Adriana Cavalcanti dos Santos

Titulo da dissertação: “Formação continuada e ensino de língua materna na Educação de Jovens e Adultos: aproximações e distanciamentos”

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ADRIANA CAVALCANTI DOS SANTOS

FORMAÇÃO CONTINUADA E ENSINO DE LÍNGUA MATERNA NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: APROXIMAÇÕES E
DISTANCIAMENTOS

Maceió- AL
2006

2

ADRIANA CAVALCANTI DOS SANTOS

FORMAÇÃO CONTINUADA E ENSINO DE LÍNGUA E MATERNA NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E EEDULTOS: APROXIMAÇÕES E
DISTANCIAMENTOS

Dissertação apresentada como requisito
parcial à obtenção do grau de Mestre
no programa de Mestrado em educação
Brasileira do Centro de Educação da
Universidade Federal de Alagoas.
Orientadora: Drª.Tânia Maria de Melo
Moura

UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Maceió- AL
2006

3

BANCA EXAMINADORA

Profª Drª Tânia Maria de Melo Moura
Universidade Federal de Alagoas
Orientador

Peofª Drª Telma Ferraz Leal
Universidade Federal de Pernambuco
Examinador

Profª Drª Marinaide Lima de Queiroz Freitas
Universidade Federal de Alagoas
Examinador

4

DEDICATÓRIA

À minha mãe, Lúcia Maria Cavalcanti
dos Santos, professora, que me mostrou
o sentido do compromisso , respeito e
estima pela educação de crianças, jovens
e adultos.

5

AGRADECIMENTOS

À Tânia Maria de Melo Moura, professora e amiga, pela preciosa orientação desse trabalho e
confiança em minha autonomia, ajudando-me a realizar um sonho há muito acalentado. E, em
especial, pela sua dedicação à Universidade Federal de Alagoas.
À FAPEAL pelo apoio financeiro, tornando possível a realização da pesquisa e a minha
permanência em Maceió durante o mestrado.
Às professoras Telma Ferraz Leal e Marinaide de Lima Queiroz Freitas pelas valiosas
contribuições sugeridas na qualificação.
Aos coordenadores do DEJA pelo apoio e disponibilidade durante a coleta de dados.
Às professoras investigadas, especialmente, àquelas que permitiram a observação de suas
práticas pedagógicas.
A(o)s alunos(a)s das turmas observadas pelo carinho e respeito durante a coleta de dados.
A(o)s professore(a)s e colegas do programa de pós- graduação da UFAL pelas inúmeras
contribuições nesse meu processo de formação.
A(o)s professore(a)s pernambucanos pelos diálogos nos eventos de formação continuada,
instigando em mim o interesse por essa investigação.
A(o)s colegas da CUT Alagoas pelo apoio na fase final dessa pesquisa.
Às amigas, Eliene, Elisabete, Joana, Regina e Socorro pela solidariedade nos momentos
difíceis.
Às minhas amadas sobrinhas, Anna Flávia e Fernanda, pelo carinho.
Aos meus pais, Inaldo e Lucia, aos meus irmãos Flávio, Silvana, Herbes e Leydiana pelo
carinho, compreensão nos momentos de ausência, e pelo estímulo a realização dos meus
objetivos.
As minhas colegas da Secretaria Municipal de Educação de Arcoverde-PE pelo incentivo ao
meu desenvolvimento profissional.
Aos componentes do grupo de Pesquisa Teorias e Práticas em EJA do qual participo, pelo
estímulo à pesquisa.
À minha prima Ítala pelos ensinamentos e solidariedade.

6

Ao Luciano pelo carinho e amizade.
À Deus pelo dom da vida, por ter me concedido inteligência, força de vontade, encorajandome para superar os desafios, dando-me forças para permanecer firme na luta pelos meus
ideais.
Enfim, a todas as pessoas que me apoiaram nessa caminhada pelo incentivo e respeito.

7

RESUMO

A presente pesquisa é resultado de um estudo sobre o processo de formação continuada de
professores e de professoras da Educação de jovens e adultos, especificamente dos cursos de
língua materna, implementado pelo Departamento de Jovens e Adultos da Secretaria
Municipal de Educação de Maceió. Tendo claro que esse processo de formação poderia ter
fomentando mudanças na prática pedagógica, configurou-se como objetivo de investigação
avaliar as influencias do processo de formação continuada, especificamente dos cursos de
língua materna, a partir da visão de todos os sujeitos envolvidos e na prática pedagógica do
professor da EJA. Nesse sentido, optamos pelos pressupostos epistemológicos da abordagem
qualitativa, utilizamos instrumentos e procedimentos de coletas de dados, entre eles:
entrevistas, analise documental e observação em sala de aula. Para tanto,os sujeitos
investigados foram: professoras, coordenadores pedagógicos e professora formadora.
Apoiando-nos em autores como Nóvoa (1995); Pérez Gómez (2001); Bakhtin (2003); Geraldi
(2003); Traváglia (1997), nossa investigação evidenciou que não são exatamente as
discussões sobre a mudança na concepção de ensino da língua materna, no caso de Maceió,
instigada pelo estudo dos pressupostos epistemológicos da lingüística textual com enfoque
sociointeracionista, que garantem mudança na concepção de ensino de língua materna e na
pratica pedagógica. Mas, a partir de um processo contínuo de experimentação e reflexão, na
pratica e sobre a prática, além do aprofundamento dos pressupostos epistemológicos que
fundamentam as teorias lingüísticas. Em função dessa realidade, em Maceió, os dados
apontam a necessidade de investigar a prática para propor processos de formação;
investimento a longo prazo na formação do professor e da professora e o acompanhamento
pedagógico na escola, entre outros aspectos. Impulsionando, concomitantemente, influencias
inovadoras no ensino de língua materna.

Palavras chave: Formação continuada, ensino de língua materna, educação de jovens e adultos

8

ABSTRACT

The present research is result of a study on the process of continued formation of teachers of
adult and young educations, speciafically of the maternal language courses, implemented for
the young and adults Departament of the Maceió city department of education. Having
clearly that this process of formation could have fomented changes in pedagogical practice, it
was configured as objective of inquiry to evaluate the influences of the continued formation
process, specifically of the maternal language courses, from the vision of all the involved
individuals and in the pedagogical practice of the Young and Adult Education teacher. In this
way, we opted to the epistemological presupposition of the qualitative approach and used
instruments and procedures of collections of data, between them: interviews, documentary
analysis and classroom observation. For in such a way, the investigated individuals had been:
teachers, pedagogical coordinators and former teacher: Supported in authors as Nóvoa (1995);
Pérez Gómez (2001); Bakthtin (2003; Geraldi (2003) Traváglia (1997), our inquiry evidenced
that are not exactly the quarrels on the change in the conception of maternal language
education in the case of Maceió, instigated for the study of epistemological presupposition
of the literal linguistics with sociointeracional approach that guarantee a change in the
conception of maternal language education and in pedagogical practice. But, from a
continuos process of experimentation and reflection, in the practice and on the practice, in
addiction of the deepening of epistemological presuppositions that are base for linguistic
theories. Because of this reality in Maceió, the data point the necessity of investigating the
practice to consider formation processes; long stated period investment in the formation of the
teacher and the pedagogical accompaniment in the school, among other aspects. Stimulating,
concomitantly, innovative influences in the maternal language education.

Keywords: Continued formation, maternal language teaching, young and adult
education

9

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Formação acadêmica dos coordenadores do DEJA -----------------------------------25
Tabela 2 – Conteúdos trabalhados --------------------------------------------------------------------59
Tabela 3 – Faixa etária do(a)s aluno(a)s -------------------------------------------------------------95
Tabela 4 – Situação funcional -------------------------------------------------------------------------96
Tabela 5 – Tempo de afastamento da escola --------------------------------------------------------97
Tabela 6 – Permanência na escola --------------------------------------------------------------------98
Tabela 7 – Conteúdos trabalhados -------------------------------------------------------------------100
Tabela 8 – Conteúdos trabalhados -------------------------------------------------------------------102
Tabela 9 – Aspectos Lingüísticos --------------------------------------------------------------------132

10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 12
Abordagem Metodológica ................................................................................................
 Os instrumentos utilizados na fase de coleta de dados ..............................................
 As entrevistas .............................................................................................................
 As observações em sala de aula .................................................................................
 A análise documental .................................................................................................

15
15
16
19
22

Capítulo I .........................................................................................................................

23

LOCUS DE FORMAÇÃO CONTINUADA: CENÁRIO E OLHARES

1.1 Registrando a História: apresentando o cenário .........................................................
1.2 A configuração da política de formação continuada de(a) professor(a) em Maceió ..
1.3 Os cursos de LM .........................................................................................................
1.4 As zonais .....................................................................................................................
1.5 O GAP .........................................................................................................................

23
30
33
39
45

Capítulo II .......................................................................................................................

48

CURSOS DE LÍNGUA MATERNA NO BOJO DA FORMAÇÃO
CONTINUADA: UMA AVALIAÇÃO A VÁRIAS VOZES
2.1 Vozes diferentes, perspectivas similares.....................................................................
2.2 Seleção dos conteúdos: definições e redefinições ......................................................
2.3 Sugestões, releituras e redefinições: os conteúdos trabalhados durante os cursos de
LM ....................................................................................................................................
2.4 As dificuldades no processo de formação em LM ......................................................
2.5 O lugar do(a)s professore(a)s nos cursos: agentes ou pacientes .................................
2.6 Cursos de LM: uma avaliação a vários olhares ..........................................................
2.6.1 As vozes das professoras .........................................................................................
2.6.2 A voz da professora formadora ...............................................................................
2.6.3 As vozes dos coordenadores ....................................................................................
2.7 Mudanças na prática: as reflexões das professoras .....................................................

48
55
58

Capítulo III .....................................................................................................................

87

PRÁTICA PEDAGÓGICA E CURSOS DE FORMAÇÃO EM LM: UMA
APROXIMAÇÃO

61
66
70
70
72
75
79

11

3.1 As escolas ...................................................................................................................
3.1.1 A escola A.................................................................................................................
3.1.2 A escola B ...............................................................................................................
3.1.3 As professoras ..........................................................................................................

88
88
90
90

3.1.4 Perfil do(a) aluno(a) .................................................................................................
3.2 Aula de LM: os conteúdos ensinados .........................................................................
3.3 Concepção de linguagem que perpassam as aulas de LM ..........................................
3.4 Análise linguística: ecos na sala de aula .....................................................................
3.5 O lugar dos gêneros textuais nas aulas de LM ............................................................
3.6 As aulas de LM na EJA: as habilidades linguísticas ensinadas na escola ..................

94
99
105
117
123
132

(In) conclusões ..................................................................................................................

137

Referências Bibliográficas ................................................................................................

143

Anexos ..............................................................................................................................

152

12

INTRODUÇÃO

Não há ensino de qualidade nem reforma
educativa, nem inovação pedagógica sem uma adequada
formação do professor ( NÓVOA, 1997, P.9).

Nos últimos anos, a formação docente em serviço passou a ocupar o centro das
atenções no campo educacional, especificamente, a partir da década de 1990. Nesse sentido,
acentuaram-se por recomendações de órgãos internacionais, o numero de programas
governamentais preocupados com a formação continuada do (a) professor(a), pautando-se no
pressuposto de que a formação em serviço é mais incisiva no desempenho da prática
pedagógica do que a formação inicial.
Exercendo a docência, em cursos de formação continuada de professores(a)s,
encaminhando discussões sobre o ensino de LM em diversos programas governamentais¹;
alem de ministrarmos cursos e oficinas pedagógicas, no município de Arcoverde-PE, e em
outros municípios do sertão pernambucano, percebíamos, nesses eventos, as dificuldades
do(a)s professores(a)s em compreender os conteúdos específicos de LM trabalhados por
exigências desses programas. Observávamos também a resistência e/ou tentativa de aplicação
na prática dessas ‘novas’ discussões pelo(a)s professores(a)s sem fundamentos teóricometodológicos consistentes. Essa experiência, inquietava-nos e aguçava em nós a necessidade
de entendermos como as discussões teórico – praticas, fomentadas por formadore(a)s de
professore(a)s impulsionavam mudanças na prática pedagógica de ensino de LM, na escola, e
quais eram essas mudanças.
_______________________________
¹ Parametros em Ação (2001-2002); Programa de Formação de Professores Alfabetizadores – PROFA (20022003); Sistema de Avaliação do Estado de Pernambuco – SAEPE (2002-2004)

13

Aos sermos aprovadas, no programa de mestrado, desde o processo seletivo, optamos
por desenvolver a nossa investigação em Maceió-AL. Acreditávamos que refletir uma outra
realidade de formação continuada – não deixando de considerar as características comuns e
distintas próprias de processos formativos, mesmo em contextos diferentes, pois estamos
inseridos numa mesma conjuntura social-, seria significativo para nossa formação, para o
estado de Alagoas, em especial Maceió que ao longo de sua história apresenta poucos
registros da sua trajetória educacional; para a melhoria da formação do(a)s professore(a)s; e
para o grupo gestor do Departamento de Educação de Jovens e Adultos – DEJA, da Secretaria
Municipal de Educação e Desporte-SEMED, que historicamente, tentou implementar, em
Maceió, propostas de formação continuada capaz de ressignificar a prática pedagógica.
Impulsionando, posteriormente, o repensar dos rumos da formação continuada nesse
município.
A nossa intenção por esse objeto de pesquisa começou a se configurar de fato, quando
em meio a conflitos epistemológicos buscávamos redefinir o nosso objeto de investigação. A
partir da realização de uma entrevista piloto com coordenadores do DEJA, no intuito de
obtermos informações sobre a proposta de formação continuada encaminhada pelos
coordenadores desse Departamento, focalizando, especificamente, os cursos que tematizaram
o ensino de LM na EJA, constatamos que muito se tinha investido na formação do(a)
professore(a) da EJA, mas perguntávamos inicialmente, até que ponto esse investimento
contribuiu para o repensar da prática do(a) professor(a)? E, quais as influências desse
processo na prática pedagógica?
Nesse sentido, pressupomos que se o(a)s professore(a)s da EJA que participaram do
processo de formação continuada implementado, especificamente dos cursos de LM,
provavelmente, apresentariam mais avanços no tratamento teórico-metodológico de ensino de
LM do que os professore(a)s não participantes. Considerando também que os cursos de LM
foram ministrados por uma professora formadora, doutora em lingüística, pesquisadora na
área, fundamentados nos pressupostos teóricos da Lingüística textual, possivelmente
implicaram mudanças na prática pedagógica de ensino de LM.

Dado o exposto, propusemo-nos a buscar respostas para o problema: Quais as
influências do processo de formação continuada, especificamente dos cursos de LM, a

14

partir da visão de todos os sujeitos envolvidos² e na prática pedagógica do professor³ do
Ensino Fundamental da EJA?
Diante dessa problemática, realizamos um estudo com o objetivo geral de avaliar as
influências do processo de formação continuada, especificamente dos cursos de LM, a
partir da visão dos sujeitos envolvidos4 e na prática pedagógica do professor5 do Ensino
Fundamental da EJA?
Esse objetivo geral desdobrou-se em objetivos específicos:
● Caracterizar os locus de formação do(a)s professore(a)s da EJA possibilitados
pela política de formação continuada do DEJA a partir de sua reestruturação em
1994;
● Avaliar os pressupostos teórico-metodológicos adotados durante os cursos de
LM, a partir de diferentes olhares;
● Avaliar as influências dos cursos de LM na prática pedagógica da professora
participante do processo de formação, estabelecendo relação com a prática de
uma professora não participante.

Para realizarmos a investigação optamos pela abordagem qualitativa, conforme
descrevemos na metodologia, a qual nos possibilitou as condições necessárias para
alcançarmos os objetivos da pesquisa. Procuramos, ao longo da investigação. Enfatizar mais o
processo do que o produto e, preocupamo-nos em retratar as perspectivas dos participantes
(BOGDAN & BIKLEN6 , 1982 apud LUDKE & ANDRÉ, 1986), já que a pesquisa qualitativa
abrange uma compreensão da relação entre assunto e método (FLICK, 2004, p.57).

_______________________
² Os sujeitos envolvidos na investigação foram coordenadores do DEJA, professoras e professora formadora.
³ O feminino será utilizado nas análises relativas Às participantes da pesquisa.
4
Idem nota 2.
5
Idem nota 3.
6
BODGAN. R. & BIKLEN. S.R. Qualitative Reaserch for Educaction. Boston, Allyn and Bacon, 1982.

15

ABORDAGEM METODOLÓGICA

A formação continuada do(a)s professore(a)s do Ensino Fundamental da EJA, em
Maceió, ao longo de dez anos7, passou por redefinições teórico-metodológicas importantes,
configurando-se numa arena fértil propicia à analise e discussões. Trata-se de um modelo de
formação construído a partir de “altos e baixos”: práticas de reflexão – ação – reflexão,
influências políticas; e intervenções diretas e indiretas de pesquisas acadêmicas (COSTA,
2000; BARROS, 2003; MOURA, 2004; QUEIROZ, 2000; SANTOS et AL. 2004).
Ao compreendermos a natureza dinâmica da pesquisa qualitativa, orientamo-nos pelos
pressupostos de que os dados são sempre inacabados. Segundo André (1995, p.37) “o
pesquisador não pretende comprovar teorias nem fazer ‘grandes’ generalizações”.
Consideramos, desta forma, as semelhanças e singularidades de cada contexto investigado
que, por um lado, se aproximaram e, por outro, distanciaram-se como mostraremos
posteriormente na análise dos dados8.

Os instrumentos utilizados na fase de coleta de dados

Ao fazermos opção pela abordagem qualitativa, como já afirmamos, os dados foram
coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas, análise documental e observações
contínuas em sala de aula.9 E, quando necessário, conversas informais com aluno(a)s e/ou
outro(a)s informantes (diretoras e coordenadoras pedagógicas) pertencentes ao quadro
funcional das escolas campo10 de pesquisa.
_______________________
7

Especificamente o período de 1994 a 2004
8 Segundo Pérez Gomez (2003, p.156) cada escola configura na própria forma especifica de estabelecer os
intercâmbios pessoais e curriculares e, embora possamos estabelecer os intercâmbios pessoais e curriculares
encontrar elementos comuns que se repetem nas mais diversas circunstâncias, sempre atuarão de maneira
singular, constituindo um modo peculiar de comportamento e identidade.
9
Concordamos com ALVES-MAZZOTTI et AL. (2004, p.163) quando afirma que a pesquisa qualitativa é
caracteristicamente multemetodológica, isto é, usa-se uma grande variedade de procedimentos e instrumentos de
coleta de dados.
10
O termo genérico “campo” pode significar uma determinada instituição, uma subcultura, uma família, um
grupo especifico de “portadores de biografias (SCHUTZE apud FLICK, 2004, p.67).

16

As entrevistas

Ao lado das observações, as entrevistas semi-estruturadas representaram um dos
instrumentos básicos de coleta de dados sobre o fenômeno investigado (LUDKE & ANDRÉ,
1986). No inicio e durante o processo de pesquisa em campo, realizamos entrevistas com
coordenadores do DEJA, professoras da EJA e professora formadora,11 a qual ministrou os
cursos que focalizaram o ensino de LM. Objetivávamos, com isso, caracterizar o processo de
formação continuada, implementado em Maceió, especificamente os cursos de LM a partir do
olhar desses sujeitos.
As perguntas das entrevistas, previamente estruturadas, serviam como um roteiro.12
Procurávamos, no momento das entrevistas, respeitar a singularidade do(a)s informantes
(professoras, formadora e equipe gestora do DEJA) quanto as suas percepções sobre o foco da
pesquisa. Não seguíamos a ordem rígida da elaboração dos roteiros da entrevista, tentávamos
adequá-las ao transcorrer das informações postas pelo(a)s entrevistado(a)s.13 Ele(a)s,
ocasionalmente, anteciparam informações subseqüentes, em função disso, algumas perguntas
não foram realizadas. Vale salientar que para construirmos o perfil do(a)s alunos(a)s das
turmas observadas, entrevistamo-los.
As entrevistas foram realizadas, exclusivamente, pela pesquisadora, com a permissão
dos informantes foram gravadas.14 Posteriormente, transcritas, lidas e adequadas as normas de
transcrição de entrevistas orais.15
No momento das entrevistas, procurávamos vivenciar uma situação informal,
interviamos de forma discreta apenas quando o discurso do(a)s entrevistado(a)s não mantinha
relações direta com a temática dos questionamentos.

_____________________________
11

A opção pela flexão do substantivo no feminino justifica-se pelo fato da formadora ser desse gênero.
Os roteiros das entrevistas propostas encontram-se nos anexos (1,2,3,4).
13
Algumas perguntas foram reelaboradas oralmente, antes de ser questionadas aos sujeitos investigados, pois a
linguagem utilizada nos questionamentos, às vezes, não eram tão familiar a(o)s entrevistados(a)s.
14
Entre as professoras entrevistadas 1(uma) não permitiu que gravássemos a sua entrevistada.
15
Ver anexo 5.
12

17

No inicio das entrevistas, procurávamos garantir um clima de confiança, com relação
ao uso dos dados, explicitamos, previamente, o rigor metodológico da pesquisa – que exigia
tempo e esforço (BRANDÃO, 2002), e a ética da pesquisadora para com o uso, quando
necessário, das informações coletadas. Essa postura, contribuiu para que o(a)s
entrevistado(a)s se sentissem à vontade para falar livremente sobre a temática em foco. Desta
forma, concordamos com Kaufman (2002, p.40), “entrevista é trabalho, reclamando uma
atenção permanente do pesquisador aos seus objetivos, obrigando-o a colocar-se intensamente
à escuta do que é dito, a refletir sobre a forma e conteúdos da fala do(a) entrevistado(a), os
encaminhamentos, as indecisões. Contradições, as expressões e gestos.”
Procurávamos manter uma série de exigências e de cuidados requeridos, no momento
das entrevistas, desde o local e horários marcados aos cumprimentos de acordos convenientes
até a garantia do sigilo, e anonimato da identidade do(a)s informantes (ANDRÉ, 1995).
As entrevistas, com os coordenadores16 do DEJA, aconteceram em dois momentos
distintos: primeiro, realizamos uma entrevista piloto com o(a) direto(a) de ensino do DEJA na
época.17 com o objetivo de coletar informações preliminares sobre o processo de formação
implementando pelo DEJA. Essa entrevista possibilitou-nos a redefinição do objeto de
investigação, como já explicitamos; em seguida, entrevistamos cada um ds ex-coordenadores
do DEJA, desta vez, as entrevistas seguiram um roteiro semi-estruturado.
Posteriormente, coletamos informações sobre quais professore(a)s pertenciam ao
quadro do DEJA em 2000, quais desses(a)s permaneciam exercendo a docência na EJA até p
período de investigação na sala de aula. Como não tínhamos condições de entrevistar
todos(a)s os professore(a)s participantes do processo de formação, e o(a)s não participantes,
mas que ainda permaneciam na EJA, devido ao limitado tempo de investigação, optamos por
definir critérios18 seletivos para coleta dos dados, pois exigiam muito tempo para descrições e
análises dos mesmos.
_____________________
16

No período da investigação, primeiro semestre de 2004, o DEJA era direcionado por coordenadores do sexo
masculino e feminino, para mantersmos o anonimato dessa equipe optamos pela flexão do masculino todas as
vezes que nos referimos a esses sujeitos.
17
Primeiro semestre de 2004.
18
Os critérios são apontados na metodologia.

18

No cruzamento das relações nominais do(a)s professores(a)s19, detectamos a
permanência, durante o período definido para a investigação 2000-2004, de 30(trinta)
professoras20 no quadro do DEJA21. Isso significa a constância de aproximadamente 34%
do(a)s professores(a)s no quadro da EJA em Maceió durante o período investigado. Dessas
professoras, como a participação aos cursos dava-se por adesão, 8 (oito) não participaram, ou
seja, aproximadamente 26%. Diante dessa realidade sorteamos 20% das professoras
participantes do processo, e 20% das não participantes para serem entrevistado(a)s. Nesse
recorte, entrevistamos 5 (cinco) professoras participantes e 2 (duas) professoras não
participantes dos cursos de LM.
No intuito de mantermos as informantes22 no anonimato, identificamo-las por P (P1,
P2, P3, P4, P5, P6, P7), a seqüência numérica indica a ordem das entrevistadas. No caso, P3
e P7 não participaram do processo de formação, cursos de LM, enquanto P1, P2, P4, P5 e P6
foram cursistas assíduas.23
Os demais depoimentos coletados durantes as entrevistas, com coordenadores e
formadora, citados nesse trabalho, identificamo-los pelas abreviaturas: C para os
coordenadores (C1, C2, C3, C4, C5, C6)24 e F para formadora. Os cursos de LM foram
ministrados por 4 (quatro) formadore(a)s, ambo(a)s trabalharam na perspectiva da lingüística
textual, no entanto, abordaram temáticas diferentes. A formadora selecionada25 justifica-se por
ter ministrado os cursos de LM durante dois anos e meio, perfazendo uma carga horária de
______________________________
19

Inicialmente, fizemos o cruzamento de duas listas nominais do(a)s professore(a)s efetivos do quadro da DEJA:
a primeira tratava-se de uma relação das Escolas da SEMED e os nomes dos seus respectivos professore(a)s do
EJA, atuantes em 2000; a segunda consistiu em uma relação nominal do(a)s professor(a)s expedida pelo DEJA,
no segundo semestre de 2004.
20
Esse número demonstra a acentuada rotatividade do(a) professor(a) um dos entraves à continuidade do
processo de formação continuada.
21
Vale salientar que, em 2000, o DEJA era constituído por 86 professore(a)s efetivo(a)s. em 2004, esse
percentual quase dobrou, subindo para 156 professores. Segundo informações dos coordenadores do DEJA,
quando acrescenta-se a esse numero o(a)s professores contratado(a)s temporariamente e o(a)s horistas, o
departamento constituía-se por 200 professore(a)s.
22
Todas as informantes eram do gênero feminino, por isso a opção pelo uso desse gênero.
23
Durante o período de investigação, entre as não participantes, 2 (duas) aposentaram-se, uma afastou-se da EJA
por motivos pessoais.
24
A ordem numérica indica a seqüência em que esses informantes foram entrevistados. 25 A formadora escolhida
é doutora Linguistica, professora adjunto de cursos de pós-graduação em Letras e Linguistica da Universidade
Federal de Alagoas. Pesquisadora do CNPQ e FAPEAL. Coordena projetos de pesquisa. É autora de livros.
Desta forma, sua formação acadêmica em nível de graduação e pós-graduação justificam a sua escolha pelos
fundamentos teórico-metodológicos da lingüística textual

19

252 horas, aproximadamente, enquanto o(a)s demais formadore(a)s ministraram cursos com
carga horária inferior.
Entre as professoras entrevistadas, sorteamos, aleatoriamente, 1 (uma) de cada grupo,
para realizarmos, com seu consentimentos, a observação de suas práticas pedagógicas de
ensino de LM. Como eles não definiam um horário disciplinar semanal, assistimos suas aulas
de LM conforme nos comunicavam.
Concordamos com Nóvoa (1995, p.28), ao defender que “as escolas não podem mudar
sem o empenhamento dos professores; e estes não podem mudar sem uma transformação das
instituições em que trabalham”. Nessa perspectiva, dentro do universo escolar, além da sala
de aula, outros contextos foram objetos de observações: conversas nos bastidores (sala dos
professore(a)s, biblioteca, corredores, entre outros), além de observarmos os acontecimentos
ocorridos no portão das escolas durante a entrada e saída do(a)s alunos(a)s. Esses momentos
nos possibilitaram a coleta de informações imprescindíveis à compreensão do contexto
escolar26 no qual as práticas estavam inseridas.

As observações em sala de aula

As observações, especificamente, das aulas que tematizaram o ensino de LM, foram
realizadas no período de abril a julho de 2005 em Maceió, em classes de 3º fase 27, do Ensino
Fundamental da EJA em duas escolas publicas da rede municipal. Observamos a prática
pedagógica durante 40h/a28 em cada escola.

_________________________
26

Pérez Gómez (2011, p.131), ao refletir sobre a cultura escolar na sociedade neoliberal, postula que a escola,
como qualquer outra instituição social, desenvolve e reproduz sua própria cultura específica. Entendendo por
isso o conjunto de significados e comportamentos que a escola gera como instituição social. As tradições, os
costumes, as rotinas, os rituais e as inércias que a escola estimula e se esforça em conservar e reproduzir.
27
O curso de Educação Básica de Jovens e Adultos – primeiro segmento do ensino fundamental de Educação em
Maceió, está estruturado num bloco único de conhecimento e didaticamente desenvolvido em trÊs fases, seis
semestres, com calendário anual de 200 dias letivos, perfazendo um total de 1800 horas. Com relação as fases,
em Maceió, a 1° fase corresponde ao processo de alfabetização; a 2ª.fase a 1ª e 2ª séries do Ensino Fundamental;
e a 3ª fase corresponde a 3ª. e a 4ª. séries do Ensino Fundamental.
28
Essas 40 h foram desdobradas em 16 dias letivos, em cada dia computávamos 2 h 30 min.

