o trabalho converteu-se em
opressão, em mecanismo de dominação e cerceamento das capacidades humanas em
potencial. Dentro desta perspectiva, faz-se necessária uma distinção entre o trabalho como
intercâmbio orgânico da natureza, como necessidade natural eterna da humanidade, a fim de
responder suas necessidades existenciais, independente da formação social em particular, do
trabalho historicamente situado, pois, com o advento da divisão social do trabalho e da
sociedade de classes, esse dado social é perpassado pela luta de classes e converte-se em
instrumento de dominação. Em suma, o trabalho, durante a história da humanidade, tem sido
representado e vivenciado de muitas formas, adquirindo significações e ressignificações em
diferentes tempos e espaços históricos.
Nesse viés histórico, no bojo da tradição da civilização ocidental cristã, o trabalho
apresenta-se como castigo ou danação, emanação direta do pecado original, “ganharás o pão
com o suor do trabalho” (BÍBLIA, 1995: Gênese 3,19), como condenação e sofrimento
expiatório, condição degradante, incumbência de indivíduos e classes inferiores, subalternas.
Esta representação perpassa hegemonicamente a civilização clássica ocidental (Grécia e
Roma) e a Idade Média, somente metamorfoseando-se a partir do Renascimento, da Reforma
Protestante e da Revolução Industrial que promovem uma nova leitura, atribuindo ao trabalho
dignidade e virtude. Erigiu-se, neste contexto, uma nova ética do trabalho associada à
ascensão da burguesia e à consolidação do capitalismo, de uma nova sociabilidade, de uma
21
nova cultura, passando a valorizar o trabalho, ao mesmo tempo em se condena e até penaliza
(prisão por malandragem) o ócio, visto como fator que enseja o desvirtuamento do caráter e a
ação de forças malignas (ARANHA, 2005).
Nas sociedades pré-capitalistas prevalecia a economia de subsistência, onde os meios
de produção (matéria-prima mais instrumentos de produção) eram primários, assim como as
técnicas para a sua confecção. Nessas sociedades, os meios de produção encontravam-se à
disposição de todos e a técnicas eram dominadas por qualquer um que quisesse ter acesso a
elas.
Como apontam Camargo (2003), Siqueira (2005) e Cardoso (2010) dentre outros,
nestas sociedades (pré-capitalistas) não havia uma delimitação rígida entre o trabalho e outras
atividades, o trabalho era permeado pelas várias dimensões da vida cotidiana, as quais
conviviam integradas (trabalho, religiosidade, diversão, ócio, festa), não configurando um
limiar preciso entre o tempo de trabalho e o de outros tempos. É com o advento e
consolidação do capitalismo industrial que se efetiva uma distinção clara, passando a ser o
trabalho submetido a uma severa disciplina, tornando-se, paulatinamente, controlado,
higienizado, moralizado, “racionalizado”, extirpando as outras dimensões que não
interessavam ao capital.
Nesta perspectiva, o tempo passa a ter uma nova dimensão, pois a compra da força de
trabalho começa a ser mensurada a partir de uma lógica produtivista, em que o capital tem
como propósito indispensável extrair o máximo de mais-valia durante um tempo determinado.
Se a construção do tempo antes do capitalismo, na Europa, ancorava-se, com toda sua
diversidade, em uma não separação do tempo de trabalho e do outro tempo, com o capitalismo
isso muda radicalmente; o que impele os trabalhadores a contemplar em suas lutas a
regulamentação da jornada de trabalho e o direito ao ócio. É interessante observarmos como o
capital mercantilizará esse tempo livre numa nova “indústria”.
A passagem das relações de produção pré-capitalista para uma realidade social
predominantemente capitalista, fundamentada na mão-de-obra 'livre' assalariada, foi um
processo marcado por rupturas, revoluções, violência e expropriação em todo mundo, não se
tratando de um processo sereno, coordenado, harmonioso. No modo de produção capitalista
os produtores são 'livres', não mais presos aos ditames dos senhores feudais, por exemplo;
contudo, essa liberdade dar-se-á acompanhada da expropriação do acesso aos meios de
22
produção, que paulatinamente passam a ser propriedade privada da burguesia. Uma liberdade
ilusória, uma vez que o trabalhador passa a deter apenas de sua força de trabalho, não tendo
alternativa de sobrevivência senão vendê-la no mercado, para mediante assalariamento
satisfazer suas necessidades. Em suma, “para subjugar o trabalhador, este deve ser livre e
expropriado, de forma que sua liberdade não encontre outra alternativa senão submeter-se ao
capital” (KOWARICK, 1994, p. 11).
Como consequência, enquanto na Europa a transição se processa sobre o
desmantelamento de um campesinato e artesanato solidamente constituídos – que repercutirá
na formação do trabalho - (KOWARICK, 1994), no Brasil a constituição do mercado de mão
de obra livre deu-se num contexto histórico em que a escravidão foi a forma dominante até
finais do século XIX, repercutindo profundamente na representação do trabalho, no elemento
nacional e na classe operária. A escravidão e a cultura associada a esta, repercutirão
marcadamente no imaginário nacional, mormente o das elites, alicerçando uma ética do
trabalho degradado; legitimado por teorias biologizantes racistas, contribuindo para formar
uma imagem depreciativa do povo ou do elemento nacional (SCHWARCZ, 1993; FRY, 2007;
DIWAN, 2007; MAGNOLI, 2009). No imaginário das elites, sobretudo a paulista, locus do
processo de industrialização (tardia) brasileira, o elemento nacional passou a ser visto como
preguiçoso, inútil, ímprobo e privado de mentalidade moderna (burguesa); desprovido de
ambição, esse elemento se satisfazia com pouco, era geneticamente propenso à preguiça e à
vagabundagem, consequentemente inábil para se submeter à disciplina do trabalho sistemático
(CARMO, 1992). Esta crença a faz optar, num primeiro momento, pela imigração e não pela
incorporação sistemática da mão-de-obra nacional. Vale destacar que em São Paulo, no início
do século XX a quase totalidade do contingente do incipiente operariado industrial era
composto de imigrantes.
Contudo, como aponta Cardoso (2010), não houve uma, mas várias transições para o
trabalho livre, ou para o trabalho não escravo. A imigração estrangeira massiva aplica-se
principalmente a São Paulo, não sendo parâmetro para todo o território nacional. Nos demais
Estados (províncias), particularmente naqueles de menor pujança econômica, a mão de obra
livre branca imigrante não foi a forma predominante de constituição do mercado de mão de
obra livre. Cada província, conforme suas peculiaridades, emanou soluções diversas para
desatar o impasse do trabalho quando a abolição apresentava-se como inevitável.
Dessa maneira, a proibição do tráfico africano, mediante a ingerência inglesa,
23
fomentará o comércio interno de escravos entre as regiões, promovendo o deslocamento de
escravos das regiões de menor poder econômico para a região cafeeira paulista, de maior
dinamismo e vitalidade econômica. A alta lucratividade do café tornou viável
economicamente aos fazendeiros paulista comprar cativos de outras regiões, apesar da
elevação dos preços decorrente do fim do tráfico africano, (o que pode parecer um paradoxo,
pois foram as regiões de maior dinamismo econômico que mais insistiram na utilização do
trabalho escravo, o que nos faz remontar ao ciclo da cana-de-açúcar no que concerne a
utilização do cativo africano ou o escravo indígena).
Para entendermos o processo de transição para a conformação do trabalho livre no
Brasil, é importante destacar que, no percorrer de três séculos de escravidão no país se
avolumou uma massa majoritária de indivíduos de várias origens e matizes sociais, que não se
enquadrava nem como senhor, nem como escravo, configurando um contingente amorfo,
heterogêneo, mestiço, predominantemente miserável, disperso e “livre” (não escravo); esse
crescente segmento de livres durante muito tempo teve participação econômica secundária e
complementar no processo produtivo, já que a figura do escravo era a base da economia
(KOWARICK, 1994; CARDOSO, 2010).
Nessa perspectiva, como já foi exposto, os “nacionais” eram encarados pelas elites
como vadios, carga inútil, desclassificados para o trabalho, o que, não impediu outras formas
de sujeição, como o colonato e parceria. É mister realçar que, neste contexto específico, para
os livres e pobres trabalharem para alguém significava a forma mais aviltada de existência,
mesmo que as suas condições materiais de existência não destoassem enormemente do cativo,
limitando-se à precariedade e à pobreza generalizada.
Nessas circunstâncias, como destaca Emilia Viotti Costa:
como pretender que homens que plantavam o suficiente para sobreviver, que viviam
ao deus-dará, se submetessem, em troca de parcos salários, ao penoso trabalho
exigido nas fazendas? Trabalhar como assalariado na grande lavoura significava,
para eles, equiparar-se à condição de escravos. (COSTA apud CARDOSO, 2010, p.
62).
Mesmo que caracterizado pela precariedade material de existência, havia alternativa à
submissão ao trabalho degradado pela escravidão, mesmo que essa alternativa estivesse no
nível da subsistência mínima, aceita como natural diante do pauperismo generalizado.
No último quarto do século XVIII, o problema da mão de obra irrompe, demandando
24
soluções, em vista da abolição da escravatura, ocorrida em 1888, como resultado de um
processo longo de pressões internas e externas. Como exposto por Cardoso (2010), a solução
emana diferentes arranjos, mas nas regiões mais dinâmicas, palco do incipiente processo de
industrialização, opta-se pela mão de obra imigrante, visto que para nossas elites o elemento
nacional era inapto. Segundo Kowarick (1994), para viabilizar a adoção do trabalho livre
imigrante e manter as estruturas de poder dominante, fez-se necessário um fluxo abundante e
contínuo, constantemente renovado, de mão de obra imigrante, custeado pelo Estado, o que
barateava os custos, rebaixando salários e desorganizando resistências. Obviamente, para
submeter-se à exploração do trabalho heterônomo, o imigrante já fora previamente
expropriado, o que o impelia a imigrar, sem recursos, mas imbuído do sonho de fazer a
América e disposto a se submeter à disciplina do trabalho, no âmago do capitalismo em
formação no Brasil.
Para que exista o trabalho livre (e heterônomo), é necessário expropriar os produtores
para que estes não tenham alternativas a não ser submeter-se ao capital, convertendo-se em
mercadoria (força de trabalho) mediante assalariamento. Isso exposto observa-se que, para a
instituição do trabalho livre no Brasil e a revogação oficial do trabalho escravo, fez-se
necessário impedir os livres ao acesso aos meios de produção; é o que ocorre, por exemplo,
com a Lei de Terras (1850), coibindo o acesso às terras devolutas aos que não podiam pagar.
A transição para a universalização do trabalho livre no Brasil advém de maneira lenta e
diversificada, variando de acordo com as singularidades de cada região.
Durante a primeira guerra mundial cai radicalmente o número de imigrantes daqueles
países de origem que compunham as forças beligerantes. Some-se a isso o recrudescimento
dos conflitos capital-trabalho, expressão da maior organização e mobilização dos
trabalhadores, o que se evidencia, particularmente, com a greve de 1917.
Diante do crescimento da influência dos ideais anarquistas e socialistas, originários da
Europa, assim como dos imigrantes, os estrangeiros passam a ser associados ao vírus
anarquista, propagadores de ideias alienígenas, estranhas ao caráter ordeiro do povo
brasileiro. Forja-se, neste momento, a ideologia do patriotismo “verde-amarelo”, ideologia
sempre evocada como antídoto para, profilaticamente, combater o agente patogênico exógeno
à cultura nacional, obstaculizando as tentativas insurgentes, baseadas em preceitos tidos como
segregadores, que incitariam à luta de classes e à violência, contrárias à índole brasileira.
Denota-se claramente a preocupação dos grupos dominantes em valorizar a mão de obra
25
nacional, outrora estigmatizada, coligada à vadiagem e à inaptidão, urgindo construir outra
representação do elemento nacional coadunada com o novo contexto histórico.
Em síntese, o mercado de mão-de-obra livre no país forjou-se em contexto de intensa
degradação do trabalho, ancorado em séculos de escravidão, respaldado em uma “ética da
degradação do trabalho que vedou por muitos anos o reconhecimento dos trabalhadores como
sujeitos de direitos, isto é, como cidadãos” (CARDOSO, 2010, p. 75).
Como manifestação de sociedade pré-capitalista, Siqueira (2005), citando Antônio
Cândido faz referência à cultura rústica com a qual a cultura urbano-industrial se defrontará,
impondo-se. Para os autores, a cultura “Caipira” revela um modo de existência distinto do
burguês, ancorado na autossuficiência, na produção para o consumo próprio e não para
acumular, configura um modo de vida cujas relações sociais são assinaladas pelo trabalho
coletivo (com exemplo, temos o mutirão, no qual o trabalho solidário findava com bailes e
cantoria, agregando-se ao trabalho a festa, marcados pela cooperação e o lúdico). Denota um
outro entendimento, pois aquilo que para o burguês e os apologista do trabalho veem como
vadiagem, reflete um outro tipo de sociabilidade; logo o desapego ao trabalho “não deveria
ser considerado com vadiagem, mas desnecessidade de trabalhar, que é outra coisa”
(SIQUEIRA, 2005, p. 56) ou percepção da inutilidade do trabalho heterônomo mediante grau
acentuado de exploração e opressão.
A apologia ao trabalho tem que ser contextualizada como parte do processo histórico
de consolidação do capitalismo, que engendra a transição de uma ética do trabalho degradado
para uma ética positiva do trabalho, passa por desconstruir material e culturalmente as
sociedades pré-capitalistas. Nesta perspectiva, o trabalho passa a ser a referência que
prevalece socialmente, em que os indivíduos não só precisassem, mas desejassem labutar,
justificando e naturalizando o trabalho. Efetiva-se o processo de proletarização dos
produtores, tanto ao artesão quanto ao camponês vai sendo imposto o assalariamento, não lhes
restando senão a alternativa de subsistência frente à privatização dos meios de produção, dos
meios materiais de vida.
Com a evolução do capitalismo, o produzir passa: “de um processo de trabalho
variado, composto de múltiplas tarefas distintas e cuja alternância é fonte de variedade, à
realização reiterada, monótona e rotineira de um reduzido número de tarefas simples”
(MANFREDI, 2002, p. 43).
26
Dá-se, pois, como condição imanente da estratégia de controle do trabalho pelo
capital, a racionalização científica do trabalho cujo objetivo é aumentar o controle do capital
sobre o trabalho, mediante a eliminação de movimentos inúteis, incorporando velocidades
máximas e com um mínimo de porosidade, além de torná-lo barato e substituível.
A passagem do trabalho artesanal para o trabalho fabril apoia-se na divisão
manufatureira da produção, que vem possibilitar o desmembramento da produção em tarefas
simples; isso culminará com o incessante aprimoramento das forças produtivas e sob a égide
do capital, na substituição do homem pela máquina e/ou conversão deste em apêndice da
mesma (do trabalho morto, consubstanciado no maquinário) no processo produtivo.
Objetivando um maior controle sobre a força de trabalho no processo produtivo, intensifica-se
a separação entre concepção e execução, cabendo ao operário apenas a execução de uma
atividade planejada a sua revelia, desabilitando-o, diminuindo seu preparo, na medida em que
não mais domina os conhecimentos, as habilidades em sua totalidade do processo, a duração,
o ritmo e intensidade do processo laborativo:
À medida que o século XIX avança, os antigos ofícios domésticos vão sendo
substituídos na indústria têxtil […] os antigos tecelões vão sendo substituídos por
batedores, estampadores manuais de percal, os cardadores de lã, os cortadores de
fustão (THOMPSON apud MANFREDI, 2002, p. 40).
Consequentemente, há o barateio do valor da força de trabalho, tornando-o facilmente
substituível no mercado. O que o enfraquece econômica e politicamente, pois tarefas simples,
que não requerem grandes habilidades, são facilmente encontráveis, e também reduz o seu
custo, em detrimento do operário, numa sociedade baseada na compra e venda da força de
trabalho e na apropriação privada dos meios de produção (BRAVERMAN, 1987).
É significativo destacar que a razão de ser da produção capitalista é o lucro, cuja
origem é a mais-valia, que se consubstancia na mercadoria; esta, por sua vez, cristaliza tanto o
trabalho necessário à reprodução do produtor (trabalho pago), como o produto do trabalho
excedente (não pago) e apropriado pelo capitalista, no processo de compra e venda da força
de trabalho. Nesse modo de produção, a apropriação privada dos meios de produção
condiciona àqueles desprovidos do acesso a estes meios, que, como alternativa de
sobrevivência, vendem sua força de trabalho, agora convertida em mercadoria. A produção é
socializada, mas a riqueza material e imaterial é privatizada.
Nesse modo de produção, inverte-se,
27
a lógica da necessidade, o que importa não é produzir bens úteis enquanto valor de
uso, algo imposto imperativamente para o ser humano enquanto ser de necessidades,
o que importa é produzir bens com valor de troca, uma atividade que traz em si a
própria finalidade (FRIGOTTO, 1996, p. 105).
Reitere-se que, nessa formação social, o trabalho deixou de ser produção em geral para
se converter, essencialmente, em produção de mais-valia, não se produz para atender
necessidades, mas parar atender necessidades, na medida em que elas promovem lucro, ou
seja, ensejando a reprodução e acumulação do capital. Não se produz por filantropia, exceto
se a filantropia converte-se em negócio, eis o exemplo do terceiro setor. Nesse sistema, as
crises cíclicas de superprodução e subconsumo não significam que a demanda por um produto
foi plenamente atendida, mas que a produção não garante a reprodução do lucro, do capital.
Como exemplo, podemos citar o fato de que excedentes podem ser jogados no lixo, para não
ocasionar desequilíbrio nos preços, mas não serão usados para saciar a fome de muitos
necessitados. Cabalmente, o exemplo acima explicita a lógica excludente do sistema, que não
pode prescindir das necessidades humanas, tanto orgânicas quanto culturais (valor de uso),
mas não pode atendê-las plenamente, pois a necessidade do produto resolvida implica a
eliminação do sistema. Vejamos o exemplo apontado por Codo:
suponha uma determinada comunidade, composta de 1000 pessoas. Temos, portanto,
uma necessidade de 1000 pares de sapato por ano. O capitalista contrata a mão-deobra de 50 operários e começa a produzir 100 sapatos por mês. Enquanto houver pés
descalços, o sistema roda normalmente. Quando as necessidades estiverem
satisfeitas, o capitalista não tem mais o que fazer. Deverá fechar a fábrica ou fabricar
sapatos praticamente sem lucro, porque eles não encontrariam saída no mercado e,
portanto, cairia drasticamente o seu preço (CODO, 1986, p. 42).
Assim como no “mito de Midas”1, tudo que o capital toca converte-se em mercadoria,
no qual o valor de troca sobrepõe-se ao valor de uso, sendo imperativo ao sistema a
necessidade de forjar incessantemente infinitas necessidades (supérfluas?), instigando o
consumo compulsivo, atrelado a lógica da reprodução do sistema, aumentando ad infinitum o
ciclo reprodutivo deste, encurtando o tempo entre produção e consumo; para isso há uma
exacerbação da redução do valor de uso das mercadorias (ANTUNES, 2005).
Por fim, devemos considerar ainda o trabalho como princípio educativo, em que o
trabalho, como atividade fundamental do ser humano, ontocriativa, produz os meios de
existência na relação do homem com a natureza, transformando-a, e, neste processo,
transformando a si, e suas potencialidades, além disso, o trabalho assume formas históricas,
1
Personagem da Mitologia grega, rei semilendário da Frígia, que recebeu o dom de transformar em ouro tudo
que tocasse.
28
convertendo-se em instrumentos de opressão e tolhimento, como exposto neste capítulo.
Despiciendo afirmar que o homem não nasce pronto, ele torna-se humano, sendo
necessária a socialização, em que as condições de existência material e simbólica interferem
no desenvolvimento pleno de suas potencialidades, oportunizada pelo seu aparato orgânico, o
qual se efetivam, socialmente, no processo de hominização que não é um processo natural,
mas histórico e social, onde ocorre o aprendizado, a internalização da dimensão cultural que o
singulariza. A formação, mediante a socialização, a educação em sentido amplo, dar-se em
contextos históricos diferentes e específicos, dependendo da posição social dos indivíduos em
relação às classes e a divisão social do trabalho num modo específico de produção.
Reitere-se, a distinção entre o trabalho como meio ontocriativo e o trabalho
historicamente situado, onde se procuraram tecer uma breve incursão na história do trabalho
no ocidente até a emergência e consolidação do capitalismo, processo de proletarização da
força de trabalho e as demandas de formação para o trabalho dentro da sociabilidade
capitalista, nos diferentes modos de acumulação. A educação não pode ser pensada deslocada
de uma totalidade histórica, sendo determinada e determinantes em suas relações sociais,
compondo um elemento de uma engrenagem maior, respondendo à funcionalidade de
reprodução das relações sociais de produção hegemônicas, mormente a capitalista. A divisão
da sociedade em classes e o acesso diferenciado aos bens materiais e imateriais (simbólicos)
suscitam formações, instituições educacionais diferenciadas para classes diferenciadas,
reproduzindo as estruturas vigentes.
No Brasil, historicamente, se tem um modelo de sociedade extremamente excludente e
desigual, em que se destacam os três séculos de escravidão, atuando como lastro histórico de
uma ética degradada do trabalho, e mesmo com a transição para o mercado de mão de obra
livre não se processaram alterações no sentido de democratizar o acesso aos bens materiais e
simbólicos para uma grande massa, sem acesso à educação, aos conhecimentos, os quais se
constituíam em privilégios, monopólio de classes, consubstanciada em um sistema de
educação dual diferenciado para segmentos diferenciados.
Uma educação academicista para as elites e os segmentos médios da sociedade, focada
na preparação para o ensino superior (universitária), objetivando a formação dos quadros
dirigentes, concatenada a funcionalidade de reprodução das relações sociais de produção,
situadas historicamente, atuando como instrumento de exercício de poder e contenção de
29
classes. Destinando as massas uma formação superficial, limitada e aligeirada, voltada para o
trabalho e submissão à sociabilidade do capital, prescindindo dos saberes científicos,
humanísticos que pudessem ensejar uma perspectiva emancipatória dos trabalhadores como
sujeitos históricos, excluindo-os do acesso aos bens (riquezas) materiais e simbólicos.
Na contramão de um modelo dualista de educação, propõe-se o entendimento do
trabalho como princípio educativo, no qual a proposta prevê o acesso para todos da dimensão
do conhecimento numa totalidade científico, tecnológico e humanista, defendendo uma escola
unitária (no sentido de única para todos) e politécnica, em que se parte de uma perspectiva
crítica quanto à formação humana dos trabalhadores no sistema capitalista, o qual é limitador,
tolhedor e opressor, que impõe um trabalho alienado e reificado pelas relações burguesas de
produção.
30
2
CAPÍTULO – O CONTEXTO HISTÓRICO DAS REFORMAS NEOLIBERAIS
O desenrolar da história humana não se processa no vácuo, mas em uma materialidade
histórica especifica que é condicionante e condicionada pelos diferentes atores sociais que
participam do jogo político. Jamais se pode prescindir da análise do contexto sócio-histórico,
da atuação dos sujeitos históricos e sua correlação de forças no cenário nacional,
internacional, regional e local que norteiam os itinerários traçados. De acordo com as ações
concretas dos homens, dos interesses representados e de que forma são representados, eis que
a história é feita de versões construídas sobre os fatos, permeados de interesses os mais
diversos, e carregam as contradições das relações de poder que perpassam a sociedade,
determinando o que deve e como deve ser visto, bem como o que é preciso esquecer.
Para entendermos o processo de reestruturação do estado, da economia brasileira e,
particularmente, do sistema educacional sob a égide neoliberal e suas consequências, faz-se
necessário nos determos no contexto sócio-histórico e suas influências no suceder histórico.
Desse modo, é necessário destacar o contexto histórico no qual se processam as
transformações que serão objetos de análise deste texto, a saber: a conjuntura de crise do
modelo de acumulação fordista-keynesianista, do Estado de Bem-Estar social, do
desmoronamento (implosão) do socialismo real, do advento da nova base material de
produção (tecnológica) e a ascensão e consolidação do neoliberalismo como filosofia
econômica e política hegemônica. Fatores que suscitarão mudanças na percepção e ação dos
sujeitos históricos, provocando alterações na configuração de poder vigente da sociedade, nas
concepções hegemônicas que norteiam e legitimam a atuação dos atores sociais no jogo de
poder instituído.
2.1
A Derrocada do Comunismo Real: o reverso da utopia
“Não temos mais os bárbaros. O que será de nós sem os bárbaros?”.
(BOBBIO, 1993, p. 20)
Primacialmente, conforme salienta Bobbio, a derrocada do comunismo real e seus
desdobramentos contribuíram para a reversão da utopia socialista, convertendo-a no seu
oposto, como utopia negativa. In verbis:
31
utopia que durante pelo menos cem anos, fascinou filósofos, escritores e poetas [...];
abalou as massas de desvalidos e impeliu-as à ação violenta; levou homens de
elevado senso moral a sacrificar as próprias vidas, enfrentando a prisão, o exílio e os
campos de extermínio (BOBBIO, 1993, p. 17).
A reversão da utopia em antiutopia foi habilmente instrumentalizada pelos ideólogos
neoliberais, como ‘prova empírica’ da vitória capitalista, momento em que eclode a tese do
fim da história de Francis Fukuyama (1992), e no cerne da qual o capitalismo liberal
‘democrático’ representaria a última etapa da humanidade, não existindo alternativas ao
capitalismo, em que as tentativas historicamente implementadas - leia-se socialismo real resultariam num totalitarismo desumano e desastroso, donde todo sonho socialista seria uma
ilusão, uma quimera, um anacronismo fora da moda (GENTILI, 2008).
Certamente, o ideário socialista (temor e aversão para uns e esperança para outros) e o
estado comunista (bloco soviético), materializado no poderio bélico, de certo modo
atemorizaram governos e as classes dirigentes ocidentais, ao mesmo tempo em que motivaram
movimentos reivindicatórios dos trabalhadores.
Destaque-se a importância do socialismo real como contrapeso ao capitalismo
selvagem, “o socialismo real demonstrou ser mais importante como corretivo ao capitalismo
dentro do próprio capitalismo do que como política que visa ir além do capitalismo”
(HOBSBAWM, 1993).
Não restam dúvidas que a derrocada do socialismo real repercutirá marcadamente no
imaginário dos movimentos sociais, nomeadamente o dos trabalhadores e será magistralmente
utilizada para legitimar as propostas neoliberais erigidas e intransigentemente propagadas por
F. Hayek, M. Friedman e K. Popper, veementes críticos do Estado de Bem-Estar
(ANDERSON, 1996).
Diante da reversão da utopia socialista e de seus valores, desnuda-se uma nova ética,
acentuadamente individualista e economicista, um novo senso comum, no qual conceitos
como democratização, participação, justiça social, igualdade e solidariedade, conceitos estes
eivados de sentido político emancipatório, são esquecidos e preteridos (tidos como
anacrônicos, obsoletos, não correspondendo à nova realidade) em nome de uma pretensa e
sempre recorrente modernização. Prevalecem termos de origem mercantil, tais como,
competitividade, competência, concorrência, disputa, produtividade, rentabilidade, custobenefício, cliente, dentre tantos outros (OLIVEIRA, 2003). Naturalizam-se as desigualdades,
32
dando-lhes um caráter positivo e necessário como fator propulsor do progresso humano,
impondo-se o darwinismo social que pode ser ostentado sem o mínimo constrangimento.
2.2
O Estado do Bem-Estar Social
No que tange ao Estado-providência, insta-se observar que este se engendrou como
alternativa ao capitalismo selvagem liberal e ao socialismo stalinista, como sucedâneo num
equilíbrio de poder, resultado de anos de embates e de uma série de compromissos e
reposicionamentos, rearranjos feitos pelos principais atores do processo histórico de
desenvolvimento do capitalismo, correlação de forças que implicaram em concessões das
classes dirigentes às reivindicações dos trabalhadores, oportunizando uma maior participação
destes no estado, via espaços democráticos. Consequentemente, como destaca Hobsbawm:
fez com que a democracia ocidental valesse a pena para seus povos. Previdência
social, estado de bem-estar social, uma renda alta e crescente para os trabalhadores,
e sua consequência natural, a diminuição da desigualdade social e da desigualdade
de oportunidades. (HOBSBAWM, 1993, p. 93 ).