20

No contexto das aulas, propusemo-nos a registrar de forma fidedigna, as situações de sala de
aula da professora A, que participou do processo de formação e da professora B que não
participou.
A identidade da pesquisadora e as intenções da pesquisa foram reveladas desde nosso
contato inicial com os informantes. O contato com as professores aconteceu, anteriormente a
nossa inserção em suas salas de aula, exatamente, no período da coleta das entrevistas. Nesse
momento, ainda não tínhamos selecionado aas professoras para observarmos suas práticas,
mas antecipamos que, possivelmente, poderiam ser selecionadas para essa finalidade. As
professoras demonstraram-se apreensivas com essa possibilidade, mas segundo elas não
haveria problema, poderíamos observá-las.
Na sala de aula, localizávamos-nos, ao lado do(a)s aluno(a)s, geralmente no final da
sala, posição que nos possibilitava uma melhor visualização da dinâmica do cotidiano escolar.
Fomos bem recebidas pelo(a)s aluno(a)s. Nos primeiros dias, na turma B, ele(a)s
demonstraram suas curiosidades com relação a nossa presença: “a senhora é professora?”, “a
senhora copia tudo que ela faz?”. Mas rapidamente, acostumaram-se com a nossa presença.
Vale salientar que, na turma A, todos os dias o(a)s aluno(a)s questionavam: “hoje é
aula de quê?”, quando a professora afirmava: “de português”. Automaticamente,
alguns/algumas aluno(a)s olhavam para o interior da sala no intuito de localizar-nos.
Infelizmente, demonstravam pouco interesse pelas aulas de

LM, resistiam aos

encaminhamentos de algumas atividades, principalmente, as propostas de produção de texto.
O (a)s aluno (a)s questionaram, em vários eventos de aula, “quando é que vai ter aula de
matemática?”, “ainda é português?”.
As professoras receberam-nos bem, sempre simpáticas e atenciosas. Atenderam nossas
solicitações no que diz respeito ao andamento da pesquisa. Em todos os eventos das aulas,
elas ao trazerem alguma proposta de atividade, xerografada ou mimeografada,
disponibilizavam-nos uma cópia.
Cabe registrar que as professoras demonstraram curiosidade com relação a nossa
pesquisa. A professora A, durante as observações, socializou que gostaria de conversar
conosco, posteriormente, sobre os aspectos observados, disse “quero melhorar minha aula”. A
professora B, também, revelou-nos ansiedade para conhecer os resultados da pesquisa.
Ambas deixaram transparecer, uma certa insegurança com relação aos procedimentos

21

didáticos, adotados durante as aula: seleção dos conteúdos e encaminhamentos das atividades,
entre outros aspectos. Muitas vezes, justificaram-nos suas opções teórico-metodológicas.
Segundo elas, o(a)s aluno(a)s apresentavam muitas dificuldades provenientes de lacunas
escolares com relação ao domínio da leitura e da escrita, por isso as suas opções pelo ensino
de alguns conteúdos gramaticais.
Sabemos que a presença de um(a) observador(a), no contexto da sala de aula, pode
alterar a obtenção dos dados, no entanto, acreditamos que a nossa presença não causou
mudanças significativas na dinâmica de LM, nem no comportamento do(a)s aluno(a)s capazes
de interferir na coleta e análise dos dados.
As aulas foram gravadas e fita K7. Na transcrição das fitas, seguimos as orientações
da análise da conversação29, a qual parte da premissa de que “a conversação é uma atividade
lingüística básica. Ela integra as práticas diárias de qualquer cidadão, independente de seu
nível sócio-cultural” (CASTILHO, 2002, P.29). Com relação as gravações, houve algumas
interferências provocadas pelos ruídos ambientais e, também, pela própria fragilidade do
gravador, tornando algumas passagens inaudíveis, não chegando a constituir prejuízo para à
analise.
Vale salientar que tínhamos um caderno de registro de observações no qual
tentávamos anotar todos os acontecimentos transcorridos durante as aulas. Esses registros
foram importantíssimos para compreendermos com se materializavam as aulas observadas.
No que se refere a transcrição das entrevistas e das aulas gravadas, seguimos as
orientações dos princípios de notação adotado pelo Projeto de Estudo Coordenado da Norma
Urbana Linguistica Culta (NURC).30

_______________________________
29

Como postula Marcushi (1986, p.14) “ a conversação é a primeira das formas de linguagem a que estamos
expostos e, provavelmente, a única da qual nunca abdicamos pela vida afora”.
30
O NURC estuda o uso da variedade lingüística urbana culta, a partir da coleta de entrevistas com adultos
universitários. Entre 1970 e 1976, lingüistas brasileiros ligados a esse projeto levantaram uma enorme
quantidade de matérias falados nas cidades de Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre

22

A análise documental

A análise documental consistiu no estudo de documentos referentes ao processo de
formação implementado, dando ênfase aos cursos de LM, no período de 2000-2004. Os
documentos estudados foram: projetos e relatório do DEJA; propostas de trabalho para os
cursos, diretriz curricular para EJA em Maceió; listas de freqüências dos cursos; e textos
teóricos31 trabalhados durante os encontros. Esses documentos32 possibilitaram-nos montar o
cenário de implementação dos cursos de LM desde os aspectos estruturais até suas opções
políticas.
A metodologia desenvolvida permitiu-nos apresentar o trabalho com a seguinte
organização:
No primeiro capítulo, apresentamos e caracterizamos os locus33 de formação
continuada possibilitados pela política de formação do DEJA a partir de sua reestruturação e
1994, estendendo-se até o 1º semestre de 2004.
No

segundo capítulo, propusemo-nos

a avaliar os

pressupostos

teórico-

metodológicos, adotados durante os cursos de LM e suas influencias no processo de ensino
de LM a partir de diferentes olhares.
No terceiro capítulo, considerando que um processo de formação continuada de
professor(a) poderá influenciar mudanças na prática de ensino de LM, nos dedicamos a
analisar a influencia dos cursos de LM na prática pedagógica da professora participante do
processo de formação, estabelecendo relação com a prática de uma professora não
participante.

_____________________________
31

Os textos foram citados nas referências bibliográficas.
A relação de todos os documentos consultados encontra-se no anexo 6.
33
Locus são espaços de produção de conhecimento. Segundo Candau, na perspectiva “clássica” de formação de
professores, o locus de produção de conhecimento, onde circulam as informações mais recentes, as novas
tendências e buscas nas diferentes áreas do conhecimento, o locus da reciclagem privilegiado é a universidade e
outros espaços com ela articulados diferentes das escolas de primeiro e segundo graus, onde se supõe que se
pode adquirir o que constitui o avanço cientifico e profissional (2003, p.53). Enquanto que, numa perspectiva
atual, o lócus de formação a ser privilegiado é a própria escola (idem, p.55)
32

23

Cápitulo 1

LOCUS DE FORMAÇÃO CONTINUADA: CENÁRIO E OLHARES

Este capítulo situa a política de formação continuada de professore(a)s da EJA,
implementada pelo DEJA, desde sua reestruturação em 1994 até o período de oferta dos
cursos de LM. Nesse sentido, faremos a priori, e, quando necessário, ao longo deste texto,
remissões aos direcionamentos e redirecionamentos, da equipe gestora do DEJA, no intuito de
caracterizarmos e compreendermos como esse processo de formação constituiu-se e
configurou-se no modelo investigado.

1.1 Registrando a história: apresentando o cenário

O DEJA34 foi criado em 1993, ao ser reestruturada a SEMED. Durante esse ano a equipe
gestora desse departamento definiu, entre outros aspectos, sua atuação pedagógica e
administrativa.35

Essa reestruturação implicou mudanças

na organização

política-

administrativa da SEMED. No que diz respeito a formação continuada do(a)s professore(a)s
da EJA, os ensaios da formação iniciaram-se em 1993 e intensificaram-se após realização do
concurso público para provimento de vagas na rede municipal de Maceió em 1994.
____________________________
34

O DEJA, desde sua criação, mantém uma articulação permanente com a Universidade Federal de Alagoas –
UFAL, especificamente com o Centro de Educação CEDU/ Núcleo de estudos, pesquisa e extensão sobre
alfabetização – NEPEAL, que numa parceria tem contribuído significativamente para os avanços, em relação a
prática pedagógica do(a)s professore(a)s (DEJA, 1999).
35
A respeito da reestruturação pedagógica e administrativa foram realizados as ações: a) visitas as escolas com
vistas a detectar problemas tanto de ordem física ou pedagógicas; b) encontros com as equipes administrativas
das escolas nas quais funcionam turmas de Educação de Jovens e Adultos; c) encontros para planejamento e
avaliação; d) parceria com COBEL ( Companhia Beneficiadora de Lixo) e o Banco do Brasil no Projeto de
Alfabetização do servidor; e) elaboração de propostas pedagógicas que levem em consideração as necessidades e
anseios das escolas; f) parceria com a UFAL, através do Centro de Educação, na assesoria para elaboração da

24

O DEJA era coordenado por 6 (seis)36 profissionais que assumiram a função de
coordenador de apoio ou diretor(a) de ensino. Entre suas funções, poderiam propor políticas
de formação, bem como, atividades burocráticas/administrativas.
A composição da equipe do DEJA37, na época38, teve um diferencial, na administração
municipal, os coordenadores foram selecionados, considerando suas experiências na EJA. A
escolha desses profissionais deu-se também pela liberdade/autonomia do(a) diretor(a) do
DEJA. Essas características poderiam ter contribuído para a implementação de uma proposta
de formação continuada que atendesse as especificidades do(a)s professore(a)s da EJA.
Tradicionalmente, as interferências político partidária, na composição de quadros
pedagógicos, em departamentos de ensino, podem, muitas vezes, reforçar a prática de
políticas descontinuas de formação, além da permanência de quadros administrativos mais
preocupados com a manutenção de status social do que, propriamente, com a melhoria da
educação pública39. Essa realidade nos leva a refletir sobre as políticas de formação
descontinuas que segundo Collares, Moysés e Geraldi.
como a ‘educação continuada’ atende a planos de governos e não a políticas
assumidas pelos profissionais do ensino, cada mudança representa um
recomeçar do ‘zero’, negando-se a história que, no entanto está lá, na escola,
na sala de aula, nos saberes do professor. O essencial dessa descontinuidade é
o eterno recomeçar, como se o passado pudesse ser anulado; repetição
constante do “novo” para manter a eternidade das relações de poder atuais
(1999, p.216)

As políticas da descontinuidade acentuada com as reformas educativas, da década de
1990, refletem a intervenção crescente de forças e da lógica do mercado na definição das
condições de cumprimento da escolaridade: na estrutura curricular; na definição de atores e
_______________________________________________
proposta pedagogia e capacitação dos professores (DEJA, 1999, P.1).
36
Dados referentes ao primeiro semestre de 2004.
37
No período de 1994-2004 a SEMED direcionou a formação continuada de todas as modalidades de ensino, por
meio da iniciativa dos departamentos que a compõem.
38
Entende-se o período entre 1993-2004.
39
Pérez Gómez (2003, p.141), ao refletir sobre os sistemas educativos (público e privado), afirma que embora
nunca se estabeleça limites e fronteiras claras e definitivas, o sistema que denominaremos “público" tem
correspondência com políticas educativas defendidas por posições sócio-democráticas ou socialistas, enquanto
que o sistema que denominamos “público” tem uma maior correspondência com políticas neoliberais.

25

nos interesses, entre outros aspectos, contribuíram para desvalorização profissional e
acentuaram o declínio da qualidade do ensino. Legitimando essa lógica da descontinuidade, o
quadro funcional das Secretarias de Educação, entre outras instituições, tem um caráter
determinado, estando sujeito a remanejamento de seus membros.
A Tabela 1 demonstra-nos a composição funcional dos membros do DEJA e suas
titulações, durante o período investigado:
TABELA 140
TÉCNICO

FORMAÇÃO

FUNÇÃO

ACADÊMICA
C1
C2
C3
C4
C5
C6

Doutor(a) em Lingüística
Especialista em Docência do
Ensino Superior
Pedagogo (a)
Mestre (a) em Educação
Mestre (a) em Educação
Especialista em Educação de
Jovens e Adultos

Diretor (a)
Coordenador pedagógico
Coordenador pedagógico
Coordenador pedagógico
Coordenador pedagógico
Coordenador pedagógico

Fonte: entrevistas – coordenadores

A tabela supracitada revela-nos uma equipe técnica-pedagógica com formação
possivelmente pertinente ao cargo ocupado. Segundo depoimentos dos coordenadores, suas
formações acadêmicas aconteceram no bojo do processo de formação continuada da EJA.
Em 2004, o DEJA atendia a 200 professore(a)s. Destes, 156 compunham o quadro
efetivo da SEMED, enquanto 30 (trinta) eram professore(a)s estagiário(a)s, contratado(a)s
temporariamente, e as vagas restantes eram ocupadas por professore(a)s horistas.41
A equipe gestora do DEJA, na tentativa de implementar uma política de formação, em
__________________________
40

Quadro funcional dos componentes do Departamento de Jovens e Adultos durante o período investigado
(2000-2004). Essas informações foram coletadas nos momentos de entrevistas.
41
O(a)s professore(a)s horistas são efetivos do quadro funcional da SEMED, atuam em outras modalidades, ao
disporem de carga horária noturno poderiam preenchê-las com aulas na EJA, por uma periodicidade
indeterminada, em situações em que existissem lacunas de professore(a)s. As situações mais recorrentes eram
licenças (médicas) e/ou lacunas no quadro de professore(a)s, pois todo(a)s ao(a)s professore(a)s concursado(a)s
tinham sido nomeado(a)s existindo vagas, na época, no quadro da EJA.

26

Maceió, que durante quase 20 anos foi relegada ao abandono por parte do governo municipal,
orientava-se pelo pressuposto de que

num primeiro momento desse processo, visávamos apenas suprir as deficiências de
uma formação inicial na qual a educação de jovens e adultos não é contemplada. [...]
Em outro momento, esta formação se deu no sentido de melhorar, sobretudo do ponto
de vista metodológico, o trabalho desenvolvido em sala de aula. Vale salientar que,
mesmo neste período, a ênfase no caráter político da educação de jovens e adultos
também foi marcado. Atualmente, buscam-se, a partir das dificuldades levantadas em
sala de aula e nos encontro semanais, organizar cursos e/ou palestras no sentido de
aprofundar o debate (COSTA, 2000, p.15)

O modelo de formação continuada adotado, nesse momento inicial, de reestruturação
do DEJA, pautava-se em intensos períodos de cursos e oficinas. Essa estratégia foi justificada
pelo fato do(a)s professore(a)s apresentarem pouca experiência no trabalho pedagógico com
jovens e adultos, haja vista, entre outros aspectos, sua formação academica centrada no ensino
para crianças (DEJA,1999). Essas preocupações referendam a nossa posição de que um salto
qualitativo na EJA perpassa por uma sólida formação do professor, historicamente carente de
propostas teóricas consistentes e políticas públicas sólidas.
Em Maceió, constatamos a tentativa da equipe do DEJA de dinamizar os rumos da
formação, no intuito de superar os entraves teórico-metodológicos da prática pedagógica.
Nesse sentido, Costa afirma que

o trabalho de formação continuada dos professores da educação de jovens e adultos
começa a se estruturar de fato a partir do segundo semestre de 1994, após a realização
do concurso público municipal. Procurávamos trabalhar à luz dos princípios de Paulo
Freire, pontuando aspectos filosóficos e metodológicos e para isso contávamos com a
assessoria dos professores da Universidade Federal de Alagoas. Na ânsia de recuperar
o tempo perdido por anos de abandono sem a devida clareza do que o mesmo
representava. A ausência de um projeto de formação claramente definido foi logo
observado: após um intenso período de cursos e capacitações, poucas mudanças
aconteciam (2000, p.2)

No estrato acima, Costa afirma que o processo de formação implementado foi alvo de
(re)definições, cujos objetivos voltavam-se a superação de lacunas da formação inicial. A
ênfase no caráter político da EJA na tentativa de suprir as dificuldades do(a)s professore(a)s

27

em sala de aula, nesse período, a ausência de um modelo de formação continuada, conduziu a
implementação de propostas de formação compensatório, “recuperar o tempo perdido”.
A forma como o(a)s gestore(a)s educacionais percebem o processo de formação, quase
sempre,

pautam-se

na

concepção

tradicional

de

ensino,

de

aprendizagem

e,

conseqüentemente, de formação de professore(a)s. Em contrapartida, o contexto de formação
estrutura-se, às vezes, para introdução de “novos métodos” de ensino e/ou divulgação das
orientações de reformas educativas. Candau postula que na perspectiva “clássica” de
formação continuada

a ênfase é posta na ‘reciclagem’ dos professores [...]. O professor, uma vez na
atividade profissional, em determinados momentos, realiza atividades especificas, em
geral, a volta à Universidade para fazer cursos de diferentes níveis, de
aperfeiçoamento, especialização, pós-graduação, não só pós-graduação lato sensu,
mas também strictu sensu. Outras possibilidades de reciclagem podem ser a
freqüência a cursos promovidos pelas próprias secretaria de educação e/ou a
participação em simpósios, congressos, encontros orientados, de alguma forma,
ao seu desenvolvimento profissional (2003, p.52, grifo nosso).

Outras iniciativas política – administrativas que influenciaram e, ao mesmo tempo,
caracterizaram-se enquanto elementos propulsores de mudanças na (re)organização da política
de formação de professore(a)s, relevantes para compreendermos o processo de formação,
segundo relatório do DEJA (1999) foram:

1995 – O DEJA inicia o trabalho de formação continuada de maneira sistematizada,
tendo o apoio do FNDE/MEC, realizando o 1º SEJA (Seminário de Educação de
Jovens e Adultos), implanta as Zonas e lança o 1º. caderno de produção coletiva que
sistematiza as produções textuais dos alunos e professores da EJA.
1996 – Realização do 2º. SEJA, que passa a ser bienal;
1998 – Realização do 3º. SEJA e o lançamento do 2º. caderno de produção coletiva e
os anais do 2º. SEJA;

Além das iniciativas supracitadas, o governo municipal de Maceió, em 1999, aprovou
o Plano de Carreira e Remuneração do Sistema Público Municipal de Educação42 do
__________________
42

Lei nº 4.731, de 02 de julho de 1998.

28

magistério que acarretou em mudanças significativas no modelo de formação continuada, ao
instituir em seu Art.8º.

as jornadas de trabalho de 20 e 40 horas semanais, assegurando-se aos ocupantes do
cargo de professor a utilizarem 25% de carga horária, para outras atividades
relacionadas ao magistério, como à preparação e avaliação do trabalho didático, à
colaboração com a administração escolar, À articulação com a comunidade, às
reuniões pedagógicas e ao aperfeiçoamento profissional, de acordo com a proposta
pedagógica de cada escola.

Nas diretrizes gerais, do referido plano, com relação a situação funcional do(a)s
professore(a)s que assumem a carga horária de 20 horas, ficou estabelecido que

professor atividade com carga horária de 20 h não será dispensado do trabalho em sala
de aula, para freqüentar os cursos citados no item 2 43 exceto para os de stricto sensu
(doutorado e mestrado), apenas mediante análise e aprovação da solicitação. Para a
formação continuada serão reservadas 2 horas quinzenais ou 4 horas de acordo com o
plano de ação da Escola/SEMED. As aulas nesse período poderão ser suspensas e
substituídas por atividades recreativas, artísticas, de lazer, dentre outras, planejadas
em consonância com o projeto pedagógico.

O plano de Carreira e Remuneração do Sistema Público Municipal de Educação do
Magistério, aprovado em Maceió, ao tentar atender aos requisitos da nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação/9644, especificamente, Art. 67, inciso II, que fixa o direito dos
profissionais da educação a formação continuada, com licenciamento e remuneração para esse
aperfeiçoamento, e, no inciso V do mesmo artigo, garante período reservado a estudos,
planejamento e avaliação, inclusive na carga horária docente, por um lado, configurando-se
enquanto uma conquistam para o(a)s professore(a)s de 40 h, por outro, acarretou inúmeras
discussões, pois não sendo assegurado, esse direito para todo(a)s o(a)S professore(a)s, esse
__________________
43

Situação a considerar: a) graduação regular diurno; b) graduação regular noturno; c) graduação – convenio
SEMED/UFAL – 1995; d) graduação – convenio à distancia – União Nacional de Dirigentes Municipais –
UNDIME;
e) pós-graduação lato sensu e stricto sensu, noturno, diurno e modular.
44
Lei 9.394/96

29

fato fomentou um dos entraves do processo de formação: indisponibilidade para participar dos
encontros de formação.
Essa situação reforça uma cultura de discriminação profissional dentro de uma mesma
modalidade de ensino. Independente da carga horária que assumem, o(a)s professore(a)s, são
profissionais de uma mesma modalidade de ensino. Historicamente, reconhecida como uma
modalidade compensatória e assistencialista, cujos professore(a)s nunca na história da
Educação Brasileira, foram alvo de políticas governamentais de formação inicial e/ou
continuada, centrada no ensino – aprendizagem que atendesse a especificidade do(a) aluno (a)
jovem e adulto(a). Moura, ao refletir sobre a evolução histórica das concepções de
alfabetização de adultos, denuncia o descaso do governo com relação a(o) professor(a) da
EJA, tal denuncia acompanha atualmente a trajetória de formação do(a) professor(a), pois
afirma a autora:

Também é “pobre” a forma como os alfabetizadores são vistos e tratos. Essa
concepção é refletida nos baixos salários; no desrespeito a legislação que obriga a
elaboração e o cumprimento de um plano de cargos e salários; nas péssimas condições
de trabalho e na falta de compromisso com a sua qualificação. Ao conceber-se a
alfabetização como um processo simples e barato, os alfabetizadores também devem
ser os que têm a menor formação e os que ganham menos. Os alfabetizadores
terminam por ser considerados da mesma forma como os alfabetizadores são
considerados; profissionais de cultura e inteligência inferior, comparando com aqueles
que exercem cargos e tarefas de maior aceitação e status social (2004, p.34)

Dado o exposto, a implementação do referido plano impulsionou, relativamente,
mudanças significativas no processo de formação continuada direcionado pelo DEJA. Entre
elas, houve modificações nos limites e possibilidades de desenvolver o processo de formação
continuada. O DEJA, a partir desse momento, passou a exercer uma maior autonomia com
relação a implementação de eventos de formação ( cursos, seminários, encontros, entre
outros) possibilitados também pela descentralização de recursos financeiros do Programa
Recomeço.45
_______________________
45

O programa Recomeço – Supletivo de Qualidade – foi lançado pelo Ministério da Educação/Secretaria de
Ensino Fundamental – MEC/SEF em 2000, inserido dentro do Projeto Alvorada, e consistiu na transferência pela
União, em caráter suplementar, de recursos financeiros em favor dos estados e municípios, destinados a ampliar
a oferta de vaga na Educação Fundamental Pública de Jovens e Adultos de 15 anos a mais. A partir de 2003
passou a ser chamado de Fazendo Escola (SEF/MEC/COEJA, 2002).

30

1.2 A configuração da política de formação continuada de(a) professor(a) em Maceió

Na tentativa de possibilitar a(o)s professore(a)s uma formação compatível aos seus
anseios e necessidades teórico-metodológicas, a equipe do DEJA estruturou a formação
através da realização de cursos, em diferentes áreas do conhecimento, além de possibilitar a
participação, de representantes de professore(a)s e/ou coordenadore(a)s do DEJA, em
encontros de estudos nas áreas de conhecimento específicos para EJA a nível regional e/ou
estadual. Na tentativa de acompanhar o(a)s professore(a)s “mais de perto”, em seu ambiente
pedagógico, o DEJA instituiu, posteriormente as Zonai46. Posteriormente, ao reconhecer a
necessidade de problematizar a prática d=no ambiente de trabalho, o Departamento elaborou
o projeto Grupo de Apoio Pedagógico/GAP – ação organizacional.
A proposta de formação, trilhada pelo grupo gestor do DEJA, na época,
fundamentava-se como qualquer modelo, numa concepção política de formação. Garcia
(1995) defende que, ao falarmos e implementarmos políticas de formação continuada,
assumimos determinadas posições (epistemológicas, ideológicas, cultural) relativamente ao
ensino, ao professor e aos alunos. Nessa perspectiva, para o coordenador C1 formação
continuada

é aquela concepção... que ela vem desde a inicial...[...] e não para...[...] que vai além
da técnica... vai muito além destas questões de formação... não só cursos[...] não só
acompanhamento pedagógico... mas [...] todo o processo que se dá [...] da orientação
individual com o professor... até a publicação das suas experiência... então é um
processo...

O Coordenador C1, ao compreender a formação continuada enquanto processo
amplo que se estende desde a formação inicial, perpassando as ações pedagógicas
vivenciadas, pelo(a)s professore(a)s, em propostas de formação continuada promovidas pelo
______________________________
46

Segundo relatório do DEJA, as zonais são nucleações que concentram escolas próximas, nem sempre do
mesmo bairro. Nas grandes zonais reunem-se os professores de todas as escolas que trabalham com EJA (DEJA,
2001).

31

DEJA e/ou por outras instituições formativas, converge com a concepção de Fusari quando
afirma que

a formação inicial e a formação continua são percebidas como dois momentos de um
mesmo processo, de tal forma que ambos se interpenetram e se complementam,
oferecendo qualidade, quantidade e dignidade de ensino e aprendizagem à formação
do educador. Trata-se, pois, de um novo paradigma para a formação do professor
(1998, p.532).

Ao considerar a amplitude e a complexidade da formação continuada, não podemos
prever de fato quando iniciamos o nosso processo profissional. Sabemos que inúmeros
eventos e práticas pedagógicas formativas, na qual interagimos, contribuíram para o nosso
aperfeiçoamento profissional. Concordamos com Nóvoa quando defende que

a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de
técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexibilidade crítica sobre as práticas e
de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante
investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência (1995, p.25, grifo do
autor).

Certamente essa característica do processo de formação continuada quando
compreendida e assumida, pelos órgãos gestores de políticas de formação de professore(a),
não só em Maceió, mas em qualquer sistema educativo, poderá ser uma possibilidade de
resistência contra as determinações políticas neoliberais, que exclui o(a) profissional da EJA
do acesso a uma formação inicial especifica para atuar nessa modalidade. Ao ultrapassar essas
determinações o(a) professor(a), ao participar de um processo de formação dinâmico e
interativo, forma-se e (re)forma-se. Nesse sentido, Nóvoa defende que a “troca de experiência
e a partilha de saberes consolidam espaços de formação mútuos, nos quais cada professor é
chamado a desempenhar simultaneamente, o papel de formador e de formando” (op. Cit.
P.26).
Os rumos tomados pelo processo de formação do(a)s professore(a)s (seleção das
temáticas, estratégias metodológicas, definição de locus, organização estrutural, entre outros
aspectos), em Maceió, apoiavam-se na forma como a equipe gestora concebia a formação

32

continuada. Os encaminhamentos teórico-metodológicos podem contribuir para (re)significar
a prática pedagógica, ou para consolidar modelos obsoletos de ensino-aprendizagem. A
qualidade de uma formação depende, sobretudo de sua concepção (PERRENOUD,
2001;2002). Nesse sentido, Nóvoa afirma que

práticas continuas organizadas em torno dos professores individuais podem ser úteis
para a aquisição de conhecimentos e de técnicas, mas favorecem o isolamento e
reforçam uma imagem dos professores como transmissores de um saber produzido no
exterior da profissão. Práticas de formação que tomem como referencia as dimensões
colectivas contribuem para a emancipação profissional e para a consolidação de uma
profissão que é autônoma na produção de seus saberes e dos seus valores (1995, p.26,
grifo do autor).

As práticas de formação que tomam como referencia as dimensões coletivas deveriam,
entre outras estratégias, envolver o grupo em práticas de observação de aulas gravadas, a fim
de realizar um exame crítico desse evento pedagógico, para que observando as situações reais
de sala de aula, no que diz respeito as práticas de ensino de LM, possa refletir as
possibilidades de mudanças. Vieira-Abraão (2002) defende que o conhecimento é construído
por meio da reflexão sobre os problemas reais encontrados e por meio de teorias que se fazem
necessário para a compreensão e busca de soluções.
Nesse sentido, Gimeno47 (1990, apud GARCIA, 1995, p.54) afirma que “ a formação
de professores deve proporcionar situações que possibilitem a reflexão e a tomada de
consciência das limitações sociais, culturais e ideológicas da própria profissão docente”. A
formação ainda passa pela experimentação, pela inovação, pelo ensaio de novos modos de
trabalho ( NÓVOA, 1995).
A formação do(a) professor(a) da EJA, nessa perspectiva, assume um papel
fundamental, à medida que é na prática que esse(a) profissional apropria-se de um saber
pedagógico empírico sobre como o(a) aluno(a) jovem e adulto(a) aprendem, e quais os
melhores caminhos para ensiná-lo(a).