Forja-se a partir da crise do capitalismo liberal, deflagrada em 1929 e das teorias
revolucionárias contrárias ao capital, materializadas, em parte, a partir 1917, com o advento
do comunismo real na URSS (coexistência antagônica). Fatores estes que engendrarão o
colapso do liberalismo econômico e político (este, o segundo em particular, com poucas
exceções no período entre guerras) e a emergência do Estado regulador, intervencionista, não
nos moldes da economia planificada soviética, evidentemente. É a partir deste cenário que se
dará a formação do Estado de Bem-Estar.
Quando falamos de crise, isto significa recessão, falência, desemprego em massa e
suas seqüelas sociais (violência, prostituição, mendicância, fome, desespero etc.) o que suscita
situações de instabilidade propensas a rupturas conservadoras ou revolucionárias.
Keynes, economista cuja teoria embasará o Estado de Bem-Estar, crítico do
liberalismo (mercado livre, sem amarras, regulando-se por si só) alerta para o caráter
anárquico e caótico do mercado e suas relações com as crises do capitalismo frente à
incapacidade do mercado como elemento regulador das relações sociais. Segundo o citado
economista, o mercado sempre tenderá a gerar desigualdades e instabilidade que ameaçaria a
reprodução da ordem social capitalista. A partir do prognóstico Keynesiano para superar o
quadro de crise, faz-se mister a intervenção do Estado na economia. Opondo-se aos princípios
33
(dogmas) liberais, imputar-se-á ao Estado o papel de reativador da economia a partir da
planificação e intervenção no processo econômico-social. Estabelece-se um modelo de
desenvolvimento:
que pode ser sintetizado na sistematização, de uma esfera pública onde, a partir de
regras universais e pactadas, o fundo público, em suas diversas formas, passou a ser
o pressuposto do funcionamento da acumulação do capital, de um lado, e, de outro,
do financiamento da reprodução da força de trabalho, atingindo globalmente a
população por meio de gastos sociais (OLIVEIRA apud FRIGOTTO, 1996, p. 58)
Nessa conjuntura, relevar-se-á a importância da previdência social, da eliminação do
desemprego e do estímulo à demanda. Em consequência, faz-se indispensável gerar renda,
ensejar meios, no sentido de colocá-los nas mãos dos trabalhadores, precondição necessária
para viabilizar o consumo em grande escala e fomentar a produção e a retomada do
crescimento econômico.
Os conceitos de keynesianismo e fordismo podem ser entendidos como, “um conjunto
de práticas de controle do trabalho, tecnologia, hábitos de consumo e configurações de poder
político-econômico” (HARVEY, 1992, p. 119).
Ainda segundo Harvey, o fordismo-keinesianismo:
tem de ser visto menos como um mero sistema de produção em massa do que como
um modo de vida total. Produção em massa significa padronização do produto e
consumo de massa, o que implica toda uma nova estética e mercadificação da
cultura (HARVEY, 1992, p. 131).
Quando se fala em fordismo, dá-se uma ênfase nos aspectos da produção, que não
estão dissociados das demais dimensões culturais, politico-ideológicas e jurídicas. Enquanto o
keynesianismo refere-se principalmente ao papel do Estado intervencionista e regulador do
mercado, que amplia os espaços democráticos mediante embates e arranjos pelo controle do
fundo público.
Deve-se aclarar que o fordismo-keynesianismo não foi bem aceito e incorporado de
imediato, pois se deparou com uma obstinada resistência tanto por parte dos trabalhadores
quanto dos capitalistas. A recusa aferrada dos trabalhadores deve-se ao caráter opressor,
castrador e desabilitador - que se traduz na perda do controle no que concerne à velocidade, à
concepção, à habilidade manual, à liberdade de criação no processo produtivo – o qual
transforma o operário num apêndice da máquina, desempenhando um trabalho rotinizado e
alienante. Essa oposição se reflete na acentuada rotatividade de trabalhadores contratados pela
34
indústria automobilística à época que abraçaram esse método e pela composição dos mesmos,
majoritariamente constituído de imigrantes e de indivíduos egressos do exército industrial de
reserva proveniente do campo. No que concerne aos capitalistas, a relutância explica-se pela
preocupação e suspeição quanto à intervenção na economia.
Só em face de um contexto de crise, de incertezas, instabilidade e quase colapso da
economia capitalista, é que há uma alteração do quadro. É principalmente no período de
belicosidade que se dão as melhores condições para as mudanças, pois:
a mobilização da época da guerra também implicou planejamento em escala, bem
como uma completa racionalização do processo de trabalho, apesar da resistência do
trabalhador à produção em linha de montagem e dos temores capitalistas do controle
centralizado. Era difícil, para capitalistas e trabalhadores, recusar racionalizações
que melhorassem a eficiência numa época de total esforço de guerra (HARVEY,
1992, p. 123).
O Fordismo-Keynesianismo se constituirá numa alternativa histórica de solução à crise
capitalista deflagrada em 1929. É o resultado da atuação dos sujeitos históricos, da correlação
de forças no sentido de construção de um caminho (alternativa) a ser trilhado. Deriva de uma
intensa luta e de uma série de compromissos e reposicionamento por parte dos principais
atores dos processos de desenvolvimento capitalista. De fato, estabelecer-se-á uma nova
relação, uma nova configuração entre capital, trabalho e Estado-nação.
Segundo Chauí (1999) e Antunes (2006), a economia política que sustentava o Estado
de Bem-Estar exibia: o fordismo na produção, caracterizado pela verticalidade na sua
configuração produtiva, acomodando grandes e concentradas plantas industriais, cujas
atividades compreendiam desde a produção da matéria-prima até sua disseminação no
mercado; a produção em série taylorista, compondo-se do trabalho parcelar, da fragmentação
das funções e separação entre elaboração e execução no processo produtivo (linha de
montagem e controle de tempo/movimento); a constituição do operário-massa, decorrente da
forte demanda de trabalhadores que resultava na inserção progressiva de indivíduos no
mercado de trabalho, suscitando, e legitimando a ideia de pleno emprego (universalização do
trabalho assalariado); os monopólios e oligopólios exercidos por grandes corporações, que
embora multi ou transnacionais, tinham como referência reguladora o Estado Nacional; e
finalmente para a materialização (financiamento) do Estado de Bem-Estar a constituição do
fundo público mediante a intervenção estatal na economia, o que contradiz os preceitos
liberais.
35
Segundo Oliveira (1995, 1999) caberia ao fundo público a função de financiar
concomitantemente, a acumulação do capital e a reprodução da força de trabalho, tentando
equilibrar, equalizar o antagonismo de classes a partir da mediação do Estado, mediante a
ampliação dos espaços democráticos de deliberações das políticas de gestão do fundo público.
Para o referido autor, foram as contradições emanadas dessa mesma instituição financeira que
culminaram no que se denominou de “crise fiscal do Estado”, que veio a se traduzir na
incapacidade estrutural de atender às crescentes demandas conflitantes da relação capitaltrabalho no seio do capitalismo.
Como revela Chauí (1999), o financiamento do capital pelo fundo público, efetiva-se
através dos gastos públicos com: infraestrutura (estradas, portos, aeroportos, infovias,
indústrias, etc.) com subsídios aos vários setores da economia, como agricultura, indústria e
comércio; com subsídios para a ciência e a tecnologia; além da valorização financeira do
capital por meio da dívida pública. Já o financiamento da reprodução da força de trabalho
consuma-se por meio dos gastos sociais com educação, medicina socializada, previdência,
seguro-desemprego, subsídios para transporte, alimentação, habitação, cultura e lazer que
chegam a alcançar quase toda população.
De fato, instala-se a duplicidade de financiamento da força de trabalho, uma parte
paga privadamente e outra paga publicamente (salário indireto), através da oferta de direitos
sociais, como os já mencionados, dispensando o trabalhador de custeá-los, liberando-os para o
consumo, ensejando o consumo de massa.
Neste norte, observa-se que o Estado-Providência ampliou os espaços democráticos,
mediante uma ressignificação do papel do Estado, atribuindo a este a obrigatoriedade na
oferta de direitos sociais, como educação, saúde, moradia, previdência; conforme Oliveira
(1995, 1999), tudo isso se constitui em anti-mercadoria, anti-valor, na medida em que passam
a ser atribuições prescritas ao Estado, como direitos, o que contraria o interesse do capital em
mercantilizar tais serviços em sua necessidade imanente de expansão, convertendo toda
realidade material e imaterial em bens e serviços (mercadorias) e em mercados para a
produção e reprodução do capital.
A oferta desses benefícios sociais por parte do Estado mediante a ação do fundo
público
36
[...] produziu uma imensa gama de bens e serviços públicos como anti-mercadorias
sociais e uma desmercantilização significativa da reprodução da força de trabalho. A
consequência política, crucial deste processo é que o embate por estes direitos se
deslocou da esfera privada para a esfera pública (FRIGOTTO, 1996, p. 73).
Em suma, a incapacidade do Estado, mediante fundo público, em atender a
duplicidade de demandas, do capital e do trabalho, estruturalmente antagônicas, compele o
Estado de Bem-Estar ao endividamento, ao déficit público, crise fiscal e quadro inflacionário.
Acrescente-se a isso a intensificação da internacionalização oligopólica da produção e
finanças, oportunizada pelo avanço das forças produtivas e os diagnósticos neoliberais que
configuram a crise e o desmonte do modelo de Estado de Bem-Estar.
2.3 O Desenvolvimento das Forças Produtivas (do Fordismo ao Toyotismo)
A burguesia só pode existir com a condição de revolucionar incessantemente os
instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de poder e, com isso, todas
as relações sociais. (...) A burguesia durante seu domínio de classe, apenas secular,
criou forças produtivas mais numerosas e mais colossais que todas as gerações
passadas em conjunto. (MARX; ENGELS, [19- -], p. 24)
Os longos anos de crescimento econômico, estabilidade e a acumulação ampliada de
capital, que particularizaram os anos áureos do Fordismo-Keynesianismo, ensejaram
investimentos pesados em tecnologia, resultando na expansão vertiginosa da base tecnológica
das forças produtivas (mormente em automação, microeletrônica, telecomunicações e
transportes), engendrando modificações na estrutura social de produção, possibilitando a
dispensa de força de trabalho (aumento do contingente do “exército industrial de reserva”), a
comunicação instantânea (o uso de computadores e comunicação via satélite) e o
barateamento dos transportes; tais transformações oportunizaram uma maior autonomia do
capital frente ao trabalho e do capital financeiro diante dos Estados nacionais.
O processo de internalização produtiva e financeira (globalização), a crise recessiva e
fiscal dos Estados Nacionais (fundo público) e o acirramento da competitividade
intercapitalista, resultaram perdas nas taxas de acumulação e a implosão do modelo FordistaKeynesianista, desencadeando um processo de reestruturação produtiva cujo objeto é a
retomada das taxas de acumulação. Neste sentido, investe-se em tecnologia (em capital
morto), na automação produtiva, o que favorece a dispensa de força de trabalho (capital vivo);
ocorre então, uma flexibilização, descentralização do processo produtivo, ensejando toda uma
rede de subcontratação e deslocamento (descentralização espacial), objetivando redução dos
custos, o que demanda um maior controle sobre o processo produtivo e consequentemente
37
sobre a força de trabalho (mercadoria paga).
Decerto, as pressões competitivas, bem como a lutas pelo maior controle da força de
trabalho, aguçadas pela internacionalização produtiva e financeira, demandaram novas formas
industriais e de gerenciamento, o que implica um processo de reestruturação econômica que
comporta uma série de transformações na materialidade objetiva e subjetiva do mundo do
trabalho e do processo produtivo (transformações nas condições de existência social, tanto a
nível jurídico quanto ao político-ideológico). Essa reestruturação enseja uma nova forma
produtiva, caracterizada, fundamentalmente, pela articulação entre desenvolvimento
tecnológico (revolucionamento da base tecnológica das forças produtivas), desregulamentação
e descentralização produtiva sob várias modalidades. Esse novo conjunto de medidas passa a
existir, tendo como objetivo medular o barateamento dos custos e manutenção das margens de
lucro, mediante a desvalorização da força de trabalho.
Nesta perspectiva, é interessante frisarmos como o desenvolvimento das forças
produtivas, mormente as revoluções tecnológicas, assim como as novas técnicas de
gerenciamento de mão de obra, forjadas no contexto capitalista e atreladas aos interesses do
capital, objetivam sempre a maximização do controle do capital sobre a força de trabalho
(convertida em mercadoria) comprada, mediante assalariamento, no mercado de trabalho. As
primeiras duas grandes revoluções, tendo com marco indicador a máquina a vapor e a
utilização de novas matrizes energéticas, derivadas do petróleo e da eletricidade,
respectivamente, ensejaram expandir e substituir a força física do homem. Uma terceira
revolução, a da energia nuclear, da microeletrônica, da automação e bioengenharia, a qual está
se vivenciando agora, possibilitou a ampliação das capacidades intelectuais do homem, que
foram dilatadas e inclusive substituídas por autômatos. Cada revolução, tomada como marco
delimitador, reflete particularidades dos diferentes contextos específicos, singularidades na
materialidade objetiva e subjetiva, configurando e demandando perfis de trabalho
diferenciados, mas não excludentes. Ressalte-se, todavia, o fato de se buscar sempre
maximizar o controle sobre o trabalho.
Segundo Rosso, podemos observar a partir das revoluções tecnológicas supracitadas, e
tomadas como marco histórico, que “prevalece a hipótese de que as mudanças tecnológicas
que acontecem de tempos em tempos, além de substituir trabalho, que é sua implicação
primeira, também contribuem para aumentar o grau da intensidade.” (ROSSO, 2008, p. 23).
38
O nível de intensidade é uma questão imanente ao capitalismo, resulta de um
antagonismo estrutural que rivaliza os interesses dos operários aos dos empregadores. Por se
tratar de uma relação de compra e venda da força de trabalho, esta convertida em mercadoria,
confere ao comprador, isto é, empregador, poder sobre o indivíduo trabalhador. Não obstante,
isto não significa a anulação plena dos interesses dos trabalhadores. Trata-se de uma relação
de poder e os trabalhadores, como sujeitos históricos, manifestam a capacidade de luta,
resistência e defesa de seus interesses, o que resulta em embates que têm resultado em
inequívocas conquistas sociais historicamente construídas por parte dos trabalhadores e as
tentativas de revogação de tais conquistas por parte do capital.
Além do mais, como destaca Rosso (2008, p. 25), deve-se considerar a “existência
prévia de padrões de intensidade construídos através do tempo e que os trabalhadores
assumem como referência” e cujos objetivos do capital é alterá-los a seu favor, intentando
maximizar o controle e a exploração sobre a força e trabalho; tais objetivos intentam fazer
com que os produtores diretos trabalhem mais, produzam mais e propiciem mais lucros,
buscando eliminar ou minimizar as “porosidades” da jornada de trabalho, isto é, os tempos de
não trabalho ou trabalho morto, estratégia do trabalhador para diminuir seu próprio desgaste
(físico, mental, relacional, afetivo, etc.) e que contraria os interesses do empregador. Se todos
os tempos mortos não podem ser erradicados, podem, ao menos, ser minorados, mediante a
“racionalização” do processo de produção; os estudos de tempo e movimento do trabalhador,
os estudos ergométricos da psicologia do trabalho buscam esse intento, qual seja, maximizar o
controle e diminuir as “porosidades”.
É relevante destacar que a intensificação do trabalho (o ritmo, a velocidade, o
envolvimento) não resulta apenas de inovações tecnológicas, mas também de inovações
organizacionais, ou ainda, simplesmente do acréscimo da intensidade de esforço do
trabalhador.
Ratificando o exposto, observa-se contemporaneamente um investimento massivo e
exponencial em capital morto, o que acarreta na redução da demanda de trabalho humano, que
se traduz no desemprego estrutural e na precarização do trabalho. Nesse passo, como
estratégia de dominação, impõe-se flexibilizar as relações de produção, formatando-se uma
sociabilidade que demanda cada vez menos trabalho estável e em contrapartida cada vez mais
trabalho part-time, terceirizado. Para o capitalista interessa apenas trabalho, não mais
emprego, compreendo-se por emprego a relação empregatícia com salário fixado no início do
39
contrato de trabalho, com direito a jornada semanal regulada segundo a lei, em resumo, todas
as condições de trabalho conquistadas pelos assalariados no seu percurso histórico de lutas
(ROSSO, 2008).
Por fim, ao contrário do que propagam os apologistas do capitalismo (neo) liberal, o
desenvolvimento das forças produtivas, sob a égide do capital, não resultou na liberação do
homem da condenação bíblica, “ganharás o pão com o suor do teu trabalho”, nem tampouco
da exploração e alienação a que estão submetidas bilhões de vidas, que continuam presas a
condições materiais de existência extremamente adversas a sua emancipação e a constituição
plena de sua humanidade. Não significou, como disseminado por muitos, a liberação do
homem da máquina, nos moldes do taylorismo, que o embrutece, como a um animal de carga.
Diferentemente do que professam os ideólogos do capital, a nova realidade de produção
flexibilizada e seus desdobramentos contribuíram para tornar precários ainda mais o trabalho
e as condições de existência humana e das demais espécies, face ao colapso ambiental
iminente. Em face de tais circunstâncias, “o tempo livre, ao contrário de se constituir em
mundo de liberdade, de fruição, do lúdico, um novo modo de vida, torna-se tempo
escravizado, tormento, desemprego e subemprego” (FRIGOTTO, 1996, p. 118).
Os
defensores
e
entusiastas
do
toyotismo
apregoam
a
polivalência,
a
multifuncionalidade como um avanço da condição humana, como a possibilidade da
sociedade do lazer, do tempo livre. Enfatizamos, entretanto, que esse processo associado
(capitaneado) ao capital, ao invés de libertar tempo livre, enquanto possibilidade do mundo de
liberdade, da desalienação e desenvolvimento da plenitude humana, de suas potencialidades e
da realização do homem total - descrito por Marx em A Ideologia Alemã (1987) - ao contrário,
tem produzido desespero, flagelo que atormenta e penaliza milhões de indivíduos que se vêem
impossibilitados de meios para garantir sua subsistência. Este 'ganho'(sic!) de tempo livre
enquadra-se na estratégia de fortalecimento do capital em detrimento do trabalho.
(FRIGOTTO, 2008; CHAUI, 1999; ANTUNES, 2001, 2006).
Como salienta KURZ (1993) e OLIVEIRA (1995, 1999), hodiernamente, o
trabalhador, ao invés de lutar pelas transformações das relações capitalistas de produção, pelo
comando do processo produtivo, luta para se tornar mercadoria, para se tornar fonte de mais
valia.
A acumulação flexível tem tornado possível uma maior exploração do trabalho, uma
40
recombinação e acentuação das estratégias de mais-valia tanto absoluta quanto relativa. Assim
descrito por Harvey:
A acumulação flexível parece enquadrar-se como recombinação simples das duas
estratégias de procura de lucro (mais-valia). A mais-valia absoluta apoia-se na
extensão da jornada de trabalho com relação ao salario necessário para garantir a
reprodução da classe trabalhadora num dado padrão de vida. A passagem para mais
horas de trabalho associadas com uma redução geral de vida através da erosão do
salário real ou da transferência do corporativo de regiões de altos salários para
regiões de baixos salários [...] e a mais-valia relativa, a mudança organizacional e
tecnológica é posta em ação para gerar lucros temporários para firmas inovadoras e
lucros mais generalizados com a redução dos custos dos bens que definem o padrão
de vida do trabalho. [...] investimentos, que cortou o emprego e os custos do
trabalho em todas as industriais [...]. No final, com efeito, o que conta é o modo
particular de combinação e de alimentação mútua das estratégias absoluta e relativa.
Curiosamente, o desenvolvimento de novas tecnologias gerou excedentes de força
de trabalho que tornaram o retorno de estratégias absolutas de extração de mais-valia
mais viável mesmo em países capitalistas mais avançados. (HARVEY, 1992, p. 174175).
Os diferentes modos de acumulação capitalista vão demandar modelos de escola e
formação de mão de obra adequados às especificidades históricas do capital, transitando do
modelo educacional nos moldes taylorista-fordista ao modelo flexibilizado toyotista, da
rigidez da base tecnológica toytista-fordista (eletro-mecânica) para a “flexibilidade” do
toyotismo (micro-eletrônica), ambos refletem as modificações atreladas aos interesses do
capital em otimizar a extração da mais-valia mediante o controle da força de trabalho, nos
moldes do “gorila amestrado” taylorista ao da subjetividade(capacidade cognitiva) do
trabalhador nos moldes do toyotismo, e as lutas dos trabalhadores por direitos e oportunidades
de acesso aos bens materiais e culturais, sobretudo o direito à educação de qualidade
convertido em direito e dever do Estado, o qual se consubstanciou no Estado de bem-estar
social, em que se tem um modelo pactuado e construído num contexto de crise do capitalismo
liberal e emulação dos ideais socialistas e do “comunismo real”.
A atual ofensiva do capital implica no desmonte das políticas de direitos sociais do
Estado Providência, alicerçada no financiamento de um fundo público compulsório,
implicando na remercantilização e refilantropização de tais direitos, desresponsabilizando o
estado e o capital pelo financiamento dos mesmos.
Por mais que se propague, pelos ideólogos entusiastas do mercado, que o modelo
flexibilizado, configurado numa nova base tecnológica e organizacional, promoveria a
omnilateralidade e politecnia, na medida em que oportunizaria o labor pensante, mais
imaginativo, reflexivo e criativo, em contraste ao trabalho embrutecedor, cerceador, reduzido
41
meramente ao adestramento das potencialidades manuais do trabalhador típicas do modelo
taylorista-fordista, denota-se a inconsistência de tal tese.
Ao invés de promover um processo de humanização do trabalho, de “libertação” e
“desalienação” através do trabalho pensante, na prática, tal multilateralidade alegada
configura-se em uma nova estratégia do capital para maximizar o controle sobre a força
laboral e intensificar a extração de mais-valia.
Ressalte-se que o desenvolvimento tecnológico, o qual demandaria e ensejaria o
trabalho criativo, fecundo, a realização da omnilateralidade, não se traduz em qualidade de
vida para os trabalhadores, em redução da jornada de trabalho e, por conseguinte, em tempo
livre para o desenvolvimento de potencialidades artísticas, esportivas, dentre outra
potencialidades humanas, ao contrário, converteu-se em desemprego, desespero, aflição,
colaborador da precarização do trabalho, em uma sociedade onde o direito aos bens
necessários à existência dar-se no mercado mediante a compra e venda da força de trabalho,
convertida em mercadoria.
O desenvolvimento das forças produtivas está atrelado à estratégia do capital em
maximizar o controle e extração da mais-valia e a reprodução e acumulação do capital, e não
a liberação do homem na perspectiva da realização do homem total.
No novo modelo de acumulação capitalista flexibilizado, as determinações e
prescrições no labor permanecem de modo mais dissimulado se comparados à ostensividade
do modelo taylorista-fordista, neste aspecto, a flexibilização e a polivalência são resultados da
intensificação da exploração sob nova base organizacional e tecnológica, resultando num
processo de redução de custos e maior produtividade, instigado pelo acirramento da maior
competitividade interempresarial e interpessoal, que resultam na precarização do trabalho.
Esta nova demanda de formação laboral, de um trabalho cognitivo e criativo, não
contempla a todos, o que se constata, na prática, é a coexistência de processos intensivos de
trabalho manual e de um trabalho mais qualificado, onde o primeiro, enquanto continuidade
do fordismo-taylorismo se traduz numa mão de obra desqualificada e de baixo custo,
composta por um contingente de trabalhadores, precariamente capacitados, responsáveis pela
execução de tarefas precarizadas e repetitivas, mesmo que sob nova roupagem modernizada,
informatizadas, enquanto o segundo detêm habilidades cognitivas requeridas, mas dentro dos
42
limites da funcionalidade do capital.
A reforma implementada pela nova LDB (Lei nº 9.394/96) (BRASIL, 1996) e pelo
Decreto n.º 2.208/9 (BRASIL,1998) reproduz e acentua, retrocedendo historicamente, a
dualidade do sistema educacional brasileiro, na medida em que separa a educação do ensino
médio do ensino profissional, direcionando a formação para a cidadania, de viés academicista
para o primeiro e a formação limitada e aligeirada para o mercado no caso do ensino
profissional. Dicotomia que não proporciona ao trabalhador a capacidade de compreender o
processo produtivo de forma mais ampla, limitando-se a garantir o treinamento de viés
puramente instrumental, caracterizado pela fragmentação, aligeiramento e superficialidade,
destinando a função criativa ao ensino universitário voltado para as elites.
Destarte a polivalência como estratégia de intensificação do trabalho não pode ser
entendida como omnilateralidade ou politecnia, mas como manifestação da intensificação da
força de trabalho, configurando parte das novas estratégias de super-exploração e redução de
custos capitaneados pelo capital.
A polivalência compõe o processo de intensificação do trabalho, em que o trabalhador
atende a vários postos de trabalho, o que resulta na redução do número de trabalhadores.
2.4
O Neoliberalismo: a revanche do capital
Para a filosofia liberal, os direitos individuais precedem a própria formação do poder
político. Do ponto de vista ético, o liberalismo sempre colocou a sua liberdade
individual no primeiro lugar de sua escala, e dedicou uma posição secundária ao
objetivo da igualdade social, aceito apenas como defesa de condições e
oportunidades iniciais idênticas para todos os indivíduos. (FIORI, 2002, p. 78)
Com a crise do modelo de acumulação fordista-keynesianista, da derrocada do
socialismo, do advento de uma nova base material (tecnológica) de produção, os diagnósticos
neoliberais
–
Estado-mínimo,
desregulamentação,
flexibilização,
competitividade,
individualismo – ganharam cada vez mais visibilidade e legitimidade, evidenciando assim a
tendência cíclica do capitalismo e sua ressignificação do papel do Estado, o qual oscila com
momentos de política intervencionista ou liberalizante do mercado.
Com a crise dos anos 1980-90, o que se denotou foi a inabilidade do modelo de
acumulação fordista-keynesianista em conter as contradições inerentes ao sistema capitalista –
tendência a crises cíclicas e a concentração –, explicitamente a incapacidade do fundo público
43
em atender à reprodução da acumulação privada e ao mesmo tempo garantir a ampliação das
demandas dos movimentos sociais, particularmente as do trabalho (FRIGOTTO, 1996;
CHAUÍ, 1999; MELO, 2004).
Por sua vez, a revolução tecnológica, associada à globalização (processo de
internacionalização produtiva e financeira), contribuiu para intensas transformações no
mundo do trabalho, caracterizado por mudanças na composição e forma do processo de
produção, o que resulta numa maior desindustrialização e descentralização. Tudo a ensejar um
processo de heterogeneização, fragmentação e complexificação da força de trabalho,
mormente entre “estáveis” e “não estáveis”, contribuindo para corrosão das condições
objetivas de identidade de classe, refletindo em suas entidades representativas (ANTUNES,
2005).
No cenário apontado, a educação, a saúde, o pleno emprego, a previdência, dentre
outros direitos sociais, são deslocados, transitando da condição de direito à condição de
propriedade. Segundo Gentili (1998), opera-se uma re-conceitualização da noção de
cidadania, mediante uma revalorização da ação do individuo enquanto proprietário, enquanto
sujeito que luta para conquistar (leia-se comprar) propriedades e mercadorias de diversas
naturezas; destarte, como afirma Gentili (1998, p. 20) “O modelo do homem neoliberal é o
cidadão privatizado, o consumidor”.
Ademais, aos que defendem a mercantilização dos direitos sociais, conquistados
mediante intensas lutas históricas, vale ressaltar que até mesmo Adam Smith – expoente
máximo do liberalismo – considera que “existem certas coisas, essencialmente bens públicos,
que o mercado não produz, uma vez que não trazem lucro” (SMITH apud HOBSBAWM,
1993, p. 264).
Perante as circunstâncias históricas desfavoráveis aos trabalhadores, como as que ora
se apresentam, a ortodoxia neoliberal impõe-se como hegemônica e norteadora das políticas
capitaneadas pelas agências internacionais como, Banco Mundial, Fundo Monetário
Internacional, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Organização Mundial do
Comércio, as quais agem de forma articulada e complementar, contando com o apoio das
elites locais, e impõem condições entrecruzadas para implementar um conjunto de medidas de
reestruturação econômica, que objetiva adequar a realidade dos países periféricos aos
interesses dos EUA e da UE, das grandes corporações e do capital financeiro internacional.
44
Gentili (1998) aponta os princípios norteadores de todo esse processo, conhecido
como consenso de Washington, implementados pelas agencias multilaterais: disciplina fiscal;
redefinição das prioridades de gastos públicos; reforma tributária; liberalização do setor
financeiro; manutenção de taxas de câmbio competitivas; liberalização comercial; atração das
aplicações de capital estrangeiro; privatização de empresas estatais; desregulamentação da
economia; proteção de direitos autorais.
Sobre os condicionamentos cruzados, diversas agências multilaterais, como as já
citadas antes, agem de modo coordenado, vinculando a liberação de recursos - empréstimos –
ao atendimento de suas exigências, de seu receituário neoliberal; assim, as orientações das
políticas educacionais precisam ser entendidas sempre em complementaridade às orientações
macroeconômicas, nestas prevalecendo a lógica financeira sobre o social, a partir dos
interesses de reprodução do grande capital internacional. Portanto, a reforma educacional é
um braço das reformas mais gerais do Estado na lógica neoliberal (OLIVEIRA, 2003, 2006;
MELO, 2004; HADDAD, 2008).
É imprescindível destacar que não se trata de uma ideia-produto importada, uma vez
que existem sujeitos internos que a reforçam, locupletando-se, como salienta Oliveira:
deve-se lembrar de que não se trata de uma imposição unilateral, uma vez que existe
uma grande anuência de grupos nacionais poderosos, tanto no âmbito político,
quanto no econômico, estabelecendo-se, dessa forma, um novo tipo de dependência
e colonialismo que envolve também as contradições e a dominação internas, que não
podem ser escamoteadas (OLIVEIRA, 2003, p. ).
Como resultados das políticas públicas norteadas pelas diretrizes neoliberais, denotamse a retração, ou minimização do papel do estado, mediante a mercantilização da escola, a
partir da busca pela criação de um mercado de consumo de serviços educacionais,
particularmente no ensino superior, sendo necessária a construção de um novo senso comum,
em que prevalece e impõe-se um discurso economicista, tecnocrático, profilático, “asséptico”
dos germes de falsas promessas igualitárias dos socialismos (diversas vertentes), evitando a
perniciosa penetração da política na esfera educacional, bem assim dos usos e abusos do mito
socialista.
Nesse passo, o argumento usado é o da incapacidade estrutural do Estado de ser
eficiente e promover a competitividade necessária para a melhoria da qualidade do sistema
educacional; daí a necessidade de estabelecer mecanismos competitivos meritocráticos,
exacerbando a ética individualista, nos moldes do darwinismo social, no qual se devem
45
instituir sistemas de prêmios e punições, tendo como paradigma o mercado competitivo, em
que os melhores (eficientes) triunfam e os piores fracassam; assim, a competitividade é fator
indispensável, tida como mola propulsora do progresso humano que deve contrapor-se às
falsas promessas coletivistas.
Por fim, o que se constata é que o processo de globalização sob a égide neoliberal e
sua consequente ressignificação do Estado e atribuições, o chamado Estado Mínimo, tem
resultado num acirramento da pobreza e disparidade entre continentes, regiões, países, classes,
contribuindo para a fragilização, o enfraquecimento do trabalho e a marginalização de parte
considerável da humanidade no que diz respeito às benesses das riquezas socialmente
produzidas; paralelamente, no tocante à educação brasileira, agrava-se a dualidade histórica
do nosso sistema educacional, debilitando ainda mais as condições de infraestrutura e da
qualidade docente, mercantilizando as nossas necessidades, metamorfoseando os direitos,
(conquistados a duras penas), em apenas serviços a serem atendidos no mercado. Como
consequência, acirram-se as contradições, tais como o apelo ao consumo compulsivo,
supérfluo, e que marginaliza 1/3 da humanidade do acesso, da possibilidade de consumir parte
da riqueza social produzida (bens materiais e imateriais) e a educação é um desses bens.
Destaque-se, porque relevante, a mudança das políticas universalistas (reitere-se,
conquista de lutas históricas do embate capital-trabalho) para intervenções pontuais, focadas
na pobreza, cuja função é evitar o caos social, impondo um novo tipo de sociabilidade que
corresponde a um cenário de desregulamentação e de flexibilização de todo sistema social;
esse cenário, montado no pós-guerra, vai desde as leis de proteção ao trabalho, de direitos à
saúde, educação, pleno emprego, previdência, em suma, de uma situação de proteção para um
contexto de mínima proteção.
Desse modo, como aponta Wacquant (2001), muda-se de um Estado Social para um
Estado policial, isto é, um mínimo em relação às políticas de proteção social e o máximo na
atuação policial, reflexo da concepção liberal de Estado Mínimo; tal panorama pode ser
observado no espaço educacional quando da transformação do Estado Educador para o Estado
Avaliador, que descentralizou responsabilidades e centralizou a avaliação, o currículo e outras
formas de controle.
Partindo da premissa da ineficácia do Estado como agente executor de políticas
públicas - diagnóstico neoliberal - desloca-se a responsabilidade e execução das ações aos
46
agentes do mercado ou ao terceiro setor, visto como público não estatal, sem, contudo, retirar
do Estado a sua função de grande financiador destas ações. O que se tem é um deslocamento
da responsabilidade para a sociedade civil, por meio da qual os indivíduos e grupos sociais
passam a executar essas políticas (NEVES, 2005).
Todavia, esta perspectiva escamoteia os conflitos, os embates que perpassam a
sociedade de classes, engendrando uma separação entre economia e política, dissimulando
ainda os antagonismos de classes, as oposições de interesses dos sujeitos históricos, seus
embates e as correlações de força, mormente, no caso brasileiro, bastante assimétrica.
No Brasil, as políticas neoliberais foram implementadas como “únicas” alternativas
exequíveis, a partir dos anos 90, no governo de Fernando Collor e FHC, ambos
desconsiderando qualquer proposta contrária.
Vale destacar a rejeição do presidente FHC e de seu governo ao rótulo de neoliberal,
enfaticamente se autodefinindo como social-democrata, na vertente da terceira via no
contexto do novo trabalhismo inglês, tendo como inspiração teórica o sociólogo Antony
Giddens, para o qual a terceira via corporifica a tentativa de transcender tanto a socialdemocracia do velho estilo quanto o neoliberalismo, repassando à sociedade civil, mais
especificamente ao terceiro setor, a execução de serviços sociais e científicos, atribuindo ao
Estado a responsabilidade pela crise (PERONI; OLIVEIRA; FERNANDES, 2009).
Desse modo, buscou-se a construção de um novo senso comum, apoiado pela quase
unanimidade da grande mídia – indispensável como fator de legitimação desta ideologia – o
que ficou conhecido como “pensamento único”, qual seja, neoliberalismo. Termos como
“dinossauros temerosos dos novos tempos”, “esquerdistas órfãos de qualquer ideologia”,
“viúvas do socialismo”, dentre outros, eram frequentes na grande mídia, numa clara tentativa
de desqualificar e ridicularizar quaisquer críticas às políticas propostas.
À evidência, cite-se o pensamento do então presidente Fernando Henrique Cardoso,
“só quem não tem nada na cabeça é que fica repetindo que o governo só se preocupa com o
mercado, que é neoliberal. Isso é neo-bobismo” (CARCANHOLO, 2008, p. 34).
Os ideólogos do capital insistem ainda em propagar o mito da convergência, ou seja,
que “a expansão do comércio e dos mercados promoveria a progressiva homogeneização da
riqueza das nações” (FIORI, 2002, p.25), que advoga a ressurgência desta tese, pronunciada
47
por Adam Smith e David Ricardo, a qual fundamentou a ideologia do Laissez Faire e dos
mercados autorregulados que norteiam a globalização neoliberal.
Contudo, os fatos indicam o contrário, refutando a hipótese de que a presente
globalização sob a égide neoliberal seja universal, inclusiva e homogeneizadora. Na prática,
ela engendrou uma maior concentração de riquezas e aumento das disparidades entre
hemisférios, continentes, países, classes, grupos humanos diversos, ampliando, desse modo, o
abismo social entre a humanidade.
Portanto, diferentemente do que apregoou não se concretizou a democratização das
decisões; o neoliberalismo, como cediço, corroborou com a centralização das decisões nas
mãos de um seleto grupo de corporações e mega-corporações transnacionais, os quais são os
principais atores sociais na definição dos caminhos a serem trilhados pela economia mundial.
Como asseverou Fiori, “a globalização não foi global” (FIORI, 2002, p. 260).
Nesta perspectiva, toda e qualquer tentativa de mudança de rumo da política
econômica nos Estados Nacionais, particularmente os países periféricos, é avaliada como
fator de instabilidade, ingovernabilidade e irresponsabilidade, ao passo em que para toda
hipótese de mudança têm-se a alegação de que é fundamental acalmar os agentes do mercado
internacional, sob pena de provocar evasão de capitais, compondo um discurso científico
economicista tecnocrático pretensamente apolítico.
O referido discurso busca, assepticamente, extirpar o debate político-econômico das
disputas eleitorais, como demonstra Miguel (2002), para quem a mídia, com raríssimas
exceções, foi um legitimador dos interesses dos grupos econômicos do capital financeiro
mundial, com anuência das elites locais, por haver justificado, ou defendido a continuidade
das políticas neoliberais, mediante um “silêncio” deliberado, que contribuiu para a reeleição
de Fernando Henrique Cardoso e seu programa neoliberal; eis que referida recondução era
dada como certa, inevitável e necessária para a continuidade do processo de “modernização”,
cuidando, para isto, de eliminar o debate político.
Destarte, a mídia ratifica a visão neoliberal das teses do menos Estado, menos política,
e a predominância da economia sobre a política, como destaca Fiori (2002, p. 78) “a palavra
de ordem, é despolitizar a economia e reduzir ao mínimo a intervenção dos Estados na vida
social, em nome da eficácia da 'mão invisível' dos mercados e dos direitos e interesses dos
48
indivíduos”.
Quanto à especificidade, do ponto de vista histórico e político, do (neo) liberalismo
atual em relação ao liberalismo clássico, Fiori (2002) afirma que este se sublevou contra o
absolutismo político e sua versão econômica - o mercantilismo -, insurgindo-se em nome da
liberdade dos indivíduos e do comércio, no contexto dos séculos XVII e XVIII, configurandose como uma ideologia insurgente, cumprindo o papel legitimador na emergência e
consolidação do capitalismo industrial, colaborando na criação das instituições políticas
liberais, que estão na origem da própria democracia.
Diversamente, o neoliberalismo foi convertido em instrumento da ofensiva do capital
sobre o trabalho, mormente, contra o Estado Providência, um dos legados da democracia de
massa da segunda metade do século XX, configurando-se como uma ideologia política
conservadora, reacionária, ao legitimar uma “vingança do capital contra os trabalhadores,
feita na forma de desmonte de sua legislação sindical e dos seus direitos sociais” (FIORI,
2002, p. 79).
A reforma da educação, mormente a profissional, na gestão do presidente FHC, inserese no contexto macro das transformações de reestruturação produtivas demandadas pelo
modelo de acumulação flexível sob a égide neoliberal em circunstâncias favoráveis ao capital
e em detrimento do trabalho, sobretudo de acentuada relação assimétrica de forças.
As mudanças pautaram-se na ortodoxia neoliberal do Estado mínimo e no desmonte
do Estado Providência ou de modelos inspirados neste, que implicaram no desmonte do
estado e das politicas de proteção social, de garantias de direitos sociais universais,
historicamente conquistados.
A educação tem que ser entendida como arena de disputas de projetos de sociabilidade
emanados de diferentes atores sociais e históricos, como instrumento de poder, determinada e
determinante em suas relações sociais, estruturada dualmente, diferencialmente para classes
diferentes, configurando diferentes níveis (tipos) de educação ou treinamento, que varia
historicamente, conforme as forças produtivas – meios e instrumentos de produção –,
atendendo à funcionalidade de reprodução da divisão social e técnica e internacional do
trabalho, e de reprodução das relações sociais de produção capitalista, perpassada pela relação
capital - trabalho. Neste sentido, a educação profissional é cenário de transformações que
49
objetivam adequá-la às demandas do projeto societário capitalista neoliberal, concatenados
aos interesses do capital global, principalmente o financeiro.
A reforma do ensino profissional atende a ortodoxia neoliberal de cortes
orçamentários, a ressignificação do estado, minimizando-o no tocante às políticas públicas de
proteção social e regulamentação da relação capital-trabalho. E, por conseguinte, a
transferência de atribuições do estado para o mercado e a filantropia. Neste diapasão, dar-se a
remercantilização e refilantropização de direitos sociais, dentre estes a educação, mudanças
estas concatenadas ao processo de reestruturação produtiva sob a égide neoliberal, deslocando
a responsabilidade do estado e do capital para o individuo, para isto, ressignificando ou
construindo novas categorias conceituais para nortear ideologicamente e justificar as
diretrizes neoliberais preconizadas. Termos como empregabilidade, pedagogia das
competências, capital humano, flexibilidade, convergem para a individualização e atomização
dos sujeitos, convertidos em Homo economicus, responsáveis por suas escolhas,
desarticuladas da totalidade social e histórica (FRIGOTTO, 2006, 2010).
A mesma estratégia, de atomização e segmentação, opera-se na construção do conceito
Terceiro Setor, compartimentando a sociedade em três esferas automizadas e desarticuladas da
totalidade social, como destaca Montaño (2008), operando a mistificação de uma sociedade
civil, concebida como terceiro setor, popular e isenta de conflitos de classes, cujo objetivo é o
bem comum, em contraposição ao Estado, “tido como primeiro setor, supostamente
burocrático, ineficiente” (MONTAÑO, 2008, p. 15) perdulário e corrupto, e ao mercado, tido
como segundo setor, eficiente, racional, mas cuja diretriz é o lucro.
Conceitos que convergem para a individualização das responsabilidades, do fracasso
ao sucesso, da competividade e desigualdade como fator natural catalizador do
desenvolvimento econômico e do “mito da convergência”, ou seja, que “a expansão do
comércio e dos mercados promoveria a progressiva homogeneização da riqueza” (FIORI,
2002, p. 25)
A reforma do ensino profissional objetiva a adequação da educação à nova
sociabilidade do capital, mediante minimização do papel do estado, em relação à questão
social e a ofensiva do capital em sua necessidade imanente em mercantilizar necessidades
humanas, transformando direitos (historicamente conquistados) em serviços (mercadorias)
intercambiáveis no mercado, buscando fomentar um mercado de consumo de serviços
50
educacionais, ensejando novos “espaços” para reprodução e acumulação do capital, assim
como, a formação da força laboral a funcionalidade de reprodução das relações sociais
hegemônicas de produção capitalista no contexto de acumulação flexibilizada.
51
3
CAPÍTULO – EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL: UM REFORÇO Á
DUALIDADE
“as especializações profissionais surgem em decorrência de mudanças de ordem
técnico-organizacionais no sistema econômico” (MANFREDI, 2002, p. 36).
Segundo Manfredi (2002), historicamente, a construção da escola não esteve associada
à preparação para o trabalho; foi criada, institucionalmente, para preparar grupos seletos,
geralmente para o exercício do poder e direção, perfazendo uma demarcação social do
conhecimento correspondente a um espaço social, uma instituição específica.
A educação escolar, separada da educação imersa nas práticas sociais, não aconteceu
simultaneamente, nem uniformemente em todas as sociedades; assim, a formação para o
trabalho consumava-se na dinâmica da vida social e comunitária, consubstanciando-se no
cotidiano. Esse constructo social era tecido na convivência e repassado informalmente de
geração a geração, mediante a socialização do conhecimento, o que se dava concomitante à
própria atividade de trabalho.
Nesse passo, constata-se que, embora a escola, como instituição, faça parte de
diferentes civilizações, os sistemas de ensino são criações recentes, são produtos da expansão
da sociedade industrial, ou melhor, do capitalismo industrial, o qual, mediante a constante e
necessária transformação das forças produtivas, demandou a necessidade da “universalização”
da escola de modo dualista, constituindo escolas diferenciadas para clientelas (classes)
distintas.
Segundo Saviani (2007), foi o advento da propriedade privada, coligada à sociedade
de classes, que tornou factível aos proprietários viver do trabalho alheio, condição que
engendrará a separação entre trabalho e educação. Em outros termos, a divisão em classes
provocou também uma divisão no universo educacional, promovendo duas modalidades
distintas e separadas de educação: uma, para formar as elites, para o comando e outra, ligada
ao processo de produção material de existência, assimilada ao próprio processo de trabalho.
Desse modo, é a primeira modalidade de educação que dará origem à escola.
É interessante frisar que a palavra escola descende do grego, e etimologicamente
significa o lugar do ócio, tempo livre, sendo este um requisito, ou uma precondição para o seu
acesso. O vocábulo remete a uma sociedade escravista, de historicidade específica, a qual
52
marginaliza, estigmatiza o trabalho manual, atributo do escravo. Evidentemente que, desde a
Antiguidade, a escola vai se tornando cada vez mais uma instituição multifacetada mediante
as demandas históricas atribuídas a mesma, decorrentes da mudança dos modos de produção
da existência humana (MANFREDI, 2002).
A educação, mormente a escolar, constituiu-se numa arena de disputas hegemônicas de
projetos de sociedade e de homem, permeadas pelos diferentes interesses dos sujeitos
históricos e da correlação de forças desses atores na sociedade; para melhor ser compreendida
tem-se que perceber a sua inserção numa materialidade e subjetividade históricas, por meio
das quais é determinada e determinante em suas relações com a totalidade social.
De toda sorte, não foi apenas a revolução das forças produtivas, inerentes à lógica
capitalista que explica a universalização, mesmo que dual, da escola; é inconteste que também
é responsável pela universalização da escola o pleito dos sujeitos históricos (trabalhadores) ao
acesso às riquezas produzidas, consubstanciadas nos bens materiais e imateriais.
Particularmente, no modo de produção capitalista, passa pelo acesso ao conhecimento, e,
nessa perspectiva, o direito à educação também é uma conquista das lutas sociais, sendo
incorporado às atribuições do Estado, mormente a ampliação e consolidação da democracia
formal, da relação, embate e negociações entre capital-trabalho mediado pelo Estado.
Nesse passo, faz-se necessário tecermos um breve histórico da educação no Brasil,
particularmente, da educação profissional, perpassando, sucintamente, pelos diferentes
momentos históricos, do Brasil colônia ao contemporâneo.
3.1
Breve Histórico da Educação Profissional Brasileira no Brasil Colônia e Império
Consoante Cunha (2005a, 2005b), ao Brasil Colonial foi imposto o sistema Plantation,
(correspondendo, como colônia de exploração, ao processo capitalista de acumulação
primitiva) baseado no seguinte tripé: latifúndio; mão de obra escrava (africana) e monocultura
de exportação. Nesse modelo, o engenho constituía a unidade básica da produção e
organização sócio-política, mas além dos engenhos, o processo de ocupação histórica
(colonização) gerou incipientes núcleos urbanos que abrigavam a burocracia metropolitana e
as atividades de comércio e serviços, configurando um tímido mercado consumidor que
necessitava de trabalho especializado, ou seja, artífices como sapateiro, ferreiro, carpinteiro,
pedreiro, dentre outros. Segundo o referido autor, neste contexto, a aprendizagem dos ofícios,
53
tanto para os escravos quanto para os não escravos, era desenvolvida no próprio ambiente de
trabalho, não se atendo a sistematizações ou regulamentações formais.
Interessante ressaltar que, no empreendimento colonial português em terras brasileiras,
a religião e os jesuítas vão desempenhar um papel ímpar, não apenas na catequese e
aculturação do índio, como também legitimando ideologicamente a empreitada expansionista
no contexto da Contra-Reforma, acomodando a dualidade espiritual e mercantil do
expansionismo colonial português. Ressalve-se, porque relevante, o papel de formação
intelectual da elite colonial desempenhado pelas ordens religiosas, na medida em que vão se
constituir, durante extenso período, nos principais atores na organização e formação do
ensino, constituindo-se num espaço para a formação das elites locais (MENDES JÚNIOR;
RONCARI; MARANHÃO, 1991).
Os colégios religiosos, particularmente os jesuítas, diante da inexistência de artífices
na colônia, vão apresentar seus quadros próprios de artesãos adventícios, constituindo-se nos
primeiros núcleos de formação profissional do país; é significativo ressaltar que esses
artífices, além de praticarem o seu ofício, também ensinavam e nos seus quadros distinguiamse os sacerdotes dedicados diretamente ao trabalho religioso e os irmãos coadjutores,
empregados no desenvolvimento das mais diversas atividades laborais, indispensáveis à
produção de utensílios, ferramentas e outros bens imprescindíveis à produção material da
existência.
Neste giro, quando organizado, o trabalho artesanal da colônia até o império, pautouse pelo modelo corporativo da metrópole, organizado em corporações emparreiradas; não
obstante, havia algumas atividades manuais que os “brancos” queriam a reserva para si.
Nesses casos, as corporações de ofícios estabeleciam normas rigorosas, impedindo ou
desencorajando o emprego de escravos em certos ofícios (CUNHA, 2010a).
Como já foi exposto anteriormente, as práticas educacionais não estão dissociadas de
uma inserção no tempo e espaço, de uma materialidade e subjetividade histórica, emanando
tensões e contradições quanto à sua funcionalidade na reprodução ou transformação das
estruturas sociais, não podem ser pensadas abstraídas desse lastro histórico; a partir desse
pressuposto, entende-se que a dualidade que marca a sociedade brasileira passa
necessariamente pelo papel, pela funcionalidade da educação associada ao modelo de
desenvolvimento econômico prevalecente num determinado contexto, bem como emanada
54
das estruturas produtivas e da ação dos atores sociais que norteiam as práticas educacionais,
tanto no âmbito macro quanto micro.
Desse modo, numa sociedade acentuadamente desigual, rigidamente estratificada
como a do Brasil colônia e império – alicerçados no trabalho escravo - o ensino reproduziu as
estruturas hierarquizadas, ou seja, a conformação dual, preservando a dicotomia entre trabalho
manual e trabalho intelectual, forjando uma classe ociosa de inspiração aristocrática, vivendo
da exploração do trabalho de outrem, especificamente do escravo.
A condição aristocrática implicava na ostentação do não trabalho, na repulsa às
atividades laborais manuais (produtivas), tidas como indignas e ultrajantes e, principalmente,
no alarde de sua capacidade pecuniária de viver na vida inativa. Isso significava uma
dedicação permanente ao pensamento, à direção dos negócios políticos e religiosos e a gestão
dos bens, o que resultava em uma separação das classes inferiores por não realizar as formas
mais vulgares de trabalho manual, sendo imprescindível para obter e conservar a consideração
alheia e a respeitabilidade, o fato de além de ser, teria que parecer rica e poderosa aos olhos
dos outros (CARMO, 1992).
Como cediço, a educação não pode ser pensada prescindindo de uma estrutura e
conjuntura histórica; ela responde às demandas atreladas ao modelo de desenvolvimento
econômico prevalecente nos diferentes momentos históricos, o que explica, segundo Moura,
(2010) as razões pelas quais no Brasil Colônia e Império a aprendizagem sistemática de
ofícios não assumir a forma escolar.
Se o modelo econômico forjado atendia basicamente a exploração e expropriação da
matéria-prima mediante exportação agrícola e extrativista, tal realidade não demandava um
grande contingente de pessoal qualificado; por conseguinte, não havia grandes preocupações
com a educação da classe trabalhadora, esta majoritariamente composta por escravos.
Portanto, a aprendizagem dos ofícios manufatureiros, não atribuídos ao trabalho compulsório,
efetivava-se nos ambientes de trabalho, seguindo padrões dominantemente assistemáticos.
A transferência da Corte Real portuguesa para o Brasil engendrará profundas
mudanças, fazendo-se necessária a formação do Estado nacional e do respectivo aparato
burocrático, no qual se gestará o aparelho educacional escolar (MANFREDI, 2002).
Inicialmente, as principais instituições públicas na esfera educacional a serem fundadas foram
55
no âmbito do Ensino Superior, destinada a formar indivíduos aptos às funções qualificadas no
Exército, Marinha e na administração, imprescindíveis para a montagem do Estado Nacional,
pois a ex-colônia assumia um novo status, tornando-se sede da monarquia do Império
lusitano.
Concomitante, era impreterível pensar também na formação de quadros profissionais
relacionados às atividades laborais básicas não atribuídas ao trabalho escravo. Tal fato
desvenda os motivos, segundo Moura (2010), da criação do colégio das fábricas, no Rio de
janeiro em 1809, a qual objetivava capacitar órfãos portugueses. Posteriormente, houve a
criação de 10 casas de educandos em várias províncias, entre outros, cuja finalidade era
abrigar menores abandonados, meninos desvalidos, crianças e jovens em situação de
indigência, atribuindo-se a finalidade moral de repressão: educar pelo trabalho, considerado
um elemento regenerador e formador de caráter, mediante aprendizagem compulsória. Tais
estabelecimentos eram concebidos mais como “obras de caridade” do que como instrução
pública, configurando-se como de natureza moralista, assistencialista e compensatória.
3.2
Breve Histórico da Educação Profissional no Brasil República
Nos fins do Império e início da República são criados os Liceus de Artes e Ofícios,
espalhando-se por todo o país, (Rio de Janeiro, Salvador, Recife, São Paulo, Maceió, Ouro
Preto) para atender as demandas dos ofícios artesanais e manufatureiros; as referidas
instituições surgiram por iniciativa das entidades civis, tendo os mesmos objetivos das
instituições menoristas da época colonial, a saber, ser assistencialista e compensatório. Em
seguida, foram ampliadas e serviram de modelo para uma rede de escolas profissionalizantes
(tipografia, encadernação, alfaiataria, tornearia, carpintaria, sapataria).
Dentre as iniciativas privadas confessionais, merece destaque os colégios Salesianos e
os Liceus de Artes e Ofícios, organizados e mantidos pela ordem dos padres salesianos,
concebidos segundo o modelo criado pelo padre salesiano João Bosco (1815-1888), em
Torino, na Itália. Estas instituições de ensino objetivavam a qualificação como antídoto às
sedições, concorrendo para disciplinar e controlar contestações à ordem capitalista instituída.
O primeiro liceu salesiano no país foi fundado em Niterói, seguindo-se de outros espalhados
no território nacional, totalizando 14 (quatorze) instituições, constituindo-se numa incipiente
rede de educação profissional (MANFREDI, 2002).
56
Todavia, é importante salientar que a ordem confessional referida não se destinava
exclusivamente ao ensino profissional, cuja clientela constituía-se, prioritariamente, de
“desafortunados”
dos
segmentos
sociais
marginalizados;
ela
tinha
como
foco,
concomitantemente, o ensino secundário (hoje, ensino médio), cuja clientela compunha-se,
majoritariamente, dos estratos superiores da sociedade.
Com a decadência do ensino profissionalizante nas escolas salesianas, oriundas da
concorrência com outras instituições públicas e privadas, a ordem passa a dedicar-se ao
ensino propedêutico em razão dos ganhos econômicos e políticos.