_________________________
47

GIMENO SACRISTAN, J. Consciencia y accion sobre La pratica como liberación profissional de los
profesores. Comunicação apresentada as jornadas sobre os molelos y estratégias em La formación permanente
Del professorado em los países de la CEE (BARCELONA, 1990)

33

As iniciativas de formação para o(a) professor(a) da EJA, deveriam pautar-se na
experimentação, possibilitando a partir de tentativas de erros e acertos, buscar “novos”
modelos de ensino-aprendizagem que atendam as necessidades de aprendizagem dos jovens e
adultos. A mudança educacional depende, entre outros aspectos, da atuação do(a)s
professore(a)s, do seu processo de formação e, conseqüentemente da transformação da prática
pedagógica.

1.2 Os cursos de LM

A equipe gestora do DEJA justificou a implementação dos cursos, ao defender que “tendo
em conta que a formação continuada vai além das zonais. Realizaram-se no centro de
Formação Paulo Freire, cursos de atualização e aperfeiçoamente para os professores,
independente da carga-horária de cada um” (DEJA, 2000)
Em Maceió, no inicio da implementação da política de formação de professore(a)s, os
cursos foram ministrados pelo(a)s coordenadore(a)s do DEJA. A partir do 2000, o MEC
impulsionou a implementação de programa de alfabetização de pessoas jovens e adultas,
descentralizando recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE para
esse fim. Tais recursos, entre outras ações, poderiam ser aplicados na formação do(a)
professor(a). Desta forma, a equipe do DEJA, ao receber tais recursos48, começou a organizar
cursos de formação continuada com o objetivo de discutir alguns pressupostos teóricometodológicos, em diferentes áreas do conhecimento, desta vez, contratando profissionais de
instituições universitárias para coordená-los.
A

equipe

do

DEJA

afirmou

que,

no

processo

de

formação

do(a)s

estagiário(a)s/bolsistas e do(a)s professore(a)s do quadro efetivo da EJA, foram realizados
cursos de: Fundamentos Metodológicos em Matemática na EJA, Fundamentos Históricos da
EJA, Fundamentos Metodológicos em Língua Portuguesa na EJA, Fundamentos Histórico_____________________________
48

Conforme, relatórios os recursos do Programa Recomeço foram investidos, além dos cursos, em publicação de
cadernos de produções coletivas, na compra de livros, material didático e na merenda escolar.

34

filósoficos e Legais da EJA, Fundamentos Metodológicos em Ciências Sociais e Naturais na
EJA, Fundamentos Sócio-antropológicos da EJA. Além destes eventos, aconteceram
momentos de estudo, discussão e socialização de experiências, entre o(a)s professore(a)s e a
equipe do DEJA, ou durante os encontros pedagógicos quinzenais nas zonais, e estudos nas
escolas com o(a)s professore(a)s que adotaram a metodologia de Redes Temática49
Os cursos possibilitaram o acesso do(a)s professore(a)s aos conhecimentos
disciplinares, raramente problematizados em propostas de formação de professore(a)s. As
precárias condições de formação – inicial e continuada – do(a)s professor(a) da EJA atreladas
a carência de materiais didáticos, específicos para essa modalidade, são fatores que podem
interferir na prática pedagógica. Nesse sentido, a formação implementada ao possibilitar o
acesso do(a)s professore(a)s às discussões especificas à modalidade de jovens e adultos, pode
avançar na perspectiva do currículo, já que os materiais e/ou propostas disponibilizadas a(o)s
professore(a)s, tradicionalmente enfatizaram, superficialmente, os conhecimentos lingüísticos
e matemáticos e, às vezes, os conhecimentos das ciências naturais e sociais. Desconsiderando
a necessidade de aprofundamento dos saberes teórico-metodológicos do(a)s professore(a)s
sobre como ensiná-los. Torres (1999, p.106), diz que “as instituições e os programas de
formação docente tem sido a melhor ‘escola de demonstração da escola de transmissão,
autoritária, burocrática, que desdenha a aprendizagem’.
Construir uma escola diferente implica, sob esse ponto de vista, entre outros aspectos,
numa transformação do modelo tradicional de formação do(a) professo(a)r formador(a) sobre
seu objeto de ensino, atrelado aos conhecimentos subjacente às especificidades de ensino
do(a) professor(a), e das necessidades de aprendizagem do(a)s aluno(a)s da EJA são aspectos
relevantes e/ou determinantes, na configuração de políticas de formação de propícios a essa
modalidade.
Todos os eventos de formação (cursos, seminários, palestras, etc), ao inserirem-se num
processo educativo pressupõem ensino-aprendizagem, consequentemente podem implicar no
______________________
49

As redes temáticas atuam como referenciais pedagógicos para o resgate constante do processo de análise
realizado pela comunidade escolar. Construídas coletivamente, são utilizadas tanto na organização do programa
das diferentes disciplinas na preparação das atividades para sala de aula (SILVA, p.6). As redes temáticas foram
implementadas, no 1º segmento da EJA nas Dom Miguel F. Camara, Nise da Silveira, João XXIII e Arnon de
Melo.

35

fazer pedagógico, desmitificando a concepção tradicional de formação entendida, muitas
vezes, como possibilidade de mudanças do fazer pedagógico, contrapondo-se a transmissão
mecânica, bancária de conhecimento científicos. Entendemos que os eventos de formação
precisam atender as reais necessidades teórico-prático do(a)s professore(a)s. É este
compromisso, é esta articulação que faltam em muitos programas de formação continuada.
Trata-se, pois, segundo Mizukami et AL (2003, p.39) de uma questão de “coerência entre o
que os educadores aprendem (e como aprendem) e o que lhes pedem que ensinem (e como
ensinem) em suas aulas, tanto no que se refere a conteúdos quanto ao enfoque, métodos,
valores e atitudes”.
Observamos, no contexto atual, a necessidade de tentarmos aproximar os
conhecimentos do senso comum50, adquiridos na experiência profissional, dos conhecimentos
da academia. Articulando, desta forma, a relação teórico-prática subjacente a modelos de
formação que almejam alcançar mudanças na prática. Ao refletir sobre a relação entre
conhecimento do senso comum e conhecimento acadêmico, Nóvoa (1999, p.57) afirma que,
na ciência moderna a ruptura epistemológica simboliza, “o salto qualitativo do conhecimento
do senso comum para o conhecimento cientifico. Na ciência pós-moderna o salto mais
importante é o que é dado do conhecimento cientifico para o conhecimento do senso comum.”
Os cursos, desde o inicio, foram ofertados às sextas-feiras e aos sábados. As aulas das
sextas-feiras foram suspensas, compensadas posteriormente com atividades extra-classe. Os
cursos, nessa configuração, como já afirmamos, foram implementados durante dois anos e
meio, após esse período, devido ao seu esvaziamento, acarretado por inúmeras dificuldades (
pedagógicas, estruturais, pessoais) foram, conseqüentemente, suspensos.
Evidentemente, a organização do calendário dos cursos, implicava na (re)organização
na vida do(a)s professore(a)s. Ele(a)s exerciam, muitas vezes, jornadas duplas ou triplas de
trabalho semanal. Para esses, os finais de semana eram os únicos espaços de tempo que teriam
para dar assistência à família, além de utilizarem-no para possíveis momentos de
planejamento da jornada de trabalho. Nesse contexto, incentivar e contribuir para a

____________________
50

Freire (1998, p.43) nos alerta de que o saber da prática docente ou quase espontânea, ‘desarmada’,
‘indiscutívelmente’ produz um saber ingênuo, um saber de experiência feito, a que falta a rigorosidade metódica
que caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito.

36

participação do(a) professor(a), durante os cursos, sem incentivo da Secretaria de Educação
configurou-se, para o DEJA, num desafio.
Essa realidade influenciou, principalmente, na reorganização do cronograma e
horários dos cursos de LM. Fazia-se necessário, nesse contexto, ofertá-los em horários
compatíveis a disponibilidade do(a)s professore(a)s, sem prejudicar a carga horária mínima
de permanência do aluno na escola estabelecida pela LDB.
Os cursos, nesse formato, não aconteceram em horários exclusivamente pedagógico,
como afirmamos anteriormente, levando a equipe do DEJA a aceitar que a participação,
do(a)s professore(a)s, ocorressem de forma voluntária, conforme depoimento do
coordenador C 5

Os cursos de finais de semana... ficaram assim... é:: por opção deles... era por adesão...
porque tinha 20 h apenas trabalhando... de segunda a sexta... não tinha assim::...
nenhum aspecto legal... que garantisse... ou não... essa minha permanência.... no
sábado inteiro estudando...

O depoimento do coordenador C5 demonstra que o DEJA assumiu uma postura
flexível quanto ao acesso do(a)s professore(a)s aos cursos de LM. Nesse sentido, não basta
que as equipes gestoras implementem propostas de formação de professore(a)s, é preciso que
haja conexão entre as condições de acesso e permanência , durante os eventos de formação, e
os modos de atuar do(a)s professore(a)s. Não havendo consonância entre estes elementos, os
objetivos da formação correm o risco de diluírem-se, perderem o sentido.
Os cursos de LM, em meio a outros cursos51, foram implementados, sistematicamente
no período de 2001-2004, perfazendo um total de 252 h de estudos no locus de formação. A
partir dos pressupostos epistemológicos adotados, lingüística textual com enfoque
sóciointeracionista, como temos afirmados, as temáticas desdobraram-se em vários aspectos
de ensino da língua. Sobre as características dos cursos de LM, nos relatórios da equipe
gestora do DEJA, temos:

________________________
51
No processo de formação do professor(a) da EJA foram oferecidos cursos em diferentes áreas do
conhecimento

37

os cursos52 ministrados, atenderam as seguintes áreas, em consonância com os PCNs:
I – Fundamentos Metodológicos na Língua Portuguesa, com aprofundamento em
Lingüística Textual, Produção Textual e Oralidade e Escritura, como proposta
de trabalho em outras linguagens para expressão do pensamento, foi realizado o
curso em Fundamentos metodológicos em Arte-Educação; II – Fundamentos
metodológicos em Ciências Sociais em Matemática, com o aprofundamento em
Geometria e Medidas, e III – fundamentos Histórico-Filosóficos da EJA. (...) a) Os
cursos iniciaram no mês de agosto com Língua Portuguesa, que aconteceu em
três etapas. Na primeira etapa, foi visto a concepção de língua, texto, oralidade e
escrita dentro de um processo enunciativo. Na segunda etapa, foi o estudo sobre
as concepções de gramática, análises de trabalhos realizados em sala de aula
pelos professores com o uso de textos, e da gramática a partir destes e com estes,
reconhecendo a participação dos sujeitos autores e co-autores, bem como
observando os lugares e processos onde estavam sendo produzidos. Na terceira
etapa, os cursos ressaltaram as modalidades da língua: falada e escrita; tipologias
textuais: dissertação – formas de dissertação (argumentação): narração.
Dissertação; relações simétricas, assimétricas e retextualizações. (DEJA, 2001,
grifo nosso)

Considerando que, durante 2001, aproximadamente a carga horária direcionada ao
trabalho com LM foi de 65 h, esse tempo, dependendo da abordagem teórico-metodológica
adotada poderia ser insuficiente para aprofundar as temáticas selecionadas, uma vez que cada
conteúdo priorizado pressupõe aprofundamento, análise, experimentação e reflexão de sua
aplicação na prática, para que sejam, possivelmente, incorporados. As inovações propostas
a(o) professor(a) não podem ser olhada isoladamente, mas sempre à luz do contexto em que
está imersa. Desta forma, eles necessitam de um tempo para (re)definição de suas bases
epistemológicas. Nesse sentido, Falsarella defende que

qualquer proposta de inovação em prática de sala de aula passa necessariamente pelo
crivo e pela aceitação do professor, pelas relações que ele estabelece com sua prática
já construída, pelas representações que revela sobre seu papel docente, pelo modo
como articula esses elementos para construir sua identidade profissional. É o professor
que efetiva ou não, as mudanças na sua prática cotidiana (2004, p.5)

Em 2002, a oferta de cursos permaneceu sendo um dos eventos privilegiados para
_________________
52

O DEJA organizou uma programação de cursos com uma carga horária de 516 horas. Essa carga horária
distribuída entre os três eixos temáticos: fundamentos metodológicos na língua portuguesa; fundamentos
metodológicos em ciências sociais e em matemática; e fundamentos históricos da EJA. Para participarem desses
cursos o(a)s professore(a)s da EJA, foram divididos em 2 (dois) grupos, cada grupo composto por 41
professore(a)s que atuavam em 19 (dezenove) escolas da rede municipal de ensino, beneficiados pelo programa
Recomeço.

38

discussão de algumas questões direcionadas ao ensino da LM. Segundo o grupo gestor do
DEJA

ta que a formação continuada vai além das zonais, realizamos no Centro de Formação
Paulo Freire, cursos de atualização e aperfeiçoamento para os professores,
independentemente da carga-horária de cada um. As temáticas que se seguem
surgiram a partir do acompanhamento da equipe técnica das atividades
pedagógicas dos professores, que após ampla discussão com os mesmos, decidiuse pelos seguintes cursos: Fundamentos da EJA; Concepção de Alfabetização;
Professor pesquisador; Língua Português; Lingüística textual, Coesão e Coerência
e Gêneros textuais; Ciências da Sociedade e da natureza: Leitura de mapas. O corpo
humano e Redes temáticas. Estes cursos seguem o mesmo formato já desenvolvido no
ano passado. A carga-horária anual foi de 474 horas para cada uma das três
turmas, perfazendo um total de 1.422 horas (DEJA, 2002, grifo nosso).

Nesse período, os estudos sobre a lingüística textual enfatizaram a coerência, a coesão
e o estudo dos gêneros textuais. O foco de análise, da lingüística textual, é o texto. Essa
materialidade lingüística, na concepção interacionista, considerada como o próprio lugar de
interação e os interlocutores, como sujeitos ativos que – dialogicamente – nele se constroem e
são construídos (KOCH, 2002, p.17)
O DEJA, mesmo em meio a um processo de (re)avaliação dos rumos da formação,
continua a oferecer os cursos, na mesma sistemática em 2003. Sobre esse período o relatório
do DEJA afirma que

no processo de formação dos estagiários/bolsistas e dos professores do quadro efetivo
da EJA, foram realizados, os cursos de: Fundamentos Metodológicos em Matemática
na EJA (280), Fundamentos históricos da EJA (160h), Fundamentos Históricos e
Filosóficos da eja (80H), Fundamentos Metodológico em Língua Portuguesa na EJA
(380h)53, Fundamentos Históricos e Sociológicos da EJA (240h), Fundamentos
Histórico-Filosóficos e Legais da EJA (!20h), Fundamentos Metodológicos em
Ciências Sociais e Naturais na EJA (100h), Fundamentos Sócio-Antropológicos da
EJA (40h); além destes eventos houve uma sistemática de encontros pedagógicos
quinzenalmente com os professores e estudos nas Escolas que desenvolvem o trabalho
com redes temáticas. [...] Em relação a Língua Portuguesa foram estudados as

_________________________
53
Essa carga horária corresponde ao total de horas das 4 (quatro) turmas de professore(a)s que participaram dos
cursos de LM

39

concepções de linguagem, língua, texto e o estudo de gêneros textuais que
permeiam a sala de aula da EJA (DEJA, 2002, grifo nosso)

No extrato, percebemos que o DEJA tentou continuar o processo de formação, desta
vez, aprofundando as concepções de linguagem, língua, texto e o estudo dos gêneros. Esses
estudos foram aprofundados em aproximadamente 92 horas. Considerando a relevância e a
complexidade desses temas, inferimos que havia por parte do DEJA o interesse em ampliar o
debate sobre esses temas, no intuito de conduzir o(a) professor(a) à reelaboração de suas
concepções de ensino de LM. Essas discussões poderiam ter implicado um processo de
desestabilização dos saberes docentes construídos pelo(a)s professore(a)s ao longo de sya
trajetória de vida e profissional. A literatura mostra que os saberes profissionais são
construídos, incorporados, subjetivados, difíceis de serem dissociados da pessoa, de sua
experiência e da situação de trabalho. Destarte, com cada professor(a) e em cada escola, a
inovação pode tomar uma forma diferente, em virtude dos inúmeros fatores que sobre a
prática exercem influências, tanto fatores ligados ao processo de formação inicial e/ou
continuado quanto ligados à organização e às condições para o desenvolvimento do trabalho
pedagógico na escola.
As reflexões dos coordenadores do DEJA, sobre as influências dos cursos na prática
pedagógica, apontaram nitidamente a necessidade de levar as discussões para dentro das
escolas, pois, esporadicamente, algumas influências eram percebidas na prática. Nesse
sentido, apontaram a necessidade da implementação, paralelo aos cursos, das Zonais.

1.3 As zonais

Os locus de encontros sistemáticos de formação nucleados que aconteciam
periodicamente, denominados Zonais, foram criados em 1995 com a intenção, a principio, de
proporcionar, a(o)s professore(a)s, um espaço de socialização de experiências e estudos
(COSTA, 2000). Nesse sentido, Nóvoa (1995, p.18) defende que “ mais do que um lugar de
aquisição de técnicas e de conhecimentos, a formação de professores é o momento-chave da
socialização e da configuração profissional”.

40

As zonais foram criadas com o objetivo, entre outros, de conceber a escola como um
espaço de socialização e construção de conhecimentos. Elas foram extintas, durante o
primeiro semestre de 2004, devido a mudanças na composição do DEJA, demonstrando-nos
que em instituições educacionais públicas a (re)composição de quadros gestores, muitas
vezes, significam mudanças de concepções de formação, que podem implicar numa
vulnerabilidade da postura do grupo gestor e descontinuidade do trabalho.
A organização das zonais54, ao reunir professore(a)s provenientes de realidades
semelhantes, tentando possibilitar a interação entre o grupo; a socialização de dificuldades; a
busca de respostas para os problemas do cotidiano, representou um avanço na concepção de
formação continuada de professore(a)s, já que tradicionalmente, em Maceió, as práticas de
formação caracterizavam-se pela oferta de cursos – eventos pontuais -, restrito aos espaços da
SEMED aglomerando professore(a)s de diversas realidades.
Entre defender um principio e executá-lo, às vezes, existem icebergs. Desta forma, a
luta por uma perspectiva de formação inovadora atrelada a sua configuração, quando se
almeja ultrapassar modelos obsoletos de formação, geralmente acarretam conflitos
ideológicos entre os grupos dominantes, defensores da manutenção do poder, e os grupos
dominados que defendem a libertação dos princípios tradicionais de formação. Uma mudança
de perspectiva de formação exige ainda que o(a)s professore(a)s se sintam agentes desse
processo, libertando-se de mitos, medos e entraves sócio-políticos e culturais que legitimam
suas práticas de formação e interferem em seu fazer pedagógico.
O deslocamento dos locus de formação não deve configurar-se apenas numa mudança
de espaço físico, mas requer uma nova forma de fazer formação (NÓVOA, 1995), implicando
numa prática problematizadora. Uma prática reflexiva, uma prática capaz de identificar os
problemas de resolvê-los (CANDAU, 2003).
Nessa perspectiva, o(a)s professore(a)s deveriam ser protagonistas do seu processo
formativo, desenvolvendo competências profissionais possibilitadas, entre outros aspectos,
pela interação55 entre o(a)s professore(a)s e formador(a).
______________________
54

As zonais aconteceram, até o período investigado, em duas Escolas da Rede Municipal de Educação: João
XXIII e Carmelita Cardoso Goma e ainda no Centro de Formação Paulo Freire, localizado na SEMED.
55
Segundo Tardif (2003, p.166), falamos de interação quando “os seres humanos orientam seus comportamentos
em função dos comportamentos dos outros”, O autor (idem, ibidem), defende, ainda que, “ o agir interativo não é

41

Essa prática, por sua vez, impulsiona o desenvolvimento de uma autonomia docente –
instituindo uma nova cultura profissional (NÓVOA, 1995). Configurar-se-ia, “numa prática
coletiva, uma prática construída conjuntamente por grupos de professores ou por todo o corpo
docente de uma determinada instituição” ( CANDAU, 2003, p.144).
As práticas de formação continuada devem ter como núcleos de referências as escolas.
Nesse sentido, Nóvoa (2001, p.2) postula que “são as escolas e os professores organizados
que podem decidir quais são os melhores meios, os melhores métodos e as melhores formas
de assegurar esta formação contínua”. Não desmerecendo, segundo o autor, a importância do
trabalho de especialistas universitários, nessa colaboração, e na organização dos próprios
professore(a)s.
Candau (2003, p.55) defende também que “o locus de formação a ser privilegiado é a
própria escola: isto é, é preciso deslocar o locus da formação para a própria escola de primeiro
e segundo grau”56. Ao deslocar esses espaços de formação para núcleos locais, faz-se
necessário que a formação continuada mantenha uma estreita relação com a prática
pedagógica cotidiana, considerando-se a priori os saberes docentes, possibilitando um
acompanhamento sistemático do(a) professor(a) na sala de aula – pelo(a) formador(a) ou por
outros profissionais habilitados para essa função-. Tentando impulsionar, dessa forma, a
transposição didática desses saberes na sala de aula. Para Nóvoa(1995, p.28) a formação
deveria passar por processos de investigação. Trata-se de considerar, segundo Candau (2003,
p.143) que “todo processo de formação continuada precisa ter como referência fundamental o
saber docente, o reconhecimento e a valorização do saber docente”.
O coordenador C5 ao refletir sobre a definição dos conteúdos, a serem discutidos nas
zonais, afirma que

Nos trabalhos com os encontros pedagógicos... as zonais... que eram delimitadas... a
partir dos locais onde as escolas funcionavam... e ai a gente tinha uma escola onde

_______________________________________________________________________________________
55
orientado para a manipulação dos objetos ou para o controle dos fenômenos do ambiente circundante, mas por
um confronto com o outro”. Para o autor, ainda, o confronto com o outro não é rígido ; podendo adaptar-se a
diversos modos e diversas modulações, de acordo com a finalidade que os autores – professore(a)s e
formadore(a)s, almejam alcançar.
56
Ensino Fundamental e Médio, de acordo com a nova LDB/9.394/96

42

seria sede dos nossos encontros... esses encontros eram quinzenais... e nesses
encontros também.... estudar alguma temática que fossem assim aparecendo como
entrave... [...] no nosso planejamento... então se a gente começava a planejar por
exemplo... língua portuguesa... o uso de um gênero textual... então a gente tentava
trazer... planejar um encontro pedagógico... onde a gente trouxesse fundamentação
teórica para [...] estudar esse gênero textual... e:: a partir daí... rever o nosso
planejamento... rever o material produzido pelos alunos em sala... analisar a luz dessa
teoria... aquilo que a gente tava propondo... como planejamento de atividade...

Segundo o coordenador C5, a seleção das temáticas a serem discutidas nas zonais
pautava-se nas dificuldades apresentadas pelo(a)s professore(a)s durante os momentos do
planejamento pedagógico. Leal (2005, p.111) defendem que “o planejamento é uma estratégia
de formação por propiciar a explicitação de princípios didáticos fundamentais, articulando-os
aos saberes práticos que são gerados no cotidiano da experiência docente”. Nesse sentido, as
discussões proporcionadas durante os encontros, nas zonais , especificamente, no momento do
planejamento pedagógico, configuravam-se num evento de formação, à medida que o(a)s
professore(a)s eram convidados a planejarem seus futuros eventos de aula, a partir da reflexão
dos saberes docentes mobilizados nesses momentos. Para Leal (idem, p.111-112) o
planejamento em contextos de formação, concebido como “um procedimento rico para ajudar
o professor a transpor para a prática os modelos teóricos que estão sendo apropriados , não
pode, no entanto, ser visto como um meio de uniformizar as práticas docentes, levando os
professores a homogeneizar suas ações em sala de aula”.
O planejamento, em momentos de formação, precisa ser entendido como uma das
possibilidades de refletir e (re)pensar a prática docente, buscando coletivamente alternativas
para melhorá-la. Essas ações ao direcionarem-se para o ensino de LM, configuram-se num
momento privilegiado para recuperar o sentido do ensino de LM para os usuários dessa
língua. Não se trata de copiar modelos, pois, em cada contexto pedagógico, o(a)s
professore(a)s deparam-se com situações complexas heterogêneas, únicas. As propostas
discutidas durante a formação são ressignificadas na prática. Desta forma, é necessário pensar
o que pode ser ensinado e como deve ser ensinado.
Nóvoa57, ao refletir sobre a formação continuada, defende que
________________________
57

NOVOA, Antonio (1991). Concepções e práticas de formação continua de professores. In Formação
continuada de professores: realidades e perspectiva. Portugal: Universidade de Aveiro, 1991.
deve estar articulada com o desempenho profissional dos professores, tomando as
escolas como lugares de referência. Trata-se de um objetivo que só adquire

43

credibilidade se os programas de formação se estruturarem em torno de problemas e
de projetos de ação e não em torno de conteúdos acadêmicos (1991 apud CANDAU,
2003, p.57)

As reuniões das zonais ilustram uma tentativa de rompimento das práticas tradicionais
de formação centradas, muitas vezes, em conteúdos acadêmicos. Conforme depoimento
supracitado, os encontros nas zonais eram realizadas também com o objetivo de assegurar o
planejamento da prática docente; o aprofundamento de questões teórico-metodológicas; o
intercâmbio de experiências, a interação entre o grupo, e a socialização das produções do(a)s
aluno(a)s. É preciso reconhecer, nesse cenário, a necessidade de um acompanhamento do(a)
professor(a) no seu locus de trabalho, no intuito de ajudá-lo(a) a buscar “respostas” para os
seus problemas pedagógicos cotidianos. Caso contrário, as reformas educacionais
continuariam servindo justamente para legitimar as práticas que deveriam ser transformadas
(ZEICHNER, 2003)
As zonais desenvolveram-se sem uma organização política-pedagógica que definissem
a sua identidade. Costa (2000, p.73) considera que, neste sentido, “as zonais assemelham-se
aos cursos de capacitações que, no início, se realizavam às pressas muito mais para ocupar às
20 horas do(a)s professore(a)s que pela existência de tal projeto definido”. Uma proposta
política destinada a formar professore(a)s da EJA deveria pautar-se na definição de um
conjunto de princípios teórico-práticos norteadores,

proporcionando condições para que

esse(a)s professore(a)s pudessem, numa relação dialética, aprender e ensinar.
O redirecionamento de uma política de formação continuada de professore(a)s
pressupõe, necessariamente , uma reflexão crítica das vertentes que a interferem. Para se
(re)pensar a formação continuada, segundo Nóvoa, é preciso

reconhecer as deficiências cientificas e a pobreza conceptual dos programas atuais de
formação dos professores. E situar as novas reflexões para além das clivagens
tradicionais (componentes científicos versus componentes pedagógicos, disciplina
teórica versus disciplina metodológico, etc) sugerindo novas maneiras de pensar
problemática da formação do professor (1995m p.23).

Apoiando-se nessa perspectiva, reafirmamos que o locus de formação continuada
deveria tornar-se um espaço dinâmico, por meio do qual o(a)s docentes ensinassem e

44

aprendessem, (re)elaborando nesse processo, suas concepções de ensino e aprendizagem,
adequando sua formação às exigências da atividade profissional. Pois, a definição de locus,
por si só, não basta para vivenciar um processo formativo, é preciso garantir que ele se efetive
enquanto lugar de ensino e aquisição de conhecimento.
Segundo a equipe gestora do DEJA, nas zonais
uma das ações de formação continuada aconteceram, quinzenalmente e mensalmente,
servindo-nos para a socialização de planejamentos, avaliação das ações de sala de
aula, e elaboração de novos planos e projetos. No caso de 2003 foram apresentados
pelos professores, no momento de socialização de experiências, os seguintes
trabalhos: monografias (trabalhos de conclusão de curso de especialização em EJA,
realizado pela UFAL, cujo objetivo de estudo foi a prática pedagógica na EJA, e
projetos didáticos cujas temáticas foram: arte educação na 3ª. idade, além da
socialização dos resultados da pesquisa sobre o fracasso escolar na EJA, na
perspectiva da Língua Portuguesa (DEJA, 2003).

O fragmento supracitado, demonstra-nos que, nas zonais, o(a)s professore(a)s eram
convidado(a)s a participarem de momentos de socialização de planejamentos e metodologia
de avaliação, além de pesquisas desenvolvidas em outras instituições formativas e projetos de
investigação. Nessa perspectiva, poderíamos inferir que as discussões nas zonais
consideravam a prática profissional e a experiência pessoal docente como elementos
propulsores de reflexões, possivelmente o desenvolvimento profissional. Segundo Herneck &
Mizukami (2002) quando a escola é concebida como espaço de socialização e construção dos
saberes, a prática dos professores, por sua vez, implica a consideração de dimensões pessoais,
políticas, sociais, culturais e ética, possuindo uma natureza subjetiva que configura diferentes
formas de agir e de conduzir o processo de ensino-aprendizagem.
A análise mostra o compromisso do DEJA em direcionar um processo de formação
continuada que proporcionasse a melhoria do processo de ensino-aprendizagem do(a)s
aluno(a)s da EJA, além de proporcionar a(o)s professore(a)s o repensar a prática pedagógica.
Nesse sentido, além da oferta de cursos que perpassaram todo processo de formação; e a
criação das Zonais, entre outros eventos formativos, o DEJA propôs a implementação do
Grupo de Apoio Pedagógico – GAP.