Somente no início do século XX é que se denota um esforço do poder público na
organização da formação profissional, face ao surto de industrialização catalisado pelas duas
grandes guerras mundiais, as quais suscitam o desenvolvimento interno, o que ficou
conhecido como modelo de substituição das importações. No contexto do processo de
proletarização da força de trabalho, mediante a transição para uma economia baseada no
“trabalho livre” assalariado, promoveu-se uma desconstrução da representação do trabalho
como castigo, estigmatizado, associado à condição inferior do escravo; este, gradualmente, foi
se metamorfoseando em algo positivo, graças a uma visão apologética do trabalho,
fundamental à consolidação de um mercado de mão de obra livre.
É importante salientar que a formação do mercado de mão de obra livre no Brasil,
majoritariamente, compõe-se inicialmente por imigrantes, graças à crença na indolência, na
inaptidão da mão-de-obra nativa – ‘preguiçosa por natureza’, ‘inapta a qualquer tipo de
trabalho heterônomo’, ‘avessa ao espírito mercantil’; tal perspectiva exigiu a desconstrução
desta imagem e uma nova representação do elemento nacional. No bojo de tais
transformações, dá-se a transição da educação profissional de uma visão assistencialista, para
uma preocupação focada mais especificamente na preparação de mão de obra operária
consoante as novas demandas da incipiente industrialização.
Com as guerras, reduz-se o número de imigrantes; além disso, os produtos importados
dos países beligerantes tinham que ser, na medida do possível, produzidos internamente,
condições que impulsionaram a industrialização nacional. Acresça-se o fato de que esta já
apresentava uma tecnologia que exigia mão-de-obra pouco qualificada, o que, contudo, não
dispensava a necessidade de núcleos seletos de trabalhadores qualificados - intermediários
entre engenheiros e os “peões”.
57
Na realidade, “o mundo do trabalho é segmentado e heterogêneo” (RIBEIRO, 2009),
não comportando generalizações simplistas; se, outrora, a abertura das primeiras fábricas no
país não exigiam requisitos de qualificações de alto nível - pois, quando imprescindível, eram
importados operários, juntamente com as máquinas - o novo momento histórico reivindicava
qualificação, mesmo que de um seleto grupo de trabalhadores “nativos”.
Podemos citar como exemplo, o ramo da construção civil, mormente as grandes obras
arquitetônicas, com as suntuosas e imponentes edificações, tanto públicas quanto privadas,
que abrigavam diferentes instituições; tais empreendimentos exigiam trabalhadores talhados
em diferentes ofícios, essenciais na concepção e execução, no acabamento, na decoração de
interiores, ensejando demandas de mobiliário, marcenaria, carpintaria, serralharia, hidráulica,
dentre outras (mobiliário em madeira e ferro, as escadarias, as fechaduras e dobradiças, parte
hidráulica, etc.).
Neste universo do trabalho, o desenvolvimento de habilidades técnicas era um
requisito indispensável para outros setores produtivos, como na indústria metal-mecânica, nos
transportes, mormente as ferrovias, dentre outros; o que viria a suscitar uma cadeia de
atividades produtivas correlatas, novos nichos de mercado, sendo premente ampliar a
formação desses segmentos de trabalhadores para responder às solicitações do mercado e,
outrossim, baratear o custo dessa mão de obra qualificada, mediante as leis de oferta e
procura.
Desta forma, as poucas e incipientes instituições de ensino compulsório de ofícios
artesanais cederam lugar a verdadeiras redes de escolas, resultado de iniciativas do Estado (na
esfera municipal, estadual e federal) e de outros protagonistas da sociedade civil, deslocando
o foco na composição da clientela, agora não mais de menores indigentes e desafortunados,
mas centrada na formação e disciplinamento em larga escala do trabalhador nos moldes das
necessidades do mercado.
O caráter elitista e dual do sistema educacional foi ainda mais corroborado no Estado
Novo, que institui uma política educacional de legitimação do dualismo estrutural, reforçando
a divisão entre trabalho manual e intelectual, entre ensino profissional e propedêutico - este
destinado às elites, as quais objetivavam o ensino superior - enquanto a educação profissional
era marginalizada, estigmatizada, direcionada às classes trabalhadoras, configurando o caráter
assistencialista do ensino, de preparação para um ofício, com cunho pragmático para
58
atendimento dos interesses dos setores produtivos.
Na Era Vargas são marcos no campo educacional a reforma Francisco Campos no ano
de 1931 e uma década depois, a reforma Capanema, já sob a égide do Estado Novo, reforma
esta que organizou nacionalmente o ensino técnico profissionalizante, normatizando a
dualidade, estabelecendo dois sistemas paralelos e independentes, a saber, propedêutico e
profissional, materializando a divisão social e técnica do trabalho, ensejando escolas
diferenciadas para clientelas diferenciadas, aguçando o caráter discriminatório, ao não
viabilizar aos egressos do ensino profissionalizante o acesso ao ensino superior.
A correspondência entre o ensino secundário e técnico inicia-se na década de 1950,
adquirindo equivalência plena com a LDB de 1961, primeira lei de diretrizes e bases da
educação que permitia aos concluintes do ensino técnico pleitear a candidatura a qualquer
curso superior.
A partir de meados dos anos 1960, particularmente durante o “milagre econômico”
(1968 a 1973), a educação profissional assume destaque, na medida em que atendia às
demandas da produção, num período em que a economia crescia aceleradamente, fazendo-se
necessário capacitar de forma rápida a força de trabalho. É neste interregno, precisamente no
ano de 1968, que se regulamenta a profissão de técnico de nível médio, atribuindo a este o
papel intermediário entre os trabalhadores não qualificados e o nível superior hierárquico no
processo produtivo.
Acordos assinados pelo governo militar com a USAID (United States Aid International
Development) acenaram para a maximização das matrícula nos cursos técnicos,
na
formatação exigida pela divisão internacional do trabalho, concomitante à divisão social e
técnica do trabalho nos moldes do fordismo-taylorismo. A grande procura por empregos,
impulsionada pela acelerada urbanização, passou a exigir, gradativamente, como critério
seletivo preliminar, uma maior escolaridade dos candidatos às vagas de emprego. Por
conseguinte, uma maior pressão pela oferta de ensino superior.
No contexto acima referido, impõe-se a profissionalização compulsória no ensino
secundário, instituída pela Lei n.º 5.692/71 (BRASIL, 1971), a qual asseverava a extinção da
separação entre a escola secundária e a escola técnica, estabelecendo uma “escola única”
profissionalizante de nível secundário; contudo, o lastro histórico e social do legado dualista,
59
manifestado por educandos e respectivos genitores, empresários do ensino, representantes de
setores da burocracia estatal e de instituições de formação profissional, mobilizaram-se no
sentido de reverter ou desfigurar a referida lei. Assim, reiteradas pressões promoveram
adequações na Lei n.º 5.692/71, tendo o Parecer do Conselho Federal de Educação (CFE) n.º
76/75 considerado a possibilidade de os cursos não levarem a uma habilitação técnica
(FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 33-34); por fim, a Lei n.º 7.044/82 (BRASIL,
1982), finalmente, revogou a profissionalização obrigatória do ensino secundário.
O dualismo, nesse momento, porém, difere do período anterior à LDB de 1961, já
que ocorre preservando a equivalência entre os cursos propedêuticos e técnicos. A
marca desse dualismo não estava mais na impossibilidade de aqueles que cursavam
o ensino técnico ingressarem no ensino superior, mas sim no plano dos valores e dos
conteúdos da formação. No primeiro caso, o ideário social mantinha o preceito de
que de que o ensino o técnico destinava-se aos filhos das classes trabalhadoras cujo
horizonte era o mercado de trabalho, e não o ensino superior. No segundo caso,
enquanto a Lei n. 5.692/71 destinava que na carga horária mínima prevista para o
ensino técnico de segundo grau (2.200 horas) houvesse a predominância da parte
especial em relação à geral, a Lei n. 7.044/82, ao extinguir a profissionalização
compulsória, considerou que nos cursos não profissionalizantes às 2.200 horas
pudessem ser totalmente destinadas à formação geral. Com isto, os estudantes que
cursavam o ensino técnico ficavam privados de uma formação básica plena que, por
sua vez, predominava nos cursos propedêuticos, dando àqueles que cursavam esses
cursos, vantagens em relação às condições de acesso ao ensino superior e à cultura
geral. (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 33-34).
Neste diapasão, interessante expor detalhes da principal rede de formação profissional
no Brasil, qual seja, o Sistema S, o qual nasceu no fim do Estado Novo, ainda no contexto da
Era Vargas, nos anos 1940, no mandato do então Presidente da República Eurico Gaspar
Dutra. Esse Sistema S constituiu-se numa rede para-estatal, administrada pela classe patronal,
mediante suas entidades sindicais representativas (federações e confederações), sendo a
primeira delas o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), criado em 1942,
sendo seguido pela criação do Serviço Social da Indústria (SESI), em 1946; ambos surgiram
como resposta à expansão da indústria, na conjuntura das políticas desenvolvimentista de
Vargas, (“modelo de substituição de importações”).
O Sistema S emergiu como uma estratégia, capitaneado por frações da liderança
empresarial, para responder à necessidade emergencial de formação de mão de obra, frente ao
surto de expansão da indústria e a drástica redução da imigração provocada pela guerra. A
criação de referido sistema, particularmente o SENAI e o SESI, intencionava, dentre outros
objetivos, debelar a mobilização de segmentos do operariado ‘contaminados’ pela ascensão do
comunismo, bem como mitigar os pleitos dos trabalhadores por melhorias das condições de
trabalho e existência, propósito estes que revelavam os embates políticos e ideológicos com
60
os setores organizados do operariado industrial.
No que diz respeito ainda ao Sistema S, este se constituiu em mecanismos de
intervenção direta das lideranças empresariais na formulação e implementação de diretrizes
‘racionalizadoras’ no ambiente industrial e fora deste, defendendo um projeto de sociabilidade
concatenado com os interesses dos segmentos empresariais. Em sua origem,
os projetos de construção do SENAI e SESI fazem, portanto, parte da estratégia
empregada pelos industriais paulistas para disciplinar o trabalhador brasileiro e
garantir a paz social, alicerçando-se nas premissas de colaboração entre capital e
trabalho e na representação de que o desenvolvimento industrial conveniente aos
empresários também interessa aos trabalhadores e a todos os brasileiros,
independentemente da condição de classe (MANFREDI, 2002, p. 182).
Por sua vez, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) e o Serviço
Social do Comércio (SESC), criados em 1946, no governo do presidente Eurico Gaspar
Dutra, surgem da mobilização dos empresários do comércio, tendo como marco a
“Conferência das Classes Produtoras do Brasil”, realizada no Rio de Janeiro em 1945, do qual
resulta a “Carta da Paz Social”, documento que expõe a necessidade de criação das referidas
instituições. O sistema S compõe-se de outros órgãos representativos de diferentes entidades
empresariais: SENAR (1976), SENAT (1993), SEST (1993), SEBRAE (1990), (MANFREDI,
2002).
Como já foi dito anteriormente, as práticas educacionais não estão dissociadas de uma
inserção no tempo e espaço, de uma materialidade e subjetividade histórica, emanando
tensões e contradições quanto à sua funcionalidade na reprodução ou transformação das
estruturas sociais, não podem ser pensadas abstraídas desse lastro histórico; a partir desse
pressuposto, entende-se que a dualidade que marca o sistema educacional brasileiro passa
necessariamente pelo papel, pela funcionalidade da educação associada ao modelo de
desenvolvimento econômico prevalecente num determinado contexto, bem como emanada
das estruturas produtivas e da ação dos atores sociais que norteiam as práticas educacionais,
tanto no âmbito macro quanto micro.
A segmentação (dualidade) do sistema educacional brasileiro reproduz o modo de
produção, as relações sociais de produção, as configurações de classes que perpassam o
processo histórico de formação nacional, caracterizado pela persistência de um modelo de
sociedade excludente e profundamente desigual, configurando um dos mecanismos estruturais
de reprodução das relações de produção hegemônicas historicamente situadas e em espaços de
61
luta de atores sociais em defesa de seus interesses.
As transformações das forças produtivas, emanadas do capitalismo, na medida em que
suscita a necessidade de formação da força laboral minimamente qualificada e docilizada,
juntamente com a ação política de segmentos dos trabalhadores, demanda a necessidade da
“universalização” da escola (dualista), constituindo redes institucionais educacionais
diferenciadas para clientelas (classes) distintas.
O quadro nacional de educação retrata a acentuada conflitividade, produto da
contradição entre as ações de classes e segmentos de classes para manter inalterados os
privilégios do sistema escolar, atrelados à manutenção e reprodução das condições materiais
de produção, bem como os embates promovidos pelas forças populares para democratizar o
acesso a uma escola de qualidade, que possa contribuir para as transformações de suas
condições de existência.
Historicamente, denota-se a recorrente preocupação com a contenção de classes, numa
tentativa de reforçar o velho dualismo estrutural, para que estas permaneçam onde estão, o
que perpassa pela história educacional brasileira, configurando esta numa fronteira/barreira de
classes que direciona as camadas populares à formação profissionalizante, básica e técnica,
aligeirada e superficial e o ensino superior para a formação das elites.
Desse modo, quando se massifica a educação de nível básico, o que, de fato, se deu na
última década, a barreira da exclusão se transfere para o interior do sistema educacional,
degradando a qualidade, discriminando a clientela foco dessa educação, reforçando a
dualidade quantidade versus qualidade.
A remercantilização e refilantropização da educação propagada pela onda neoliberal
transmuta um direito (conquista histórica), em um bem de consumo acessível à capacidade
aquisitiva dos indivíduos consumidores, bem como transfere para a sociedade, mediante
solidariedade e filantropia, a responsabilidade por aqueles que não podem pagar por tais bens,
desobrigando o estado e o capital desta função, o que compõe parte da estratégia de
reestruturação produtiva do capital.
A dualidade perpassa a história da educação nacional, concomitante a manutenção de
um modelo de sociedade excludente e concentrador de renda e acesso aos bens materiais e
imateriais, tendo a educação (sistema educacional) à funcionalidade de reprodução das
62
estruturas de relações sociais de produção, ao mesmo tempo em que se compõe como espaço
de disputa hegemônica de diferentes atores sociais e respectivos projetos de educação e
sociedade.
A tentativa de profissionalização compulsória implementada pela Lei 5.692/71, em
plena ditadura civil-militar, corresponderia, em tese, a tentativa de implementar uma escola
unitária (profissionalizante) que não se efetivou, por contrariar interesses hegemônicos
diversos, particularmente, com o rompimento com a tradição do ensino propedêutico
academicista focada no ensino superior, dirigido às elites e às classes médias, e o ensino
profissionalizante para os estratos inferiores.
Acrescente-se ainda a falta de infraestrutura das escolas públicas das redes estaduais e
municipais para efetivar tal proposta, eis que demandaria construção de laboratórios,
aquisição de equipamentos, capacitação e contratação de pessoal, o que implicaria,
necessariamente, grandes investimentos e novas estratégias pedagógicas. Tudo isso viria a
extrapolar o intento do projeto, a estratégia do governo de acelerar a formação de mão de obra
técnica num momento de acelerado crescimento econômico (‘milagre econômico’) ao mesmo
tempo em que continha a demanda pelo ensino superior.
Finalizando este tópico, teceremos um sucinto histórico da Escola Técnica Federal de
Pernambuco, de sua gênese à atualidade, sucinto, reitere-se, pois o tema já foi abordado neste
capítulo, optamos por um brevíssimo histórico de sua existência.
O que hodiernamente se tem como Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Pernambuco, teve sua célula embrionária inaugurada em 23 de setembro de
1909, mediante Decreto n.º 7.566/1909, emitido pelo então Presidente da República Nilo
Peçanha, tendo, como exposto, por objetivo a oferta de ensino profissional primário gratuito,
direcionado aos “desfavorecidos da sorte”, como uma espécie de “asilo”. Quando inaugurado,
suas instalações eram no bairro do Derby, na capital pernambucana, onde hoje se encontra a
Fundação Joaquim Nabuco e o Colégio da Polícia Militar de Pernambuco; mais tarde, em
1923, foi transferido para novo endereço, desta vez, na Rua da Aurora, onde hoje funciona o
Ginásio Pernambucano, ocupando a parte posterior deste. Em 1933, retornou à antiga
instalação no Derby, onde funcionou até 1975, quando foi transferido para a atual sede, na
Cidade Universitária, devido à enchente que atingiu a capital. A nova sede, hodiernamente,
constitui-se numa das maiores sedes de IF no país, o quarto em área construída.
63
Ao longo deste período, o IFPE apresentou varias denominações: Escola de
Aprendizes e Artífices do Recife, Liceu Industrial, Escola Técnica do Recife, Escola Técnica
Federal de Pernambuco, Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco e
recentemente, em 28 de dezembro de 2008, assumiu a condição de Instituto (Lei 3775/2008).
A condição de Instituto ocorreu com a integração do Centro Federal de educação de
Pernambuco, das Escolas Agrotécnicas Federal de Barreiros, de Belo Jardim e de Vitória de
Santo Antão.
Atualmente, o IFPE oferta cursos técnicos integrados ao ensino médio e pós-médio
(ou sequencial): Segurança do Trabalho, Eletrônica, Mecatrônica, Eletrotécnica, Saneamento
Ambiental, Edificações, Química Industrial, Química, Telecomunicações, Mecânica
Industrial, Turismo, Refrigeração e Ar Condicionado, Enfermagem, Agropecuária,
Agroindústria, agricultura, Zootecnia, Informática, Automação Industrial, Petroquímica,
Construção Naval, EAD (ensino a distância) em Informática para Internet, assim como os
cursos superiores em Licenciatura em Geografia, Design Gráfico, Gestão Ambiental,
Radiologia, Análise e Desenvolvimento de Sistemas, Gestão de Turismo, Engenharia de
Produção Civil, Licenciatura em Matemática, Licenciatura em Física, Licenciatura em
Química, Licenciatura em Música, Licenciatura em Agroecologia, EAD em Gestão
Ambiental, EAD em Licenciatura em Matemática.
A distribuição espacial do novo instituto compreende o Campus Recife localizado na
capital de Pernambuco, onde também aloja-se a Reitoria no mesmo prédio e o campus de
Ipojuca, na região metropolitana; na Zona da Mata tem-se o campus de Vitória de Santo
Antão e Barreiros, no Agreste temos os campus de Pesqueira, Belo Jardim, Caruaru e
Garanhuns e o sertão dispõe de um campus na cidade de Afogados da Ingazeira.
64
4
CAPÍTULO – A REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO GOVERNO
FHC
4.1
Breve Histórico do Cenário Nacional em que se Contextualiza a (Contra) Reforma
A escola capitalista está marcada por uma contradição fundamental, isto é, a de que
as classes dominantes se procuram servir dela, para formar uma mão de obra dócil e
submissa, sem grande preparação e pouco exigente, esforçam-se, ainda, por
selecionar um escalão médio, dotado de uma pequena qualificação, cuidando e
tomando precauções para que ele não alimente perspectivas exageradas e não se
sinta tentado a entrar em concorrência com os descendentes do patronato
(SNYDERS apud OLIVEIRA, 2003, p. 7).
O capitalismo, não recusa o direito à escola, [...], mas recusa-se a mudar a função
social dela. (SIMÕES, 2010, p. 109)
Seguiremos, agora, os passos trilhados pela história acerca do período de
redemocratização pós-ditadura civil militar de 1964; informamos que ela principia num
momento de crise econômica, que abre espaços a vozes dissonantes, eis que a referida crise
leva a uma de legitimidade.
Neste contexto, merece destaque a atuação dos movimentos sociais, os quais lutavam
pela distensão política e clamavam por reformas, participando ativamente do processo de
redemocratização que culminou na promulgação da Constituição de 1988, a qual trouxe
consideráveis avanços, promovendo as bases da proteção social que adota como referencial o
Estado de Bem-Estar Social.
A Constituição Cidadã, como ficou conhecida, carrega consigo a afirmação de
significativos direitos sociais e econômicos, numa perspectiva de ampliação do espaço
público; contudo, protelou as questões mais polêmicas, as quais ficaram inconclusas,
dependendo de leis complementares, como exemplo na educação tem-se a proposta da LDB.
A década de 1990 foi marcada por um movimento adverso, um retrocesso, ou espécie
de contrarreforma; em referido momento destaca-se a crise do Estado de Bem Estar, a
derrocada do comunismo real e o domínio do neoliberalismo. A primeira eleição direta pósditadura para presidente da república consagra a vitória de Fernando Collor de Melo, que traz
à tona uma nova agenda neoliberal, concatenada com os interesses do capitalismo financeiro.
No período em que estava previsto a revisão constitucional, eis que a Nova Constituição
estava ‘obsoleta’, “anacrônica”, era um “obstáculo” ao desenvolvimento, aos novos tempos,
segundo os ideólogos do mercado. Em 1994, Fernando Henrique Cardoso foi eleito e
65
implementou sistematicamente uma política neoliberal concatenada às orientações do
Consenso de Washington.
A constituição de 1988 surgiu na contramão da onda neoliberal no mundo, enquanto
no Brasil emergia um regime político pós-ditatorial, assumindo uma fisiologia legal –
promulgação da Constituição Cidadã – eminentemente imbuída da ideologia do Estado de
Bem Estar Social, por garantir direitos fundamentais e sociais, o mundo era surpreendido por
uma avalanche neoliberal que, em tese, afirmava-se a vitória da sociedade capitalista diante
do socialismo real, mediante um aparente ‘comprovação empírica’.
É de se registrar que, posteriormente a promulgação da Constituição Federal de 1988,
a agenda neoliberal foi, de logo, ensejada: era necessário dar ritmo ao Brasil (colocá-lo em
compasso com a “nova ordem mundial”). O ‘ritmo’ neoliberal principiou-se já no mandato do
Presidente Fernando Collor de Melo, através de reformas neoliberais com o processo de
abertura comercial concatenada ao novo modo de acumulação capitalista, que demandava
flexibilização das leis, contudo, como cediço, a legislatura do então presidente não se
completou.
É no governo de Fernando Henrique Cardoso que se consolida o processo de
reestruturação do Estado nos moldes da agenda neoliberal; nesse passo, a educação seguiu à
reboque o processo macro, momento em que foi ensejada uma série de reformas educacionais.
O argumento às reformas usado pelo governo FHC era o de adequação à nova “ordem
mundial”, eis que havia descompasso nas instituições de ensino; esta nova ordem requeria um
novo perfil de trabalhador, o que suscitou embates entre diferentes modelos de educação,
consubstanciados nas propostas da Lei de Diretrizes e Bases, todos eles apresentados em
forma de projetos de lei, que configuravam concepções de sociedade e educação distintos
entre si, outrossim, harmonizados aos interesse dos diferentes atores histórico-sociais, que
atuavam no parlamento.
Dentre os projetos, destaque-se o Projeto Jorge Hage (OLIVEIRA, 2003a), com
histórico de participação de várias entidades da sociedade civil comprometidas com a
educação democrática, laica, universal, gratuita e politécnica. O referido projeto se
contrapunha ao projeto do governo FHC, mais vinculado às propostas de caráter neoliberal,
dentre os quais o Projeto do Senador Darcy Ribeiro, aprovado como a Lei n.º 9.394/96 – nova
66
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
A mencionada LDB representou a vitória dos segmentos conservadores da sociedade,
na medida em que se apresentava com um formato minimalista, em cujas lacunas adentraram
muitas reformas. O tópico referente ao ensino profissional compõe o capítulo III, artigos 39 a
42
CAPÍTULO III
Da Educação Profissional
Art. 39º. A educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao
trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de
aptidões para a vida produtiva.
Parágrafo único. O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e
superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a
possibilidade de acesso à educação profissional.
Art. 40º. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino
regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições
especializadas ou no ambiente de trabalho.
Art. 41º. O conhecimento adquirido na educação profissional, inclusive no trabalho,
poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento
ou conclusão de estudos.
Parágrafo único. Os diplomas de cursos de educação profissional de nível médio,
quando registrados, terão validade nacional.
Art. 42º. As escolas técnicas e profissionais, além dos seus cursos regulares,
oferecerão cursos especiais, abertos à comunidade, condicionada a matrícula à
capacidade de aproveitamento e não necessariamente ao nível de escolaridade.
(BRASIL, 1996).
Nesse passo, imediatamente a aprovação da nova lei, o governo FHC intentou
regulamentar a LDB, lançando o Projeto de Lei n.º 1.603/96, o qual, por necessitar da
aprovação do Congresso, não se concretizou, o que “forçou” o poder executivo a mudar de
estratégia, optando pela implementação da reforma do ensino profissional mediante
regulamento autônomo do poder executivo, ou o Decreto n.º 2.208/97, o qual continha em sua
essência as mesmas concepções dispostas naquele projeto inerte, que foi, posteriormente,
retirado de discussão no parlamento.
Portanto, o Decreto citado foi imposto de forma autoritária, na medida em que
prescinde - ao contrário do projeto de lei – de emendas, substitutivos ou outras formas de
intervenção legislativa, exceto com revogação pelo parlamento:
Antes de dezembro de 1996, quando da aprovação da Lei 9.394/96, a forma legal
para essa regulamentação era através de projeto de lei, por isso o Executivo Federal
apresentou o PL 1.603/96. Mas, a partir da aprovação da nova LDB o governo
federal passou a ter em mãos a possibilidade legal de regulamentar o ensino
profissional mediante decreto. Retirou o PL, com pretexto de reformá-lo em vista da
nova LDB aprovada, e apresentou o Decreto 2.208/97. (MARTINS, 2000, p. 80).
67
A reforma educacional brasileira implementada a partir da Lei nº 9.394/96, e, em
particular, a reforma da educação profissional, regulamentada pelo decreto nº 2.208/97,
consolidou a politica neoliberal e reafirmou o dualismo estrutural. O Decreto Nº 2.208/97
regulamenta o § 2º do art.36 e os arts. 39 a 42 da Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
É importante vislumbrar a normatização implementada, in litteris:
Decreto n.º 2.208/97. Art.2º A educação profissional será desenvolvida em
articulação como o ensino regular ou em modalidades que contemplem estratégias
de educação continuada, podendo ser realizada em escolas do ensino regular, em
instituições especializadas ou nos ambientes de trabalho.
Art. 3º A educação profissional compreende os seguintes níveis:
I - básico: destinado à qualificação, requalificação e reprofissionalização de
trabalhos, independentes de escolaridade prévia;
II - técnico: destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos
matriculados ou egresso de ensino médio, devendo ser ministrado na forma
estabelecida por este Decreto;
III - tecnológico: corresponde a cursos de nível superior na área tecnológica,
destinados a egressos do ensino médio e técnico.
Art. 4º A educação profissional de nível básico é modalidade de educação não
formal e duração variável, destinada a proporcionar ao cidadão trabalhador
conhecimentos que lhe permitiam reprofissionalizar-se, qualificar-se e atualizar-se
para o exercício de funções demandadas pelo mundo do trabalho, compatíveis com a
complexidade tecnológica do trabalho, o seu grau de conhecimento técnico e o nível
de escolaridade do aluno, não estando sujeita à regulamentação curricular.
§1º As instituições federais e as instituições públicas e privadas sem fins lucrativos,
apoiadas financeiramente pelo Poder Público, que ministram educação profissional
deverão, obrigatoriamente, oferecer cursos profissionais de nível básico em sua
programação, abertos a alunos das redes públicas e privadas de educação básica,
assim como a trabalhadores com qualquer nível de escolaridade.
§2º Aos que concluírem os cursos de educação profissional de nível básico será
conferido certificado de qualificação profissional.
Art. 5º A educação profissional de nível técnico terá organização curricular
própria e independente do ensino médio, podendo ser oferecida de forma
concomitante ou seqüencial a este.
Parágrafo único: As disciplinas de caráter profissionalizantes, cursadas na
parte diversificada do ensino médio, até o limite de 25% do total da carga horária
mínima deste nível de ensino, poderão ser aproveitadas no currículo de habilitação
profissional, que eventualmente venha a ser cursada, independente de exame
específicos.