45

1.1 GAP

Com o objetivo de (re)direcionar a formação, do(a)s professore(a)s da EJA, a equipe
gestora do DEJA, em 2004, elaborou um projeto para

implementação do GAP. Essa

iniciativa foi resultante de reflexões sobre o processo de formação vivenciado numa trajetória
marcada por seus avanços e retrocessos. Segundo o grupo gestor do DEJA, este projeto “se
fundamenta nos princípios da democracia, autonomia e profissionalização docente, partia de
uma realidade da formação continuada do DEJA, redirecionada ao longo de uma trajetória de
dez anos, que acenou para a criação de um grupo de Apoio Pedagógico – GAP58”
(GAP/2004).
Inserido no contexto de formação continuada, demonstrando preocupação com a
profissionalização docente, o GAP tinha por objetivo “contribuir por meio da formação
continuada para o fortalecimento do processo democrático das escolas públicas municipais”
(GAP, 2004, p.4). A proposta de criação do GAP tentou ultrapassar a perspectiva de formação
técnica, “que estabelece uma clara hierarquia entre o conhecimento cientifico básico aplicado,
e as derivações técnicas da prática profissional” (PÉREZ GÓMEZ, 1995, p.107).
Segundo a equipe gestora do DEJA
A equipe de se construir um grupo que pudesse dar apoio aos professores da EJA vem
sendo amadurecida desde 2000 quando da conclusão da pesquisa de Costa (2000), que
analisou a formação continuada desenvolvida pelo Departamento. A partir dessa
pesquisa foram apresentados os seguintes pontos para reflexão: 1) A formação
continuada deve estar a serviço do processo de democratização da escola; 2) É
necessário identificar as reais necessidades dos professores , quando do planejamento
das ações de formação continuada; 3) Definir uma proposta, de fato, de formação
continuada; 4) A manutenção desse processo é necessário devendo existir maior
atenção ao fazer pedagógico dos professores; 5) A práxis docente como lugar da
produção do saber; 6) Tornar a escola um espaço de formação; 7) O professor deve
torna-se “produtor de sua profissão”, alicerçado numa sólida formação; 8) As trocas
de experiências deveriam avançar no sentido do que, porque e para que se faz; 9)
Planejamento articulado das ações de capacitação, favorecendo a seqüencia dos
cursos; 10) Realização de um planejamento a longo prazo da formação continuada;
11) Mudanças pretendidas no plano da consciência, criticidade e atuação competente,
são conseqüências da conquista da cidadania desses profissionais (GAP, 2004).

_______________________
58

O grupo de apoio pedagógico foi criado, mas não foi consolidado nas escolas, devido a motivos políticos
institucionais os componentes do DEJA afastaram-se do departamento, deixando para trás a trajetória que
construíram durante 10 anos.

46

O GAP preocupava-se, entre outros aspectos, com o acompanhamento do(a)s
professore(a)s no espaço escolar. Acreditava que a presença de um(a) profissional de apoio,
na escola, poderia contribuir para (re)significar a prática pedagógica. Esse profissional
ajudaria a constituir, um contexto interativo entre aluno(a) – professor(a)/formador(a), além
de proporcionar momentos de reflexões sobre os saberes docentes e a prática pedagógica. A
prática deve mesmo “constituir-se como o ponto de partida do currículo de formação”
(PÉREZ GÓMEZ, 1995, p.111). Nessa perspectiva , o grupo idealizador do GAP afirma que
o eixo central dessa proposta era “garantir uma presença constante desse grupo nas escolas,
onde funcionavam as turmas de jovens e adultos, mantendo-se uma postura propositiva, no
sentido de intervir para qualificar o trabalho pedagógico” (GAP, 2004. P,6).
O GAP era formado por 9 (nove) educadore(a)s, entre ele(a)s, 4 (quatro) profissionais
que compunham o quadro da equipe central do departamento na época da pesquisa59. Os
outros 5 (cinco) profissionais, exerciam suas funções docentes em turmas da EJA. Ao serem
selecionados pela equipe central60, passariam a atuar junto ao DEJA no referido projeto.
Nessa configuração, cada membro do GAP assumiria o acompanhamento pedagógico de 6
(seis) escolas aproximadamente.
No projeto de implementação do GAP eram apresentadas as suas atribuições:
1)Atuação como educador de apoio no acompanhamento da prática pedagógica do
professor da EJA em sala de aula nas escolas sob sua responsabilidade; 2)
Coordenação de reuniões de planejamento, estudo e socialização das experiências
pedagógicas desenvolvidas pelos professores de EJA; 3) Participação no mínimo duas
vezes por semana das reuniões sobre a política de trabalho do Departamento de
Educação de Jovens e Adultos; 4) Participação das pesquisas acadêmicas realizadas
pelo DEJA/SEMED em parceria com a UFAL; 5) Atuação como mediadora das ações
pedagógicas entre escola, SEMD/DIGEM/DEJA/comunidade; 6) Organização e
realização nas escolas sob a responsabilidade dos educadores de apoio em ação de:
seminários , palestras, encontros, cursos, dentre outras atividades; 7) Organização de
um plano de trabalho que deveria ser discutido com a equipe do DEJA bem como com
os professores junto aos quais seria desenvolvido o trabalho; 8) Formação inicial dos
professores que iriam assumir as turmas de EJA (GAP 2004, p.7-9)

Dado o exposto, o projeto do GAP representaria, ao seguir o rigor metodológico e
ético que defendia, um salto qualitativo na prática de formação do(a) professor(a) vivenciada
nas zonais. Nesse sentido, o(a) formador(a) estaria mais próximo dos problemas cotidianos da
______________________
60

Tendo como critério avaliativo seu desempenho nos encontros de formação e/ou em suas práticas pedagógicas.

47

escola, teria condições de intervir na realidade e, ao mesmo tempo, fazer parte dela. As
atribuições do GAP demonstravam a responsabilidade que o grupo teria ao tentar contribuir
para o desenvolvimento sistemático de ações pedagógicas. Para Pérez Gómez (1995, p.113), é
preciso “criar espaço para um novo tipo de investigação sobre a vida complexa na sala de
aula, sobre o pensamento prático do professor, sobre o seu conhecimento-na-acção, sobre o
seu fazer, sobre a sua reflexão-na-acção e sobre a sua reflexão sobre a acção”.
Na conjutura atual, articular a formação do(a) professor(a) e o desenvolvimento de
espaços de reflexão na escola ainda são ações marginais, desacreditadas. As estratégias de
formação almejam melhorar a qualidade do sistema educacional, mas para melhorá-la é
necessário investir na qualificação do profissional da educação, proporcionando-lhe também
um espaço propício ao desenvolvimento de sua prática docente e a troca de experiências com
a equipe pedagógica da escola.
Uma política de formação continuada capaz de atender as necessidades teórico-prático
do(a)s professore(a)s, contribuindo para o seu desenvolvimento profissional será possível,
entre outros aspectos, quando essa formação considerar as especificidades sócio-culturais da
formação humana. Nesse sentido, Candau (2003, p.152) postula que

“temos

de

estar

conscientes da necessidade de articulação dialeticamente entre as diferentes dimensões da
profissão docente os aspectos psicológicos, técnicos, científicos, políticos-sociais,
ideológicos, étnicos e sociais”. Para propor

um modelo de formação que atenda as

necessidades do grupo, precisamos redirecionar os modelos de formação postos na sociedade
(CHANTRAINE-DAMAILLY, 1995).
Dado o exposto, o (re)direcionamento das práticas de formação pressupõe a reflexão
contínua do(a)s agentes implementadore(a)s e do(a)s professore(a)s cursistas na tentativa de
redirecionar constantemente os rumos da formação. Nesse sentido, no próximo capítulo
refletiremos a partir dos vários olhares dos sujeitos envolvidos as especificidades dos cursos
de formação de LM.

48

CAPÍTULO 2

CURSOS DE LÍNGUA MATERNA NO BOJO DA FORMAÇÃO CONTINUADA:
UMA AVALIAÇÃO A VÁRIAS VOZES

Neste capítulo nos propusemos a avaliar os pressupostos teórico-metodológicos
adotados durantes os cursos de LM, a partir da escuta das vozes das professoras, dos
coordenadores e da formadora. Esse(a)s informantes, como

demonstraremos, foram

determinantes na definição do percurso teórico-metodológico direcionado no período de
implantação dos cursos de LM.
Para fundamentação desse capítulo, nos baseamos, principalmente, nos estudos de
Bakhtin (2004), Geraldi (2003), Matencio (2002), Nóvoa (1995, 1999), dentre outros autores
que também vêm contribuindo na discussão sobre ensino de LM e/ou formação continuada de
professore(a)s.

2.1 Vozes diferentes, perspectivas similares...

O ensino de LM, em Maceió, ocupou lugar privilegiado entre as ações de formação
continuada do(a) professor(a) da EJA. Nesse contexto, a equipe do DEJA investiu,
consideravelmente, em cursos que tematizaram o ensino de LM. Esses cursos caracterizaramse por sua natureza sistemática, configurando-se enquanto modelo de formação inserido
dentro de uma política ampla implementada pelo Departamento. Nesse perspectiva, a equipe
gestora do DEJA defende que

49

a formação contínua é uma das principais ações do DEJA, assim temos repensado
num processo permanente de ação-reflexão-ação o nosso fazer pedagógico. Neste ano,
com a contribuição dos recursos do Programa Recomeço foi possível ampliar a oferta
dos cursos e participação de vários encontros nacionais, que oportunizaram a
apresentação de experiências de EJA no Município de Maceió ( DEJA 2001).

O programa Recomeço objetivava, entre outras ações, proporcionar ensino de
qualidade, mediante formação continuada de professores. Reconhecemos a relevância desses
recursos, para implementação de proposta de formação de professore(a)s, mas contrapomonos ao seu caráter emergencial, provisório, compensatória e sujeito à interrupção.
Considerando as especificidades do(a) professore(a)s da EJA, faz-se necessário o
investimento em políticas públicas de formação continuada de professore(a)s. Evitando-se
iniciativas e extinção de propostas de formação que a cada (re)começar desconsideram os
saberes docentes construídos ao longo do ciclo de vida profissional do(a)s professore(a)s.
Huberman (2000, p.31-61), ao analisar o ciclo de vida profissional de professores
identifica as seguintes “fases ou estágios”, pelos quais passam o professor no decorrer de sua
profissionalização, que podem ser considerados no momento de definir programas de
formação continuada de professore(a)s: entrada na carreira; estabilização; lamentações; e
desinvestimento. No entanto, a passagem por essas fases não é um percurso natural, inúmeros
fatores de natureza política e cultural colaboram para que essa evidencia ocorra em alguns
contextos.
Com relação a responsabilidade do DEJA, em oferecer locus de formação a(o)s
professore(a)s e, em contrapartida, o compromisso do(a) professor(a) para com o seu
desenvolvimento profissional, o coordenador C 3 afirma que

é obrigação... enquanto instituição oferecer a formação continuada... mas... ela é
pequena... diante do universo da prática... [...] você sujeito... também tem que se
responsabilizar um pouco pela sua formação... então não esperar tê só esses
momentos... de estudo

Ao refletir sobre a relevância dos cursos para a formação do(a) professor(a), no
depoimento supracitado, constatamos que o coordenador C3 demonstrou preocupação com a
necessidade do(a)s professore(a)s em investir em sua auto-formação (PERRENOUD, 2002).

50

No locus de formação docente, o(a)s professore(a)s, deveriam ser conduzidos a refletirem
coletivamente sobre a sua função, seu processo de formação e suas necessidades de
aprendizagem ambas de natureza política. Pois, nenhum ensino, e nenhuma educação de
professores podem ser neutra (ZEICHNER62, 1995 apu GERALDI et AL., 2003), como já
havia postulado Paulo Freire (1987).
Os cursos de LM, possibilitaram o estudo dos pressupostos teórico-metodológicos da
lingüística textual, no intuito de fomentar o repensar a prática de ensino de LM na escola.
Vale ressaltar que foram propostas outras iniciativas paralelas aos cursos, entre elas, a
participação em eventos pontuais (congressos, seminários, oficinas) e estudos nas zonais.
Ao falar sobre a organização dos cursos o coordenador C3 afirma que

[...] tinha uma carga horária de trabalho...[...] foi com a língua portuguesa... em torno
quase de 120 horas por ano [...] ou seja... é uma carga horária... que a gente... poderia
dizer assim... já razoável... pra determinadas questões da linguagem já terem sido
superadas

O coordenador C3 demonstrou inquietações com relações aos resultados do trabalho
desenvolvido, por não perceber os reflexos do processo de formação na prática pedagógica. A
transposição dos conhecimentos teóricos, discutidos durante os cursos, em conteúdos
didaticamente assimiláveis pelo(a)s aluno(a)s, ou seja, na atividade de transposição didática (
PERRENOUD, 1993), que resulta da construção do “ conhecimento pedagógico dos
conteúdos” (SHULMANN, 1986), um dos diferenciais da docência como atividade
profissional, não acontecem instantaneamente, precisam de um tempo para ser
(re)significadas e incorporados à prática.
A prática pedagógica de ensino de LM constitui-se por sua complexidade.
Historicamente, o ensino de língua está marcado pelo peso da tradição. As experiências que
o(a)s professore(a)s tiveram com o ensino de LM, durante longos anos de escolaridade,

62

ZEICHNER, K.M. & GORE J.M Using action research vehicle for student teacher reflection: a social
reconstrutionist appioach. In: NOFFKE e ETEVENSSON (eds) Educacional action research: becoming
practically critical. Londres e Nova York. Teacher. Madrid Morata; La Coriña, Fundación Paideia.

51

enquanto eram estudantes, são tomadas como referencias para o trabalho com a LM na escola.
A esse respeito, Kennedy63 (1990 apud Vieira-Abraão, 2002), “os professores adquirem
marcas aparentemente permanentes de sua experiência como alunos que são difíceis de
remover”.
Tardif (2003, p. 261) defende que “a inserção do professor em seu espaço de trabalho,
experiências anterior ao exercício da profissão docente, se manifestam através de toda uma
bagagem de conhecimentos anteriores, de crenças, de representações e de certezas sobre a
prática docente”. Mas do que “um lugar de aquisição de técnicas e de conhecimentos a
formação de professores é o momento chave da socialização da configuração profissional” (
NOVOA, 1995, p.18). Já que resultados positivos implicam “ações integradas, políticas
diferenciadas, consideração de dificuldades especificas e adequadas ao estatuto de formação
de docentes para EJA” (SOARES, 2002, p.113).
Nesse sentido, os locus de formação continuada devem proporcionar a(o) professor(a),
momentos de socialização e de valorização de sua subjetividade, no que diz respeito aos seus
saberes docentes construídos ao longo do seu processo de formação profissional. Segundo
Nóvoa, cada professor(a) “tem o seu modo próprio de organizar as aulas, de se movimentar na
sala, de se dirigir aos alunos, de utilizar os meios pedagógicos, um modo que constitui uma
espécie de segunda pele profissional” (2000, p.16, grifo do autor).
Suassuna (2000, p. 60), ao refletir sobre as novas perspectivas de ensino de língua,
defende que “nós professores de língua materna, deparamos com uma situação de impasse;
toda a prática tradicional está posta em questão e não nos parece muito claro, de imediato, que
caminhos poderíamos ou deveríamos seguir”. Nessa perspectiva, o(a)s formadore(a)s
deveriam dominar, entre outros saberes, os fundamentos teórico-práticos subjacentes ao
ensino de LM, considerando, entre outros aspectos, as necessidades de aprendizagem do(a)s
alunos(a)s da EJA.
Zeichner64 (1997 apud GERALDI et al., 2003, p.244) referenda que seria “dicotômico
cobrarmos que os professores façam coisas que nós mesmos não conseguimos fazer”. É nesse
momento que “a formação adequada e a ação integrada implicam a existência de um espaço
próprio, para os profissionais da EJA, nos sistemas, nas universidades e em outras instituições
63

KENNEDY, M. Policy Issues in teacher Education. East Lansing , Mitch: National Certer for Reach on
Teacher Learning. 1990
64
Ver nota 60.

52

formadoras” (SOARES, 2002, p.120). Destarte, a formação inicial e continuada do(a)
professor(a) da EJA poderá ser uma alternativa para legitimação ou invalidação dos saberes
docentes inerentes à prática pedagógica.

Sobre a opção pelo caminho teórico-metodológico, seguido durante os cursos de LM,
o coordenador C1 afirma

trouxemos uma nova concepção na formação de língua... com a F... com a questão de
sociolingüística... da lingüística textual... [...] para eles começar a refletir [...] mas
quando a gente chega lá... cadê? Comé que eu vou trabalhar a gramática? Ai eu deixo
a gramática de lado... porque eu [...] não tenho conhecimento... só sei dá a gramática
daquele jeito... e uma gramática contextualizada não consigo trabalhar... até porque eu
já esqueci... o que é o verbo... [...] já esqueci preposição... não sei nem comé que vou
trabalhar isso... nessa perspectiva da linguistica

O coordenador C1, ao tentar refletir sobre os saberes discutidos, durante os cursos, e
a sua transposição à pratica de ensino de LM, justifica o não avanço do(a)s professore(a)s em
suas concepções, pelo fato de apresentarem lacunas conceituais provenientes de seus
processos de formação inicial. A inclusão dos conteúdos trabalhados, no período dos cursos,
no currículo da EJA, nem sempre serão suficientes para que haja uma mudança na prática.
Muitas vezes, as discussões fomentadas não estabelecem relações diretas com os saberes
ensináveis a(o)s aluno(a)s. Nesse sentido, Tardif (2003, p.37) defende que a prática docente
“não é apenas um objeto de saber das ciências da educação, ela é também uma atividade que
mobiliza diversos saberes que podem ser chamados de pedagógicos”.
As dificuldades da inclusão dos estudos lingüísticos na escola, no contexto atual, é
natural, já que “os estudos dos textos e do discurso são muito recentes para que seus
princípios possam ser incorporados às práticas escolares sem dificuldades, sejam estas de
ordem teórico-metodológica ou institucional” ( MATÊNCIO, 2002, p.73).
Em EJA, a preocupação com o ensino de língua, tendo por base o texto, iniciou-se
mesmo de forma incipiente, na década de 1980, conseqüentemente com os avanços das
ciências lingüísticas ocorreu um maior aprofundamento no final da década de 1990. Matêncio
(idem, p.83) afirma que até a década de 60, na realidade, existiam outros grandes problemas

53

de ordem estrutural na universidade: discutia-se ainda o papel das pesquisas para o
desenvolvimento das ciências profissionais no país, nesse contexto, a Lingüística estava
apenas sendo introduzida nos cursos de formação de professore(a)s.
Ao questionarmos, se os estudos dos pressupostos teórico-metodológicos, durante os
cursos, desdobravam-se em outros encontros progressivamente, partindo-se dos saberes da
experiência para paulatinamente construir novos conhecimentos, o coordenador C5 afirmou
que

a coisa aparecia... nós estávamos no curso discutindo o ensino da língua portuguesa...
então aparecia nessa perspectiva que tava sendo trabalhado... àquela concepção de
linguagem... então aparecia durante as zonais... sem necessariamente... a gente pensar
na progressão dessas temáticas

O coordenador C5 reconhece que não havia uma preocupação, no processo de
formação, com a progressão dos pressupostos teórico-metodológicos discutidos. Ao longo de
um processo de formação, naturalmente, o(a)s professore(a)s podem demonstrar dificuldades
em compreender os temas abordados. Desta forma, o encontro subseqüente, como se tratava
de um processo de formação continuada, poderia ser um momento privilegiado para refletir os
pressupostos que ainda não foram compreendidos, e avançar no já sabido. O processo de
aquisição de conhecimento não acontece em apenas alguns encontros, mas paulatinamente
através de estudos, experimentação e reflexão. Nessa direção, Torres (!999), propõe, entre os
princípios norteadores, as políticas no campo da formação docente, a necessidade de articular
a formação inicial e formação em serviço. Essa articulação, é inerente à própria concepção de
aprendizagem e de desenvolvimento profissional da docência, entendida com um continuo ao
longo da vida.
A definição dos pressupostos teóricos a serem discutidos, durante os cursos de LM,
pautavam-se também em análise das produções escritas do(a)s aluno(a)s, como podemos
constatar no depoimento do coordenador C5.

54

a gente tava estudando gêneros textuais... as marcas lingüísticas do gênero bilhete...
antes de estudar [...] as marcas lingüísticas do gênero... levou as produções dos
alunos... [...] diante dessa produção... a gente analisou o estudo do gênero

Na definição dos pressupostos teóricos a serem discutidas, segundo o coordenador C5,
levava-se em consideração o conhecimento prévio do(a) aluno(a) sobre o gênero textual,
inferidos a partir de suas produções, proveniente de suas práticas sociais ou escolares, essa
estratégia mostra-nos a tentativa de aproximar os conteúdos trabalhados, durante os cursos , e
os saberes do(a)s aluno(a)s. Nesse sentido, Kleiman postula que

é preciso partir das situações de fora do contexto escolar e dar-lhe uma significação
dentro do contexto da escola, pelo enriquecimento e pela ampliação das concepções e
representações que o aluno traz em relação à escrita, do desenvolvimento de gêneros
escolares que sejam úteis para a aprendizagem e da criação de situações significativas
de uso da escrita que extrapolem os limites da sala de aula. (2001, p. 242)

O respeito aos saberes do(a)s aluno(a)s da EJA, saberes socialmente construídos, sobre
os usos e as funções da leitura e da escrita, pressupõe aceitar que os conteúdos discutidos na
escola devam manter relações com as práticas sociais de uso da linguagem fora dela. Para isso
é preciso desmitificar, por meio de eventos de formação, perspectivas obsoletas de ensino de
LM na escola.
Atrelada ao descaso governamental, com relação ao processo de profissionalização
docente, segundo Messina (2002, p. 11) “ as inovações na formação inicial docente não foram
incorporadas as problemáticas da educação de pessoas jovens e adultas, nem a perspectiva de
educação permanente”. Para a autora ainda, nesse contexto, a formação do educador de adulto
“ continua segregada ou passou a fazer parte das tentativas de formação dos professores e das
professores do ensino regular, sejam em âmbitos federal, estaduais e/ou municipais” ( idem,
ibidem). Embora, percebemos indícios de algumas tentativas de propostas de estruturação, de
formação contínua em contextos isolados.

55

Os cursos de LM pautaram-se em estratégias especificas. No que diz respeito a seleção
dos conteúdos tentou-se ouvir o(a)s professore(a)s, antes de selecionaram os conteúdos,
referendamos, posteriormente, como esse processo aconteceu.

2.2 Seleção dos conteúdos: definições e redefinições

Tem sido lugar comum, durante os eventos de formação de professor(a), a definição
dos conteúdos tomarem como parâmetros: orientações da proposta curricular para o 1º
segmento do ensino fundamental da EJA: apoio em propostas curriculares de outras
modalidades de ensino e/ou podem ser estruturadas pelo(a)s formadore(a)s ou pelas equipes
das Secretarias de Educação (estaduais e/ou municipais). Segundo Zabala (1998, p. 30) o
termo conteúdo normalmente foi empregado para “expressar àquilo que deve se aprender, mas
em relação quase exclusiva aos conhecimentos das matérias ou disciplinas clássicas e,
habitualmente para aludir àqueles que se expressam no conhecimento de nomes, conceitos,
princípios, enunciados e teorias”.
Em Maceió, a definição dos conteúdos abordados, durante os cursos de LM, seguiram
inicialmente as orientações do(a)s coordenadore(a)s do DEJA, como podemos perceber no
depoimento da Formadora

quando eu fui convidada... para participar como formadora [...] da formação
continuada [...] primeiro ela me deu uma temática... por sinal temática de texto [...]
como [...] introduzir o texto na educação de jovens e adultos... e [...] caminhando toda
a aquisição da linguagem... toda essa parte... como é passar os conhecimentos de
língua para os estudantes da EJA.... que têm um conhecimento de mundo que lhe é
peculiar [...] que buscasse no próprio aluno da formação continuada... aquilo que eles
mais gostavam... que precisavam... então é o primeiro curso... um curso que alguém
me desse um tema... foi exemplo como estudar o texto...

56

A formadora afirma, no extrato acima, que inicialmente recebeu do grupo gestor do
65,

DEJA

na época, a sugestão de iniciar o processo de formação a partir das discussões

teórico-metodológicas sobre a introdução do estudo do texto na EJA. Posteriormente, outros
conteúdos foram desdobrando-se: aquisição da linguagem e como ensinar a LM a(o)s
aluno(a)s da EJA, considerando seus conhecimentos de mundo, de linguagem oral e escrita
construídos em suas relações sociais.
A necessidade de inclusão do estudo do texto, nas aulas de LM, vem sendo discutido
por diversos pesquisadores (KOCH, 2002; MARCUSHI, 2002; GERALDI, 1997; 2003;
TRAVAGLIA, 2003; SANTOS et al 2004). No entanto, a inserção do texto, na sala de aula,
enquanto objeto de estudo, principalmente na EJA, apresenta-se ainda timidamente. Segundo
Fávero e Koch (1988, p. 25), o texto é qualquer passagem, falado ou escrita, que forma um
todo significativo, independente de sua extensão. Trata-se, pois de uma unidade de sentido, de
um contínuo comunicativo contextual que se caracteriza por um conjunto de ralações
responsáveis pela tessitura do texto.
Observamos, no contexto escolar, a persistência dos estudos gramaticais
descontextualizados, quase exclusivo, nas aulas de LM em detrimento do ensino de outros
aspectos lingüísticos. Bagno (2002, p. 17), ao falar sobre o ensino de língua, afirma que

ao longo do tempo foi acontecendo um fenômeno bastante curioso. A gramática, que,
por opção consciente de seus fundadores só cuidava da língua escrita literária,
começou a ser usada como um código de leis, como uma régua para medir todo e
qualquer uso oral ou escrito de uma língua. Assim, transformando em instrumento de
poder e dominação de uma parcela pequena da sociedade sobre todos os demais
membros dela, a GT foi avançando, conquistando terreno, impondo seu domínio: a
partir de um pequeno setor do universo total da língua.

Posteriormente, segundo a Formadora, o(a)s professore(a)s foram convidado(a)s a
sugerirem os conteúdos:

65

Alguns componentes do DEJA em parceria com o CEDU-UFAL, e uma professora do departamento de letras
e lingüística, da mesma universidade, desenvolvem pesquisas cientificas direcionadas a lingüística em interface
com a educação. Esse vínculo pode justificar a escolha da abordagem teórica que permearam as discussões
durante os cursos de formação.

57

Então:: o que eu quero dizer... é que... o primeiro encontro [...] me deram a temática...
porque ai... eu vi como adequar esse tema as professoras... as que estavam sob minha
custodia... mas os temas seguintes... eles provieram da necessidade dos próprios
professores... então:: o bonito é que eu tinha um acompanhamento do grupo... e:: o
grupo ia sentindo a necessidade [...] do que eles estavam precisando... então:: o tema
seguinte [...] ou que iria ser a grande temática do outro [...] seria centrada nos próprios
formandos... naqueles que estavam na formação continuada

O depoimento da formadora demonstra-nos que o(a)s professore(a)s atuavam
sugerindo os conteúdos que deveriam ser trabalhados durante os cursos de LM. Se o(a)s
professore(a)s desconhecem os conteúdos específicos das ciências lingüísticas, não poderiam
sugeri-los. Desta forma, as sugestões do(a) professor(a)s, embasadas em suas experiências de
vida e profissional, foram ressignificadas pela formadora. Os motivos que podem levar o(a)s
professore(a)s a envolverem-se em uma proposta de formação, socialização de suas
experiências e interesses são àqueles relacionados às necessidades especificas do ensino
(GARCIA, 1995)
A seleção dos conteúdos problematizados, durante os cursos, foram delimitados a
partir das necessidades de aprendizagem do(a)s professore(a)s, sobre o ensino de LM,
segundo o coordenador C3

[...] a escolha dos nossos temas... e ai foi uma coisa... que nós sempre batemos desde o
inicio... era de que... primeiro teríamos que ouvir o professor... mas também... o ouvir
não ficasse somente em eu vou atender tudo que ele ta pedindo... a gente até que
colocava como sendo muitas vezes a necessidade dele... a gente levava ele a refletir...
se era realmente aquilo... já que muitos estão atrelados a questão muito da prática pela
prática da oficina.

Nessa passagem, o coordenador C3 mesmo querendo demonstrar que a equipe do
DEJA mantinha-se numa postura democrática na seleção dos conteúdos, deixou transparecer
os limites dessa liberdade, ela tinha um caráter restrito, submetia-se, posteriormente, à analise
do grupo gestor do DEJA que definia, por sua vez, a pertinência das solicitações.
O coordenador C5¸ sobre o critério de escolha dos conteúdos, afirma que

58

essa definição... ela era tomada... a partir das sugestões dos professores... da reflexão
[...] da avaliação desses encontros... tanto dos cursos... quanto das zonais... a partir
dessa avaliação... [...] o Departamento ia fechando a temática

Nessa perspectiva, devemos manter-nos em alerta, quanto a coerência entre discurso e
prática já que, no contexto pedagógico, segundo Nóvoa (1999, p. 158) inovações, mudanças,
criatividades, autonomia, “tornaram-se termos que brilham no discurso oficial da sedução,
mas que não escondem a realidade da rotina estritamente regulamentada e a mediocridade de
condições de trabalho que limitam, em larga medida, a vivencia nos espaços escolares”.
Dado o exposto, para que o(a) professor (re)direcione a sua atuação no ensino da
leitura e da produção de texto, ele(a) precisa tomar consciência de sua concepção sobre
gêneros textuais, sobre a linguagem, sobre práticas sociais de uso da língua em diversos
contextos, mas precisa sobretudo conhecer quais são os processos cognitivos envolvidos na
atividade de leitura e na produção de textos. Precisam ainda, refletir sobre a didática do ensino
da leitura e da produção de textos, sobre progressão escolar, sobre currículo, entre outros
aspectos. Nesse sentido, refletirmos nos encontros de formação apenas sobre os conteúdos
curriculares podem não garantir mudanças na prática, é preciso compreender também como
acontece o processo de ensino-aprendizagem.

2.3 Sugestões, releituras e definições: os conteúdos trabalhados nos cursos
de LM

Durante os cursos de LM foram trabalhados conteúdos66 procedimentais, atitudinais,
conceituais67 entre outros. No entanto, como investigamos um processo de formação já

66

Concordamos com Zabala (1998, p.30) ao defender que “devemos nos desprender da leitura restrita do termo
“conteúdo” e entende-lo como tudo se tem que aprender para alcançar determinados objetivos que não apenas
abrangem as capacidades cognitivas como também incluem as demais capacidades”.
67

Segundo Zabala (1998, p.42), os conteúdos e os princípios são termos abstratos. Os conceitos se referem ao
conjunto de fatos, objetivos ou símbolos que tem características comuns, e os princípios se referem às mudanças
que se produzem num fato, objeto ou situação em relação a outros fatos, objetos e que normalmente descrevem
relações causa efeito ou de correlação.

59

vivenciado, não encontramos dados suficientes para analisarmos todos os conteúdos
abordados. Desta forma, os conteúdos conceituais foram nosso foco de análise.
A tabela 2 sintetiza os conteúdos trabalhados nos cursos68 de LM:
TABELA 2 – CONTEUDOS TRABALHADOS
Proposta de trabalho69
Ementa: Levar os professores a refletirem sobre sua prática pedagógica à luz das teorias
lingüísticas da aquisição da linguagem, com enfoque sóciointeracionista.
Conteúdos:





As concepções de linguagem
As teorias sóciointeracionista
Considerações entre a oralidade e a escrita
Análise de texto

Ementa: Compreensão do lugar da Lingüística Textual em relação às demais ciências, com
foco na sua definição histórica e no seu objeto de estudo.
Conteúdos:
● A Lingüística textual em relação às ciências da linguagem
● A Lingüística textual: definição, origem, objeto de estudo e principais precursores
● Conceitos-chaves da Lingüística textual
● Caracterização das relações entre língua falada e língua escrita
● Frase, texto, discurso, tipo textual e gêneros discursivos70
● Ensino de Português
● As condições de produção do discursos
● Paráfrase e polissemia
● A enunciação
● Competência textual
● Gêneros textuais: comédia, charge, Lead, piada, poemas, Cartum, caricatura, tiras,
manchetes, artigo de jornal, propaganda e fábulas
Fonte: Registros dos cursos

A tabela 2 nos demonstra que, durante os cursos de LM, foram discutidos alguns
princípios epistemológicos da lingüística textual com enfoque sóciointeracionista. Com o
68

Os cursos fundamentaram-se em Baktin (2004); Citelli (1994); Costa Val (1999); Fávero (!983). Koch (1991;
1984);Marcuschi (1983; 2000); Meurer (1997); Santos (1999); Geraldi (2003); Possenti (2003), entre outros.
69
Esse quadro foi montado a partir das informações coletadas nos textos “propostas de cursos “.Na
inexistência de registro sobre o processo de formação, não foi possível recuperar todos os conteúdos trabalhados,
porém a partir das análises das entrevistas percebemos que esses foram os conteudos mais discutidos.
70
Conteúdos recuperados a partir de textos trabalhados durante a formação

60

objetivo de conduzir o(a)s professore(a)s à reflexão sobre suas práticas de ensino de LM a
partir dos pressupostos da lingüística textual; à compreensão do lugar da lingüística em
relação às demais ciências; as características dos gêneros textuais; e as relações lingüísticas
estabelecidas pela textualidade.
É interessante observarmos que grande parte dos conteúdos sistematizados, na tabela
2, referem-se as definições de pressupostos epistemológicos da lingüística textual, saberes
disciplinares específicos par ao professor de LM. Mas,, não, necessariamente, ensináveis a(o)s
aluno(a)s do Ensino Fundamental da EJA. Nesse sentido, é necessário que o professor
compreenda os pressupostos teóricos discutidos, reflitam sobre a sua relevância, a teorização
sobre a prática, e encontrem através de discussões coletivas respostas para suas inquietações
sobre a prática de ensino de língua.
O critério para definição de conteúdos, abordados, em encontros de formação,
pressupõe uma concepção de linguagem. Nesse sentido, Geraldi postula que

a alteração da situação atual do ensino de língua portuguesa não passa apenas por uma
mudança nas técnicas e nos métodos empregados na sala de aula. Uma diferente
concepção de linguagem constrói não só uma nova metodologia, mas principalmente
um ‘novo conteúdo’ de ensino. (2003, p.45).

A concepção de linguagem adotada pelo(a) formador(a) poderá ser um elemento
propulsor de mudanças no tratamento teórico-metodológico dos conteúdos trabalhados
durante as práticas de formação. Na realidade, se almejamos formar jovens e adultos letrados
capazes de interagir competentemente, fazendo uso da leitura e escrita em diversos contextos
sociais, sabemos que não é apenas o conhecimento teórico-metodológico dos fundamentos da
lingüística que “irá proporcionar aos profissionais de ensino de língua materna posturas mais
eficazes em sala de aula” (MATÊNCIO, 2002, p. 85). Embora seja um dos aspectos essências,
referenda a questão posta por Freire (1998, p. 90) “como alfabetizar sem conhecimento
precioso sobre aquisição da linguagem, sobre linguagem e ideologia sobre técnicas e métodos
de ensino da leitura e da escrita?”
A Formadora afirma que a sua opção metodológica se apoiava nos conhecimentos da
lingüística com enfoque sóciointeracionista. Desta forma, segundo ela. “ todas as temáticas
foram temáticas ligadas ao sóciointeracionismo. Houve até uma época em que se pensou em

61

dá uma só de gramática”. Na referida abordagem, através da interlocução e das relações entre
os seres humanos. Para Marcushi (2003, p. 33), nessa perspectiva, a “fala e a escrita
apresentam

dialogicidade;

usos

estratégicos,

funções

interacionais,

envolvimento,

negociações, situacionalidade, coerência e dinamicidade”.
No ensino das modalidades lingüísticas oral e escrita, durante as aulas de LM, não se
trata de privilegiar uma em detrimento da outra, mas compreendê-las

como formas de

enunciação, com características próprias, que precisam ser apropriadas por seus usuários.
Precisamos compreender que “a comunicação é de natureza social” (BAKHTIN, 2004). A
língua e o sujeito se constituem nos processos interativos ( GERALDI, 2003). Na verdade, a
lingua não se transmite; ela dura e perdura sob a forma de um processo evolutivo continuo
(BAKHTIN, idem). É inegável, portanto, a necessidade de uma revisão crítica dos cursos que
tematizaram o ensino da LM, seja na formação inicial ou continuada do(a) professor(a) para
que, conseqüentemente, seu ensino se aproxime mais das reais necessidades de aprendizagem
de uma língua.

2.4 As dificuldades do processo de formação em LM

A formação continuada do(a) professor(a) é um processo influenciado e determinado
por fatores de natureza social e político, os quais interferem desde a implementação de
iniciativas de formação até o desenvolvimento desse processo. Nesse contexto, o(a)s
professore(a)s para participarem das iniciativas de formação oferecidas pelos órgãos
governamentais precisam superar inúmeras dificuldades (disponibilidade de carga horária,
recursos para deslocamentos, problemas familiares , entre outros).
Em Maceió, os cursos de formação em LM receberam interferências de diversos
fatores de naturezas complexas. Sobre as dificuldades surgidas, o coordenador C5 afirma
que

a maioria dos professores tinham dificuldades... a partir do amadurecimento das
discussões... dos encontros de língua portuguesa... a gente foi avançando... com
relação a algumas questões... mas assim... envolvidas por questões pessoais... sociais...
econômicas... não avançou tanto:: quanto se estava esperando [...]

62

O depoimento do coordenador C5 nos leva a defender o pressuposto de que em
qualquer processo de formação, precisamos conhecer a singularidade do(a) professor(a), com
relação as suas dificuldades pessoais e sociais. A realidade na qual estão inseridos é
populsora, por um lado, de incertezas, desilusões, mal está docente (ESTEVES, 1991). Por
outro lado, podem impulsionar motivação, prazer e/ou perspectiva de mudança. Para isso, o
conceito de coletividade deve ser invocado, a fim de que os cursos de formação de
professore(a)s sejam percebidos como espaços de produção coletiva, no qual ele(a)s se sintam
a vontade para socializar suas dúvidas, dificuldades pessoais, perspectivas, valores éticos e
experiências. Segundo Tardif (2003, p. 241) “o principal desafio para a formação de
professores nos próximos anos será o de abrir um espaço maior para os conhecimentos dos
práticos dentro do próprio currículo”.
Além dos impedimentos pessoais, a inadequação da escola às camadas
desprivilegiadas, a precária formação do(a) professor(a), atrelada ao fracasso do ensino de
LM, tradicionalmente, vêm reforçando o insucesso do(a) aluno(a) no domínio da leitura e da
escrita, entre outras habilidades. Nesse sentido, Kleiman (2001) afirma que devido à sua
formação acrítica em cursos sem leitura e sem escrita, esses alfabetizadores não conseguem
evitar a frustração e o fracasso do cotidiano da aula. Eles poderão até, alfabetizar, mas,
certamente, não formarão sujeitos letrados que utilizam a escrita para o seu desenvolvimento
e o do seu grupo social”.
Nesse sentido, o(a) professor(a) ao adentrar em cursos de formação, muitas vezes,
procura respostas para seus problemas cotidianos no intuito de superar suas dificuldades. Os
eventos de formação, nesse contexto, configuram-se numa possibilidade de ressignificar a
prática. O Coordenador C1 demonstra essa perspectiva ao afirma que

não pense que é fácil... você levar um curso... quando você começa pela concepção de
língua... quando você começa por todas àquelas coisas... pra poder chegar e tal... mas
eles querem sabe... ‘mas eu quero saber como eu vou fazer’... porque o aluno também
tem pressa... [...] então::: têm todas essas dificuldades...

No extrato, a coordenadora C1 defende que propor um curso abordando
conhecimentos teóricos, sem de certa forma estabelecer relação com a prática pedagógica,
torná-se uma ação difícil. O(a)s professore(a)s querem saber o que devem fazer com os
conhecimentos discutidos. Transformar os conhecimentos teóricos trabalhados, durante os

63

cursos, em conhecimentos didaticamente ensináveis, essência da docência, é uma atividade
desafiadora. Nesse sentido, o(a) professor(a) precisa, nos encontros de formação, apoiado em
reflexões coletivas, encontrar possíveis respostas para seus questionamentos. Para ultrapassar
a dicotomia teoria-prática, da forma como tradicionalmente se apresenta, é preciso, segundo
Kramer

superar a concepção instrumental de linguagem71 que está subjacente aos cursos de
formação de professores em serviço, pois estes pretendem transmitir conteúdos sobre
a linguagem, sem se dispor a pensar essa linguagem e sem conhecer a linguagem
praticada e produzida naquela experiência de formação

Em uma perspectiva de formação que adota como ponto de partida o(a) professor(a) –
seus interesses, seus conhecimentos, suas experiências, a pergunta que deveria ser posta é o
que o(a) professor(a) sabe sobre o ensino de LM?
O coordenador C5 aponta um dos entraves do processo de formação “a resistência
do professor ao novo... a resistência em fazer... até porque... eles não conseguiram fazer
também... então assim:... são duas dificuldades básicas. Nesse caso, o coordenador acredita
que a resistência à incorporação dos novos saberes à prática, justifica-se pelo fato do(a)
professore(a)s não saberem como transpô-los, ou seja, são dificuldades provenientes da
relação teórica-prática subjacente a uma determinada postura pedagógica. Devemos
considerar também que as discussões sobre o ensino de LM, na escola, ´por serem estudos
recentes, ainda carecem de propostas de aplicação ao ensino.
A fragilidade na formação inicial do(a) professor(a) parece ser evidenciada ainda no
depoimento do coordenador C4

a gente via... a fragilidade da própria formação inicial deles... não tinham porque
determinadas questões [...] a gente apresentava pra eles... que deveriam ter sido
trabalhados na formação inicial

As dificuldades conceituais apresentadas pelo(a)s professore(a)s são percebidas pelo
coordenador C4 . Considerando que pouco(a)s professore(a)s, durante sua formação inicial,
71

Koch (2002, p. 14) afirma que à cocepção de linguagem como estrutura, por seu turno, correposnde a de
sujeito determinado, assujeitado pelo sistema, caracterizado por uma espécie de ‘não consciência’. O principio
explicativo de todo e qualquer fenômeno e de todo e qualquer comportamento individual repousa sobre a
consideração do sistema, quer lingüístico, quer social.

64

tiveram a oportunidade de aprofundar e/ou (re)elaborar seus saberes lingüísticos, constatamos
a necessidade de repensar a trajetória de formação continuada ao intencionar mudanças na
postura de ensino de LM. Dionísio (200, p.82) postula que, “ recai, sobre os cursos de
formação de professores, especificamente sobre os cursos de lingüística que os graduandos
possam perceber como selecionar e como orientar os conteúdos de linguagem para o Ensino
Fundamental e Médio”.
Tardif (2003) defende que um professor de profissão não é somente alguém que aplica
conhecimentos produzidos por outro, não é somente um agente determinado por mecanismos
sociais, é um ator no sentido forte do termo, isso é um sujeito que possui conhecimentos e um
saber fazer provenientes de sua própria atividade docentes, podemos observar essa
constatação no depoimento da coordenadora C5

a maioria dos professores tinham pedagogia... existia... assim... uma grande
dificuldade nossa de apropriação [...] dessa reflexão... sobre o ensino de língua
portuguesa [...] a gente conseguiu avançar muito... a partir desses encontros... [...]
entretanto a gente ainda tinha uma barreira[...] fruto da nossa formação inicial [...] de
nossa formação do ensino fundamental... de ensino médio... da dificuldade de
produzir... de compreender o texto escrito principalmente... essas dificuldades...
conseqüentemente dificuldades também em nossa prática pedagógica... nós não
conseguimos fazer isso com muita clareza... [...] achávamos quase que impossível...
fazer essa transposição... daquilo que nós estávamos estudando para a nossa prática
pedagógica... nos tínhamos muita dificuldade [...]

O depoimento da coordenadora C5 aponta os principais fatores que dificultaram a
qualidade do processo de formação implementado pelo DEJA. Esses fatores podem ser
resumidos em:I) a maioria do(a)s professore(a)s foram formados para lecionar em outras
modalidades de ensino, apresentam lacunas de formação quantos aos fundamentos
lingüísticos; II) essa realidade acarreta dificuldades na apropriação dos conhecimentos
discutidos nos cursos; III) não tendo clareza dos aspectos discutidos seria quase impossível
transpô-los à prática.
A heterogeneidade de tempo de atuação na EJA, também apresenta-se enquanto
desafio a ser superado. Segundo o coordenador C4

um outro desafio... era a questão de termos dois públicos distintos na rede... um grupo
que já tinha uma certa caminhada... que entrou na rede... no concurso de 1994...

65

então:: determinadas questões metodológicas mesmo.. já estavam até superadas...
então... não daria pra ta trazendo ela de volta... repetindo... e um outro... que não tinha
essa caminhada...

A heterogeneidade do grupo de formação, com relação a experiência profissional,
participação nos eventos de formação e a rotatividade docente são aspectos a serem
considerados quando se almeja desenvolver uma formação comprometida com a
aprendizagem do grupo. O discurso do coordenador C4 demonstra-nos a necessidade de
(re)pensar o modelo de formação implementado. Para o sucesso desse investimento, o ciclo
de vida profissional de professores deve ser considerado no momento em que se planeja essa
formação, como referenda Candau

para um adequado desenvolvimento da formação continuada, é necessário ter presente
as diferentes etapas do desenvolvimento profissional do magistério; não se pode tratar
do mesmo modo o professor em fase inicial do exercício profissional, aquele que já se
encaminha para a aposentadoria; os problemas, necessidades e desafios são diferentes
e os processos de formação continuada não podem ignorar esta realidade promovendo
situações homogêneas e padronizadas, sem levar em consideração as diferentes etapas
do desenvolvimento profissional (1996, p. 143)

A heterogeneidade é constitutiva dos seres humanos. Os saberes docentes são plurais e
heterogêneos

(TARDIF, 2003). Mesmo que tenhamos um grupo de professore(a)s que

iniciaram o processo de formação ao mesmo tempo, nunca teremos um grupo homogêneo.
Para Tardif (idem, p.263) os saberes profissionais também “são variados e heterogêneos
porque não formam um repertório de conhecimentos unificados em torno de uma disciplina,
de uma tecnologia ou de uma concepção de ensino; eles são antes, ecléticos e sincréticos”.
Dado o exposto, não basta definir o profissional que se deseja formar, mas precisa-se
compreender e atentar para o profissional que estão em formação, como alerta Arroyo

não é ingênuo pensar que as atribuições listadas em cada nova lei, nova política, novo
parecer, possam, por um passe de mágica, alterar o histórico oficial de mestre que os
professores repetem? É curioso com que facilidade cada lei ou parecer lista novas
atribuições com a pretensão de formar um novo perfil, mas moderno e atualizado de
educador. O grave não é, apenas essa ingênua pretensão. O grave é confundir a função
histórica de educador com detalhes, com capacidades de elaborar um projeto da
escola, por exemplo, ou como aprender novos critérios de enturmação de avaliação, de
aceleração. É grave porque distraídas as leis e os pareceres com detalhes, os
currículos, as pesquisas e as políticas de formação não chegam ao cerne do oficio dê
mestres do papel social do educador, do que é a qualidade constitutiva, do que é

66

historicamente identitário do pensar e agir educativos. E´isso que deve ser formado e
qualificado. Outra concepção e outra prática de formação. (1999, p. 145)

Não obstante, o investimento na formação continua de professore(a)s, com a
finalidade de alterar a prática pedagógica, só faz sentido quando esta formação tiver como
princípio organizador o atendimento às necessidades formativas do(a) professor(a).

2.5 O lugar do(a)s professore(a)s nos cursos: agentes ou pacientes?

O locus de formação deve configurar-se num espaço coletivo de construção de saberes
docentes, através de práticas de socialização de experiências, discussão coletiva – sobre os
problemas do cotidiano escolar, e, incentivo à prática de pesquisa. Segundo Kleiman

a formação continua do professor é um processo que tem sido comparado à atividade
de pesquisa. Não havendo respostas prontas, mas perguntas sobre o processo de
ensino e de aprendizagem. As respostas seriam obtidas por meio de metodologias que,
de fato se assemelham à metodologia de um pesquisador que procura, nos dados
empíricos, respostas aos seus questionamentos (2001, p.207).
]

A formação, nessa moldura, proporcionaria o crescimento profissional do grupo.
Exigindo, do(a) formador(a), para isso, uma postura interativa, entre professor(a)formador(a), possibilitando a construção de conhecimento mútuo. Matêncio, ao refletir sobre
a formação continuada do(a) professor(a) de LM, defende que

os cursos de formação de professores deveria compartilhar da visão, existente
em outros setores, de que o educador pode e deve dar continuidade à sua formação,
em um processo de reflexão e de troca contínua com outros profissionais. Não estou
propondo, nesse sentido, que os cursos de formação incorporem a visão histórica de
que a formação dos professores é incompleta, pois é exatamente essa concepção que
leva a tentativa de se suprimir as lacunas durante o exercício profissional (2002, p. 86)

Nessa perspectiva, professore(a)s e formadore(a)s assumem uma postura de agentes do
processo de formação, desmontado a concepção de espaço de formação enquanto depósito de
conhecimento. Se almejamos (re)significar os saberes docentes, através do processo de

67

formação continuada, seria necessário compreendermos como se dar o processo de
aprendizagem humana. Segundo Vieira-Abrahão

o conhecimento é construído por meio da reflexão sobre os reais problemas
encontrados e por meio de teorias que se fazem necessário para a compreensão e
busca de soluções. [...] Considerando necessário que o aluno-professor tenha acesso a
teorias e princípios , a resultados e técnicas de investigação, a estratégias e técnicas de
ensino, mas que os mesmos não sejam apresentados de forma impositiva e dogmática,
como verdades únicas e aplicáveis a qualquer contexto (2002, p. 65).

Sob essa perspectiva, a heterogeneidade da formação do(a) professor(a) da EJA, aliado
as suas reais condições de trabalho, a seleção dos conteúdos, a opção metodológica, os
avanços e recuos na progressão dos conteúdos, a relação com as outras áreas do
conhecimento, bem como a reflexão sobre a transposição didática, entre outros aspectos, são
elementos a ser considerados ao propor cursos de LM.
O(a) professor(a), muitas vezes, mesmo assumido uma postura política passiva
mediante os rumos da formação continuada implementada (a nível nacional, municipal ou
estadual) -, possui expectativa, interesse, angustia, opiniões com relação à formação recebida.
Deixá-lo(a) falar sobre suas expectativas poderia contribuir para o traçar de novos rumos para
a formação continuada. Sobre isso a professora P5 relata que

quando organiza essa formação... se havia uma pesquisa... havia um interesse de
saber... qual a necessidade do professor... o que (...) a professora gostaria... que
necessidades ela tinha... então havia antes essa preocupação... de dá essa formação a
partir da necessidade do professor...

O discurso da professora P5 revela que havia, por parte da equipe do DEJA, a
preocupação em conhecer as necessidades teórico-metodológicas do(a)s professore(a)s, sobre
o ensino de LM, e, a partir daí, montar cursos que possibilitassem superar as lacunas
provenientes do processo de formação do(a)s professore(a)s. Nóvoa (1995) defende que os
professores têm de ser protagonistas ativos nas diversas fases dos processos de formação: na
concepção e no acompanhamento, na regulação e na avaliação. Alarcão (2003, p. 115), nesse
sentido, afirma que “qualquer formando é sujeito e não objeto de formação e que só é efetiva
se for significativa para quem se forma”.

68

No contexto atual, formar o(a) professor(a) para ensinar a LM, principalmente na EJA,
cujos aluno(a)s almejam, entre outros aspectos, apropriaram-se da cultura letrada, é um
processo complexo. Muito(a)s professore(a)s acreditam ainda que ensinar a LM significa,
“inculcar um conjunto quase interminável de prescrições sintáticas consideradas corretas,
impor uma série de pronúncias artificiais que não correspondem a nenhuma variedade
lingüística real, cobrar o conhecimento – através de práticas de memorização, repetições
mecânicas” (BAGNO, 2001, p. 10). Essas práticas, de ensino de língua, desprovidas de
função social, muitas vezes, podem reforçar a condição de sujeito aprendiz, analfabeto
funcional. Contrapondo a essa perspectiva, os encontros de formação devem aguçar no(a)
professor(a) a percepção de que estudar e ensinar a língua é

não se contentar com o que vem pronto, é não querer reproduzir sem crítica uma
doutrina transmitida intacta durante séculos a fio. É buscar construir seu próprio
conhecimento, é contrastar a diferença entre o que é e o que alguns poucos acham que
deveria ser. (BAGNO, ibidem, grifo do autor).

Nessa perspectiva, os conteúdos curriculares da LM destinados ao ensino fundamental
de jovens e adultos, deveriam ser tratados em níveis de abrangência e complexidade
necessária a (re)significação de conhecimentos e valores adquiridos, pelo(a)s aluno(a)s, em
suas práticas sociais. Para isso, o(a) professor(a) da EJA precisa assumir uma postura de
pesquisador. Ou seja, conhecer através do diálogo e da problematização os saberes discentes
sobre a LM em uso, para através de práticas significativas de reflexão sobre a língua, aprender
a usá-la em diferentes práticas sociais de leitura e escrita. Nesse sentido, Freire afirma que

fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No meu entender o que há de
pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser de atuar que se
acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a buscar
a pesquisa. O que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se
percebe e se assumi, porque professor, como pesquisador. (1998, p. 32)

O(a)s professore(a)s, durante os cursos, foram convidados a refletirem sobre os
conhecimentos e as dificuldades do(a)s aluno(a)s com relação ao uso da modalidade
lingüística escrita, como aponta o depoimento da professora P5

69

sempre assim... ela trazia... [...] material... apostila... mas também... principalmente o
material do aluno... sempre... estudado junto... a gente avaliava... a gente colocava
como levava os textos dos nossos alunos pra que a visse... [...] produzidos pelos
nossos alunos... assim... de uma forma bem mais prática... não meu aluno está
escrevendo... assim... não o que eu posso diante do proposto dessa formação [...] como
eu posso trabalhar? [...] para a melhoria da escrita dele? da compreensão da escrita
dele? então aí... aqueles outros recursos... [...] e vídeos... também... [...] retroprojetor...
recursos assim... pra mim foi fundamental ... [...] a produção dos alunos... a gente tava
trabalhando com os alunos... vê fazer a pesquisa sobre... observar assim... realmente
assim a fonte... nosso objetivo... este meu aluno está assim... o que eu posso fazer pra
enriquecer a aprendizagem.

No discurso da professora P5, observamos alguns indícios de que o(a)s professore(a)s
participaram do processo de definição dos saberes docentes trabalhados, durante os eventos
de formação. Essa participação aconteceu à medida que o(a)s professore(a)s interagirem com
seus pares, socializando as produções do(a)s aluno(a)s e buscando sugestões de
encaminhamentos teórico-metodológico, capazes de possibilitar o avanço do(a)s aluno(a)s no
domínio da escrita. Tardif (2003, p. 298) afirma que “só os próprios profissionais são capazes
de avaliar, em plena consciência, o trabalho de seus pares”. Para o autor ainda, a competência
e a incompetência de um profissional só pode ser avaliadas por seus pares.
A formação continuada poderia contribuir para o (re)significar o ensino de LM na
escola. Nessa perspectiva, Nóvoa afirma que

toda formação encerra um projeto de ação. E de trans-formação. E não há projeto sem
opção. As minhas passam pela valorização das pessoas e dos grupos que têm lutado
pela inovação no interior das escolas e do sistema educativo. Outras passaram pela
tentativa de impor novos dispositivos de controle e de enquadramento. Os desafios da
formação de professores (e da profissão docente) jogam-se neste confronto. (1995, p.
31).

Dado o exposto, a formação continuada do(a) professore(a) almeja ressignificar a
prática pedagógica. Por isso, a implementação de qualquer política de formação pressupõe o
planejamento de ações, a definição de pressupostos epistemológicos, a valorização dos
saberes docentes e da pessoa do(a) professor(a). A formação continuada do(a) profissional da
educação é um processo lento, complexo72, angustiante para quem se forma, é também uma
possibilidade de perceber outras possibilidades de ensino e aprendizagem.

72

Como reconhece Perrenoud (1993, p. 102-103) ‘complexo’, consolidado e enfraquecido pelos feed-back que o
professor recebe no dia-a-dia

70

2.6 Cursos de LM: uma avaliação a vários olhares

Ouvir as percepções do(a)s professore(a)s, coordenadores e professora formadora
sobre o processo de formação, poderia ser um dos caminhos para ressignificar a própria
formação, esse ressignificar implica mexer com o paradigma73 vigente de concepção de
formação do(a) professor(a) – podendo contribuir para formação de professore(a)s técnicos74
ou práticos – reflexivos.

2.6.1 A voz das professoras

Ao participarem do processo de formação, os sujeitos investigados, expõem suas
impressões, socializam aspectos, muitas vezes, silenciados pelo(a)s implementadore(a)s de
políticas de formação, mas não apagados da memória do(a)s professore(a)s. Como podemos
constatar no discurso da professora P1

pra mim... experiência pessoal... foi fantástico [...] porque foi uma
formação assim... com os melhores professores... com doutores da
universidade... aproxima muito a gente da academia,.. foi [...] uma
formação bem acadêmica... a ligada a academia... então foi uma
conquista... o município ofereceu... que eu não tinha visto ainda de 1ª. a
4ª. de educação infantil... que em jovens e adultos agente teve essa
oportunidade

No depoimento da professora P1, constatamos que os cursos de LM permitiram uma
aproximação entre os saberes docentes empíricos (adquiridos pela experiência) e os saberes
profissionais e curriculares discutidos nas academias. Essa experiência, avaliada, de forma
positiva, já que, entre outros aspectos, foi uma das primeiras oportunidades que o(a)s
professore(a)s tiveram de participar de eventos de formação coordenados por profissionais
73

Usamos o conceito de paradigma tal como é apresentado por Kuhn (1987), um paradigma é aquilo que os
membros de uma comunidade cientifica partilham.
74
Segundo Shön (2000, p. 15), a racionalidade técnica diz que os professores são aqueles que solucionam
problemas instrumentais, selecionam os meios técnicos mais apropriados para o propósito específicos.