Art. 6º A formulação dos currículos plenos dos cursos do ensino técnico
obedecerá ao seguinte:
I - o Ministério da Educação e do Desporto, ouvido o Conselho Nacional de
Educação, estabelecerá diretrizes curriculares nacionais, constantes de carga horária
mínima do curso, conteúdos mínimos, habilidades e competências básicas, por área
profissional.
II - os órgãos normativos do respectivo sistema de ensino complementarão as
diretrizes definidas no âmbito nacional e estabelecerão seus currículos básicos, onde
constarão as disciplinas e cargas horárias mínimas obrigatórias, conteúdos básicos,
habilidades e competências, por área profissional;
III - o currículo básico, referido no inciso anterior, não poderá ultrapassar
setenta por cento da carga horária mínima obrigatória, ficando reservado um
percentual mínimo de trinta para que os estabelecimentos de ensino, independente
de autorização prévia, elejam disciplinas, conteúdos, habilidades e competências
68
específicas da sua organização curricular;
§1º Poderão ser implementados currículos experimentais, não contemplados
nas diretrizes curriculares nacionais, desde que previamente aprovados pelo sistema
de ensino competente.
§2º Após avaliação da experiência e aprovação dos resultados pelo Ministério
da Educação e do Desporto, ouvido o Conselho Nacional de Educação, os cursos
poderão ser regulamentados e seus diplomas passarão a ter validade nacional.
Art. 7º Para a elaboração das diretrizes curriculares para o ensino técnico,
deverão ser realizados estudos de identificação do perfil de competências
necessárias à atividade requerida, ouvidos os setores interessados, inclusive
trabalhadores e empregadores.
Parágrafo único. Para atualização permanente do perfil e das competências de
que trata o caput, o Ministério da Educação e do Desporto criará mecanismos
institucionalizados, com a participação de professores, empresários e trabalhadores.
Art. 8º Os currículos do ensino técnico serão estruturados em disciplinas, que
poderão ser agrupadas sob a forma de módulos.
§1º No caso de o currículo estar organizado em módulos, estes poderão ter
caráter de terminalidade para efeito de qualificação profissional, dando direito, neste
caso, a certificado de qualificação profissional.
§2º Poderá haver aproveitamento de estudos de disciplinas ou módulos
cursados em uma habilitação específica para obtenção de habilitação diversa.
§3º Nos currículos organizados em módulos, para obtenção de habilitação,
estes poderão ser cursados em diferentes instituições credenciadas pelos sistemas
federal e estaduais, desde que o prazo entre a conclusão do primeiro e do último
módulo não exceda cinco anos.
§4º O estabelecimento de ensino que conferiu o último certificado de
qualificação profissional expedirá o diploma de técnico de nível médio, na
habilitação profissional correspondente aos módulos cursados, desde que o
interessado apresente o certificado de conclusão do ensino médio.
Art. 9º As disciplinas do currículo do ensino técnico serão ministradas por
professores, instrutores e monitores selecionados, principalmente, em função de sua
experiência profissional, que deverão ser preparados para o magistério, previamente
ou em serviço, através de cursos regulares de licenciatura ou de programas especiais
de formação pedagógica.
Parágrafo único. Os programas especiais de formação pedagógica a que se
refere o caput serão disciplinados em ato do Ministério de Estado da Educação e do
Desporto, ouvido o Conselho Nacional de Educação.
Art. 10º Os cursos de nível superior, correspondentes à educação profissional
de nível tecnológico, deverão ser estruturados para atender aos diversos setores da
economia, abrangendo áreas especializadas, e conferirão diploma de Tecnólogo.
Parágrafo único.O conjunto de certificados de competência equivale a todas as
disciplinas em módulos que integram uma habilitação profissional dará direito ao
diploma correspondente de técnico de nível médio. (BRASIL, 1998).
Considerando o decreto supracitado, é importante destacar como o mesmo está
concatenado e explica-se por àquele momento histórico, nas condições materiais
historicamente estabelecidas de predomínio do modo de acumulação capitalista flexibilizado
sob a hegemonia neoliberal, consolidando, normatizando, legitimando uma nova
sociabilidade, erigida num contexto de flagrante assimetria de forças favorável ao capital. Isso
se percebe no desmonte do Estado Providência, - ou, como no Brasil, que se inspira neste despublicizando os direitos sociais conquistados historicamente, remercantilizando-os,
destituindo-os do caráter universal, exaltando e naturalizando as diferenças, entenda-se,
desigualdades, como fator positivo e imprescindível ao progresso humano.
69
É neste diapasão que a reforma instituída no Governo FHC pode ser concebida como
uma contra-reforma, na medida em que posicionou-se como óbice às garantias asseguradas
com a Constituição Cidadã de 1988, eis que se buscou privatizar a educação, um dos direitos
ali garantidos, tudo concatenado ao paradigma neoliberal de Estado Mínimo. Desse modo, na
esteira do entendimento neoliberal, os recursos disponibilizados para a educação existentes
eram suficientes para concretizar aquela, sendo necessária, tão-somente, uma mudança no
gerenciamento dos mesmos, otimizando-os, já que, para os teóricos neoliberais, o Estado,
sobretudo o de formatação de Bem-Estar, era incapaz de promover uma educação de
qualidade, por apresentar-se como perdulário e ineficiente.
Nesta nova ótica FHC, a educação não pode ser observada como obrigação exclusiva
do Estado, mas de toda sociedade, em decorrência disso, o Estado docente, típico do
Keynesianismo, transmuda-se em Estado avaliador, revelando explicita contradição, a saber,
temos um Estado mínimo com relação aos gastos sociais e um Estado forte controlando a
implementação de diretrizes elaboradas centralmente, buscando viabilizar o intento temos o
fortalecimento dos instrumentos de avaliação já existentes e surgimento de novos meios
avaliativos.
Portanto, a reforma no governo FHC deve ser compreendida dentro do conjunto de
reformas educacionais gestados pela nova LDB e pelo Decreto-lei n° 2.208/97, o qual impôs a
reforma do ensino profissional, que acarretou, como reiteradamente observado, uma mudança
substancial na estrutura das Escolas Técnicas Federais, suscitando a transformação das
mesmas em CEFET.
A restruturação educacional vinculou-se a um processo mais amplo, de flexibilização
produtiva e financeira. A reforma do sistema educacional atendeu a resolução da crise fiscal
do Keynesianismo a partir da ótica neoliberal, proposta que difundiu a desregulamentação, a
redução da responsabilidade do Estado (Estado mínimo) na prestação dos serviços públicos.
As reformas implementadas no CEFETPE inserem-se no contexto macro das políticas
neoliberais, de desmonte do Estado, resultado de uma política de desvalorização do servidor
público, simultaneamente ao desmonte da instituição em si através da precarização da
infraestrutura, das condições de trabalho, do “arrocho salarial”, da demonização dos
servidores e do Estado, do intento de revogação de direitos do funcionário público, tidos
como privilégios; todas essas medidas resultaram em aposentadorias em massa e a não
70
reposição dos quadros, agravando o déficit de docentes, a terceirização, mediante
intensificação da utilização de professor substituto, como estratégia de “racionalizar”
(baratear) os custos, tudo para atender às orientações macro econômicas atreladas às diretrizes
do Fundo Monetário Internacional e agências congêneres.
Segundo dados apresentados Lesbaupim (2002) e Adhemar Ribeiro, nas despesas da
União com educação, em geral, entre os anos de 1995 a 2000, houve um decréscimo de 20,3%
para 8,9% da receita corrente líquida. No mesmo período, as despesas com o ensino superior
reduziu-se de 9,2% para 4,2%. Os autores destacam a disparidade dos números quando
comparados com os gastos com os juros da dívida, que tiveram um aumento substancial de
24,9% para 55,1% do Produto Interno Bruto (PIB).
A leitura de relatórios de gestão do CEFET/PE, no período de implementação das
reformas da educação profissional na gestão FHC, demonstra as dificuldades frente à escassez
de recursos para o custeio; no Relatório de Gestão do CEFET/PE, ano 2000, são explicitadas
as dificuldades orçamentárias e financeiras da instituição:
[...] quanto às despesas consideradas típicas de manutenção, [...] a falta de uma
política de programação financeira por parte do tesouro nacional, o que gerou
constante atrasos nos repasses financeiros, deixando esta escola, muitas vezes, em
situação delicada, tendo que reprogramar a execução de metas de fundamental
importância, como pagamentos de suas despesas contratuais, anteriormente
firmadas, aquisição de material didático, [...], pagamento de 23 empresas
contratadas, além de obrigações que envolve a própria sobrevivência da instituição,
como gastos com energia, telefone, água, manutenção de equipamentos e reprodução
gráfica (CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE
PERNAMBUCO, 2000, p. 35-36).
A mesma observação revela-se nos relatórios de gestão dos anos de 1998 (1942-1943)
e de 2002. Apesar da escassez de recursos, o planejamento estratégico do CEFET/PE neste
último relatório previa a ampliação da oferta de vagas em 60% (sessenta por cento) até o ano
2005, considerando ainda a proibição de contratação de novos docentes, demonstrando toda a
contradição entre a precarização da infraestrutura e custeio frente à exigência do aumento de
vagas.
A formação técnica proposta pelo Decreto n. 2.208/97 situa-se na contramão de uma
orientação articulada e integrada a uma formação científico-tecnológica e humanística, a qual
enseja ao indivíduo elementos para a compreensão dos fundamentos técnicos, sociais e
políticos na perspectiva de sua autonomia e emancipação como sujeito histórico.
71
O decreto ratifica a dicotomia social – separação entre escola da elite e outra dos
trabalhadores – assumindo a noção fordista/taylorista de trabalho, resultado do aprimoramento
da divisão técnica do trabalho, objetivando baratear o custo da mão-de-obra assalariada,
mediante a separação entre concepção e execução, cabendo ao trabalhador apenas a execução
de uma atividade planejada a sua revelia, desabilitando-o, diminuindo seu preparo, na medida
em que não mais dominam os conhecimentos, as habilidades em sua totalidade do processo.
Consequentemente, há o barateio do valor da força de trabalho, tornando-o facilmente
substituível no mercado. Cabia ao operário a execução repetitiva de tarefas, antes
cuidadosamente planejadas e padronizadas antes de ser rígida e mecanicamente estabelecida
(MARTINS, 2000, p. 82)
No entanto, os trabalhadores não podem ser expropriados de forma absoluta dos
conhecimentos, porque, sem conhecimento, eles não podem produzir e, se eles não
trabalham, não acrescentam valor ao capital. Desse modo, o capitalismo
desenvolveu mecanismos pelos quais procura expropriar o conhecimento dos
trabalhadores e distribuí-los de forma parcelada. O taylorismo é a expressão dessa
contradição (SIMÕES, 2010, p. 112)
No capitalismo, o desenvolvimento das forças produtivas atinge intensidade e
velocidade ímpares na história humana, desse modo, a ciência é agregada ao trabalho
produtivo, convertendo-se em potencialidade material a serviço do capital que a financia. O
conhecimento se converte em força produtiva e, portanto, em meio de produção. A ciência
como modalidade de conhecimento é instrumento de poder e monopólio da escola formadora
dos dirigentes, enquanto a outra é voltada à educação profissional dos trabalhadores,
qualificação de mão de obra, diretamente atrelada a uma tarefa ou ocupação no mercado de
trabalho, apresentando um conhecimento de forma parcelado e controlada, cabendo aos
trabalhadores:
[...] dominar um conjunto de conhecimentos necessários para serem eficientes no
processo produtivo, mas não devem ultrapassar esse limite. Nesse quadro é que se
delimita a concepção de profissionalização, de ensino profissionalizante no
capitalismo: fragmentação do trabalho em especialidades autônomas. Tal concepção
implica a divisão entre os que concebem e controlam o processo de trabalho e
aqueles que executam. O ensino profissional é destinado àqueles que devem
executar, ao passo que o ensino científico-intelectual é destinado àqueles que devem
conceber e controlar o processo (SIMÕES, 2010, p. 112).
O decreto n.º 2.208/97, diferentemente do discurso oficial, pautou-se no paradigma
taylorista/fordista de produção, caracterizado pela dualidade entre planejamento e execução,
forjado no contexto do pacto keynesiano, marcado pela estabilidade, homogeneidade,
verticalidade, operário massa, como demonstrado alhures, alicerçado em processos de
72
produção de base eletromecânica, minuciosamente estruturados, que não ensejavam
intervenções criativas significativas para a maioria dos trabalhadores.
Tal modelo se caracteriza pela rigidez do processo, embasado na separação entre
concepção e execução, em que a educação dual, àquela destinada aos trabalhadores,
fundamenta-se de treinamento em habilidades, as quais, no transcurso de sua vida
profissional, desempenhavam com pequenas variações. É um processo educativo cuja
habilidade cognitiva a ser trabalhada era a memorização, articulada ao disciplinamento, que
combinavam com o desenvolvimento de habilidades psicofísicas e comportamentos com
alguns conhecimentos, apenas o necessário para o exercício do ofício. “Compreender os
movimentos e passos necessários a cada operação, memorizá-los e repeti-los em uma
determinada sequência demandava uma pedagogia que objetivasse a uniformidade de
respostas para procedimentos padronizados” (KUENZER, 2009, p. 7).
Contudo, as transformações advindas no universo do trabalho, a partir dos anos 90,
suscitaram mudanças no processo de formação profissional, decorrente das novas demandas
do capitalismo, atreladas ao novo modelo de acumulação flexível. Enquanto no
taylorismo/fordismo a relação entre trabalho e educação:
é mediada pela força física, pelas mãos ou por habilidades específicas que
demandavam coordenação fina ou acuidade visual, para dar apenas alguns
exemplos, passa a ser medida pelo conhecimento compreendido enquanto
domínio de conteúdos e de habilidades cognitivas superiores (KUENZER, 2009,
p. 9).
As mudanças das bases tecnológicas, transitando da eletromecânica para a
microeletrônica resultaram na passagem dos procedimentos rígidos para os flexíveis,
demandando um novo perfil de trabalhador e, por conseguinte, uma nova formação
profissional. Esta requer da força laboral níveis mais altos de conhecimento e de criatividade,
que se traduz em maior (e melhor) escolaridade, com ênfase nas habilidades cognitivas,
comunicativas e criativas – agregando saberes cognitivos, psicomotores e sócio-afetivos,
demandando um novo perfil laboral, o que não significa a ruptura total com o modelo
taylorista-fordista anterior. Nas palavras de Kuenzer, eis o que ocorre:
[...] ao contrário do que diz o novo discurso do capital, a cisão entre trabalho
intelectual, que compete cada vez a um número menor de trabalhadores, estes sim,
com formação flexível resultante de prolongada e continuada formação de
qualidade, e o trabalho instrumental cada vez mais esvaziado de conteúdo.
(KUENZER, 2009, p. 12)
73
Observa-se uma maior heterogeneidade, complexidade da classe laboral e a
persistência de contingente enorme de trabalhadores nos moldes taylorista/fordista e uma
maior intensificação dos níveis de exploração do trabalhador mediante novas estratégias do
capital no novo regime de acumulação flexibilizada. A alegada substituição do operário
especializado pelo operário polifuncional, criativo e autônomo é pura retórica, mascara a
exacerbação da exploração, na qual o trabalhador executa várias tarefas antes de incumbência
de outros profissionais que são dispensados como estratégia de redução de custos.
O decreto presidencial (2.208/97) reforçou a dualidade estrutural, assemelhando-se em
parte a reforma promovida pelo Estado Novo, ao criar duas modalidades de ensino: o
propedêutico e o profissional (concomitante ou sequencial, isto é, concomitante como ensino
médio ou após o término do mesmo), duplamente, tanto legal quanto social; na primeira vem
estabelecer a separação entre educação profissional, média e social ao oferecer cursos
especiais e programas de formação inicial para o trabalhador descuidando da escolaridade
deste.
Contudo, o anacronismo do Decreto 2.208/97, frente ao novo perfil laboral demandado
pelas mudanças da base tecnológica das foças produtivas, não é paradoxal:
não significa que a regulamentação do ensino profissional no Brasil ocorreu em
desacordo com a lógica imposta pelo capital internacional. Pelo contrário, essa
regulamentação apresenta-se em profunda sintonia com os ditames da 'nova
ordem', na medida em que estabelece papéis diferentes às nações, a saber:
algumas poucas, as mais desenvolvidas, são as protagonistas e o restante, as
empobrecidas, as figurantes (MARTINS, 2000, p. 84).
Cabe às figurantes, apenas, aplicar a ciência e a tecnologia desenvolvidas pelos
protagonistas, conforme a divisão internacional do trabalho.
4.2
As Agências Internacionais, o PROEP e a Cefetização da ETFPE
As agências internacionais, tais como Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional
e Banco Interamericano de Desenvolvimento, entre outras, atuaram, incisivamente, como
mentores, propagadores e implementadores das politicas neoliberais de reestruturação dos
Estados Nacionais, sobretudo nos países da periferia do capitalismo, adequando-os aos
interesses dos países centrais do capitalismo globalizado, das grandes corporações e do
capital, mormente o financeiro. Atuavam de maneira articulada e complementar,
condicionando a liberação de recursos – empréstimos - ao atendimento de suas orientações
74
pautadas na ortodoxia neoliberal.
Dessa forma, as orientações das políticas educacionais precisam ser compreendidas
sempre em complementariedade às orientações macroeconômicas. Contudo, ressalte-se que
esta tutela não foi mera imposição externa, uma vez que existia uma grande anuência de
grupos nacionais poderosos, configurando-se como uma opção política consciente das elites,
que trocaram o “desenvolvimentismo” por uma estratégia de abertura e desregulação
econômica com vistas a uma transnacionalização radical dos centros de decisões, não se
configurando apenas como subserviência (FIORI, 2002, p. 11).
Não se trata de simples imposição, as agências multilaterais contam nos seus quadros
com técnicos, intelectuais, articulistas da grande mídia, acadêmicos, geralmente economistas,
os quais comungam de suas ideias, atuando não só como executores do receituário, mas como
propositores de políticas, concatenados ideologicamente à visão de mundo dessas agências.
Habitualmente, referidos técnicos transitam da esfera do Estado para as agências e
destas para aquele, ocupando cargos no primeiro e segundo escalão do governo e, após
concluírem seus mandatos, retornam às agências, evidenciando uma promiscuidade entre o
publico e o privado. Promiscuidade de interesses, eis que os mesmos indivíduos que
ocupavam cargos importantes na iniciativa privado, são nomeados para cargos estratégicos no
Estado, como no Banco Central, por exemplo, e ao saírem retornam as instituições
financeiras, ou passam atuar em consultorias, auferindo grandes vantagens pecuniárias. Tal
situação denota as relações de interesses que permeiam as mediações entre governo e agências
multilaterais, interesses pessoais, de grupos sociais, classes, frações de classes que atuam no
jogo político, e da correlação de forças desses atores.
A atuação do Banco Mundial e agências congêneres já se fazia marcante nas décadas
de 1960 e 1970 do século passado, por financiar projetos de desenvolvimento, mediante
concessão de empréstimos nas áreas de infraestrutura, indústria e agricultura, patrocinando a
modernização desta última; contudo, este modelo de crescimento configurou-se como um
modelo de desenvolvimento concentrador de renda e como associado dependente aos países
centrais do capitalismo internacional (TOMAZI, 2003), o que evidencia a aliança de classes, e
de segmento de classes nacionais associadas aos interesses do capital internacional.
A partir da década e 1980, o Banco Mundial, em particu’ lar, e o Fundo Monetário
75
Internacional, em face da emergência da crise de endividamento dos países periféricos “em
desenvolvimento”, mudaram sua atuação, aquele se transmutando de um banco de incentivo
ao desenvolvimento, indutor de crescimento, reitere-se concentrador de renda, a uma
instituição gestora da crise de endividamento e guardião dos interesses dos credores
internacionais, dos países centrais e de suas corporações econômicas, do capital globalizado,
atuando ostensivamente para garantir o pagamento da dívida externa e empreender a
reestruturação neoliberal das economias desses países, moldando-as aos interesses do capital
globalizado e ao novo modelo de acumulação flexível do capital (SOARES, 2003).
Segundo Haddad, o Fundo Monetário Internacional é o principal adequador das
políticas econômicas, enquanto as outras agências acima referidas “se incubem de pautar
outras políticas, de forma complementar e coerente (HADDAD, 2008, p. 8), procedendo de
forma a intensificar o processo de reestruturação neoliberal”.
A reforma educacional, prioritariamente a profissional, insere-se no processo de
reestruturação macro, buscando a adequação do sistema educacional nacional à reforma do
Estado, nos moldes do Estado mínimo preconizado pelo neoliberalismo, significando a
despublicização de direitos sociais, alicerçada numa visão economicista, tomando o mercado
como paradigma.
Efetiva-se as reformas educacionais num contexto de hegemonia neoliberal, em
detrimento dos ideais do Estado providência, momento histórico de desequilíbrio de forças
entre capital e trabalho (favorável ao capital), ocasião em que se buscou adequar a educação
às demandas do novo modelo de sociabilidade do trabalho, concatenada ao padrão de
acumulação flexível do capital globalizado; esse caracteriza-se por profundas mudanças nas
bases tecnológicas e organizacionais da produção, com a intenção de obter um controle maior
do capital sobre a força de trabalho, objetivando maximizar a extração da mais-valia e a
reprodução e acumulação do capital. A educação não poderia escapar de uma adequação à
funcionalidade do capital, da reprodução das estruturas de classe, das estruturas de poder, na
esfera nacional e global.
O Banco Mundial atuou não apenas no fomento (empréstimos em forma de parceria,
exigindo contrapartida financeira por parte do Estado), mas como consultor, participando
efetivamente das políticas em educação, por meio da efetivação de seus consultores, incutindo
o enfoque economicista, concatenado ao receituário neoliberal, às políticas educacionais,
76
“ofertando” pacotes educacionais, sob a roupagem de parcerias.
Um papel de destaque teve o Banco Mundial na edição do Decreto 2.208/97; eis a
semelhança entre o conteúdo do decreto e o Projeto de Lei n.º 1.603/96, apresentado pelo
governo e depois retirado, por haver esta mesma regulamentação autônoma legiferado todo o
conteúdo do ensino profissional. Interessante observar que o referido projeto foi gestado por
consultores do Banco Mundial, do BID e da Universidade de Oklahoma (OLIVEIRA, 2003,
p. 53).
As agências internacionais cumpriram um papel estratégico no financiamento das
reformas do ensino profissional, merecendo destaque o PROEP (Programa de Expansão da
Educação Profissional), conduzido pelo Ministério da Educação em concomitância com o
Ministério do Trabalho. Foi financiado com recursos federais, sendo 25% do MEC e 25% do
FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) do Ministério do Trabalho e Emprego e o
empréstimo junto ao BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) dos 50% restantes
para financiamento da reforma do ensino profissional.
O Programa de Expansão da Educação Profissional (PROEP) está inserido no
processo macro de ajustamento estrutural do país às determinações dos setores hegemônicos
do capitalismo financeiro no âmbito local e internacional. Apresenta-se como “cooperação”
técnica, mas comporta formas de endividamento externo e de espoliação, consubstanciadas
em pagamentos de juros e encargos do endividamento (MELO, 2004). Não se trata de atos de
filantropia e benevolência dos organismos financeiros multilaterais ou de governos de países
centrais. Como destaca Deitos:
o financiamento externo aos programas educacionais para o ensino médio e
profissional permitiram a operacionalização das condicionalidades para a
implementação das reformas realizadas e geraram e geram onerosos encargos
financeiros, que se somam ao processo de endividamento interno e externo do país
(DEITOS, 2005, p. 326).
O Programa de Expansão do Ensino Profissional (PROEP) constituiu-se no principal
instrumento para efetivação das mudanças, muito mais eficiente que as leis como a LDB, o
Decreto n.º2.208/97 e a Portaria do MEC n.º 2.267/97, que estabeleceu as diretrizes para
elaboração do projeto institucional para implantação de novos CEFET, condicionando a
liberação de recurso a mudanças administrativas e pedagógicas.
Segundo a Portaria MEC n.º 2.267/97, as escolas técnicas deveriam ser avaliadas para
77
assumir a condição de CEFET. O órgão responsável, o Ministério da Educação, constituiria
uma equipe para proceder à análise dos projetos institucionais, devendo apresentar, com base
em indicadores do próprio Ministério da Educação (MEC) e Secretaria de Educação média e
Tecnológica (SEMTEC), as condições físicas, de laboratórios e de equipamentos, a existência
de recursos humanos condizentes com o projeto institucional, especificando o número de
docentes com pós-graduação, por titulação e com experiência na área.
O PROEP cumpria o papel de implementação acelerada das novas diretrizes legais
prescritas na LDB 9.394/96 e no decreto 2.208/97, num contexto de desmonte do estado e de
escassez de recursos, o PROEP surge como estratégia de sobrevivência. A partir deste,
impulsionou-se de forma desordenada o movimento acelerado pela Cefetização oriundas das
próprias escolas técnicas, as quais ofereciam apenas o ensino técnico profissional, nos moldes
tradicionais e que uma vez CEFET poder-se-ia ofertar cursos superiores.
O desencadeamento do processo de Cefetização não se deu com a promulgação da Lei
n.º 8.984/94, já que esta asseverava uma transformação gradativa e criteriosa, ao contrário do
que foi levado a efeito, de modo desenfreado e obedecendo a critérios políticos.
O receituário proepiano, consoante a LDB e o Decreto-Lei n.º 2.208/97, determinava:
A. Separação da Educação profissional do ensino regular, a fim de que esta se
torne uma complementação da educação Geral e não uma parte da mesma. As
escolas que ofereciam os dois cursos simultaneamente puderam continuar a oferecer
ambas alternativas, só que separadamente. Desta forma, a Educação profissional
passa a fazer parte do ensino pós-secundário.
B. Estabelecimento de três níveis de Educação profissional.
Cursos básicos: uma modalidade de educação não formal, com duração variável
destinada a proporcionar ao trabalhador, com qualquer nível de escolaridade,
conhecimentos que permitam sua reprofissionalização, qualificação e atualização
para o exercício de profissões demandadas pelo mercado. Os concluintes desses
receberão certificados de qualificação profissional.
Cursos Técnicos: visando à formação, habilitação e certificação de técnicos, estes
cursos destinam-se a jovens ou adultos que estejam cursando ou já tenham concluído
o Ensino Médio.
Cursos Tecnológicos: estes cursos deverão ser estruturados para atender aos diversos
setores de economia, abrangendo áreas especializadas e conferirão ao aluno o
diploma de tecnólogo.
C. Currículos abertos. Um curso profissional não pode ter currículos fechados e
rígidos, assim as diretrizes não vão definir os currículos ou disciplinas, mas as
competências e habilidades que o aluno deverá conquistar numa área determinada.
Além disto, os professores precisam ter uma formação vinculada à atividade
78
produtiva e empresarial e o sistema de avaliação deve fugir do esquema tradicional,
i.e., perguntas e respostas. Isto afeta o tempo de duração dos cursos o qual deve ser
definido pelo desenvolvimento das habilidades necessárias.
D. Ensino por Módulos. A educação Profissionalizante estruturada por módulos
prevê que o aluno, ao adquirir determinadas competências num módulo específico,
já pode ingressar no mercado de trabalho enquanto continua cursando os módulos
seguintes. Dentro desta nova perspectiva de ensino em módulos também são
contemplados trabalhadores que adquiriram competências na prática, exercendo
funções no mercado sem nunca ter frequentado um curso profissionalizante. Estes,
na Nova Educação Profissional, poderão obter certificados para suas competências
procurando uma agência credenciada para exame e prática. De acordo com o
resultado, poderá ainda continuar o curso completando as disciplinas que faltam.
E. Estudos de mercado. Para acompanhara reforma, a escola deve fazer,
permanentemente, estudos de mercado a fim de determinar a demanda por
profissionais e o tipo de oferta disponível de cursos. Faz-se necessário conhecer as
tendências do mercado para que os cursos possam se adaptar às novas realidades.