71

habilitados na área. A relevância dos cursos para o processo de formação profissional foi
percebida pela professora P3, ao afirmar que

eu acho que todos os cursos são ótimos [...] todos os cursos você ta melhorando sua
maneira de trabalhar... e o seu conteúdo... eu acho muito interessante que ele
permaneça tendo...

Os cursos para a professora P3 são entendidos enquanto uma “boa oportunidade” de
aperfeiçoamento profissional. Muitas vezes, influenciadores de mudanças na prática docente,
acrescendo na formação do(a) professor(a) saberes profissionais, curriculares e experiências.
A falta de familiaridade com os pressupostos epistemológicos da LM fpo percebida
pela professora P1, como um dos aspectos que precisam ser considerados

pra mim... eu queria mais... acho que a questão [...] da língua portuguesa pra gente...
era uma coisa nova... nós não somos da área... a formadora tinha uma paciência
fantástica... ela também... tinha que ir mais devagar [...] porque nós éramos maioria de
outras áreas ... então... eu acho que foi fantástico assim muito... muito... muito...
muito... muito bom... um nível muito alto... a gente teve conhecimentos de teorias que
a gente não tinha acesso... fiquei até empolgada... querendo ir para a área de letras...
mestrado por ai na época...

A professora P1 aponta quatro aspectos que precisam ser considerados no
desenvolvimento das propostas de formação: a) a falta de familiaridade com a área; b) a
interação formador(a) – professores(a)s; c) o caráter inovador dos conhecimentos científicos,
muitas vezes, não acessíveis a muito(a)s professore(a)s, principalmente da EJA; d) a
influencia dos cursos na escolha de um posterior aperfeiçoamento. Para ela, esses aspectos, ao
serem considerados, foram importantes no desenvolvimento do processo de formação.
A relação entre os conteúdos abordados nos cursos de LM, e as necessidade de ensino
de língua na prática, não foram percebidos pela professora P6 como demonstra o
depoimento:

olha eu vejo assim... conhecimento bom... eu não digo bom... porque eles não estão
[...] na sala de aula como nós... na vivencia com jovens e adultos... eles já têm uma
visão de professor universitários [...] mas existia essa [...] troca de idéias professor
estou fazendo assim... [...] olha era muito aberto os encontros [...] onde a gente se
colocava a nossa maneira... e via a argumentação deles

72

O depoimento da professora P6 revela sua percepção sobre o distanciamento entre os
conhecimentos trabalhados, durante os encontros, e os conteúdos ensináveis a(o)s aluno(a)s
da EJA. Mesmo assim, considera relevante a troca de experiência entre formadora e
professora(a)s, possibilitados nos momentos de formação. A professora aponta também a
dinâmica do processo de formação no qual poderia expor suas concepções e estabelecer
relações com a perspectiva teórica da formadora.

2.6.2 A voz da formadora

No caminho desta pesquisa, entendemos que qualquer locus de formação configura-se
em um espaço de aprendizagem. No qual, constantemente, professore(a)s estabelecem, nessa
prática educativa, trocas de conhecimentos. Freire considera que toda prática educativa
demanda a existência de sujeitos, um que,

ensinando, aprende, outro que, aprendendo, ensina, daí o seu cunho gnosiológico; a
existência de objetos, conteúdos a serem ensinados e aprendidos; envolve o uso de
métodos, de técnicas, de materiais; implica, em funções de seu caráter diretivo,
objetivo, sonhos, utopias, idéias. Daí a sua politicidade, qualidade que tem a prática
educativa de ser política, de não poder ser neutra.

Os reflexos dos programas de formação de professore(a)s incidem diretamente na
prática docente. Por um lado, um(a) professor(a) bem formado(a), consciente do seu papel
competente político e pedagogicamente na EJA, consegue lutar pelos seus direitos
profissionais. Por outro, o(a) formador(a) politizado consegue ultrapassar os limites impostos
pela política neoliberal.
Considerar que os limites de uma proposta de formação deveria estar na trajetória do
grupo e não em determinações governamentais, configura-se, no contexto atual, em um
desafio capaz de transformar a educação numa prática libertadora. A formadora, ao refletir
sobre a interação estabelecida nos cursos, afirma que

eu acredito que... eu nunca mas encontrei um grupo tão coeso em relação ao trabalho e
com tanta cientificidade como esse grupo... desse período... porque ao mesmo tempo
que eu tava dando aula... eu tava aprendendo... eu tava revivendo coisas que realmente

73

[...] de língua portuguesa... mas é o uso... ai eu digo... eu nunca mais tinha visto... ai
elas pediam... quer dizer... vai prum canto... e lá as pessoas solicitam alguma coisa pra
vê num outro curso

Na resposta acima, a formadora considera importante a “coesão” entre
o grupo de formação, ou seja, o processo dialógico estabelecido entre
formador(a)-professo(a)r. Para a formadora ainda é relevante o processo
construído, especificamente, porque o grupo a fez (re)ver algumas discussões
sobre o ensino de língua não tão freqüente em sua formação de professore(a)s .
Isso demonstra que, todo processo de formação deve ser dinâmico, vivo,
adequado as reais necessidades do grupo em formação. Essa postura implica o
(re)direcionamento teórico -metodológico, a opção por concepções de base
interacionistas e/ou por outras concepções de ensino – aprendizagem em
contextos de formação. Nesse sentido, a formadora ao socializar sua
experiência afirma que

to d a s a s te má t ica fo ra m te má t ica s li g ad a s ao s ó cio -i n ter acio n i s mo ...
e ho u ve a té u ma ép o ca q ue se p e n so u e m d ar u ma só d e gra má t ica. ..
p o r q ue e n si n ar a lí n g ua p o rt u g ue s a é p as sar o s p ad rõ e s
gr a mát ic as. ..[ ...] u ma c o ncep ção d a es co l a a n ti ga d a e sco l a
tr ad i cio n al.. . é o q ue ma i s a ge n te vê ... a go ra co ns e g uir mu d ar...
fa zer co m q ue e s se p ro fes so r e n si ne ... [...] q ue a ge n te d i sc u ta co m o
p r o f es so r d a EJ A. .. a n e ces s id ad e d e d á a l í n g ua p o rtu g u es a ma s es sa
lí n g ua p o r t u g ue sa ... ma s fl ui nd o [. ..] d o p ró p r io te xto . .. d a s p ró p r ia s
d i fic u ld ad es d o s al u no s. .. e d a li ti rar to d o o co n te úd o gra mat ic al p ara
exp li car o al u no ... r e al me n te é d i fíc il ... m as nó s co n se g uir mo s
fa zer .. . q u er d izer ... nó s d arí a mo s a p ar te t eó r ica e n u nca n e n h u m
as s u nto el e fo i só teó r ic o ... el e fo i t eó rico e p r át ico ...

No fragmento acima, a formadora aponta que no processo de formação
direcionava as discussões sobre o ensino da língua numa perspectiva
sóciointeracionista, na qual a unidade de senti do básica de ensino da língua
deveria ser o texto. Ela avalia que não é fácil encaminhar discussões, sobre o
ensino de língua, quando se tenta

“romper” com modelos tradicionais de

ensino centrados em conhecimentos, quase exclusivo, da gramática normativa.
A formadora, nos momentos de formação, entre outros aspectos, deveria
conduzir as discussões teóricas estabelecendo relação com a prática, saberes
da experiência.

74

Neves, ao refletir sobre o estudo da gramática e o ensino da LM na
escola, defende que
na verdade, nem os leigos nem os estudiosos têm sabido muito bem o que fazer com a
gramática – e vou mais longe, com a disciplina português – que, no fundo, revolta –
ou pelo menos incomoda – todos àqueles que se sentam nos bancos escolares, e
incomoda porque todos – ou quase todos – não entendem bem a que chegarão, com
ela, ao final do ‘aprendizado’ e a reflexão vai para a seguinte questão: Que esperam a
sociedade e a família das aulas de português nas escolas? (2003, p. 113)

Nesse contexto, problemas estão instaurados: o(a) professor(a)s da EJA, em sua
grande maioria, precisam repensar o ensino da LM na escola; precisam apropriar-se, muitas
vezes, das discussões teórico-metodológicas sobre o ensino da LM com base numa
perspectiva lingüística; o processo de formação precisa instigar, no(a)s professore(a)s,
propostas de mudanças de ensino de LM na escola. Esses problemas, atrelados ao descaso
com a formação do(a) professor(a) da EJA configuram-se, no cenário brasileiro, num desafio
para o século XXI.
Essa proposição impulsiona a busca de respostas para outras questões: o que ensinar
quando se ensina LM na educação de jovens e adultos? E, conseqüentemente, como “formar”
o(a) professor(a) da EJA para ensinar, entre outras disciplinas, a LM?75 Desta forma, estamos
diante de dilemas reais que requerem soluções imediatas. Nesse cenário, o(a) formador(a)
assume um papel primordial nos eventos de formação, podendo, contribuir para a aquisição
de saberes docentes inerentes ao ensino de LM na escola. Concordamos com Kleiman ao
defender que os cursos de formação de professore(a)s acarretam conseqüências direta na
prática docente. Por isso,

um professor bem-formado, consciente de seu papel político na alfabetização de
jovens e adultos, consegue manter o aluno na escola, assim incrementando as suas
possibilidades de tornar-se um sujeito letrado, mesmo quando as condições para a
realização da tarefa são precárias. Por outro lado, um professor mal preparado, mesmo
inserido num contexto que lhe forneça todas as necessidades de infra-estrutura para
realizar o trabalho, continuará a dar aula que acabam por excluir os alunos (2001, p.
35)

75

Não nos propusemos a responder esses questionamentos, mas fomentar posteriores curiosidades
epistemológicas

75

Dado o exposto, a necessidade do desenvolvimento de programas de formação
contínua de professore(a)s, pautados em princípios éticos, políticos, específicos ao tratamento
teórico-metodológico condizentes com as necessidades de aprendizagem do(a) aluno(a) da
EJA, requer investimentos em políticas de formação e, também, formadore(a)s habilitados
para conduzirem a complexidade dos processos de formação continuada. Considerando a
complexidade do contexto social do(a) aluno(a) da EJA, suas condições de vida e trabalho,
entre outros aspectos, é necessário a implementação de uma política de EJA, além de uma
(re)estruturação do contexto social.

2.6. 3 As vozes dos coordenadores

Os depoimentos dos coordenadores demonstram que os cursos de LM
contribuíram para o repensar a prática pedagógica mesmo enfrentando alguns
entraves, entre eles, carência na formação inicial do professor, falta de apoio
administrativo e resistência às mudanças.
A forma como os coordenadores percebem as influências dos cursos de
LM, na prática pedagógica, reforça a idéia de que, concomitantemente, à
formação e à prática, precisam ser repensadas.
O coordenador C2 percebe as influênci as dos cursos para o processo de
formação profissional, segundo ele

d ia nt e d o p r o ce s so d e fo r mação . .. [. ..] àq uel e s q ue se id e n ti fica v a m...
co m o tr ab al ho .. . co m a li n g u a ge m.. . el es fo ra m cad a v ez ma i s
le va nd o p o r t ad o re s d e te xto p r a sa la d e au la... e le s fo ra m
o u sa nd o .. .s e m ter me d o d e errar... e n tão a s si m.. . nó s co n se g u i mo s
[ ...] v ê v ár io s p ro fe s so res. .. [...] q ue faz ia m letr as ... o u q u e n ão
fa zi a m l etr a s. .. fi zera m p ed a go gia ... fa zer c u rso d e esp ec ial iza ção e m
lí n g ua p o r t u g ue s a... o u t ro s te nt a nd o o me s tr ad o [...] se p rep ar a nd o ...
a g e nte v ia q ue o s c ur so s[...] fa vo rec ia m p r a el e s s e co lo car e m... p r a
ele s r e f le tir e m... o q ue ele s ta vão trab al ha nd o e m sa la d e a u la... ho j e
eu p er ceb o q ue a g e nt e av a nço u mu i to no tr ab al ho co m l ei t ura e
p r o d uç ão d e te x to ... e n t ão ... a s v eze s.. . [...] el e s se se n ti a m t í mi d o s

76

d e faz er u m trab al h o mai s a va nç ad o e m rel ação a a n ál is e
li n g üí s ti ca... p o rq u e e x i ge d ele s a s si m o co n he c i me nto mai s p ro fu nd o
d e d eter mi n ad a s q ue stõ es.. . q u e a fo r ma ção co mo p ro fe s so r n ão d e u
p r a p ud er e m [ ... ] art ic u lar mai s e s se trab al ho e m sa la d e a ula [... ]
co m o s f u nd a me nto s q ue el es p rec i sa m ter e ta m b é m o me d o ... p o rq ue
ele s tê m mu i to med o d e p rin cip a l me n te e m p úb lico . .. [...] so ci al izar
d eter mi n ad as e xp er iê nc ia s... q u e e le s rea li za m co m o s a l u no s ...
p o r q ue co m o s al u no s v o cê erra ... ma s vo c ê nã o te m t a nto r ece io ...
p r i ncip al me n t e o s no sso s al u no s.. . q u e nó s trab al ha mo s.. . ta n to co m
es sa q ue st ão d e não t e m med o d e errar ... s ej a o no s so al u no q ua l
fo r . .. p r i n cip al me n te d e EJ A... q u e é tão d i scr i mi n ad o p e la fal a p e la
esc r it a [ .. .] no sso s p ro fe s so re s e le s a v a nçar a m m ui to n a l i n g ua ge m e u
p er ceb o

O depoimento da coordenador C2 revela sua percepção sobre as contribuições dos
cursos de LM, entre ele(a)s: a) inclusão de portadores de textos na sala de aula; b) posturas
mais ousadas do(a) professor(a), superando o medo de “errar”; c) a influência na escolha da
área do conhecimento para aperfeiçoamento profissional; d) favorecimento do contexto de
reflexão sobre a prática; e) abertura de espaço, no locus de formação, para socialização de
experiências. As influências identificadas pelo coordenador na postura do(a) professor(a)
cursista, tanto no contexto de formação quanto da tentativa de transpor os pressupostos
teórico-metodológicos à prática, demonstram a necessidade de fazer convergir nos eventos de
formação a relação teoria-prática.
Ao refletir sobre os cursos, o coordenador C5 afirma

[...] quando eu cheguei... os cursos e os encontros já estavam sendo trabalhados com a
professora F... era encontro [...] que a gente levava até material dos alunos... inclusive
até produções dos alunos... e a partir dessas produções... a professora F montava...
planejava os cursos... material que ela levar para discutir conosco... [...] muito ricos do
ponto de vista prático-pedagógico... e no ponto de vista teórico do estudo da língua
portuguesa [...] existia assim uma grande dificuldade nossa da apropriação dessa
reflexão... [...] a gente conseguiu avançar muito a partir desses encontros... desses
estudos... entretanto a gente ainda tinha barreiras fruto de nossa formação inicial

No fragmento, o coordenador C5 reconhece as contribuições dos cursos de LM na
formação do(a) professor(a), no entanto, evidencia que o grupo, incluindo-se nesse contexto,
sentia dificuldade em compreender os pressupostos teórico-metodológicos abordados. Nesse
cenário, os problemas do fracasso do ensino de LM, na escola, relacionam-se a outros
problemas do fracasso do ensino de LM, na escola, relacionam-se a outros problemas sociais;
a desigualdade na distribuição de renda, déficit de escolarização, falta de recursos materiais e

77

humanos na escola, falta de bibliotecas, acesso restrito à informática e a internet, como
também a precária formação inicial e/ou continuada do(a) professor(a).
As influencias, fomentadas pelos cursos de LM, são percebidas pelo coordenador C3

as pequenas coisas que nós conseguimos fazer... elas deixaram marcas nos
professores... eu acho isso muito importante... de professores que se esforçam que
pesquisavam... que provaram por exemplo que não havia um limite pra você dizer que
o aluno só vai aprender isso quando tiver tal idade... ou quando tiver em tal série

No extrato, o coordenador C3 ao avaliar os cursos reconhece suas contribuições ou
seja “ deixaram marcas nos professores”, despertaram nele(a)s o esforço e o interesse pela
pesquisa. Além de demonstrarem para eles que há limites no processo de aprendizagem do(a)s
aluno(a)s jovens ou adulto(a).
Os entraves, durante a oferta de cursos de LM, são percebidos pelo coordenador C6

a gente tem um deficiência extrema em termos do processo de formação inicial... seja
esse professor que teve a formação do magistério... hoje normal... ou mesmo o
professor que fez licenciatura... independente de ter sido pedagogia que das uma
abrangência maior... mas necessariamente os nossos melhores professores não eram
pedagogos... você tinha professores excelentes... medíocres... que também eram
pedagogos...[...] como você também tinha professores da área de letras... de história
que eram excelentes professores... você tinha péssimos professores da área de letras...
História... outras licenciaturas... então [..] sempre foi um drama você definir que é que
faz a diferença... porque que um professor consegue avançar.... consegue ter uma
postura mais critica... de buscar... outros professores não... uma questão que a gente
observou... um entrave forte... é a formação independente de tem sido só no nível
médio ou no nível superior... uma questão que a Universidade também tem que
atender... não dá pra gente ficar brigando eternamente...

Ao ser convidado para refletir sobre os cursos de LM, o coordenador C6 aponta,
entre os entraves, no processo de formação; as lacunas provenientes do processo de formação
inicial do(a) professor(a) independente da graduação. Segundo o coordenador as dificuldades,
do(a)s professore(a)s, estão postas,elas vão além do processo de formação continuada e
convoca a universidade a refletir sobre elas.
Na EJA, muitas e urgentes são as razões sociais que justificam o empenho por uma
formação de professore(a)s que o(a) subsidiem no sentido de redirecionarem o ensino da LM
na escola. Antunes (2003, p. 37) postula que “ sabemos que a educação é um processo social,

78

com nítida e incontestável função política, com desdobramentos sério e decisivos para o
desenvolvimento global das pessoas e da sociedade”.
A dicotomia entre os pressupostos teórico-metodológicos discutidos durante os cursos
e a prática de ensino de LM é avaliada pelo coordenador C2, ao afirmar que

[...] não chega na sala de aula e com toda essa discussão que [...] não chega na sala
de aula... nós não conseguimos dá conta de fazer esse acompanhamento específico
por várias questões estruturais muito sérias na Secretaria ... transporte ... de
condições materiais .... de fazer o trabalho [...] porque o trabalho da Secretaria
envolve muito o grupo que era uma equipe pequena ... que a gente ali fazia tudo e
[...] planejava a executiva.

No extrato, o coordenador C2 afirma perceber os limites entre os pressupostos
teórico-metodológicos discutidos nos encontros de formação e a prática pedagógica. Justifica
que as limitações, nesse caso, estão relacionadas, entre outros aspectos, a dificuldade do
grupo gestor do DEJA em fazer o acompanhamento da prática pedagógica. Nesse sentido,
estudos mostram que é importante que se crie em Alagoas (COSTA, 2000; MOURA, 2004;
QUEIROZ, 2000; SANTOS et al, 2003), principalmente em Maceió, um espaço de reflexão e
análise sobre os eventos de formação docente promovidos. Segundo Santos et al

Além das preocupações sobre letramento, existe também um repensar na formação
continuada dos professores de EJA, em alguns municípios, quanto ao ensino dede
língua portuguesa, tendo em vista uma concepção de linguagem como forma de
interação, por possibilitar não somente uma transmissão de informações de um
emissor a um receptor, mas por ver a linguagem como um lugar de interação
humana (2004, p. 31-32, grifo do autor).

Esse repensar a formação pressupõe aceitação de múltiplos olhares, dos sujeitos
inseridos no processo e também de olhares externos, possibilitando a problematizarão da
realidade posta em sala de aula.
Dado o exposto, concordamos com Alarcão (2003, p. 116), quando afirma que “o
processo de formação implica, frequentemente, inovação, mudança e abandono de hábitos
adquiridos, por vezes, bem antigos e fortemente enraizados”. Esse abandono de hábitos, e a

79

apropriação de novos saberes docentes implicam (re)significação de saberes profissionais
proporcionados em contextos de formação.

2.7 Mudanças na prática: as reflexões das professoras

Ao participarem de eventos formativos (cursos, seminários, palestras, entre outros),
o(a)s professore(a)s, muitas vezes, podem ampliar seus saberes docentes. Dessa forma,
conhecemos as contribuições do processo de formação poderá possibilitar um (re)pensar dos
caminhos percorridos na prática pedagógica. Para identificarmos essas contribuições se faz
necessário escutarmos as vozes dos sujeito envolvidos, no processo de formação, entre
ele(a)s, do(a)s professore(a)s. Alarcão (2003, p. 55) defende que “é evidente que a pessoa que
mais sabe de uma dada trajetória profissional é a pessoa que a viveu”. Pois, ela passou por um
processo de (re)definição de saberes teórico-práticos.
Os cursos, que tematizam o ensino de LM, segundo as professoras, implicam
mudanças em suas práticas, como podemos observar no depoimento da professora P4

os cursos realmente [...] contribuem muito ... [...] antigamente eu não conseguia dá
um assunto que estava no livro... um exemplo [...] a gente sempre tem algum livro...
que a gente tá observando vários livros [...] embora nenhum livro é adotado em
jovens e adultos .... mas eu tenho um acervo de livros em casa... mas eu não sabia
[...] pegar um assunto que tava no meio do livro e dá antes daqueles que estavam no
início... não conseguia [...] eu achava que eles não ia obter um bom aprendizado...
mas hoje em dia tá fácil... isso eu aprendi nos cursos.... a Formadora mostrava muito
os textos... como trabalhar o texto e a gramática... muitas vezes hoje... se eu pegasse
assim uma atividade minha de muito tempo... eu ia observar que a parte gramatical
que eu fazia... eu muitas vezes não tinha nada como o texto... mas isso foi no
começo viu minha filha (risos)

A professora P4 socializou que superou, a partir dos estudos possibilitados nos
cursos, a concepção de ensino de língua que defendia, tradicionalmente, o estabelecimento de
uma sequência definida de conteúdos a serem ensinados na escola, que não podia sofrer
alterações. Metodologicamente, o(a) professor(a) deveria ensinar os conteúdos que eram
considerados mais “fáceis” e progressivamente abordaria os mais “difíceis”. Segundo ela, esse
salto qualitativo, em sua prática, foi impulsionado durante os cursos a partir do trabalho de

80

análise dos textos escritos por aluno(a)da EJA. Afirmou ainda que consegue estabelecer
relação entre texto e gramática, ou seja, consegue trabalhar a gramática tendo como eixo o
texto. Reforça enfática que a relação dicotômica entre o trabalho com o texto e o ensino da
gramática se estabeleceu em sua prática, apenas no início de sua trajetória profissional.
A professora P1, ao refletir sobre as contribuições dos cursos, afirma perceber
mudanças em sua prática

de valorização mais do aluno... dos trabalhos do aluno de [...] ter mais uma
percepção maios dos textos deles... de valorizar mais aqueles textos de [...] não ficar
na gramática pela gramática... isso ficou muito claro pra gente também... acho que
isso foi muito importante pra gente.

No fragmento, a professora P1 afirma que, a partir dos cursos, passou a valorizar as
produções escritas do(a)s aluno(a)s, pois o processo de formação ampliou sua percepção
sobre texto. Ela teria compreendido a concepção de texto subjacente aos estudos da linguística
textual, trabalhados nos cursos de formação em algum gênero textual. Os textos realizam
“discursos” (SANTOS, 2002, p. 3). Socializou também que deixou de explorar a gramática
pela gramática sem uma função social.
É notável o silêncio do(a)s professor(a)s e dos manuais didáticos com relação ao
estudo da variedade linguística na escola. A variedade linguística é o reflexo da variedade
social e, como em todas as sociedades existe alguma diferença de status ou de papel entre
indivíduos ou grupos, estas diferenças se refletem na língua (POSSENTI, 2003). Com relação
as discussões sobre a variedade linguística, nos cursos de LM, a professora P5 aponta as
influências dessas discussões ao afirmar que

muita coisa [...] com relação a eles... que a gente pode levar em consideração o que
eles falam... que num é [...] na forma padrão mas é uma outra forma de falar [...] que
a gente não pode considerar errada... e isso é nessa formação que a gente conseguiu
ter toda essa percepção... e a Formadora foi fundamental nesse processo.

No depoimento, supracitado, a professora socializa que, durante os cursos de LM,
foram discutidos os pressupostos epistemológicos da variação linguística (de origem histórica,

81

geográfica, social e estilística). Essas discussões levou-a, a compreender que o(a) aluno(a)
ainda não dominava a linguagem padrão, mas uma outra forma de falar, segundo ela não era
“errada”.
A professora ao chegar a esse entendimento caminha na direção da Traváglia, ao
anunciar que

todos sabem que existem um grande número de variedades linguísticas, mas, ao
mesmo tempo que se reconhece a variação linguística como um fato, observa-se que
a nossa sociedade tem uma longa tradição em considerar a variação numa escala
valorativa, às vezes até moral, que leva a tachar os usos característicos de cada
variedade como certos ou errados, aceitáveis ou inaceitáveis, pitorescos, cômicos,
etc. (1997, p. 41).

A mudança na forma de conceber a variedade linguística, entre outros aspectos,
também foi apontado no depoimento da professora P4

eu recordo muito que ela falava que o aluno nunca escrevia [...] nunca falava
errado... falava diferente... ela sempre abordava assim pra gente nunca dizer... ele tá
falando errado... você procura olhar de onde ela mora... a cultura daquele aluno... aí
a gente passava para a linguagem culta... mas sempre valorizando a forma dele
falar... é dessa forma assim... que eu procuro trabalhar... eu procuro trazer textos em
cima disso... não somente para passar para a linguagem culta... que a gente trabalha
também tem que trabalhar o que tem no texto... informações contidas no texto... mas
eu também peço para ele passar para a linguagem culta... e até assim eles falam na
sala de aula... eu não sei se você observou ontem aquilo... a aluna falou “refigerante”
é a forma de falar “refigerante” como outras e outra coisa “eu seio” aparece muito
na sala de aula “a gente vamos” aí eu sempre observava como eles falavam como
ainda faço aí vou anotando... aí elaboro alguma atividade pra trabalhar... em cima
daquilo que eles estão falando diferente... eu falo têm pessoas que falam assim mais
de acordo com gramática como nós deveríamos fazer... aí digo a eles minha gente
isso não é errado pra eles também não ficarem pra baixo.

A professora P4 compreendeu que o(a) aluno(a) não falava “errado”, falava, na
verdade, diferente do “padrão”. Ora, se a língua é uma atividade social, histórica, diacrônica,
entre outros aspectos, a variação linguística é um fenômeno característico de todas de todas as
línguas. Poder-se-ia afirmar que ela estaria num processo de ressignicação dos seus saberes
linguísticos discutidos durante os cursos. Entre os textos trabalhados, durante os curós de
formação, a língua é definida como “atividade social, histórica e cognitiva. Privilegia os
aspectos formal e estrutural da lingual” (SANTOS, 2002).

82

Embora tente compreender a dinâmica da língua, a professora P4 revela sua indecisão
sobre como agir diante de aluno(a)s que falam a variedade linguística informal, demonstra o
peso, na escola, da tradição de ensino da linguagem da linguagem escrita, que defendia a
higienização dos textos escritos e o apagamento do estudo da modalidade oral. No entanto,
durante as aulas observadas, ela não faz ao uso da modalidade linguística oral, que pode variar
enquanto dialetos (na dimensão territorial, geográfica, regional, social, de idade, do sexo, da
geração e da função) e quanto as formas de registro (grau de formalismo, modos e sintonia),
embora essas características da modalidade linguística oral tenham sido abordadas durante os
encontros de formação.
Ao longo da análise dos dados, os sujeitos envolvidos no processo de formação de LM
defendem que os cursos tinham por pressupostos atender às necessidades de aprendizagem
docente, como se pode perceber no depoimento da professora P6

é [...] possibilitaram... buscavam assim... é buscava saciar digamos assim... a sede do
professor [...] era as formações [...] das nossas necessidades que a gente sempre
colocava... como trabalhar [...] em língua portuguesa de que forma então assim... é
uma das coisas que eu recordo assim foi muito importante [...] trabalhar gêneros
textuais... foi bastante importante essa clareza de que gênero eu trabalhado que tipo
de gênero... então pra mim... foi muito importante essa formação... [...] ampliou... se
a proposta era essa.. pra mim era realizada é ampliar nosso conhecimento... também
visando uma melhor aprendizagem buscando todos os recursos que eu poderia trazer
de objetivo

No extrato, a professora P6 afirma que os cursos possibilitam sua compreensão sobre
as características dos gêneros textuais. Ela aprendeu, durante as discussões, as diferenciar os
gêneros trabalhando em sala de aula. Esse depoimento, demonstra-nos que o(a)s
professor(a)s, muitas vezes, podem estar ensinando alguns aspectos da língua, a exemplo os
gêneros textuais, sem ter clareza dos pressupostos epistemológicos que os constituem. Nessa
perspectiva, a formação continuada seria uma estratégia significativa no processo de
aperfeiçoamento profissional.
Outra estratégia metodológica destacada, pela professora P4, propulsora de mudanças
consistia em:

83

ela levava muito as produções dos alunos... do mesmo jeitinho... eu acredito que
alguma escola favorecia pra ela [...] colocava no retroprojetor... em cima daquilo a
gente ia trabalhando... aí também entrava àquela parte dos alunos que são silábicos...
silábicos-alfabéticos... [...] a gente ia identificando essa parte da reescrita como a
gente trabalhava àquela parte da reescrita com os alunos eu procuro fazer mais
coletiva... às vezes... eu escolho uma que tenha assim muitas coisas para gente
trabalhar... aí coloco aquela no qudro para todo mundo... sem identificar o nome do
aluno... aí gente vail melhorando àquele texto... depois todos copiam... e eu sempre
procuro assim elogiá-lo... pra que precisam melhorar mais com relação a autoestima.