Daí a necessidade de flexibilidade da escola.
F. Participação comunitária. Existem atualmente no país 133 escolas federais entre
agrotécnicas, técnicas e Unidades Centralizadas de ensino (Uned) e os centros
Federais de Educação Tecnológica (CEFET) de nível superior que o governo vai
preservar, transformando-os em centros de referência nacional. Além desta rede, a
nova concepção da educação Profissional incorpora o Sistema S (SENAI, SENAC,
SENAT e SENAR), as ONGs e os estabelecimentos de ensino profissional livre.
Desta forma, o governo Federal divide cada vez mais com a sociedade sua
responsabilidade com a educação profissional (BRASIL. MEC/SEMTEC/PROEP,
1998, apud CORDEIRO, 2004, p. 77-79).
Como já exposto anteriormente, os empréstimos, a liberação de recursos estavam
condicionados ao atendimento das diretrizes propostas, desse modo, numa situação de
escassez de recursos, a adesão à proposta se dava como estratégia de sobrevivência, como
garantia desta, em face de uma política de prática sistemática de redução de investimentos,
cortes orçamentários, etc.
O processo de cefetização da Escola Técnica Federal de Pernambuco resultou na
adequação às diretrizes Proepiana, não atendendo, assim como em outros casos, às exigências
técnicas exposta na Portaria MEC n.º 2.267/97, efetivando-se mais por critérios políticos, o
que nos remete à criação das escolas de artífices e aprendizes, criadas por Nilo Peçanha em
1909, em que a localização das instituições obedeceu a critérios políticos.
O PROEP foi criado por portaria do MEC n 1.005/97 e tornou-se um meio eficiente de
implementação das diretrizes emanadas da LDB e do decreto lei n 2.208/97, atuando como
catalisador das mudanças, conformando-as as demandas do novo projeto de sociabilidade
capitalista, concatenada ao processo macro de reestruturação produtiva sob a égide neoliberal.
79
Particularmente, no CEFETPE, estruturou-se com processos injungidos de cima para
baixo, ou seja, sem consulta ou participação democrática da sociedade e da instituição
envolvida, objeto de tais modificações, mormente dos segmentos que compõem essa
instituição de ensino. Para estes, especialmente os docentes, foram impostas mudanças
significativas, de caráter administrativo e pedagógica, que afetaram sua prática cotidiana, não
estando a ETFPE preparada para tão volumosa metamorfose, o que incidiu numa
desestruturação desta autarquia.
Reitere-se, porque relevante, que, segundo Cordeiro (2004), o processo de Cefetização
ocorreu
sem
planejamento,
transparência,
participação
da
comunidade
escolar,
esclarecimentos acerca das novas diretrizes pedagógicas, dos meios de pleitear recursos, o que
resultou na ausência de critérios para empregar os recursos, assim como na desinformação
quanto ao modo de pleitear tais recursos.
A titulo de esclarecimento podemos apontar os recursos auferidos com o PROEP, no
CEFET/PE, em que de um total auferido, cerca de R$1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil
reais), foram utilizados com compras de equipamentos 89% (oitenta e nove por cento) do
valor, R$ 1.007.315,89 (um milhão, sete mil, trezentos e quinze reais e oitenta e nove
centavos), com capacitação 14,3 % (quatorze vírgula três por cento), R$ 170.574,20 (cento e
setenta mil reais e quinhentos e setenta e quatro reais e vinte centavos) e o restante, R$
8.149,75 (oito mil, cento e quarenta e nove reais e setenta e cinco centavos), com serviços em
geral. Na capacitação, incluam-se visitas a outras instituições, capacitação em programas de
neurolinguística quando da introdução da modulação e do ensino por competência no curso
técnico em Edificações (CORDEIRO, 2004).
Manuseando os relatórios de gestão e outros documentos emitidos pelo CEFET/PE, há
reiterada menção aos recursos provenientes do PROEP, na aquisição de equipamentos. Os
recursos foram investidos, de modo concentrado, nos cursos superiores e em algumas
coordenações; enquanto outras não foram beneficiadas, por desconhecerem os meios de
pleitear os recursos. Da forma como se efetivou o processo, sem transparência,
esclarecimentos, participação e envolvimento da comunidade cefetiana, a maioria teve que
aceitar às mudanças impostas e adaptá-las a sua realidade e prática (pedagógica) diária.
O processo de cefetização implicava na mudança de status da instituição, passando as
antigas ETF, que ministravam cursos técnicos integrados (médio profissionalizante) e o
80
especial (pós-médio) a oferecer cursos superiores tecnológicos.
A oferta de cursos superiores pelas escolas técnicas federais não se constitui em fato
novo, remonta-nos a ditadura militar e a reforma educacional promovida por esta, através da
influência do convênio MEC-USAID e o breve ‘milagre brasileiro’. É na década de 1970 que
se dá a iniciativa na criação de cursos superiores de curta duração, cujo objetivo era reter a
demanda pelos cursos superiores ‘normais’ e a aceleração na formação de quadros
profissionais, aproveitando a estrutura física e os recursos humanos instalados das escolas
técnicas federais. Foi nesta conjuntura que se criou o curso de Engenharia de Produção, dando
origem a outras habilitações nos mesmos moldes, tais como a de Administração Rural,
Análise Química, dentre outros, de formação curta, cuja especificidade apresentava-se em
currículos menos densos, mais práticos e intensivos, objetivando maior terminalidade.
Todavia, como destaca Oliveira (2003a), ‘o milagre brasileiro’ não perdurou, advindo
a retração e estagnação econômica e, por conseguinte, maior competitividade no mercado de
trabalho, o que suscitou a atuação corporativista de entidades representativas de classe por
defesa de reserva de mercado, como no caso dos Conselhos Regionais de Arquitetura e
Engenharia (CREA). Eles opõem-se, não reconhecendo ou até limitando, a atuação do
tecnólogo, especialmente do engenheiro de operação, assim como a barreira cultural da
sociedade que concebia a graduação como um curso superior de quatro ou cinco anos;
referidas resistências culminaram na extinção dos cursos citados em 1977.
Todavia, como estratégia de contorno do impasse, a Lei n. 6.545/78 elevou as três
escolas técnicas que ofertavam o curso – as escolas de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Paraná
– à condição de Centros federais de Educação Tecnológica, tornando-as aptas a ofertar cursos
superiores, inicialmente com o curso de engenharia industrial de duração plena, argumentando
que as referidas escolas localizavam-se em “cidades polos de industrialização”. Interessante
registrar que a regulamentação desta lei só foi finalizada em 1982.
Com as reformas dos anos 1990 retoma-se o modelo, novamente sob inspiração
externa; - nesse caso, o BID (PROEP) -, em sintonia com as orientações macroeconômicas de
ortodoxia neoliberal, apesar do contexto de precarização do trabalho e acirramento da
competitividade. Os cursos de curta duração apresentam-se como necessidade de flexibilizar o
ensino profissional, com o objetivo de ajustá-lo às rápidas transformações do setor produtivo,
face ao intenso processo de transformações tecnológicas e organizacionais do novo modelo de
81
acumulação flexível.
Os cursos tecnológicos receberam nova roupagem e se concatenaram às categorias
conceituais de individualização, competitividade, flexibilidade, empregabilidade e capital
humano, emanadas de uma materialidade histórica caracterizada pelo avanço do capital, sob
novas formas de controle da força de trabalho, em um momento de desarticulação,
heterogeneização e fragmentação da classe operária, em um contexto objetivo e
subjetivamente desfavorável à construção de uma identidade de pertencimento de classe.
Cursos de formação aligeirada (com dois anos de duração em média) potencialmente
desconsidera as particularidades sócio-econômicas e regionais de um país tão diverso e
desigual feito o Brasil; assim como desconsidera a precariedade da formação básica, o quadro
de intensa precarização e intensificação do trabalho, a maior seletividade do mercado em
situação de acirrada disputa de vagas de trabalho.
No CEFET/PE, o curso pioneiro foi o de tecnologia de design, instituído em 1999, de
modo bastante incipiente, ofertando 25 vagas e, como todo processo de cefetização tratado
neste estudo, deu-se sem muito planejamento, sem a participação de toda comunidade.
4.3
Os Novos Paradigmas Conceituais da Reforma Educacional Profissional.
É necessário criar novos conceitos, ressignificar outros, que possam explicar e
legitimar as mudanças capitaneadas pelos interesses do novo regime de acumulação flexível;
termos como capital humano, empregabilidade, certificação por competência, polivalência,
são regularmente utilizados pelo vocabulário neoliberal, todos conduzem a valorização dos
indivíduos, para explicar as desigualdades sociais.
A ressurgência da teoria do capital humano, cuja origem remonta à ciência econômica
dos anos 1950, e, posteriormente, dos anos 1960/70 é transposta para o âmbito educacional, o
que evidencia o predomínio do economicismo na educação, convertendo esta em mera
variável econômica.
A teoria do capital humano se configurou como um dos elementos constitutivos da
tendência economicista e tecnicista em educação, incorporando, nas análises, uma
nomenclatura técnica, hermética (economês) que dificultava o entendimento daqueles que não
estavam familiarizados com essas categoriais conceituais, recorrendo ainda a fórmulas
82
matemáticas para a explicação dos fenômenos, configurando um modelo de ciência de
inspiração positivista, de objetividade e neutralidade epistemológica, cujo modelo são as
ciências naturais. Nesta visão (economicista) o social, o politico e o filosófico são preteridos,
focando-se apenas ou principalmente nos aspectos “técnicos”, pedagógicos, gerenciais,
constituindo-se em muitos casos em análise a-histórica (FRIGOTTO, 2006, 2008).
A citada teoria propagou-se de forma avassaladora na América Latina pela ingerência
dos organismos internacionais, tais como: Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional,
Organização Internacional do Trabalho, Banco Interamericano de Desenvolvimento, dentre
outros, mediadas por políticas públicas atreladas a políticas de “cooperação técnica” mediante
concessão de empréstimos.
Para a teoria do capital humano, as desigualdades entre nações, grupos sociais,
indivíduos explica-se pela dimensão individualista, na qual os indivíduos seriam portadores
de uma racionalidade econômica – natureza humana; segundo esta, todos os indivíduos
nascem com predisposição pela busca racional da maximização da vantagem, guiando-se pela
relação custo-benefício. Nesta perspectiva teórica, os indivíduos aparecem atomizados (são a
base, a origem do poder), o que nos remete ao jus naturalismo e a ideia de contrato entre os
indivíduos para formação da sociedade política. O indivíduo surge como a unidade básica de
análise, numa perspectiva a-histórica, o Homo economicus é um ser racional, livre e
responsável por suas escolhas.
Para os liberais clássicos todos os indivíduos aparecem no mercado em “iguais
condições” de escolha pessoal, desconsiderando as condicionantes estruturais, as relações de
poder historicamente construídas e situadas; com efeito, a referida “natureza” revela-se como
uma abstração, que na realidade é a materialização da sociabilidade capitalista, concebida
como universal.
Sob a ótica dos pensadores liberais, fundamentados na teoria do capital humano, o
componente de produção, decorrente da instrução, é um investimento, um aumento na renda
futura, semelhante a qualquer outro investimento em bens de produção (FRIGOTTO, 2008, p.
68).
O que se constata na atualidade é que, paradoxalmente, ao que preconiza a teoria,
inversamente a tendência universal do aumento da escolaridade, há um recrudescimento do
83
desemprego estrutural e intensificação da exploração do trabalho. O que se observa é que “ao
contrário de mais emprego para os egressos do ensino superior, temos cada vez mais um
exército de 'ilustrados' desempregados ou subempregados” (FRIGOTTO, 2006, p. 27). A
realidade vem desconstruir e refutar a tese do papel messiânico (redentor) da escola tão
propagada, o que contribuiu para escamotear as causas estruturais que condicionam o acesso
desigual às oportunidades, aos bens materiais e simbólicos da sociedade, atribuindo aos
indivíduos (responsáveis pelas escolhas) a responsabilidade por sua condição. Com efeito, a
questão do emprego transcende a escola, sendo necessário transformar as estruturas que dão
sustentação a reprodução das relações assimétricas de poder imanentes às relações sociais de
produção capitalista.
Na mesma linha interpretativa, o discurso da empregabilidade denota a visão
ideológica que também remete ao indivíduo a responsabilidade pela sua situação de fracasso
ou sucesso, contribuindo para a relativização da crise do desemprego em massa, atribuindo-o
a inadequação (má qualificação) dos trabalhadores às demandas do mercado, deslocando,
assim, a culpa de tal desemprego ao indivíduo (OLIVEIRA, 2008).
A ideia de empregabilidade contrapõe-se a ideia de “pleno emprego” do Estado de
Bem-Estar Social, o que subtrai do Estado, e do Capital, a obrigação de promover a formação
do trabalhador (Estado mínimo). Ressalte-se ainda que, na interpretação liberal a competição
é catalizadora do progresso, em que a desigualdade é um fenômeno natural, e não há lugar no
acesso aos bens para todos, o que premia, tão somente, os “melhores”, o que se coaduna ao
Estado Mínimo, em que a intervenção do Estado como garantidor de direitos e regulador das
relações sociais encontra-se cada vez mais diminuída, atribuições estas transferidas ao
mercado.
O discurso do capital humano, empregabilidade, flexibilidade, polivalência,
certificação e currículo por competência apresentam um elemento em comum, qual seja, a
exacerbação do individualismo, o que contribui para debelar as soluções alternativas de viés
coletivo, corroborando para a desconstrução de uma identidade de classe.
Faz-se necessário destacar as circunstâncias, as condições sociais objetivas, a gênese
histórica que suscita a emergência das referidas teorias alicerçadas na ideia de
individualização e seu viés ideológico (FRIGOTTO, 2006), concatenadas ao processo de
reestruturação do capital (MONTAÑO, 2008).
84
Para os entusiastas do mercado, o modelo flexibilizado, configurado numa nova base
tecnológica e organizacional, engendraria a omnilateralidade e polivalência, na medida em
que ensejaria o trabalho pensante, mais dinâmico, reflexivo e criativo, em oposição ao
trabalho reduzido meramente ao adestramento das potencialidades manuais do trabalhador
típicas do modelo taylorista-fordista. Eles afirmam, ainda, cuidar-se de um processo de
“libertação” e “desalienação” através do trabalho pensante, todavia, tal multilateralidade
configura-se em uma nova estratégia do capital para maximizar o controle sobre a força
laboral e intensificar a extração de mais-valia.
Nesse contexto de acumulação flexível:
pretende-se a produção de mais-valia, não apenas com base na objetividade da força
de trabalho, mas também através da tentativa de expropriação e formalização de seus
saberes e conhecimentos, inclusive tácitos, que se encontram eivados da
subjetividade dos trabalhadores, o que gera, embora sob a égide de uma
pseudoautonomia, a minimização do poder real de intervenção e de negociação dos
trabalhadores no processo de trabalho (FIDALGO, 2007, p. 22).
As prescrições permanecem, de modo mais sutil, se comparados à ostensividade do
modelo taylorismo-fordismo; neste aspecto, a flexibilização e a polivalência são resultados da
intensificação da exploração sob nova base organizacional e tecnológica, resultando num
processo de redução de custos, maior produtividade, instigado pelo acirramento da maior
competitividade inter-empresarial e interpessoal.
Esta nova demanda de formação laboral, de um trabalho cognitivo e criativo não é
extensivo a todos, pois o que se observa na prática é a coexistência de processos intensivos de
trabalho manual e de um trabalho mais qualificado, em que o primeiro enquanto continuidade
do fordismo-taylorismo se traduz numa mão de obra desqualificada e de baixo custo,
composta por um contingente de trabalhadores, precariamente capacitados, responsáveis pela
execução de tarefas precarizadas e rotineiras, mesmo que informatizadas; enquanto o segundo
detêm habilidades cognitivas requeridas e necessárias, constituindo o núcleo da empresa, ou
um grupo seleto qualificado.
Como salienta Rodrigues:
parece improvável que o capital- principalmente diante da vaga neoliberal [...] esteja
disposta a abrir, de moto próprio, mão de parcela da mais-valia expropriada da
classe trabalhadora, a fim de elevar os patamares sociais, em geral, e da educação,
em particular. O capital pode, contudo, ser obrigado a elevar o patamar educacional
de uma pequena parcela de trabalho, disponibilizando-a às novas demandas do
mundo do trabalho. (RODRIGRES, 1998, p. 144)
85
Outros elementos discursivos da reforma compõem novos paradigmas pedagógicos
alinhados à perspectiva individualista, a reforma imposta pelo Decreto n.º 2.208/97 introduziu
a ideia de competência, certificação por competência e currículo por competência, sendo que
a lógica que permeia a ideia de competência assemelha-se ao que poderia ser definido como
uma tentativa de construção da omnilateralidade para o trabalho subsumido, na razão
proporcional em que o desdobramento das potencialidades humanas, intrínsecas a esta lógica,
com efeito, não se mostra numa perspectiva de desalienação, mas preserva a expropriação
multilateral das forças de trabalho (FIDALGO, 2007, p. 22).
O desenvolvimento tecnológico de base microeletrônica, no qual as máquinas
desenvolvem um papel de “atores inteligentes”, decorrente do acentuado grau de automação;
por conseguinte, impõe cada vez mais a capacidade de atuar em diálogo com os equipamentos
e diante de tal realidade, a força laboral tem sua dimensão racional apropriada pelo capital,
sendo mister outra forma de monitoramento do trabalho, mais sutil, sofisticada e que não
ostente tão diretamente os estratos superiores da gestão
Nesse diapasão, busca-se robustecer o discurso da autonomia, da horizontalização
hierárquica e da gestão participativa em oposição ao modelo fordista, criando uma
intercompetitividade entre trabalhadores, os quais se tornam fiscais de si próprios e dos
outros, engendrando a construção de uma identidade laboral cada vez mais desarraigada do
conjunto, suscitando a quebra da solidariedade e do compartilhamento entre o segmento
laboral.
Todos esses elementos percorrem no sentido de acentuar o processo de
individualização das relações de trabalho, incutindo, assim, uma cultura de desqualificação
entre os trabalhadores, convencendo-os de uma necessidade de nova qualificação, ou
reciclagem, o que os responsabiliza por sua empregabilidade.
A lógica das competências, assim como da empregabilidade e capital humano, adota
como referência principal o indivíduo, em detrimento de uma sociabilidade pautada na
solidariedade, no projeto coletivo. Ao exaltar a perspectiva individualista essa lógica desvia o
foco das estruturas, mascarando as reais condições de acesso e de permanência no mercado de
trabalho, consubstanciadas nas relações de capital-trabalho.
A noção de competência é, então, apropriada ao processo de despolitização das
relações sociais e de individualização das reivindicações e das negociações. As
86
relações coletivas não se esgotam, posto que o trabalho continua sendo uma relação
social e o homem continua vivendo em sociedade, mas elas se pautam cada vez
menos por parâmetros coletivos e políticos, para se orientarem por parâmetros
individuais e técnicos (RAMOS, 2002, p. 406).
Para melhor compreensão do tema, é importante a abordagem do conceito de
politecnia, a qual é o domínio dos supedâneos científicos das distintas técnicas que
caracterizam o processo de trabalho moderno. A politecnia tenta romper com a dicotomia
entre educação geral e técnica, contemplando o princípio da formação humana em sua
totalidade, o que integra a ciência e a cultura, humanismo e tecnologia, objetivando o
desenvolvimento das potencialidades humanas, configurando-se como uma crítica ao modelo
burguês que se pauta pela divisão social e técnica do trabalho, materializada numa escola
dual, cuja função é reproduzir as diferenças estruturais.
A politecnia ocorre no âmbito do capitalismo, como instrumento de luta política que
busca uma formação mais elevada aos filhos dos trabalhadores, objetivando democratizar o
conhecimento, para que este não seja monopólio de classe, mediante formação técnicapolítica, prática-teórica, pretendendo elevar a classe trabalhadora à autotransformação, numa
compreensão de sua própria condição social e histórica.
Por sua vez, a omnilateralidade remete a formação humana em sua totalidade,
contemplando todas as suas faculdades humanas, todo o seu potencial e não como um ser
fragmentado, em contraposição ao homem limitado da sociedade capitalista, só sendo possível
quando diante da ruptura com a sociedade capitalista.
É importante distinguir politecnia de polivalência, pois se trata de perspectivas
antagônicas; enquanto o horizonte da formação polivalente, proposto pelo discurso industrial,
é o mercado, como estratégias históricas do capital para expropriar e incorporar o saber, o
horizonte da educação politécnica é o homem omnilateral, em sua busca pela liberdade no e
do trabalho, objetivando a aprimoramento intelectual da classe trabalhadora, o
desenvolvimento das múltiplas necessidades e capacidades humanas.
O interesse da burguesia industrial pela educação da classe trabalhadora sempre esteve
presente no campo dos embates hegemônico-pedagógico, buscando criar homens à sua
imagem e necessidade, na pretensão de adaptar ou conformar o trabalhador aos interesses da
produção (RODRIGUES, 1998).
87
O perfil do trabalhador na proposta da formação polivalente está descrito por
Rodrigues, in litteris:
Este novo tipo de trabalhador precisa, ainda, ser capaz de tornar-se um 'déspota de si
mesmo', já que não é mais o eficiente clic-clac contínuo das máquinas que determina
o externamente o ritmo de trabalho. O próprio trabalhador torna-se responsável pela
eficiência da produção de mais-valia relativa, sem esquecer que no chip estão
encerradas as informações do ritmo de produção de cada operador. O autocontrole e
os pulsos binários substituem, na produção participativa, os capatazes e o clic-clac
da maquinaria de base eletromecânica (RODRIGUES, 1998, p. 138).
Na ótica do capital, uma característica é invariante: a constituição humana é
meramente uma variável a ser funcionalizada a concepção maximizada do capital, a
valorização do saber do trabalhador coloca-se na contradição medular do capitalismo, o
trabalhador não pode ter os meios de produção, não pode deter o saber, mas sem saber, ele não
pode produzir (SAVIANI apud RODRIGUES, 1998, p. 142), a educação deve ser na medida
em que não ultrapasse as necessidades do capital, segundo Rodrigues (1998, p. 142) “uma
classes trabalhadora socializada no saber mais desenvolvido, mais geral, mais abstrato, enfim,
possuidora do conhecimento científico, é uma ameaça ao poder despótico do capital”
Por fim, a reforma educacional do ensino profissional no governo FHC, insere-se no
contexto de reestruturação produtiva sob a ótica neoliberal, numa conjuntura favorável ao
capital e desfavorável ao trabalho, de despublicização e mercantilização da escola, e reforço à
dualidade estrutural, consolidando uma concepção de educação profissional deslocada da
necessidade dos conhecimentos básicos indispensáveis ao desempenho crítico e criativo da
atividade produtiva, convertendo a educação profissional em um mero treinamento parcial,
aligeirado e superficial.
4.4
Consequências da Separação do Ensino Médio Integrado à Educação Profissional
no CEFETPE
Para muitos docentes a separação entre o ensino propedêutico e o profissional,
efetivada com o desmembramento do técnico integrado ao ensino médio para o técnico
sequencial (pós-médio) resultou numa queda de qualidade no ensino técnico (sequencial), em
que se evidenciou um desnivelamento das turmas, em relação ao modelo integrado anterior, já
que neste, mesmo o aluno com precariedade de formação, tinha a oportunidade de
nivelamento com o tempo. Tal fato não acontece no pós-médio, compelindo, em muitos casos,
um esforço do professor no sentido de tentar preencher as lacunas deixadas por uma formação
88
anterior débil, o que compromete o andamento da matéria e da formação profissional
(CORDEIRO, 2004; OLIVEIRA, 2003a).
A separação implicou, segundo orientação do PROEP, consoante Portaria n. 646/97,
numa redução inicial de 50%, com progressão até 20% da oferta de ensino médio, podendo
ficar abaixo desse índice, contribuindo desta forma para diminuir o número de vagas no
ensino médio de qualidade, ofertado pela rede federal, o que demonstra o descaso do governo
com esta modalidade de ensino, já que, segundo os dados do INEP – Instituto Nacional de
Pesquisa Educacional Anísio Teixeira -, o maior contingente de matriculados no ensino médio
está na escola pública estadual e municipal, apresentando índices críticos de aprendizagem
(Vide Gráficos 19 e 20).
Tabela 1 – Vagas para o Ensino Médio de 1998 a 2003 – CEFET/PE
Vagas
Vagas Ensino Médio
PROEP (Projeção)
1998
1999
2000
2001
2002
2003
320
240
80
80
80
80
Vagas oferecidas
320
320
240
240
160
160
Fonte: CORDEIRO, 2004, p. 307. Elaboração a partir do projeto elaborado pelo CEFET-PE para pleitear as
verbas do PROEP e dos relatórios anuais de gestão.
Portanto, como revelam os dados, o desmembramento do ensino integrado, médio e
profissionalizante, assim como o advento dos cursos tecnológicos, engendrou significativa
desestruturação da vida acadêmica na escola. A referida cisão deu-se em detrimento do ensino
médio face às orientações do PROEP, o qual condicionou a liberação de recursos ao
atendimento às orientações prescritas, passando o ensino médio a uma condição marginal
diante das outras modalidades de ensino coexistentes, sobretudo em relação ao tecnológico. O
desprestígio do ensino médio, inicialmente, provocou uma corrida de muitos docentes para as
outras modalidades, face à redução progressiva da oferta e a possível iminência de sua
extinção (vide Tabela 1).
Mesmo diante de tal desprestígio, houve uma forte procura pelas vagas do ensino
médio, ofertada pela instituição, graças à imagem positiva de qualidade atribuída à instituição
EFTPE, a qual, mesmo diante da precariedade, falta de professores qualificados em algumas
áreas, desinteresse da direção decorrente das orientações superiores, manteve um alto índice
de aprovação no vestibular.
Tais mudanças promoveram uma redistribuição de professores, compondo um quadro
89
de desequilíbrio de demanda; em algumas áreas houve um acréscimo de carga horária,
enquanto em outras, um déficit, além do remanejamento para os novos cursos tecnológicos.
Estas reorganizações desorganizadas faziam com que disciplinas que contemplavam um ou
dois semestres no modelo integrado anterior, passassem a configurar os três anos do ensino
médio, por exemplo, o que acarretou profundo desequilíbrio de esforço acadêmico para os
docentes entre as diversas áreas de ensino, destacando-se, ainda, o fato de que muitos
docentes não estavam, e/ou não foram preparados para as novas demandas, particularmente
no médio e tecnológico.
Válido esclarecer ainda que o argumento do governo para legitimar a separação
pressupõe que os discentes egressos do ensino básico (ensino médio) já possuem o
embasamento teórico-científico necessário para a formação técnica, argumento que ignora a
precariedade da escola pública estadual no país. Tal medida reforça o caráter dual do sistema
educacional brasileiro. A deficiência da formação escolar é sentida nos resultados das
avaliações nacionais, como SAEP, ENEM, PISA, como ilustra a Tabela abaixo:
Tabela 2 – Frequência e Percentual de alunos de Construção de Competências
– Língua Portuguesa – 3ª Série do Ensino Médio – Brasil – 2001.
Estágio
%
Muito Crítico
4,92
Crítico
37,20
Intermediário
52,54
Adequado
5,34
Fonte: BRASIL. MEC/Inep/Daeb, 2004, p. 10
Em consequência da separação do ensino técnico do propedêutico citada, reduziu-se a
oferta de vagas no ensino médio na rede federal de ensino profissional e elevou-se a faixa
etária de seus estudantes, na medida em que, segundo a lei, o aluno tem, necessariamente, que
cursar o ensino médio para em seguida se formar no curso técnico, ou, concomitantemente em
ambos, estando a emissão do diploma condicionado a conclusão do ensino médio, o que, com
efeito, penalizou o aluno carente de recursos, público alvo, em tese, do ensino técnico.