No extrato acima, a professora aponta que a análise de produções de textos escritos,
pelos(a)s aluno(a)s implicaram mudanças em sua prática. A descrição da proposta de
(re)escrita de texto demonstra-nos a forma como a professora compreendeu o processo de
reescrita de texto. Ela ao afirmar, “às vezes eu escolho uma que tenha assim mujtas coisas pra
gente trabalhar”, demonstra-nos sua preocupação em tentar resolver todos os problemas do
texto do(a) aluno(a). Considerando que o(a)s podem estar em processo de aquisição da escrita
alfabética, não dominam os conhecimentos linguísticos suficientes para (re)pensar os desvios
presentes nas produções. Nesse sentido, a metodologia e os aspectos enfocados nas propostas
de análise linguística precisam ser representados, não podemos esperar que o(a) aluno(a)s
interagem na reflexão de aspectos linguísticos quando ele(a)s ainda não os dominam. Desta
forma, como defende Geraldi (2003, p. 74) “para cada aula de análise linguística, o professor
deverá selecionar apenas um problema. De nada adianta queremos enfrentar de uma vez todos
os problemas que podem ocorrer num texto produzido por nosso aluno”.
A professora P6 reflete as contribuições do estudo da coerência e a coesão textual:

em português nós vimos coerência e coesão... produção textual onde isso aí é a base
de [...] aprendizado [...] pra gente trabalhar com o aluno praticamente eu
respondendo por mim 3ª fase [...] que o aluno já tá sabendo ler e escrever texto [...]
ele precisa ter arrumação nos textos [...] com a escrita dele... assim sem coerência
[...] então valeu [...] só deu pra esclarecer as nossas dúvidas e aprofundar mais
naquilo que a gente queria.

Os estudos direcionados a discussão sobre a coerência e coesão do texto, segundo a
professora, clareavam suas dúvidas sobre esses aspectos. Destaca ainda a relevância do ensino
desses conteúdos em sua turma de 3ª fase, nessa fase seus alunos já produziam textos e
precisam segundo ela “arrumá-los”.

84

A vivência de situações práticas, durante os cursos, também foram apontadas no
depoimento da professora P4

ela assim levava textos... fragmentos... aí a gente debatia... aqueles fragmentos... o
que queria dizer... toda aquela parte da compreensão... aí depois... elas falavam
assim um exemplo... essa palavra aqui se a gente colocasse no masculino... como
ficaria... como aente iria ler esse período... [...] no plural... no singular... e assim pelo
menos eu fui entendendo dessa forma... se eu to indo certo... eu to achando que to
viu? Você vá clareando.

No extrato acima, a professora refere-se as contribuições das situações práticas de
reflexão sobre a língua. Essa estratégia consistiu, para ela, em uma possibilidade de trabalhar,
a partir ou através de texto, os conteúdos de LM como: a flexão do substantivo em número e
gênero, a concordância verbal e nominal, entre outros aspectos. Perrenoud (1993, p. 25)
define transposição didática como a essência do ensinar: “a ação de fabricar artesanalmente os
saberes, tornando-os ensináveis e passíveis de avaliação no quadro de uma turma, de um ano,
de um horário, de um sistema de comunicação e trabalho”. Para o autor essa é uma tradução
pragmática dos saberes para a atividade e situação didática que surge como resposta ou reação
às situações reais, dinâmicas e complexas de sala de aula.
A professora P4 revela que sugerir as temáticas a ser discutida consistiu em uma
estratégia propulsora de mudanças na prática:

o pessoal pedia muito produção de texto... porque de certa forma... é um assunto que
os alunos sentem muito dificuldade... [...] se a gente trabalha mais essa parte... e
aprende dá gramática do texto [...] mas eu acho que deveria ser mais trabalhando
também... assim o período do curso é curto... não dá pra gente pegar muita coisa...
não que eles deem receita porque ele não dão... mas eles clareiam... e eu gostava
muito dela porque mostrava exemplos mesmo de sala de aula [...] como se fosse
assim uma professora mesmo na sala... como se fosse não... ela era mas como sei lá
ela se comportava como a gente na sala de aula mesmo... ela entendia quando a
gente perguntava... a linguagem dela bem clara eu achava agora tinha uma parte que
eu não gostava... era a parte da linguística mesmo... quando ela ia com àquela parte
teórica tá na nã na... aquela parte ali a gente presta atenção tudo... mas assim eu
acho que é porque a gente não utiliza tanto na sala de aula... que a teoria a gente que
ter tem... mas a prática mesmo quando ela explicava eu gostava... [...] eu achava
mais difícil... de compreender... às vezes porque têm muitas palavras assim que são
meio difícil [...] pelo fato da gente não utilizar tanto que a gente tem [...] a teoria tem
que saber mas eu acho a prática bem melhor para a gente se encaminhar na sala que
é o que a gente usa.

85

A preocupação com o ensino da linguagem escrita era evidenciada pelo(a)s
professor(a)s, principalmente os assuntos que o(a)s aluno(a)s demonstravam dificuldades,
assim como a necessidade de aprender e encaminhar “novas” situações de estudo da
linguagem, libertando-se de antigos modelos. Ela afirma que o período dos cursos foi
insuficiente para aprofundar as temáticas discutidas, já que o estudo da língua abrange
aspectos de diferentes naturezas. No depoimento, a ênfase é posta no estabelecimento de
relações entre os conteúdos trabalhados e a aplicação na prática. Essa reflexão (re)afirma a
concepção de que a docência se constrói numa articulações de saberes 76 disciplinares
(conhecimentos de um corpo organizado de conteúdos), saberes de experiência
(conhecimentos da prática) e com os saberes curriculares (conhecimentos dos discursos,
objetivos, conteúdos e métodos). Pois, a ação de ensinar pressupõe saber o que e como
ensinar.
A professora, mesmo identificando as inúmeras contribuições proporcionais pelos
curso de LM, socializou que não gostava dos momentos direcionados às discussões teóricas,
justificando sua rejeição pelo fato de desconhecer a nomenclatura linguística utilizada. Para
ela eram “palavras difíceis”, além de não serem utilizadas em sala de aula. Isso demonstra a
necessidade constante do estabelecimento da relação teórico-prática.
Embora a professora P4 reconheça que entre as temáticas discutidas algumas
poderiam ser ensinadas na sala de aula, afirma que:

não tanto... ele servia muito para o profissional... mas pra você passar muitas coisas
para a série que você estava trabalhando não [...] era específico não... a turma de
primeira... fase... de segunda fase... não... ele era conteúdo geral... você era
beneficiado que você tirava alguma.... que você podia aplicar na sala... naquela
série... que você tava trabalhando... mas não especificamente mesmo para jovens e
adultos.

No fragmento inferimos que o(a)s professor(a)s nem sempre conseguem (re)significar
os conhecimentos trabalhados na formação, possivelmente, transpostos à sala de aula.
Segundo a professora as temáticas não mantinham relação com o nível de discussão das
turmas, embora fossem “adequadas” ao aprofundamento do profissional. Se almejamos

76

Sugerimos a leitura de Tardif (2003) para aprofundamento dos saberes docentes.

86

contribuir para melhoria da qualificação profissional, é necessário escutarmos o(a)
professor(a), tentando perceber de que forma acontece a apropriação das temáticas discutidas,
e como ela estabelece relação com a prática pedagógica.
No próximo capítulo, evidenciaremos os dados coletados a partir da observação em
sala de aula. Nesse sentido, os aspectos analisados mantém relação com os pressupostos
teóricos abordados durante os cursos.

87

CAPÍTULO 3

PRÁTICA PEDAGÓGICA E CURSO DE FORMAÇÃO EM LÍNGUA MATERNA: UMA
POSSIBILIDADE DE (DES)ENCONTRO

O presente capítulo tem por finalidade descrever e analisar os dados coletados na
pesquisa de campo através da observação da prática pedagógica, especificamente, durante as
aulas de LM. A análise dos dados trouxe-nos informações relativas sobre o que pensam, falam
e fazem as professoras em suas práticas ao tentarem ensinar LM.
É na sala de aula, lugar onde aluno(a)s e professor(a)s estabelecem relações mútuas de
ensino-aprendizagem que o trabalho docente acontece. Nessa prática, o(a) professor(a) deixa
transparecer marcas da sua subjetividade: concepção do processo de ensino-aprendizagem,
saberes docentes, paradigmas, entre outros aspectos. Na prática, o(a) professor(a) tem a
possibilidade de experimentar, criar e recriar seus saberes docentes.
Para análise dos resultados das observações e entrevistas, delimitamos as categorias:
concepções de linguagem; análise linguística; e gêneros textuais. Como não tínhamos
definido previamente quais categorias seriam nosso foco de análise, fizemos o caminho
inverso. Observamos a prática intencionando perceber quais conteúdos, no universo dinâmico
da prática pedagógica, estabeleciam relação com os conteúdos trabalhados no transcorrer dos
curós de formação. Desta forma, essas categorias foram selecionadas no universo
significativo de conteúdos abordados na perspectiva da linguística textual com enfoque
sociointeracionista. Para tanto, tomamos como base os estudos de Bakhtin (2004), Travaglia
(1997), Koch (2002), Geraldi (2003), Bagno (2000), Marcuchi (2000); e Santos et al (2004),
entre outros autores.
Antes de iniciarmos a análise das observações, consideramos relevante caracterizar o
contexto de investigação: as escolas; os sujeitos observados; as professoras, o(a)s aluno(a)s; e
refletir os conteúdos abordados nas aulas de LM.

88

3.1 As escolas77

A seleção das escolas, campo de investigação, seguiu o critério78 definido para
amostragem da prática pedagógica. Elas foram identificadas, posteriormente, por: escola A e
escola B. Na primeira, observamos o cotidiano da professora A, na segunda, observamos, a
prática de ensino de LM da professora B, em ambas observamos as aulas de LM durante 40
h/a.

3.1.1 A Escola A

No intuito de conhecer a escola A, caracterizamo-la em torno de seus aspectos físicos,
sociais e econômicos.
A escola localiza-se no bairro do Tabuleiro do Martins, periferia da cidade, situandose bem próximo ao terminal de ônibus do bairro Eustáquio Gomes. A comunidade e/ou
visitantes para ter acesso a ela, dispõem de uma única empresa de ônibus circulando pelo
bairro. Para ilustrar essa apresentação, transcrevo uma das nossas impressões contruídas ao
nos dirigirmos à escola.
Para chegarmos a escola A, viajávamos em ônibus lotados, seus passageiros
demonstravam-se cansados, alguns dormiam, outros distraiam-se obsevando a paisagem,
provavelmente, retornavam de suas jornadas de trabalho diária. Como a escola situa-se
próxima a Universidade Federal de Alagoas – UFAL, em meio aos passageiros, muitos são
estudantes universitários. Todos os ônibus, que trafegam em sentido ao Eustáquio Gomes,
circulam obrigatoriamente, por dentro do campos da universidade. Desta forma, escutávamos
várias vezes, passageiros questionando: “ainda vai entrar na UFAL?” – demonstrando
insatisfação com esse trajeto. Após sairmos do campos da UFAL, em direção à escola,
passávamos ainda defronte da penitenciária, depois por uma
77

favela, posteriormente

A rede municipal de ensino, de Maceió, na época da investigação, era composta por 93 escolas, das quais 46
atendiam a(o)s aluno(a)s da EJA, além de atender aluno(a)s do ensino fundamental regular (5ª a 8ª séries), no
horário noturno. As escolas, em sua maioria, localizam-se em bairros periféricos da cidade. Nesse cenário, a
SEMED, oferecia, educação para 7.500 jovens e adultos na.
78
O critério definido foi observar a prática das professoras A e B, como já expomos na metodologia, para isso
precisávamos compreender o contexto escolar em que estavam inseridas.

89

seguíamos por algumas ruas e avenidas – esquisitas, pouco iluminadas. Finalmente, após
viajarmos quase 1 (uma) hora, do centro de Maceió, chegávamos ao terminal de ônibus do
Eustáquio Gomes. A escola79 localiza-se a alguns metros dele, as ruas de acesso à escola eram
pouco iluminadas. Raramente encontrávamos pessoas nas calçadas e/ou circulando pelas ruas.
A fundação da escola em referência data de 27 de março de 1983, e já passou por
algumas reformas. É uma instituição de porte médio, suas salas são amplas – bem iluminadas,
dispõem de alguns ventiladores – as portas das salas possibilitam o acesso direto ao pátio,
espaço constantemente frequentado por aluno(a)s e/ou funcionário(a)s, que entre outras
atividades, conversam, passeiam ou descansam antes do início da aula.
O trabalho com jovens e adultos, na escola A, iniciou-se em 1985. As primeiras
iniciativas de EJA, na escola, ocorreu em consequência do processo de “abertura
democrática”. Esse processo, provavelmente, influenciou o plano de organização da escola, na
época, no que diz respeito a opção teórico-metodológica, a concepção de ensinoaprendizagem. Nesse contexto, gradativamente, a escola se abre a tudo e a todos,
impulsionando a grande inserção das camadas populares nesse ambiente pedagógico.
Na época da investigação, em 2004, ela atendia as três fase da EJA (1ª, 2ª e 3ª). As
turmas funcionavam, exclusivamente, no horário noturno das 19:00 às 22:00 h.
No bairro do Tabuleiro do Martins, como em outros bairros de Maceió, há poucas
escolas, muito(a)s aluno(a)s deslocam-se, a pé, de outras localidades para frequentá-la. No
referido bairro, não existe emprego suficiente para seus habitantes. O comércio é restrito, nele
encontrávamos, apenas, algumas padarias, vendas, bares e mercadinhos.
Nesse cenário, a responsabilidade social da escola ganha destaque como possível
centro de articulação dos habitantes da região em torno dos seus interesses, como foco de
atividades educacionais, de lazer e cultura, além de ser um espaço de formação para o
mercado de trabalho.

79

A escola situa-se próximo a uma praça, próximo a uma pequena pizzaria e alguns bares. A partir das 20h,
diariamente, aluno(a)s e comunidade movimentam a praça.

90

3.1.2 A escola B
A escola B localiza-se, geograficamente, no bairro do Feitosa – zona periférica da
cidade, porém nas proximidades do centro. Ao contrário da escola A, a comunidade tem a
sua disposição várias linhas de ônibus trafegando em suas proximidades, provenientes de
várias localidades de Maceió.
No Feitosa, assim como no Tabuleiro do Martins, não há emprego suficiente para seus
habitantes, o comércio do bairro é limitado, nele encontrávamos, várias padarias, bares,
farmácias, lojas, açougues, quitandas, entre outras formas de comércio informal.
Os ônibus, no qual tivemos a oportunidade de circular em direção a escola, raramente
trafegam lotados, diferentes dos que circulavam em direção a escola A. O(a)s passageiro(a)s,
demonstravam ser estudantes e/ou trabalhadores, provavelmente, alguns retornavam as suas
residências após uma jornada de trabalho.
É uma escola jovem, sua fundação data de 18 de maio de 2000. Em 2004, passou por
uma reforma para ampliação do seu espaço físico. É uma instituição de porte médio, suas
salas têm dimensões adequadas a quantidade de aluno(a)s que a frequentam, algumas salas
são bem iluminadas. A secretaria da escola separa-se das salas de aula por um pátio, espaço
onde frequentemente o(a)s aluno(a)s reúnem-se,, antes do horário de aula, para conversar,
esperar o sinal para dirigirem-se as salas, e/ou para acomodarem-se antes de receberem a
merenda escolar – servida todos os dias antes do início das aulas.
O atendimento a(o)s aluno(a)s80 da EJA, na escola81, iniciou-se no ano de 2012. No
período da investigação, a escola, oferecia as três fases da EJA (1ª, 2ª, 3ª), distribuídas em 7
(sete) turmas82.

3.1.3 As professoras

Ao procurarmos analisar, entre outros aspectos, os reflexos do processo de formação
continuada na postura pedagógica das professoras, em sala de aula, conseguimos identificar
80

O(a) aluno(a) residem em suas proximidades, ao contrário dos alunos da escola A.
A escola atendia, na época da investigação, a aproximadamente 685 aluno(a)s.
82
A escola atendia, na época da pesquisa, a 3 (três) turmas de 1ª fase, 2 (duas) turmas de 2ª fase e 2 (duas)
turmas de 3ª fase.
81

91

alguns aspectos que podem influenciar no desenvolvimento desse processo. Nessa
perspectiva, optamos por refletirmos algumas características das professoras A e B: formação
em nível Superior; tempo de atuação no magistério; tempo de atuação na EJA; e idade83.
A busca pela qualificação profissional, no contexto atual, entre outros aspectos,
constitui-se enquanto possibilidade de mudanças nos rumos da educação e da realização
profissional. As professoras A e B têm formação em nível Superior, ambas cursaram também
o Magistério, hoje Ensino Médio na Modalidade Normal. A primeira é formada em
Pedagogia. A segunda, em Serviço Social, atualmente está cursando Direito em uma
instituição particular.
A professora B, como percebemos, está investindo em outra profissão. Para ela, a
formação em Direito seria uma alternativa para deixar a educação. Entre as causas de sua
opção por outra graduação, ela destaca a desvalorização salarial. Enquanto que a professora
A socializou que ainda não tinha feito um curso de especialização devido a dificuldades
financeiras. Para ela, os cursos de especialização, oferecidos em Maceió, são relativamente
caros. Nesse contexto, as professoras não recebiam nenhum auxílio do governo municipal
para se aperfeiçoarem.
Vale salientar que no Plano de Carreira e Remuneração do Sistema Público Municipal,
só tem direito a progressão salarial, o(a) professor(a) que tiver formação inicial em nível de
licenciatura plena. Nesse sentido, a professora B, por ser bacharel em Serviço Social, para
conseguir enquadramento no referido plano, precisa cursar uma licenciatura plena. Esse fato,
possivelmente, pode influenciar a sua fuga para outra profissão. Pois, mesmo cursando
especialização, mestrado e doutorado em Educação não poderia ser enquadrada em nenhuma
das faixas salariais do referido plano.
Segundo Alarcão (2003, p. 115) “assisti-se hoje a uma diversidade de formação no que
diz respeito a instituições formadoras, conteúdos de formação, modalidades de formação”.
O(a) professor(a), de modo geral, tem a sua escolha várias opções de situações formativas. A
diversidade de formação inicial pode ser uma vantagem, não deixará de ser uma fraqueza se
não estiver a serviço da qualificação profissional, impulsionando o desenvolvimento
individual e coletivo do(a)s professor(a)s, contribuindo para a construção de uma identidade

83

No anexo 7, apresentado o perfil das professoras entrevistadas.

92

profissional. Segundo Esteves84 a seleção que cada um faz, quando dispõe de condições
econômicas para isso, mantém relação direta com

cada professor enquanto indivíduo, com uma história de vida profissional própria,
com necessidades e interesses de formação diferenciado em relação aos seus pares,
portador de experiência muito pessoais sobre os efeitos da formação contínua para a
sua satisfação profissional, seja qual for o campo onde predominantemente situe esta
satisfação (1991, apud ALARCÃO, 2003, p.115).

Considerando que nem sempre ter concluído um curso superior é condição básica para
ministrar aulas em EJA, como em qualquer outra modalidade, se essa formação inicial não
possibilitar o aprofundamento, pelo(a)s professor(a)s, das especificidades do(a) aluno(a)
jovem e adulto: como ele(a) aprende, quais suas maiores dificuldades e expectativas; qual a
base curricular adequada ao processo de ensino dessa modalidade entre outras características.
Nesse sentido, o processo de formação de professor(a)s da EJA, em serviço, ao
intencionar a ressignificação da prática pedagógica deveria ser contínuo, permanente e
sistemático. Possibilitando a(o) professor(a) oportunidade de reflexão crítica sobre prática
escolar. Caso contrário, a ausência de perspectiva na formação docente para o desempenho
profissional, atrelada às péssimas condições de trabalho, podem acarretar, em muitos
contextos já acarretam, a rotatividade do(a) profissional da EJA, dificultando o processo de
formação continuada.
Em Maceió, o(a) professor(a0 da EJA, depara-se com um campo restrito de opções
formativas para o seu aperfeiçoamento. Há menos de uma década foi introduzido a disciplina
eletiva Educação de Jovens e Adultos no curso de Pedagogia da UFAL. E, até o momento 85,
em Alagoas, foi oferecido um curso de especialização em EJA em 200286. A escassez de
instituições formativas para o(a) professor(a) que pretende atuar na EJA contribui para que a
opção pelo ensino nessa modalidade seja, quase sempre, uma alternativa para solucionar
dificuldades das professoras de natureza diversas (horários disponíveis, faixa etária dos
alunos, localização da escola).
84

ESTEVES, M (org). “Perspectiva da formação contínua de professores de Portugal”. In: Ciências da Educação
em Portugal. Situação actual e perspectiva. Actas do 1º Congresso da EPCE. Porto, SPCE, 1991.
85
Primeiro semestre de 2004.
86
Em 2005 foi oferecido o segundo curso de especialização em EJA.

93

Em 2002, com a implantação do Mestrado em Educação Brasileira do Centro de
Educação da Universidade Federal de Alagoas – CEDU, passou-se a ofertar duas vagas, por
ano para candidatos87 que apresentam projetos de pesquisa em EJA. Se levarmos em
consideração o universo docente que atua na EJA, e a restrita possibilidade de acesso e essas
práticas formativas, percebemos as limitadas possibilidades de estudos, atualizações,
aperfeiçoamento e qualificação na área.
Sobre o tempo de atuação no magistério, a professora A leciona há 13 (treze) anos,
enquanto a professora B, há 8 (oito) anos. Desta forma, elas já têm uma significativa
trajetória de atuação na educação. A professora A atua há 9 (nove) anos na EJA, enquanto
que a professora B há 8 (oito) anos. O tempo de serviço contribui para a constituição da
experiência profissional, elemento determinante na definição de procedimentos metodológico
e opções teóricas. Além de configurar-se num fator importante na definição de estratégias de
formação. Nessa perspectiva, qualquer processo de formação continuada, comprometida com
a aprendizagem do(a)s aluno(a)s-professor(a)s precisa considerar as características dos
cursistas (idade, sexo, situação funcional, nível de formação, tempo de magistério, entre
outros aspectos).
As professoras demonstram uma certa estabilidade na EJA, pois já atuam, nessa
modalidade há mais de 5 anos. Ao estabelecermos relação entre o tempo de exercício no
Magistério e o exercício da profissão, percebemos uma aproximação relativa entre ambos. A
professora A tem apenas 1 (um) ano a mais de experiência na EJA do que a professora B.
Esta ao assumir o magistério público, após ser aprovada no concurso da Prefeitura Municipal
de Maceió, em 1994, engajou-se imediatamente no quadro de EJA. As professoras também
lecionam no Ensino Fundamental regular 1ª a 4ª série em horário diurno. Enquanto a
professora B, além de complementar sua carga horária em turmas de 1ª a 4ª série do Ensino
Fundamental, exerce em outra instituição, em horário diurno, a função de Assistente Social. A
professora A também é efetiva do quadro funcional da rede estadual de ensino de Alagoas.
Segundo ela, tem uma carga horária de 60 h/a semanal. Durante o dia trabalha com crianças.
Esse fato, pode estar influenciando, em sua prática pedagógica, a opção por alguns gêneros
textuais que circulam em livros didáticos direcionados ao público infantil.

87

O(a)s aluno(a)s aprovado(a)s para as duas vagas vinculam-se ao grupo de Pesquisa Teorias e Práticas emEJA,
coordenado pela professora Tânia Maria de Melo Moura, que desenvolve pesquisa na área.

94

A atuação das professoras em mai de uma instância escolar e/ou educativa,
desenvolvendo funções diferentes e com modalidades de ensino diferentes, colabora para
manutenção de entraves no processo de aperfeiçoamento profissional, visto que ao assumirem
jornadas duplas ou triplas de trabalho diário não dispõem, entre outros aspectos, de tempo
para se dedicarem aos processos formativos, as leituras e pesquisas necessárias ao
aperfeiçoamento profissional.
No que se refere à idade, as professoras têm 35 (trinta e cinco) anos. A idade das
professoras atreladas ao tempo de atuação na EJA pode significar uma certa maturidade
profissional. provavelmente, elas trazem familiaridade com o universo escolar, seja através de
suas experiências profissionais e/ou por já terem sido alunas da escola pública.

3.1.4 Perfil do(a)s aluno(a)s

Particularmente relevante para nossa análise é conhecermos o perfil do(a)s aluno(a)s
jovens e adulto(a)s. em primeiro luar, porque as informações relacionadas as suas trajetórias
na EJA, muitas vezes, marcados por uma história de fracasso, configura-se num instrumento
necessário para (re)organização dos aspectos teórcio-metodológicos subjacentes a qualidade
da EJA. Em segundo lugar, a escola precisa superar seus limites, preocupando-se mais com o
contingente de jovens e adultos tradicionalmente excluídos, além de perceber que, na escola,
milhões de crianças e jovens estão condenados a fazer parte do contexto ainda marginalizado
que se encontra a EJA no Brasil.
Em um país pobre e de renda mal distribuída, como o Brasil, a trajetória educacional
das camadas populares é marcada, por um lado, pelo caráter descontínuo, desviado do seu
percurso garantido por lei, por outro, a trajetória educacional das classes médias
intelectualizadas caracterizam-se, normalmente, por histórias de sucesso, continuidade,
regularidade. Contrariando o discurso corrente, a escola as camadas populares, a escola do
povo, precisa ser uma escola para o povo, a serviço da emancipação das camadas populares, e
não um entrave entre o povo e o saber socialmente construído. Ribeiro (2003, p. 22) ppostula
que “no Brasil, quando se fala em educação de adultos, normalmente se pensa em cursos de

95

reposição da escolaridade, mas em países economicamente mais desenvolvidos, a
preocupação volta-se para a educação permanente ou continuada”.
Na turma A, foram matriculados, no período da investigação, 47 (quarenta e sete)
aluno(a)s, desses 3 (três) foram encaminhados para 5ª série do Ensino Fundamental, e 12
(doze) nunca compareceram. Desta forma os percentuais apresentados posteriormente,
mantém relação com a(o)s 32 (trinta e dois) aluno(a)s que frequentavam as aulas. Enquanto
que na turma B, o(a)s 37 (trinta e sete) aluno(a)s matriculado(a)s compareciam, mesmo com
altos índices de faltas. Os percentuais apontados na pesquisa, oram calculados a partir do
quantitativo de alunos supracitados.

TABELA 03 – Faixa etária do(a)s aluno(a)s
Turma A

Turma B

Entre 15 e 20 anos

24%

26%

Entre 21 e 30anos

56%

42%

Entre 31 e 40 anos

8%

16%

Entre 41 e 50 anos

12%

16%

Total

100%

100%

Fonte: Entrevistas - alunos

Os dados apresentados revelam que o maior número de aluno(a)s concentram-se na
faixa etária entre 15 e 30 anos, 80% da turma A, e 68% da turma B. Esse(a)s alunos
encontram-se na faixa produtiva, na qual se concentra a proficiência das campanhas
governamentais. Esse fato evidencia o aumento significativo da quantidade de jovens que
cada vez mais procuram a EJA, por diversos motivos, entre eles: precisam trabalhar para
ajudar na manutenção da renda familiar, e sentem-se deslocados nas séries regulares do
ensino fundamental diurno e/ou são transferidos compulsoriamente para o ensino noturno.
Segundo Soares (2002, p. 114) “a maior parte desses jovens e adultos, até mesmo pelo seu

96

passado e presente, movem-se para a escola com forte motivação, buscam dar uma
significação social para as competências, articulando conhecimentos, habilidades e valores”.
Na escola A, a turma era constituída por 24% de jovens, esse(a)s alunos(a)s
apresentavam um maior número de faltas, durante as aulas, do que o(a)s adulto(a)s. Na turma
B, por outro lado, os jovens eram mais assíduos do que o(a)s adulto(a)s. Inferimos que,
provavelmente, em cada prática pedagógica atendiam a interesses distintos.
Na tabela 3, podemos observar ainda a disparidade entre a faixa etária do(a)s
aluno(a)s. Por um lado, se na turma A temos aluno(a)s com 15 anos; por outro encontramos
aluno(a)s prestes a completarem 50 anos. Essa heterogeneidade de geração, impulsionado pela
juvenilização da EJA, a partir de 1980, diante da “expulsão” do(a)s aluno(a)s chamado ensino
regular, implica no desafio de atender as expectativas diferenciadas do(a)s aluno(a)s quanto as
suas necessidades de aprendizagens.