Os efeitos trazidos e apresentados agravaram profundamente o dilema dos jovens das
classes populares, os quais precisam ‘escolher’ entre a formação escolar e a inserção no
mundo do trabalho, já que, dificilmente, tais jovens teriam condições (materiais) de
90
frequentar, diuturnamente, a escola, para estudar no ensino médio num turno e o técnico em
outro, em escolas diferentes. Da mesma maneira, estes mesmos jovens não poderiam dispor,
ou ‘se dar ao luxo’, em se tratando do técnico sequencial, de consumir cinco anos em vida
acadêmica à obtenção de uma formação profissional.
Interessante ressaltar que todas as mudanças foram impostas, sem planejamento, nem
transparência, somando-se a isto o quadro de instabilidade político-institucional do
CEFET/PE, associado à conjuntura de privatização e desmonte do Estado.
O quadro político do CEFET/PE viveu uma instabilidade com a saída do diretor que se
manteve no cargo por dezesseis anos ininterruptos, de 1979 a 1995, o sucessor deste foi o
terceiro colocado na lista tríplice, gerando muito descontentamento, ficando por 04 (quatro)
anos, justamente o período em que se deu a cefetização, sendo o Estado de Pernambuco um
dos primeiros a adotar a cartilha Proepiana.
Registre-se ainda que, antes do término do mandado, o referido diretor assumiu um
cargo em Brasília, no MEC, nomeando o substituto que dirigiu o centro por mais dois anos
(1999-2000), sendo novamente substituído pelo antecessor deste, em 2001, enfrentando forte
resistência interna. Em 2002, a assunção do novo diretor eleito foi procedida da morte deste,
tendo a diretora da sede, pois na época existia a sede que ficava em Recife e as unidades
descentralizadas de Petrolina e Pesqueira, em que pese não ter sido eleita, assumiu o cargo na
direção, dirigindo a instituição até o novo processo eleitoral que se deu em abril de 2003,
contudo o novo diretor, com pouco tempo de gestão, é suspenso do cargo graças a um
processo administrativo disciplinar. Ou seja, durante o período de reforma educacional no
CEFET/PE, a instituição viveu uma crise política interna, a qual influenciou negativamente
nos rumos tomados.
As mudanças materializadas na nova LDB (Lei 9.394/96), no Decreto n.º 2.208/97,
criou três níveis de educação profissional; foram eles o básico, o técnico e o tecnológico. No
primeiro nível, a saber, na educação profissional básica, não há exigência de escolaridade do
candidato, sendo configurada como não formal, podendo ser oferecidas por muitas
instituições de ensino e até sindicatos.
Diante disto, faz-se mister incursionar no instrumento de implementação da política de
formação profissional básica, a saber, o PLANFOR – Plano Nacional de Qualificação do
91
Trabalhador - , criado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, de 1995 a 2002 (mandados de
FHC), o qual teve como meta articular as políticas públicas nas áreas de emprego, trabalho e
renda, cuja principal fonte de financiamento provinha do FAT (Fundo de Amparo ao
Trabalhador).
Quanto ao PLANFOR, estudos independentes indicaram que, além do mau uso dos
recursos públicos, referido plano notabilizou-se pela baixa qualidade e acanhada efetividade
social, oriunda da débil articulação com as políticas de geração de emprego e renda,
desarticulação das políticas de educação, limitados instrumentos de controle social e de
participação no planejamento e na gestão dos programas e, por fim, ênfase em cursos de curta
duração, consumados em treinamentos pontuais e específicos de poucas horas (KUENZER,
2010, p. 256).
O Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador está inserido no cerne das políticas
de educação profissional, configurando um modelo de formação assaz deficiente para
trabalhadores precarizados, consolidando uma concepção de formação profissional deslocada
da necessidade dos conhecimentos básicos fundamentais ao desempenho crítico e criativo da
atividade produtiva e, portanto, convertendo a educação profissional em mero treinamento
aligeirado, fragmentado e superficial para o trabalho.
Desse modo, o mencionado plano não contribuiu para elevação da escolaridade da
clientela foco, fator relevante e indispensável para galgar outro estágio de desenvolvimento
econômico e social. Vale ressaltar, porque relevante, que essa modalidade de ensino
concentrou aproximadamente 70% a 80% das matriculas no total da oferta de educação
profissional, sendo ofertado, sobretudo, nas redes do Sistema S (GRABOWSKI; RIBEIRO,
2010, p-272).
Nesse diapasão, pode-se afirmar que a política de formação básica no governo FHC
configurou-se como assistencialista e compensatória, nos moldes neoliberais das políticas
focais, em detrimento da perspectiva universalista, cuidando em amenizar a pobreza para
evitar tensões que pudessem comprometer a continuidade das reformas econômicas. O que
nos remete à política implementada no idos do século XX, quando da criação das Escolas de
Aprendizes e Artífices nas capitais do país em 1909, tema já exposto alhures, retomando o
princípio inicial que orientou a formação das referidas escolas, uma politica assistencialista e
compensatória para os “desafortunados” da sorte.
92
A política do ensino profissional/básico contribuiu para acentuar o caráter elitista e
dual do sistema educacional brasileiro, reforçando, na prática, o dualismo estrutural, a divisão
entre trabalho manual e intelectual, entre ensino profissional e propedêutico, entre os que têm
acesso aos bens materiais e simbólicos e os excluídos do acesso a estes bens. Destinado a um
enorme contingente de trabalhadores sem ou com pouca escolaridade, uma formação
profissional aligeirada, precária, de caráter adestrador e pragmático, de preparação para um
ofício num contexto de intensa precarização do trabalho.
Esses cursos básicos assumiram mais a função de treinamento aligeirado,
desconsiderando uma política mais ampla que oferecesse condições ao trabalhador de dar
continuidade aos seus estudos. Ao contrário, os trabalhadores “incapazes de estudar” têm que
“aprender a trabalhar” através dos cursos básicos (KUENZER, 2007a, 2010, 2011),
conformando-os à posição subalterna na divisão social e técnica do trabalho.
Como reiteradamente afirmamos, a separação da educação profissional básica do
ensino formal reflete e reforça o dualismo estrutural da educação no país, na medida em que
exclui um grande contingente de trabalhadores do acesso a oportunidades de formação
qualificada, não se pode pensar em capacitação do trabalhador num cenário de precarização
da escola formal. A formação profissional não pode prescindir de uma educação básica que
oportunize o mínimo de saberes para a sua inserção como cidadão e trabalhador.
A prática de um ensino deficitário, de qualidade sofrível para uma clientela que, pelo
histórico de desassistência por parte do Estado e vulnerabilidade social, necessitaria de um
período mais longo de estudos, e de estratégias pedagógicas para sanar as deficiências
escolares, demandando investimento em infraestrutura, professores qualificados, estratégias
educacionais adequadas às particularidades desses educandos, além de reformas que
extrapolam o âmbito da escola.
Na prática, no ensino básico as políticas públicas de universalização no Governo FHC
foram minadas pelas políticas macroeconômicas, através de reiterados cortes de gastos sociais
que inviabilizaram a efetivação das políticas de universalização com qualidade, atendendo
apenas aos critérios quantitativos.
O que se constatou foi uma dicotomia entre a universalidade da educação básica e a
qualidade desta, em que uma grande parcela conclui o ensino fundamental sem dominar a
93
leitura e a escrita, o que nos leva a ilação de que só o acesso à escola não basta para que
ocorra aprendizagem. Não alterando a dualidade estrutural de escolas diferenciadas para
segmentos distintos, em especial, uma escola pobre (material e culturalmente) para uma
clientela igualmente pobre, a escola continuará cumprindo a função social de reprodução das
estruturas sociais, refletindo as estratégias de classes e reprodução de estruturas de poder
associadas à divisão social e técnica do trabalho, promoverá uma “inclusão excludente”
(KUENZER, 2009).
O referido quadro agrava-se ainda mais face à precarização do trabalho e a crescente
elevação da escolaridade exigida pelo mundo do trabalho. É neste cenário que se apresenta os
cursos profissionalizantes básicas, como alternativas redentoras e emergenciais de inserção
dos trabalhadores no mundo do trabalho.
A opção por investir nessas políticas de formação básica, sem alteração das estruturas
sociais, tem uma conotação conservadora, no sentido de reprodução da ordem estabelecida ou
das relações de produção capitalista, na medida em que não contrariam os interesses
hegemônicos, tendo um custo político e econômico mínimos.
Insta expor informações quanto à conformação do ensino básico; segundo dados do
Censo Escolar 2006, 90,49% dos alunos matriculados no ensino fundamental, incluindo o
EJA, estão em escolas públicas, enquanto 9,51% nas escolas privadas. (MOURA, 2010)
Cabe ainda acrescentar, segundo SIMÕES (2010, p. 101), que, apesar da ampliação do
acesso, atingindo a universalidade quantitativa, esta, no entanto, é acompanhado de
reprovações sistemáticas e um significativo percentual no quesito evasão, o que se materializa
no abandono “físico” e “espiritual” do aluno, uma vez que somente 70% dos jovens
concluíram o ensino fundamental, e muitos pela Educação de jovens e Adultos (EJA). O
sucateamento da escola e a falta de perspectiva de trabalho e vida futura faz com que a
instituição perca significado para os educandos.
Com efeito, a evasão escolar, antes de se confirmar como evasão física, é também
precedida por uma invisível e simbólica evasão de sentido cultural e desejos de presença de
professores e alunos. (SIMÕES, 2010, p. 102).
O gráfico abaixo nos dá uma ideia da situação crítica (calamitosa) da educação dos
jovens no país (de 15 a 25 anos), em que um reduzido número (24%) apenas estudava, sendo
94
preocupante o número de jovens que não estudavam, não trabalhavam, ou procuravam
emprego, apresentando-se como um forte candidato a compor o número de egressos e
ingressos do sistema carcerário no cenário nacional, o que ilustra de modo negativo a situação
educacional do Brasil.
Gráfico 1 – Situação dos Jovens Entre 15 a 24 anos no Brasil.
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2001 apud SIMÕES, 2010. Tabela montada
a partir dos dados do Programa Nacional de Amostra por domicílios (PNAD) – 2001.
É inegável o grande avanço nos anos 1990 no que concerne à universalização da
educação fundamental e ampliação da oferta do ensino médio; contudo, esta dilatação da
oferta se efetivou em detrimento da qualidade, os dados provenientes de avaliações nacionais
e internacionais – Saeb (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS
EDUCACIONAIS, 1999, 2002, 2005), ENEM (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E
PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2004a, 2006b), IBGE e PISA (INSTITUTO NACIONAL
DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2001)- mostram sérios problemas de
eficiência (para usarmos jargão economicista) do sistema educacional brasileiro,
historicamente perpassado por um dualismo estrutural arraigado, forjando escolas
diferenciadas para clientelas diferenciadas, dualidade esta alicerçada em uma sociedade
caracterizada historicamente por grandes desigualdades sociais e econômicas, como a
brasileira.
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), elaborado e aplicado
pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), vinculado ao
MEC, faz a aferição da situação dos concluintes, da quarta e oitava série do ensino
95
fundamental e do terceiro ano do ensino médio, a partir dos Parâmetros Curriculares
Nacionais; coletando dados por meio de testes cognitivos aos educandos e aplicação de
questionários sócio-econômicos aos discentes, professores, turmas, diretores e escolares,
através de amostras representativas da população escolar brasileira, com o objetivo de aferir a
condição dos concluintes do ensino básico em termos de apreensão e aquisição de habilidades
e competências, com a intenção de avaliar não o aluno isoladamente, mas o conjunto do
sistema educacional e traçar o perfil sócio-econômico dos educandos.
Os indicadores aferidos na amostra dos discentes da quarta série registrou um quadro
alarmante, em que 59% do total de estudantes brasileiros situava-se, no final dos anos 1990 e
inicio da primeira década de 2000, nos patamares entre os estágios Muito Crítico e Crítico.
Em Matemática a situação não é diferente, ficando em 52% (INSTITUTO NACIONAL DE
ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2004).
No que concerne aos discentes da oitava série, “em Língua Portuguesa, apenas 10%
dos estudantes estão no estágio considerado adequado. Em Matemática são menos de 3% dos
alunos” (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2004,
p. 7).
Com relação aos concluintes do ensino médio,
42% dos alunos estão no estágio 'muito crítico' e 'crítico' de desenvolvimento de
habilidades e competências em Língua Portuguesa. São estudantes com dificuldades
em leitura e interpretação de textos de gêneros variados. (...) Os denominados
'adequados' somam 5% (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS
EDUCACIONAIS, 2004, p. 7).
A partir dos dados do Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais (2001,
2004, 2006b), observa-se forte correlação entre o perfil socioeconômico, a posição social do
educando na estratificação social, e seu desempenho nos testes. Dos discentes do ensino
médio com desempenho inadequado, mais precisamente, no estágio “muito crítico”, 76%
encontram-se majoritariamente matriculados no turno escolar noturno, 96% estudam em
escolas públicas, 48% combinam trabalho e estudo e 84% apresentam distorção idade-série,
estando acima da considerada ideal para a série. Além disso, apresentam mães com reduzida
escolaridade.
O perfil acima contrasta com os educandos que apresentam desempenho adequado, no
qual 76% estudam na rede de ensino privada, 89% cursam a escola no turno diurno, 87% só
96
estudam e 84% das genitoras tem apenas o ensino médio (INSTITUTO NACIONAL DE
ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2004).
Outro indicador, essencial para se entender o quadro da educação no país, é a evasão
escolar, a qual, na rede pública, corresponde a 17% das matrículas, sendo que 70% dos que
evadem estudam no turno noturno (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS
EDUCACIONAIS, 2004, p. 8).
Interessante registrar o dado quanto à distorção idade-série na educação, no Brasil
53,3% dos discentes matriculados no ensino médio apresenta inadequação com a faixa etária
ideal, aproximadamente, entre 15 e 19 anos de idade. A distorção idade-série na Região
Nordeste atinge 70%, enquanto na Região Sul é de 37,3%. Em Pernambuco, especificamente,
corresponde ao percentual de 67,5.
Com relação aos discentes com rendimento 'muito crítico', merece destaque os dados
relativos à repetência de série, onde 66% dos alunos já repetiram uma ou mais vezes a série
escolar. Também nessa faixa de desempenho, especificamente em Língua Portuguesa, cerca
de 40% concluíram o ensino fundamental via supletivo.
Os dados obtidos mostram como a educação é desigualmente distribuída, apontando as
disparidades entre regiões, redes de ensino público e privado, estrutura escolar, clientelas e
distintos níveis culturais e sócio-econômico. Constata-se que a diferença entre as redes
privadas e públicas são bem mais significativas de que as diferenças entre as regiões,
“enquanto a diferença no rendimento em Língua Portuguesa entre os estudantes do nortenordeste e do restante do país apresentava-se próximo a 20 pontos, a diferença entre as redes
pública e privada no nordeste é superior a 50 pontos” (INSTITUTO NACIONAL DE
ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2004, p. 29).
Em matemática o quadro é mais contrastante. Segundo os dados do Sistema Nacional
de Avaliação da educação básica (Saeb) (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS
EDUCACIONAIS, 1999, 2002, 2005) na rede pública, no intervalo entre 1995 e 2001, período
situado na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, o desempenho dos discentes
piorou em menos 9,2 pontos, enquanto na rede privada melhorou 32,1 pontos. Neste mesmo
período, a diferença entre os discente da rede pública e privada alargou-se 41,5 pontos em
Matemática e 33,7 em Português. Estudantes que sempre estudaram em escolas privadas
97
apresentaram colocação acima daqueles advindos da rede pública. A diferença aproxima-se
aos 54 pontos em Língua Portuguesa e 71 pontos em Matemática (INSTITUTO NACIONAL
DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2004, p. 31).
Sendo o ensino pago seletivo economicamente, atendendo uma clientela bem menor e
em contexto social favorável, essa queda diferenciada de desempenho revela um
aprofundamento das desigualdades sociais, resultado das políticas de desmonte do Estado e de
cortes sucessivos de investimentos sociais, o que reforça ainda mais o dualismo da educação
brasileira, materializado em redes distintas de atendimento para clientelas diferenciadas. Uma
rede privada, para aqueles que podem pagar, e uma rede pública de massa, de caráter
discriminatório, cuja funcionalidade adéqua-se à reprodução das estruturas de poder e de
classes, da reprodução das relações de produção capitalista.
Mesmo diante deste quadro o governo promoveu a reforma do ensino profissional,
desmembrando-o em médio e profissional, reduzindo a oferta de ensino médio de qualidade,
oferecendo um ensino profissional de nível técnico aligeirado, num contexto em que um
número significativo de alunos egressos do ensino médio apresenta sérias deficiências de
aprendizagem.
A reforma partiu do pressuposto de que o modelo educacional das escolas técnicas
federais apresentava-se obsoleto, ineficiente e dispendioso, não atendendo às novas demandas
econômicas do mundo globalizado; contudo, a reforma contribuiu para reforçar a dualidade
estrutural resultado da desigualdade abissal entre as classes no país, configurando, de fato,
uma contrarreforma do Estado vinculada ao processo de reestruturação do capital.
No que tange à dualidade público/privado é importante considerar qual é a clientela
que tem acesso à escola de qualidade, eis que “as elites” preenchem as vagas das instituições
de melhor qualidade, seja ela pública ou não, apropriando-se dos bens simbólicos, do saber
socialmente e historicamente construído, os quais se tornam monopólio desses grupos, e
instrumento de poder.
Reitere-se, há escolas públicas de qualidade, e escolas privadas ruins, cujo
desempenho depende fortemente da origem social da clientela destas instituições, pois as
melhores instituições públicas, pelo concorrido acesso, tende a abrigar aqueles alunos que
dispõem de melhores oportunidades de formação nas fases escolares anteriores. Como
98
demostra o gráfico abaixo, a oferta no ensino médio concentra-se na rede pública estadual,
que tem a clientela discente oriunda das camadas populares da sociedade, e estas escolas se
caracterizam pela precariedade.
Gráfico 2 – Matrícula, em 25/03/1998, no Ensino Médio, por Dependência
Administrativa – 1998 – Brasil.
Fonte: Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais - INEP, 1999
99
Gráfico 3 – Matricula, em 25/03/1998, no Ensino Médio, por Dependência
Administrativa – 1998 – Nordeste.
Referendando o gráfico e todo o exposto, têm-se os dados do CENSO escolar de 2006,
os quais mostram que 90,49% matriculados no ensino Fundamental (incluindo EJA) estão em
escolas públicas, enquanto 9,51% nas escolas privadas; no ensino médio estes números não
diferem muito.
Uma educação de qualidade pressupõe investimentos, vontade política, não é
simplesmente, como defendem os ideólogos neoliberais, uma questão técnica, de
gerenciamento de recursos – frequentemente suficientes –, não se trata da incapacidade
estrutural do Estado de gerir um ensino de qualidade.
Embora o potencial mínimo de recursos para a educação - 4,44% do Produto Interno
Bruto (PIB) - não esteja tão distante dos percentuais dos países desenvolvidos, já que a média
da OCDE é de 4,9 do PIB, este é inferior, em termos absolutos, quando comparado ao desses
países, o que implica em um valor por aluno muito pequeno (INSTITUTO NACIONAL DE
ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2003, 2004b). O outro fator é o abismo
educacional que nos separa em relação a estes países e até mesmo países com padrão de
desenvolvimento similar, demandando valores bem mais elevados para vencer os desafios
educacionais, no sentido de democratizar o acesso a uma educação de qualidade e superar um
atraso educacional secular.
100
Outro aspecto relevante no quadro educacional brasileiro é a discrepância entre
valores gastos nos Estados da federação, em 1998: no Brasil tinha-se um gasto médio de R$
670,00 aluno/ano, no Maranhão o valor era de R$ 401,00 aluno/ano, no Rio de Janeiro de R$
877,00
aluno/ano
(INSTITUTO
NACIONAL
DE
ESTUDOS
E
PESQUISAS
EDUCACIONAIS, 2003, p. 7), enquanto o aluno Cefetiano, conforme Relatório de Gestão
2002, tem um custo de R$ 2.900,00. Se considerarmos a diferença entre prefeituras, regiões,
Estados e União, teremos uma dimensão das desigualdades de financiamento; contudo, não há
que se nivelar tomando como parâmetro o menor valor, eis que uma educação de qualidade
implica custos.
Neste diapasão, sobreleve-se o exemplo coreano – país cuja situação socioeconômica e
educacional se assemelhava ao Brasil – onde se promoveu mudanças para reverter o quadro
de subdesenvolvimento; inicialmente foram alocados investimentos acima dos padrões
mundiais, o que mostra a participação do governo e sociedade, que resultaram em índices
excelentes – entre os primeiros nos exames do PISA, o que evidencia que educação exige
investimento. Confrontando tal mudança com a realidade brasileira, deve-se observar os
gastos das mensalidades da educação das elites se comparados com os parcos recursos
investidos por aluno/ano nos estados e municípios.
Segundo dados do Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais (2001), no
âmbito privado das famílias, a “prioridade” de gastos era distinta para os diferentes níveis de
renda e instrução. Naturalmente, as famílias com insuficiência de recursos tendem a
concentrar os mesmos no atendimento de suas necessidades básicas de sobrevivência,
apresentando, por conseguinte, uma reduzida diversificação de consumo. Diferentemente das
famílias de mais elevada renda e instrução do(s) progenitor (es) ou responsáveis, que
apresentam maiores gastos, em termos absolutos, e diversificação de produtos e serviços
educacionais consumidos.
De fato, esses contextos interferem no desempenho educacional dos educandos, não de
forma absoluta, mas, marcadamente, no papel da educação formal, numa sociedade de classes,
e na reprodução das relações de produção capitalista. É o que se observa estatisticamente, pela
coleta e análise elaboradas por diversas pesquisas, mormente as citadas nesse trabalho,
Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais (1998, 1999, 2000, 2001, 2002,
2003, 2004a, 2004b, 2005, 2006a, 2006b). As citadas pesquisas revelaram que as disparidades
se dão entre regiões, mas são muito discrepantes quando confrontadas entre as redes públicas
101
e privadas.
Outro indicador importante para avaliarmos a situação educacional brasileira é o
Programa Internacional de Avaliação (PISA) da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), aplicado aos países membros e convidado, dentre eles
o Brasil, compondo 32 países nesta etapa. A aplicação dos testes de proficiência no Brasil
coube ao Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep), sendo responsável pela
avaliação e análise dos dados, sob a orientação do Consórcio Internacional responsável pelo
programa. Em 2001, o foco da avaliação foi em Língua Portuguesa, mensurando a
proficiência em leitura (os outros focos são Matemática e Ciências, não avaliadas nesta
ocasião). Neste ano, 2001, o Brasil ocupou a última posição dentre os países avaliados (INEP,
2001).
A participação brasileira é relevante na medida em que enseja, mediante análise dos
dados coletados, comparar o desempenho dos educandos brasileiros no contexto da
realidade educacional nacional e internacional. No caso brasileiro, foram
selecionadas jovens entre 15 e 16 anos, mediante escolha alheatória, de sorteio de
escolas e, dentro das mesmas, sorteio de alunos das idades e séries incluídas na
amostra da população referência. Assim como na Saeb, agrega-se aos testes de
proficiência, a aplicação de questionários objetivando coletar informações
contextuais, pois não se pode pretender estudar resultados cognitivos de alunos
prescindindo de seu contexto de origem sócio-econômico e cultural. (INSTITUTO
NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2001, p. 23)
O resultado mostra a distância, o abismo que separa a nossa realidade educacional de
países desenvolvidos, bem como comprovam a dualidade coerente com um modelo de
sociedade desigual, excludente, cuja educação corresponde a um instrumento de reprodução
das estruturas de poder e das relações de produção capitalista.
4.5
A Reforma e o Perfil Discente da ETFPE/CEFETPE
A formação técnica proposta pelo Decreto n.º 2.208/97 estabeleceu uma educação
dicotomizada entre ensino médio e ensino técnico, entre instrução de caráter propedêutico e
instrumental, entre cultura geral e cultura técnica (profissional), não proporcionando ao
trabalhador a capacidade de compreender o processo produtivo de forma mais ampla,
limitando-se a garantir o treinamento de viés puramente instrumental, caracterizado pela
fragmentação, aligeiramento e superficialidade, logo superada pelas mudanças tecnológicas,
sobretudo, pelo emprego acirrado da ciência e tecnologia.
Mudanças se efetivaram no âmbito administrativo, gerencial, jurídico-ideológico e
102
pedagógico suscitando novos paradigmas, consubstanciados ao novo modelo de acumulação
capitalista flexível. Categorias como currículo por módulos e competência configuravam
novas concepções pedagógicas compatíveis com as novas demandas do capitalismo
internacional financeiro sob a égide do neoliberalismo. Currículos por módulo e competência
contrapuseram-se ao modelo precedente, constituído por disciplinas conteúdistas, os quais
foram apresentados como anacrônicos, rígidos, demasiadamente teóricos e inapropriados face
à nova conjuntura de intensa transformação tecnológica e organizacional.
Eram necessárias mudanças, segundo a ótica neoliberal, e tais transformações se
sustentavam no argumento da ineficiência, inadequação e na incapacidade de atendimento às
novas demandas do novo modelo produtivo do mundo globalizado, as quais o modelo rígido
de ensino profissional não conseguia atender:
O Ministro Paulo Renato, justificando a reforma da educação profissional, disse que
as escolas técnicas federais estavam preparando os alunos para passarem no
vestibular e esse não era o seu objetivo. Separou-se o ensino médio do técnico, mas
numa escola em Goiás alunos que já haviam terminado o ensino médio já muito
tempo, alunos de até 45 anos de idade, que voltavam e faziam só o curso técnico,
também passavam no vestibular. Também vários alunos que já haviam terminado o
ensino médio e tentado o vestibular várias vezes e não passavam. Depois esses
alunos faziam o curso técnico (especificamente o técnico) e eles também estavam
passando no vestibular. Assim, não é separando o ensino médio do técnico que vai se
impedir que o aluno faça o vestibular. Mesmo porque o vestibular é raciocínio e se
você estimula o aluno a pensar, e é isso que esses cursos fazem, ele vai acabar
passando no vestibular (DUARTE apud CORDEIRO, 2004, p. 196).
Além do argumento supra, acrescente-se ainda, na rede federal de escolas técnicas e
agrotécnicas, o alto custo alegado pelo governo, revelando a preocupação deste em cortar
gastos, pois tais instituições de ensino não atendiam, segundo a versão oficial, a função de
formar técnicos para o mercado de trabalho, graças à reconhecida qualidade do ensino
ministrado nestas escolas, as mesmas apresentavam-se ‘elitizadas’; além disso, o governo
argumentava que a clientela dessas escolas era composta, em grande número, de egressos da
“classe média”, que a usavam como trampolim para o ingresso no ensino superior, causando
um alto índice de evasão no último ano, já que os discentes tinham êxito nas seleções
vestibulares e, portanto, migravam para os cursos superiores.
Contudo, percebe-se que a evasão dos cursos técnicos do ensino médio integrado,
antes e depois da separação promovida pela reforma, decorria do dilema do jovem discente
entre estudar ou trabalhar, diante da dificuldade de conciliar as duas atividades entre concluir
o técnico e cursar a universidade, ele optava pela melhor formação profissional, a que trazia
103
melhores perspectivas. Não se pode prescindir do fato de que num país de abissal
desigualdade de classes, por conseguinte, de oportunidades, o jovem não almeje uma
formação superior e o status, o que se traduz na possibilidade de melhor remuneração e
mobilidade social ascendente.
Com a separação promovida, denota-se uma preocupação de contenção de classe, no
sentido de reforçar o velho dualismo estrutural que perpassa a historia educacional brasileira,
configurando um limite de classes, direcionando as camadas populares à formação
profissionalizante, básica e técnica, e o ensino superior para a formação das elites. Destarte, a
política governamental seguiu contrariamente ao desejo dos discentes, os quais vislumbravam
a oportunidade de cursar uma universidade, o que as condições da rede federal
propiciam/propiciavam, graças a um ensino de qualidade. Observando os gráficos 4 e 5,
particularmente, o primeiro, conclui-se que, por quase unanimidade, que o alunado aspirava à
universidade, indo na contra mão dos interesses do governo de que o educando cefetiano deve
priorizar o mercado.
Gráfico 4 – Alunos que aspiram a Concorrer à Universidade
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 1988. O curso especial hoje corresponde ao
pós-médio.
104
Gráfico 5 – Alunos do Curso Especial que participaram da Seleção à Universidade
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 1988.
Nota:*Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio.
Oliveira (2003) questiona a afirmação do governo, materializada na fala do Ministro
da Educação Paulo Renato, quanto ao perfil sócio-econômico da clientela das Escolas
Técnicas Federais, de que os discentes compunham-se de egressos da classe média; tal
elitização alegada é contestada pelos dados coletados em pesquisas realizadas no CEFET-MG,
que não referendam esta tese professada pelo governo. Os dados coletados indicam que a
maior parte dos alunos advém de escolas públicas e a escolaridade dos pais é mínima:
Foi tomado, como referencia, o período compreendido entre 1995 (antes da reforma)
e 2000 e os dados sintetizados que indicam: no turno noturno 77% dos alunos são
provenientes exclusivamente de escolas públicas e no turno diurno, 67%; no turno
noturno, 17% cursaram a maior parte do ensino fundamental em escolas públicas e
no turno diurno, 16%; 21%, no turno noturno, cursaram o supletivo e no turno
diurno, 1,5%. quanto à escolaridade dos pais, constatou-se que: mais de 50%, no
turno noturno, não possuem ensino fundamental completo e mais de 52% das mães
também não atingem esse nível, contra cerca de 5% que possuem curso superior. No
turno diurno, cerca de 37% dos pais possuem ensino fundamental incompleto e 17%,
curso superior. Quanto às mães, 35% não possuem ensino fundamental completo,
contra 18% que possuem curso superior (OLIVEIRA, 2003, p. 79).
Para Oliveira, o trabalho de pesquisa de D' Ávila (1998), no CEFET do Espírito Santo
e Ferreira (1990), no CEFET de São Paulo, revelou um percentual significativo de discentes
egressos de estratos sociais médio-baixo e baixo da sociedade em suas pesquisas. A referida
autora informa que os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (INEP) também
evidenciaram a inconsistência da afirmação do governo quanto ao perfil do aluno cefetiano,
não obstante, deve-se considerar as singularidades da realidade de cada instituição num país
105
de dimensão continental como o Brasil e sua heterogeneidade socioeconômica, histórica,
cultural e regional.
A partir do Gráfico 5, pode-se observar que 80% dos alunos do curso especial
(pósmédio) participaram da seleção do vestibular, o que se pode inferir que o curso técnico
apresenta-se como segunda opção, posteriormente à universidade; acrescente-se ainda um
outro dado, que os alunos do curso especial, 40% em média, cursam concomitantemente a
Escola Técnica Federal/Centro Federal de Pernambuco e a Universidade, e destes mais de
50% cursam o técnico na mesma área do curso superior. (Vide Gráfico):
Gráfico 6 – Alunos dos Cursos Especiais (Pós-Médio) que Estudam na ETFPE
e na Universidade Simultaneamente.
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização sócio-econômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota:*Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio.
106
Gráfico 7 – Alunos dos Cursos Especial cuja Área de Estudo é a Mesma do Curso Superior
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização sócio-econômica da clientela escolar ingressa na Escola
Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota: *Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio.
A partir da leitura dos gráficos supra expostos podemos afirmar que a separação
promovida pelo governo não atendeu ao argumento por este apresentado, eis que o alunado
não abandonou a ideia de cursar o ensino superior como demonstrado no aumento de
discentes (vide gráfico 5) que concorreram às vagas oferecidas pela universidade.
Interessante registrar que o ETFPE oferecia, até 1997, curso regular (médio
profissionalizante) nos três turnos e o curso especial (pós-médio) apenas à noite, porém, a
partir de 1998, com a transformação da Escola Técnica em Centro Federal, este passa a ofertar
o ensino médio, o subsequente (profissional, semelhante ao curso especial) e o tecnólogo
(superior), todavia o médio só dispõe de vagas no turno diurno, caracterizando mais uma
forma de alijar o aluno que trabalha.
Trazendo a discussão fomentada por dados para o CEFET/PE, observa-se um
desequilíbrio favorável ao egresso das escolas particulares, tendo como explicação para o
maior número de egressos oriundo da rede particular de ensino o fato de aquele centro
educacional ser a única escola profissional federal gratuita de reconhecida qualidade na área
metropolitana do Recife, o que suscita uma maior seletividade (vide gráfico 10 e 11), a
motivação indicada no gráfico citado suscita ainda uma maior seletividade.
Insta destacar, porque relevante, que a partir de 1998, ano da cefetização, ocorre a
separação do ensino propedêutico do profissional, que se traduz na extinção do curso regular
107
(integrado) e na oferta do ensino médio; em relação a esse último, o desequilíbrio entre as
redes públicas e particulares se tornou ainda mais acentuado, eis que o ingresso de alunos de
escola pública reduziu, em média, 10%, reforçando a dualidade histórica de uma formação
propedêutica, cientifica e humanística preparatória para a universidade e uma formação
técnica profissional aligeirada, superficial para o mercado de trabalho para os trabalhadores.
(Vide Gráfico 8).
No que tange ao ensino especial, a partir de 1998 passou a denominar-se subsequente,
o qual passou a ser ofertado nos três turnos, diferentemente do antigo curso – especial – que
era oferecido apenas à noite, manteve-se sem maiores alterações, apresentando um
desequilíbrio de menor graduação (vide Gráfico 9).
Gráfico 8 – Escola de Origem dos Candidatos – Curso Regular
Fonte: Escola Técnica Federal De Pernambuco - ETFPE. Caracterização socioeconômica da clientela escolar
ingressa na Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota: *Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio e do sequencial.
108
Gráfico 9 – Escola de Origem dos Candidatos – Curso Especial
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização sócio-econômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota: *O curso especial é equivalente ao sequencial; ambos são pós-médio.
O crescimento da procura dos cursos oferecidos pelo CEFET/PE se deve à imagem
positiva da ETFPE ou CEFET/PE como centro de excelência de ensino, o que se constata no
Gráfico 10 – Motivo da Escolha pela ETFPE – Curso Regular
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
109
Gráfico 11 – Motivo da Escolha pela ETFPE – Curso Especial
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Como dito alhures, o fato de ser a única escola de excelência patente, o acirramento da
competição pelas vagas cefetianas se traduz no percentual de alunos que frequentam cursos
preparatórios, objetivando a seleção da Escola/Centro Federal de Educação Tecnológica de
Pernambuco, o que difere no curso especial, em que uma fração mínima de alunos
frequentava cursos preparatórios, eis que já concluíram o ensino médio.
Da leitura de todos os gráficos, percebe-se que os candidatos priorizavam a entrada na
universidade, além de que um percentual significativo de alunos cursam, concomitantemente,
a universidade e a escola, na mesma área, o que enseja a inferência de que tais discentes
buscam nas escolas técnicas não apenas a prática, quiçá ainda o enriquecimento curricular
(vide Gráficos 6 e 7).
110
Gráfico 12 – Participação em Cursos Preparatórios para a ETFPE – Curso Regular
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização sócio-econômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota: *Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio.
Gráfico 13 – Participação em Cursos Preparatórios para a ETFPE – Curso Especial
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização sócio-econômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001. O curso especial equivale ao PósMédio.
Os Gráficos seguintes, a saber, 14 e 15, correspondem ao número de vezes que os
alunos concorreram ao processo seletivo nos cursos regular e especial, e, a partir de 1998, nos
cursos médio e subsequente, denotando que, com a reforma, tem-se um predomínio quase
absoluto de aprovados na primeira tentativa, quiçá refletindo o significativo número de
111
discentes que frequentaram cursos preparatórios, além do aumento de aprovados entre os
egressos da rede privada, os quais desfrutavam de melhores condições objetivas de estudo.
Enquanto isso, no curso especial não se observa maiores alterações; nos anos anteriores à
reforma oscilou em torno de 10%, predominando dos aprovados em primeira tentativa.
Gráfico 14 – Número de vezes que o Aluno Concorreu ao Processo Seletivo – Curso Regular
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa
na Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota: *Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio.
Gráfico 15 – Número de vezes que o Aluno Concorreu ao Processo Seletivo – Curso Especial
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa na
Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota*Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio
112
Os dados apresentados pela Escola Técnica Federal de Pernambuco não destoam dos
dados apresentados pelo INEP, no que concerne à relação educação versus trabalho, ou seja,
dos alunos que trabalham e sua formação, eis que apresentam um numero significativo de
alunos que trabalham nos cursos oferecidos no período noturno, diametralmente proporcional
aos cursos regular e médio, que tem uma parcela diminuta no mercado de trabalho. O
desmembramento entre o médio e o profissional ocorrida no CEFET/PE não significou a
oferta de ensino médio no período noturno, o que poderia trazer um atendimento àquela
clientela, excluindo-a da oferta de ensino médio de qualidade. Gráficos 13 e 14.
Gráfico 16 – Alunos que Trabalham – Curso Regular
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa
na Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota:*Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio.
113
Gráfico 17 – Alunos que Trabalham- Curso Especial
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar ingressa
na Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
O Gráfico 18 demonstra que o número de vagas sofreu uma queda no ano de
implementação das reformas, graças ao processo de mudanças que provocaram a
desestruturação momentânea do recém-criado Centro Federal de Educação Tecnológica.
Gráfico 18 – Matrículas nos Cursos Normais e Especiais
Fonte: Gráfico montados a partir dos dados da Caracterização socioeconômica da clientela escolar
ingressa na Escola Técnica Federal de Pernambuco no período de 1994 a 2001.
Nota:*Há a extinção do curso regular integrado e a oferta do Ensino Médio e do Pós-médio (equivalente
ao antigo especial). Obs.: os cursos normais funcionavam pela manhã, tarde e noite, os especiais
apenas à noite.
114
A cisão do ensino propedêutico do profissional, promovido pela reforma, resultou num
aumento da participação de egressos da escola particular; aconteceu, também, num
aligeiramento em relação ao nível dos cursos, para muitos, adestramento e reforçou a
dualidade educacional, promovendo uma maior exclusão da clientela de baixa renda, da
oportunidade de acesso ao ensino médio-integrado, ao profissional, ou seja, acesso ao ensino
de qualidade que ensejava àqueles discentes às bases científicas, humanísticas, técnicas,
imprescindíveis a sua atuação como sujeito histórico.
Na realidade, a reforma engendrou um maior desnivelamento entre àqueles egressos
do ensino médio público, estadual e municipal, de reconhecida precariedade, e os egressos das
escolas particulares, de formação, segundo os dados apresentados pelas avaliações do INEP,
de melhor qualidade, comprometendo o rendimento das aulas, eis que o docente deverá
promover um nivelamento mínimo.
Outro aspecto relevante é que, majoritariamente, os discentes do ensino sequencial,
“pós-médio”, optaram pela universidade, sendo o ensino técnico uma segunda opção.
Ressalte-se ainda que aproximadamente metade destes discentes cursam concomitantemente a
universidade e, destes, metade cursam também o ensino técnico na mesma área do curso
universitário; infere-se ,desse modo, que tais alunos buscam a prática, mas priorizam o nível
superior, por razões culturais e financeiras. Interessante registrar ainda que o curso médio,
com a reforma no CEFET/PE, não foi ofertado no horário noturno, excluindo, assim, a classe
trabalhadora do acesso a um ensino médio de qualidade.
A estratégia do governo de atribuir um caráter terminal ao ensino profissionalizante
não logrou êxito, uma vez que, como demonstram os dados, os discentes continuam
vislumbrando a universidade, e grande número de discentes cursam esta concomitante ao
ensino profissionalizante.
A reforma acentuou o caráter dualista na medida em que manifesta um intuito de
contenção de classes, legando aos filhos dos trabalhadores de baixa renda o ensino
profissional, priorizando a universidade às classes médias e às elites.
115
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A escola não está dissociada de seu contexto histórico, é determinada e determinante
em suas relações sociais, não podendo ser pensada no vazio; ela configura um espaço de
disputa hegemônica de projetos de sociedade, de reprodução, controle e mudanças e “se
define pelas relações de poder existentes no plano estrutural e conjuntural da sociedade […]
que se dá em todas as esferas da sociedade e, por isso, não pode ser tomada como um fator
isolado, mas como parte de uma totalidade histórica complexa e contraditória” (FRIGOTTO,
2010, p. 25).
Nesse contexto, as reformas no ensino profissional na gestão FHC se configuraram
como reação às macromudanças no processo de reestruturação do Estado brasileiro sob a
égide neoliberal, significando um retrocesso em relação às garantias de direitos sociais, no
que concerne à educação, o que reforçou a herança histórica que reproduz e se alimenta da
estrutura dual e, portanto, desigual do sistema educacional brasileiro.
A instituição escola já se consolida na literatura especializada como espaço de
reprodução das relações sociais de reprodução, das estruturas de classes que configuram
historicamente um modo de produção; todavia, não se pode negar que a escola é o locus de
disputa hegemônica vinculada a diferentes projetos de sociedade, é determinada e
determinante em suas relações sociais. Como aponta Simões, in verbis:
No conceito de hegemonia e contra-hegemonia, a escola reproduz as classes, mas,
sofre a resistência das lutas dos jovens pertencentes à classe trabalhadora. Essa
contra hegemonia, ou resistência, fundamenta-se em movimentos sociais e políticos
que ocorrem fora da escola. O sistema educacional não é só um instrumento da
classe dominante, mas um produto dos interesses de classes (SIMÕES, 2010, p.
109).
Como tática de resistência e emancipação das camadas populares, a escola vem, nos
últimos tempos, apresentando desafios que a colocam como instituição essencial, como
ambiente de oposição entre os novos mecanismos de reprodução das relações sociais de
produção e as transformações de condições dos trabalhadores para superação da desigualdade
social.
Se, por um lado, não há dúvida de que a escola reproduz as relações sociais de
produção na perspectiva do sistema como um todo, por outro a questão é entender o
papel da escolarização na luta e conquista das pessoas e grupos no seu
desenvolvimento individual e coletivo (SIMÕES, 2010, p. 101-102).
116
A reprodução das relações sociais não se dá de forma determinística, mas em um
cenário de disputa dialética, cujas contradições engendram a produção de novas relações
sociais e históricas. O processo histórico não está preso a determinismos de natureza
biológica, econômica, divina ou de outra ordem, o homem é sujeito do devenir histórico,
contudo, está preso a uma historicidade, na qual é sujeito que a determina e é por ela
determinado. Nesta perspectiva, revela-se, no universo micro, a relação dialética entre sujeito
e estrutura, assim como, entre estrutura e sujeitos no processo social. Desse modo, a
instituição escolar pode reproduzir as desigualdades sociais, apesar de sua expansão estar
associada à luta da classe trabalhadora por mais igualdade e mobilidade social.
A escola constitui-se num espaço de disputa hegemônica, na perspectiva macro, é um
instrumento de reprodução e transmissão de valores dominantes, de distribuição desigual do
capital simbólico, contribuindo para a reprodução da estrutura de classes. Já numa perspectiva
micro, a escola pode ser instrumentalizada como estratégia de indivíduos em superar as suas
condições sócio-econômicas mais precárias de vida, através da aquisição do conhecimento e
busca de formação. Facultando a alguns a possibilidade de mobilidade social, todavia,
configurando-se como exceções que confirmam a regra, não alterando o papel macro de
reprodução das relações sociais de produção historicamente situada.
A educação no Estado capitalista conforma-se numa rede dual de escolarização,
ensejando a reprodução da divisão social e técnica do trabalho, assim como a divisão
internacional do trabalho, por sua vez, engendra um processo de inclusão subordinada dos
países “periféricos” aos núcleos globais do capitalismo.
O crescimento das demandas por direito à educação inserem-se no leque das lutas
históricas dos trabalhadores por direitos sociais, num contexto de ampliação da democracia
que se consolidou no Estado Providência, erigido na conjuntura de crise do capitalismo liberal
e do espectro do ideário socialista, materializado, em parte, no comunismo real.
O Estado de Bem-Estar ampliou os espaços democráticos, publicizando direitos
sociais, tidos como obrigação do Estado, o que contraria o interesse privado do capital em
mercantilizar tais direitos – educação, saúde, previdência, como exemplos. No Brasil não se
instituiu o Estado Providência, contudo o mesmo repercutiu, inspirando na feitura da
Constituição Federal de 1988.
117
O crescimento da demanda por ensino profissional é parte do pleito dos trabalhadores,
motivados tanto pela valorização da educação em relação ao conjunto dos direitos da
cidadania, quanto como estratégia de inserção no mercado de trabalho num contexto de
crescente precarização. Por outro lado, outrossim é pleito, ainda, de segmentos do
empresariado, os quais demandam por mão de obra qualificada necessária para a viabilização
da expansão dos seus interesses econômicos, eis que, segundo as leis de mercado, quanto
maior a oferta, menores os custos desta força laboral.
De fato, a democratização tem aumentado a inclusão nas diversas modalidades de
educação disponibilizada, contudo, a expansão tem sido acompanhada da precarização dos
processos educativos, que resultam em mera oportunidade de certificação, numa educação de
massa, um processo de inclusão que, dada a sua desqualificação, é excludente (KUENZA,
2010, p. 16).
No tocante à alegação da meritocracia, professadas pelos ideólogos do mercado, de
naturalização das desigualdades, impulsionada pela ideia de que a competitividade é algo
natural e necessário como fator propulsor do desenvolvimento, tem-se que o referido discurso
meritocrático apresenta-se como uma justifica ideológica que escamoteia as razões estruturais,
em que a individualização do fracasso aparece como resultado de ações individuais, no qual
as desigualdades e antagonismos de interesses são acomodados sob uma pretensa unidade,
dissolvendo-se, portanto, as relações de poder.
Não se pode negar que a essência da escola é meritocrática, no sentido de que ela
classifica os indivíduos; todavia, deve ser observado que o acesso aos bens materiais e
simbólicos passa por mecanismos de produção e reprodução das estruturas sociais das
relações de produção. Numa sociedade de classes, as oportunidades são, em si, assimétricas,
constituindo escolas diferenciadas para públicos diferenciados.
Enfatize-se que nesta realidade, especialmente nas economias em desenvolvimento, na
periferia dos centros hegemônicos, o mérito desempenha um papel apenas marginal para os
filhos dos segmentos pobres da sociedade, como bem apontou Simões (2010, p. 104): “Não é
diretamente a escola que realiza as grandes operações de distribuição dos alunos, são as
desigualdades sociais que comandam o acesso às diversas formas de ensino”. Dentro da
perspectiva dualista ora trabalhada, tem-se que o ensino profissional sempre foi atribuído às
camadas de baixa renda no Brasil.
118
Enquanto as intensas e frequentes transformações tecnológicas, associadas ao processo
produtivo, requerem da força laboral níveis mais altos de escolaridade e de criatividade, o que
demandaria maior investimento na formação mais completa desse trabalhador, a reforma do
ensino profissional na gestão FHC, consubstanciada na nova LDB (9.395/96) e no Decreto nº
2.208/97, seguiram um sentido contrário, aligeirando, fragmentando, na medida em que
separa o técnico do propedêutico no nível médio e dissocia a formação profissional básica do
ensino regular. Tais medidas contribuem para uma formação apenas superficial, instrumental,
precária e descartável, logo superada pelas mudanças tecnológicas instrumentalizadas pelo
capital.
A política implementada no governo de Fernando Henrique Cardoso reforçou o
dualismo estrutural, destinando aos trabalhadores uma educação básica, profissional e
tecnológica restrita, no caso, uma educação profissional concebida como adestramento rápido
em uma determinada habilidade, sem os conhecimentos dos fundamentos científicotecnológico-histórico-social, que permitem a compreensão dos fundamentos técnicos, sociais
e políticos das relações de produção nas quais estão inseridos, o que não oportuniza, portanto,
que os trabalhadores se constituam como sujeitos de seus itinerários históricos.
Na contramão da formação integral ampla, humanística e tecnológica, a política do
governo FHC não realizou um modelo de educação que concebesse a formação humana como
síntese, a qual contempla a unidade de conhecimentos gerais e específicos, tendo por eixos
norteadores o trabalho, a ciência e a cultura. O custo (financeiro) dessa educação equivaleria
ao quanto a elite paga nas escolas particulares, eis que uma educação de qualidade exige
recursos.
Insta-se destacar que os avanços institucionais da política de FHC foram relativizados
diante do paradoxo entre o discurso de modernização, melhoria e qualidade da educação e
redução sistemática de investimento em políticas sociais, concatenadas à ideia do Estado
Mínimo, com supedâneo no Consenso de Washington, o que promoveu uma despublicização
dos direitos, mercantilizando-os.
O período é marcado por políticas focais, em detrimento da universalidade,
significando a naturalização das desigualdades e a atenção apenas aos mais pobres entre os
pobres, ou a determinados segmentos sociais, sem questionamentos das estruturas econômicas
e políticas.
119
No seu cerne, as reformas contribuíram para manter a dualidade estrutural da escola
como reprodutora das desigualdades de classes, como produto e condição do projeto
dominante de sociedade brasileira, projeto de capitalismo associado e dependente ou um tipo
de desenvolvimento que, como afirmou Francisco de Oliveira, “se ergueu pela desigualdade e
se alimenta dela” (FRIGOTTO, 2005, p. 11).
As reformas na ETFPE/CEFETPE inseriram-se num conjunto maior de reformas
econômicas, atreladas ao processo de reestruturação econômica capitaneada pelas forças
sociais vinculadas aos interesses do capitalismo financeiro globalizado. Neste diapasão, a
implementação das mudanças administrativas e pedagógicas foi ungido de cima para baixo,
sem consulta, esclarecimento ou participação democrática daqueles que compunham a
instituição CEFET/PE. A tão volumosa metamorfose incidiu num processo de desestruturação
e desorganização, resultando numa crise de identidade da autarquia ora em comento, marcada
pela convivência com três níveis de ensino distintos, a saber, o médio, o profissional (pósmédio) e o tecnológico (superior), não existindo clareza na delimitação entre os níveis, eis que
muitos docentes lecionavam nos três níveis, sem distinção normativa de metodologia, carga
horária e etc.
Se historicamente havia uma maior participação de alunos egressos da rede privada,
motivada, como dito alhures, pela qualidade do ensino da única escola técnica federal da
região metropolitana do Recife, com o desmembramento entre o médio e o profissional,
aumentou a participação de discentes egressos das escolas particulares no ensino médio,
corroborando o dualismo estrutural do ensino médio voltado para preparação à seleção da
universidade, subtraindo o discente com insuficiência de recursos, que cursava o ensino
médio profissionalizante, do acesso a um ensino de qualidade que oportunizasse concorrer a
uma vaga no ensino superior.
Nessa diapasão a reforma reforçou a dualidade que perpassa a história do sistema
educacional brasileiro, pari passu a manutenção de um modelo de sociedade acentuadamente
excludente e concentrador de renda e riqueza; além disto, ofereceu um ensino
profissionalizante aligeirado e pontual, sem oportunizar ao discente às bases científicas e
humanísticas imprescindíveis para a formação profissional e cidadã, em face da precariedade
da formação escolar pública no país, como demonstrado pelas estatísticas das avaliações do
INEP.
120
Para aquele governo, as escolas técnicas estariam desvirtuando sua função, sendo
utilizadas pela classe média como trampolim para a universidade, argumento que legitimou a
separação. Contudo, mediante análise dos questionários socioeconômicos, provou-se que a
reforma não alterou esse quadro. Aqueles que ingressavam no ensino médio almejam a
universidade, os que cursam o sequencial já tentaram, na grande maioria, o vestibular das
universidades federais, e um número significativo cursavam concomitantemente, 40% em
média, a Escola Técnica Federal/Centro Federal de Pernambuco e a Universidade, e destes
mais de 50% cursavam o técnico na mesma área do curso superior.
Destarte, a política governamental seguiu contrariamente ao desejo dos discentes do
CEFETPE, os quais vislumbravam a oportunidade de cursar uma universidade, o que as
condições da rede federal propiciavam, graças a um ensino de qualidade, eis que, consoante
análise dos questionários socioeconômicos, 80% dos alunos do curso especial (pós-médio)
participaram da seleção do vestibular para ingresso na universidade, ou seja, o curso técnico
apresenta-se como segunda opção, o que se explica por razões econômicas (salariais) e
culturais.
Se havia o predomínio de egressos de escolas particulares, tal predominância
explicava-se pelo ensino de qualidade ofertado, o que atraia uma clientela mais preparada, que
conseguia superar processo seletivo concorrido; acrescente-se, ainda, ser esta a única escola
técnica federal no Grande Recife. Com a separação promovida, denota-se uma preocupação
de contenção de classe, no sentido de reforçar o velho dualismo estrutural que perpassa a
historia educacional brasileira, configurando um limite de classes, direcionando as camadas
populares à formação profissionalizante, básica e técnica, e o ensino superior para a formação
das elites.
Ressalte-se, porque relevante, que a reforma engendrou uma situação de precarização,
o que parece um paradoxo face às promessas do PROEP, evidenciada na escassez de recursos
para manutenção, não contratação de funcionários (administrativos e docentes) em face de um
quadro de aposentadoria em massa frente às ameaças de perdas de direitos, congelamento dos
salários.
O argumento do custo elevado das escolas federais - como se tratasse apenas de
gerenciamento, questão meramente técnica - dissimilou a ofensiva do capital no desmonte das
políticas de direitos sociais do Estado Providência, alicerçada no financiamento de um fundo
121
público compulsório, resultando na remercantilização e refilantropização de tais direitos,
desresponsabilizando o estado e o capital pelo financiamento dos mesmos.
A reforma do ensino profissional objetiva a adequação da educação à nova
sociabilidade do capital, mediante minimização do papel do estado, em relação à questão
social e a ofensiva do capital em sua necessidade imanente em mercantilizar necessidades
humanas, transformando direitos (historicamente conquistados) em serviços (mercadorias)
intercambiáveis no mercado, buscando fomentar um mercado de consumo de serviços
educacionais, ensejando novos “espaços” para reprodução e acumulação do capital, assim
como, a formação da força laboral a funcionalidade de reprodução das relações sociais
hegemônicas de produção capitalista no contexto de acumulação flexibilizada.
Os dados apresentados pela Escola Técnica Federal de Pernambuco não destoam dos
dados apresentados pelo INEP, no que concerne à relação educação versus trabalho, ou seja,
dos alunos que trabalham e sua formação, eis que apresentam um numero significativo de
alunos que trabalham nos cursos oferecidos no período noturno, diametralmente proporcional
aos cursos regular e médio, que tem uma parcela diminuta no mercado de trabalho. O
desmembramento entre o médio e o profissional ocorrido no CEFET/PE não significou a
oferta de ensino médio no período noturno, o que poderia trazer um atendimento àquela
clientela, excluindo-a da oferta de ensino médio de qualidade.
Sem olvidar que a escola é uma das formas de materialização da divisão de classes,
historicamente construída, tem-se que as reformas educacionais do ensino profissional,
vinculadas às demandas do novo regime de acumulação flexível num país de economia
periférica, aprofundaram as diferenças de classes, reforçando a dualidade estrutural.
Como reação às reformas, podemos propor uma escola que possibilite a emancipação
dos indivíduos e do país, rompendo com as estruturas de poder historicamente construídas
sobre a separação entre trabalho manual e intelectual; em que se atenue a divisão social e
técnica do trabalho, bem assim, com a divisão internacional do trabalho, o que ensejaria, ao
menos em tese, o desenvolvimento das potencialidades, ou possibilidades humanas, buscando
focar o trabalho como princípio educativo, no sentido de superar a dicotomia entre trabalho
manual e intelectual, incorporando a dimensão cognitiva ao trabalho produtivo.
Por fim, romper com este modelo dual é promover a defesa de uma educação unitária,
122
laica, gratuita, de formação polítécnica e omnilateral, em que estão integrados o trabalho, a
ciência e a cultura.
123
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