TABELA 04 – Situação funcional
Turmas

Trabalham

Não Trabalham

A

52%

42%

B

46%

54%

Total

100%

100%

Fonte: Entrevistas – aluno(a)s

A tabela 04 demonstra-nos que mais da metade do(a)s aluno(a)s da turma A trabalham
(52%), embora tenhamos ainda um percentual elevado de aluno(a)s desempregado(a)s (42%).
Do(a)s aluno(a)s que trabalham o(a) mais jovem tem 18 anos e o(a) mais velho(a) tem 43
anos. Por outro lado, na turma B, 46% trabalham enquanto 54% estão desempregados. Entre
o(a)s que trabalham o(a) mais jovem tem 15 anos e o(a) mais velho(a) tem 49 anos. Vale
salientar que ente as ocupações remuneradas, exercidas pelo(a)s aluno(a)s da turma A,
encontramos: domésticas, borracheiro, ambulante, motorista e comerciante. Já na turma B,

97

destacaram-se: comerciante, faxineira, pintor, jardineiro e doméstica. Observamos que as
ocupações88 do(a)s aluno(a)s enquadram-se na categoria informal.
Devido a isso, coloca-se à escola mais um desafio, considerar a realidade social do(a)s
aluno(a)s. A grande maioria, são trabalhador(a)s, almejam, muitas vezes, adquirirem
conhecimentos que o(a)s conduzam a um melhor desempenho em suas ocupações, ou buscam
apropriar-se de conhecimentos que os ajudem a conseguir alguma atividade profissional
remunerada. Devemos considerar também que o(a) aluno trabalhador(a) ao chegar à escola,
após um longo dia de trabalho, poderá apresentar, inclusive, indisposição à aprendizagem,
além de faltas sucessivas.

TABELA 05 – Tempo de afastamento da escola
TURMA A

TURMA B

Entre 1 e 10 anos

88%

84%

Entre 11 e 20 anos

8%

13%

Entre 21 e 30 anos

4%

3%

Total

100%

100%

Fonte: Entrevistas – aluno(a)s

A trajetória escolar do(a)s jovens e adulto(a)s é marcada por sucessivas tentativas de
acesso, seguido de abandono. Se por um lado, estamos diante de uma situação paradoxal, a
escola ocupa o lugar central para a apropriação da cultura letrada pelo(a)s aluno(a) da EJA,
por outro, impossibilita a acumulação desse saber pelos aluno(a)s das camadas populares.
Particularmente relevante para a nossa análise é evidenciarmos que, do(a)s aluno(a)s
da turma A, 88% passaram entre 1 e 10 anos afastados da escola, realidade semelhante do(a)s
88

Para maiores esclarecimentos sobre os tipos de ocupações sugerimos a consulta ao site:
HTTP://www.mtecbo.gov.br, do Ministério do Trabalho.

98

aluno(a)s da turma B (84%). Nesse sentido, evidenciamos uma situação antagônica, a escola
que exclui é a mesma que atrai, quase sempre, por necessidade. É fato consumado que, muitas
vezes, o(a)s aluno(a)s da EJA retornam a escola tentando apropriar-se dos conhecimentos,
principalmente, da leitura e escrita, mas encontram enormes dificuldades para compreender o
que se ensina na escola, no caso da pesquisa, quando se ensina a LM.

TABELA 06 – Permanência na escola
TURMA A

TURMA B

Entre 1 e 2 anos

16%

65%

Entre 3 e 4 anos

29%

34%

Não estudavam na escola

40%

1%

Estudaram em 1999 ou 2001

15%

-

Total

100%

100%

Fonte: Entrevistas – aluno(a)s
A permanência dos jovens e adultos nas escolas é um desafio a ser enfrentado, nesse
início de século, exigindo uma (re)configuração da EJA e das políticas públicas sociais. De
nada adianta investimento na EJA, se a escola, inserida num contexto social, principalmente,
não proporcionar condições para a permanência do(a)s aluno(a)s. Eles(a)s, muitas vezes
sentem dificuldade de aprendizagem, impedindo-os de progredirem nos estudos.
A realidade nos mostra que atrelado as dificuldades educativas do(a) aluno(a)s,
inúmeros fatores internos e externos a escola, abrangendo desde questões sócio-políticas e
culturais, até questões relativas a formação profissional do(a) professor(a), podem interferir
no desempenho e permanência do(a) aluno(a) jovem e adulto na escola.
Na tabela 06, identificamos um percentual significativo de aluno(a)s que estão
permanecendo na escola. Se há permanência, provavelmente a escola possibilita condições
mínimas para o ensino e a aprendizagem. Do(a)s aluno(a)s da turma A, 16% estudam na
escola a pelo menos 1 ou 2 anos, enquanto na escola B esse percentual sobe para 65%.
O(a)s aluno(a)s das professoras A e B cursavam a 3ª fase da EJA. Entre o(a)s
aluno(a)s da turma A, 29% estudavam há 3 ou 4 anos na escola. Em contrapartida, esse
percentual sobe para 34% na escola B, nesse caso, um maior tempo de permanência. Na

99

escola B detectamos um maior número de ingressos pela primeira vez a escola (40%). A
escola A é a única do bairro que oferece educação pública para jovens e adultos. Desta forma,
esse(a)s aluno(a)s estavam fora da escola ou foram transferidos de outras instituições
escolares.
Vale salientar que o(a)s aluno(a)s das turmas observadas são provenientes das classes
populares, dominam a variedade linguística coloquial. Cabe o(a)s professor(a)s discutir os
valores sociais atribuídos a cada variedade linguística (BAGNO, 2000). Percebemos que a
língua é frequentemente usada na prática da discriminação, da exclusão social. Explicitar,
explicar e combater esse preconceito é uma das tarefas do(a) professor(a).
Dado o exposto, conhecer o perfil singular do(a)s aluno(a)s em cada uma das turmas
poderá ser um fator impulsionador para a adequação das práticas às especificidades
educativas. Para isso, além de uma estrutura organizacional, a formação do(a) professor(a)
ocupa lugar privilegiado. Pois, não é suficiente possibilitar o acesso a uma estrutura adequada,
mas o(a) professor(a) através de sua sólida formação continuada precisa, entre outros
aspectos, compreender quais os melhores caminhos para conduzir o(a)s aluno(a)s a
aprendizagem, definir uma base curricular adequada às necessidades de aprendizagem do(a)s
aluno(a)s da EJA.
Antes de iniciarmos a análise das categorias, apresentadas anteriormente,
consideramos relevante refletir a seleção dos conteúdos definidos e problematizados pelas
professoras A e B durante as aulas de LM observadas.

3.2 Aulas de LM: os conteúdos ensinados

Na escola, o(a)s professor(a)s ao definirem os conteúdos a serem trabalhados ao
longo de um ano letivo, orientam-se, muitas vezes, por propostas curriculares, programas de
disciplinas, e pelo livro didático. No que diz respeito a esse suporte textual percebemos que as
professoras selecionam qualquer livro didático, alguns direcionados ao público infantil,
embora a escola tenha recebido do DEJA, uma relativa quantidade de livros direcionados a
EJA. Os conteúdos definidos nesses instrumentos “tradicionalmente foram classificados

100

conforme um critério de pertencimento a uma disciplina abordados em sala de aula”
(ZABALA, 1998, p. 140).
Na tabela 07 sistematizamos os conteúdos trabalhados, pela professora A, durante
as aulas de LM observadas.

TABELA 07 – Conteúdos trabalhados
CONTEÚDOS





Práticas de leitura: decodificação
Compreensão de textos escritos
Produção de textos escritos
Análise linguística
 Pontuação
 Ortografia: emprego de “M” ou “N”
 Substantivo próprio
 Emprego de “a gente” ou “nós”
 Sílaba tônica
 Sinomínia
 Construção de frases

Fonte: Registro de aulas
A seleção dos conteúdos abordados, durante as aulas, como podemos observar na
tabela 07, demonstra-nos a opção da professora A em considerar os eixos centrais de ensino
de uma LM: práticas de leitura; produção de texto e análise linguística. Nessa seleção
percebemos a ênfase posta no ensino da modalidade linguística escrita em detrimento da
modalidade linguística oral, embora os estudos, durante os cursos de LM, tenham abordados
mais o uso da fala e da escrita, além das práticas de análise linguística. No que diz respeito a
ênfase na escrita, Marcuschi (2003, p. 26) afirma que “a supervalorização da escrita
alfabética, leva a uma posição de supremacia das culturas com escrita ou até mesmo dos
grupos que dominam a escrita dentro de uma sociedade desigualmente desenvolvida”. A
escola, deveria possibilitar também o desenvolvimento da competência discursiva oral do(a)
aluno(a). o uso da oralidade para o autor (idem, ibidem), “seria uma prática social interativa
para fins comunicativos que se apresenta sob várias formas ou gêneros textuais fundados na
realidade sonora; ela vai desde uma realização mais informal à mais formal nos mais variados

101

contextos de uso”. Nesse sentido, o(a) professor(a) precisa (re)pensar o lugar das práticas de
uso das modalidades linguísticas oral e escrita nas aulas de LM.
No que diz respeito ao tratamento metodológico dos conteúdos supracitados, a
professora A abordava vários assuntos durante o horário de aula noturno, no entanto, as
discussões e/ou exposições dos conteúdos não se pautavam em estratégias consistentes. Ela
restringia-se a fazer comentários superficiais sobre os conteúdos. E, o(a)s aluno(a)s
limitavam-se, na maioria das vezes, a escutar o seu discurso. Nesse contexto, o silêncio do(a)s
aluno(a)s poderiam ser explicado por Posenti quando afirma que

o resultado da imposição da norma culta como única variedade de prestígio
desconsiderando os usos da língua é o aumento do silêncio, pois na escola não se
consegue a variedade ensinada, e se consagra o preconceito que impede de falar
segundo outras variedades. E isso é politicamente grave (2003, p. 56).

A professora A tentou propor situações de produções de textos, mas não demonstrou
conhecimentos sobre as condições de produções do discurso89. Os gêneros textuais
introduzidos, na sala de aula, e as tentativas de análise linguística restringiram-se a corrigir os
desvios da norma culta presente nas produções escritas do(a)s aluno(a)s. tradicionalmente, a
imposição de uma cultura culta como referencial, exclusivo em detrimento das experiências
vivenciadas, especialmente pelos jovens e adultos providos de camadas marginalizadas, pode
contribuir para o aumento dos índices de evasão ou retenção, desse público, na escola. Além
de fomentar o agravamento, ou manutenção das situações de exclusão social. Segundo Bagno
(2002, p. 70) “a língua é frequentemente usada na prática da discriminação, da exclusão
social. O preconceito linguístico vivo e atuante é uma realidade inegável no Brasil”90.

89

Sobre as condições de produção do discurso recuperamos que, durante os cursos, a formadora pontuou
teoricamente que o que fizemos aí usava a linguagem de maneira significativa é produzir discursos, que
envolve certas condições, ou alguns elementos indispensáveis como: 1) um locutor (aquele que diz, sua posição
sócio-histórica); 2) um alocutário (aquele para quem se diz o que tem a dizer, sua posição sócio-histórica); 3)
um referente (o que dizer, sempre determinado pelos sistemas semântico de coerência e de restrições); 4) uma
forma de dizer, um, determinada língua (é preciso que se escolham estratégias para se dizer; 5) um contexto
em sentido estrito: as circunstâncias imediatas; o que é agora do ato de discurso; 6) um contexto em sentido
lato: as determinações histórico-sociais, ideológicas, o quadro das instituições em que o discurso é produzido –
a família, a escola, a igreja, o sindicato, a política, a informação, a língua (CARDOSO, 1999, apud, SANTOS,
2002).
90
Para aprofundamento sobre o preconceito linguístico sugerimos a leitura de Bagno (2000).

102

Todos sabemos que o(a)s aluno(a)s da EJA têm consciência do seu desconhecimento
de normas e prescrições gramáticas, até porque não são linguísticas, destarte expor suas
hipóteses sobre os conhecimentos discutidos, em sala de aula, sem receio de críticas ainda
precisam, em muitos contextos, serem superados.
Dado o exposto, encontramos pouca ressonância das discussões proporcionadas,
durante os cursos, na prática da professora A.
Na tabela 08 sistematizamos os conteúdos trabalhados durante as aulas observadas na
turma B:

TABELA 08 – conteúdos trabalhados
Conteúdos





Prática de leitura
Compreensão de texto escrito
Produção de texto escrito
Análise linguística
 Adjetivo
 Pontuação
 Substantivo
 Ortografia: emprego de “Mau” ou “Mal”
 Separação silábica

Fonte: Registros de aulas

A professora B, assim como a professora A, considerava os eixos centrais do ensino
de LM supracitados, embora, restringisse o foco de estudo nas aulas de LM, exclusivamente,
na modalidade linguística escrita.
O trabalho com os conteúdos gramaticais aconteceram de forma fragmentada,
superficial. A professora B não se preocupava em desenvolver sequências de atividades que
garantissem, progressivamente, a aquisição dos conhecimentos pelo(a)s aluno(a)s, em
aprofundar as discussões, restringia-se a pontuar, esporadicamente, nomenclatura gramaticais.
Em uma mesma aula, a professora B chamava a atenção do(a)s aluno(a)s para vários aspectos
linguísticos. Contrapondo-se aos estudos de Geraldi (2003), quando afirma que não se pode

103

resolver todos os desvios gramaticais do texto numa única proposta de análise, mas é preciso
selecionar um aspecto de cada vez.
A seleção dos conteúdos pela professora B aproximar-se da seleção da professora A.
A ênfase posta nos conteúdos gramaticais, sobretudo nas definições das classes de palavras, o
texto não foi compreendido como objeto de análise. Durante a realização e correção dos
exercícios o(a)s aluno(a)s demonstraram

suas dificuldades em entender os conteúdos

trabalhados, sobretudo no que diz respeito a identificação de nomenclaturas gramaticais das
classes de palavras.
Ao refletir a prática de ensino de LM centrada na supervalorização da gramática,
Neves afirma que o

tratamento escolar da linguagem tem de fugir da simples proposição de moldes de
desempenho (que levam a submissão estrita a normas linguísticas consideradas
legítimas) bem como da simples proposição de moldes de organização de entidades
metalinguísticas (que levam a submissão estrita a paradigmas considerados
modelares) (2003, p. 116).

A seleção dos conteúdos, e o tratamento teórico-metodológico de ensinoaprendizagem da LM ao se distanciarem das temáticas discutidas nos encontros de formação,
podem ser explicados por Matêncio ao afirmar que

o hiato que se constitui entre os avanços científicos na área da linguagem e sua
incorporação na formação de professores, bem como em sua prática em sala de aula,
reflete os problemas do ensino no Brasil: só muito tardiamente os avanços
científicos na áreas mencionadas têm sido incorporados ao ensino de terceiro grau e,
portanto, reestruturados para inclusão no níveis iniciais (2002, p. 78).

Ao considerarmos a organização curricular dos cursos de licenciatura, exceto os de
Letras, percebemos nitidamente a manutenção do hiato entre a linguística e as demais
ciências, inclusive a pedagogia. Raramente, o(a)s professor(a)s são convidados a refletirem

104

sobre o ensino da LM, embora todas as ciências trabalhem essencialmente com práticas de
leitura e escrita.
O estudo sobre a linguagem, para muitos professor(a)s, somente são possibilitados,
durante o processo de formação continuada, já que raramente o(a)s professor(a)s da EJA são
graduados em Letras. Desta forma, o professor(a) precisa de um tempo para refletir, analisar,
experimentar e estudar continuamente a nova proposta de ensino de LM.
O texto como elemento central de estudo, visto como lugar de interação, pressupõe a
análise linguística em função do seu uso. Nesse sentido, a gramática deveria ser entendida
como um dos elementos de estudo, durante as aulas de LM, e não objeto de estudo exclusivo.
Na sala de aula, observamos que o texto serviu apenas de pretexto para a abordagem
de conteúdos gramaticais. Esse fato demonstra-nos que transformar os conhecimentos
teóricos em conteúdos didaticamente ensináveis, pressupõe um processo de formação
permanente, no qual o(a) professor(a) (re)signifique os conhecimentos dobre o ensino de
língua adquiridos ao longo de suas histórias de vida e profissional. Para isso, o(a) professor(a)
precisa pensar sobre a prática, planejá-la, entre outras estratégias, para que haja uma
apropriação individual, possibilitados por reflexões coletivas, das novas estratégias didáticas
para superar as dificuldades do(a)s aluno(a)s.
Herneck e Mizukami (2001, p. 317) postulam que a prática dos professores, por sua
vez, implica a consideração de dimensões pessoais, políticas, sociais, culturais e éticas,
possuindo sua natureza subjetiva que configura diferentes formas de agir e de conduzir o
processo de ensino-aprendizagem. Dessa forma, durante as práticas de formação continuada,
precisamos considerar a pessoa do professor, suas relações interativas com seus pares, seus
valores, crenças, paradigmas, para possivelmente impulsionar o (re)pensar a prática.
Dado o exposto, após refletirmos sobre as características do(a)s aluno(a)s, das
professoras e os conteúdos abordados em sala de aula, direcionarmos o nosso olhar as
categorias de análise supracitadas.

105

3.3 Concepção de linguagem que perpassa as aulas de LM

A apropriação da língua escrita requer não só o domínio de um código formal
(alfabeto, convenções ortográficas, procedimentos de organização do texto, coerência e
coesão, etc.), mas, principalmente, uma multiplicidade de conhecimentos epilinguísticos e
metalinguísticos subjacente ao funcionamento da linguagem. Segundo Geraldi (1997, p. 191)

as atividades epilinguísticas refletem sobre a linguagem e a direção desta reflexão
tem por objetivo os usos destes recursos expressivos em função das atividades
linguísticas em que está engajada. Assim, toda a reflexão sobre diferentes formas de
dizer, são atividades epilinguísticas e, portanto análise linguística. Considero as
atividades metalinguísticas como uma reflexão analítica sobre os recursos
expressivos que levam a construção de noções com as quais se tornam possível
categorizar recursos (1997, p. 190 – 191).

O ensino de LM, na escola vem tradicionalmente apoiando-se nas duas orientações do
pensamento filosófico-linguístico: subjetivismo individualista91 e objetivismo abstrato92.
Demonstrando esse pensamento, os estudos Bakhtinianos mostram que “a língua vive e evolui
historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema linguístico abstrato das
formas da língua nem n psiquismo individual dos falantes” (BAKHTIN, 2004, p. 124). Nesse
sentido, a língua é entendida como lugar de interação humana, que “constitui num processo
evolutivo ininterrupto, que se realiza através da interação verbal e social dos locutores” (idem,
p. 127, grifo do autor). Os sujeitos são vistos “como atores sociais, o texto passa a ser
concebido como próprio lugar de interação” (KOCH, 2002, p. 16). Destarte, as práticas de
ensino de língua, na escola, deveriam considerar a perspectiva dinâmica da língua, a relação
dialógica entre os sujeitos.

91

Essa concepção, segundo Bakhtin (2004, p. 110) “apoia-se sobre a enunciação monológica como ponto de
partida da sua reflexão sobre a língua.
9292
Para Bakhtin (idem, p. 90) os representantes do individualismo abstrato acentuam constantemente que o
sistema linguístico consiste num fato objetivo externo à consciência individual e independente desta. Para o
autor ainda, nessa concepção, a língua se apresenta como sistema de normas rígidas imutáveis.

106

Se considerarmos os reflexos do tradicional modelo de ensino de língua, que perpassa
a história da disciplina Língua Portuguesa93, caracterizado por privilegiar o ensino da forma
(estrutura) em detrimento da função da linguagem (uso), fica evidente a persistência de
dificuldades do(a) professor(a) em entender e incorporar, na prática pedagógica, novos níveis
de análises e novos procedimentos de ensino de LM, capazes de superar os modelos de ensino
de língua vivenciados pelo(a) professor(a)s enquanto ainda eram estudantes, como
percebemos no depoimento da professora A: “em relação ao ensino de Língua Portuguesa,
dava para observar uma sequência do livro adotado e muitas vezes a parte gramatical estudada
ficava fora do contexto”.
No depoimento da professora A, ao relembrar sua experiência com a aprendizagem
da língua escrita, revela-nos a perspectiva de ensino de LM da escola tradicional da época94.
Nesse contexto, o livro didático era um dos poucos instrumentos que circulavam na escola, os
estudos das normas e prescrições gramaticais95 ocupavam lugares privilegiados. Nitidamente,
percebemos a influência desse processo de formação na prática da professora.
Vale salientar que os fragmentos de aula analisados, posteriormente, ilustram a
concepção de linguagem adotada pelas professoras. No entanto, para identificarmos a
concepção de linguagem consideramos a definição dos objetivos, a escolha dos
procedimentos didáticos, os conteúdos ensinados a seleção dos textos, as propostas de
atividades e a interação professor – aluno. Antunes (2003, p. 39), ao refletir os caminhos da
aula de LM, na escola, defende que “desde a definição dos objetivos, ,passando pela seleção
dos objetos de estudo, até a escolha dos procedimentos mais corriqueiros e específicos, em
tudo está presente uma determinada concepção de língua, de seus processos de aquisição, de
uso e de aprendizagem”.
Nesse sentido, Geraldi (2003, p. 40) afirma que “os conteúdos, o enfoque que se dá a
eles, as estratégias de trabalho com os alunos, a bibliografia utilizada, o sistema de avaliação,
o relacionamento com os alunos, tudo corresponderá, nas nossas atividades concretas de sala
93

Nomenclatura tradicionalmente utilizada no contexto educacional.
Período entre 1974 – 1979 época em que a professora estudava no antigo curso primário, atualmente, 1º
seguimento Ensino Fundamental 1ª a 4ª séries.
9595
Há estudos indicando que a gramática tradicional ainda é privilegiada nas aulas de língua materna
(ANTUNES, 2003; BAGNO, 2002; GERALDI, 2003; FIAD, 1996; TRAVÁGLIA, 1997). Outros estudos permitem
visualizar lacunas na formação de professor(a)s, no que se refere à habilidade de trabalhar com a gramática –
nas modalidades linguísticas oral e escrita – leitura e/ou produções de textos (CASTILHOS, 2002; MATÊNCIO,
2003; MARCUSCHI, 2003).
94

107

de aula, ao caminho que optamos”. O autor defende ainda que “uma resposta ao para que
envolve tanto uma concepção de linguagem quanto uma postura relativamente à educação”
(idem, p. 41).
Durante as aulas de LM, a professora A tentava estabelecer uma relação de interação
com o(a)s aluno(a)s. tivemos a impressão de que ela se apoiava na concepção de linguagem
como processo de interação. Nessa concepção além de exteriorizar96 um pensamento ou
transmitir informações, o indivíduo age sobre o seu interlocutor, produzindo uma relação
dialógica, o seu discurso. “Essa concepção é representada por todas as correntes de estudo da
língua que podem ser reunida sob o rótulo de linguística de enunciação” (TRAVÁGLIA,
1997, p. 22). Nessa concepção de linguagem, a palavra é proferida em função do seu
interlocutor.
No entanto, ao longo das observações, percebemos que o processo de interação
acontecia de forma restrito. A professora A limitava-se a tomar o turno para expor suas
concepções sobre os temas discutidos. Dessa forma, o procedimento da professora distanciase da perspectiva de Bakhtin (2004, p. 99), quando afirma que na concepção de linguagem
como interação, “não há discurso individual, no sentido de que todo discurso se constrói em
função de um outro, todo discurso se constitui no processo de interação – real ou
imaginário97”.
Dado o exposto, é preciso descartar uma concepção de sujeito neutro, passivo, à mercê
das ideologias, dos discursos, dos mecanismos disciplinares presentes na sociedade. Para
Kleiman (2001, p. 224), adotar a concepção interacionista, “implica o compromisso de tentar
conhecer o aluno: seus interesses, seus objetivos, suas experiências e seus conhecimentos
deverão servir de ponto de partida para o trabalho pedagógico”.
Essa concepção pressupõe uma mudança na relação professor(a), aluno(a)s e
conhecimento, além de uma sólida formação docente, na qual o(a)s aluno(a)s-professor(a)s
possam num processo de construção coletiva (re)pensar o seu fazer pedagógico. Leal (2005,
96

. Para Bakhtin (2004, p. 111) a expressão comporta, portanto, duas facetas: o conteúdo (interior) e sua
objetivação exterior para outrem (ou também para si mesmo). Toda teoria da expressão, por mais refinada e
complexa que sejam as formas que lhe pode assumir, deve levar em conta, inevitavelmente, essas duas
facetas: todo ato expressivo move-se entre elas.
97
Toda enunciação, mesmo na forma imobilizada da escrita, é uma resposta a alguma- coisa e é constituída
como tal. “Não passa de um elo da cadeia dos atos de fala. Toda inscrição prolonga aquelas que a precedem,
trava uma polêmica com elas, conta com as reações ativas da compreensão, antecipa-as” (BAKHTIN, 2004, P.
98).

108

p. 113) propõe que “a teorização da prática é o caminho para desenvolvermos, enquanto
professor, uma ação mais consistente, levando-nos a um planejamento mais elaborado e
reflexivo. Propomos, ainda que a formação do professor(a) é um momento privilegiado para
que isso aconteça”.
A professora A, durante as aulas observadas, selecionava um gênero para ser lido. Às
vezes, encaminhava a leitura silenciosa e/ou solicitava a oralização do texto de forma
fragmentada, cada aluno(a) deveria ler uma parte do texto. Em seguida, instigava uma
discussão sobre o tema tratado pelo autor(a) deveria ler uma parte do texto. Em seguida,
instigava uma discussão sobre o tema tratado pelo autor e/ou alguns aspectos do texto, quase
sempre, abordando aspectos relacionados ao domínio da gramática.
Nos momentos de leitura, a participação do(a)s aluno(a)s acontecia de forma restrita,
quase sempre participavam o(a)s mesmo(a)s aluno(a)s, embora a professora A incentivasse a
interação da turma. Ela, ao levar textos para sala de aula, restringia-se a socializar o gênero
que seria objeto de estudo naquele momento, mas não deixava claro qual o objetivo da
proposta de atividade.
A professora A inicia a aula de língua materna dizendo “eu trouxe um texto, é uma
piada... vamos vê se vocês entendem!”. Em seguida, ao distribuir o texto, solicita-lhes que
façam a leitura silenciosa. Ao concluírem essa prática de leitura, a professora questiona:

Professora: Por que esse texto é uma piada?
Aluno(a)s: ...
Professora: Quais são os personagens do texto?
Aluno(a)s: O homem e o balconista.
Professora: O narrador é personagem?
Alunos: Não.
Professora: Não, ele não participa da história
Vamos ler o texto diferente eu preciso de narrador, balconista e
comprador
((um aluno se dispõe a ser um dos personagens, depois de muita
insistência da professora, progressivamente, outros aluno(a)s se
dispuseram a participar da atividade))

109

O(a)s aluno(a)s dirigem-se a frente na sala para dramatizar o texto. A professora, nesse
momento, lembra-os de que cada um(a) deveria ler os fragmentos correspondentes aos papéis
por ele(a)s assumidos. Após a “dramatização”, a professora estabelece o diálogo:

Professora: risos... minha gente!
É uma piada.
Aluno(a)s: ((risos))
((o(a)s aluno(a)s sorriram para satisfazer a professora, tivemos a
impressão de que eles não compreenderam a piada))

Nessa sequência discursiva, percebemos que a professora A abordou, no primeiro
momento, questões referentes a superficialidade do texto (personagens,

narrador),

desconsiderando os efeitos de sentido por ele produzido. Essa situação demonstra-nos a
preocupação da professora apenas com a decodificação do texto. Essa postura, pressupõe a
concepção, por seu turno corresponde a de sujeito determinado, assujeitado pelo sistema,
caracterizado por uma espécie de não consciência. Nessa concepção, uma vez decodificado o
texto torna-se totalmente explícito. Para Traváglia (1997), nessa concepção, a língua é um
conjunto de signos que se combinam segundo regras, que é capaz de transmitir uma
mensagem, informação de um emissor a um receptor. Com base nesse pressuposto, a língua é
apenas um elemento exterior, ou seja, o indivíduo não é dono do seu discurso. E, o texto uma
vez decodificado torna-se explícito.
A professora A praticou um tipo de intervenção didática distante da perspectiva de
ensino da língua como forma de interação. Embora essa perspectiva tenha sido discutida e
vivenciada durante os encontros de formação. A perspectiva interacionista “preocupa-se com
os processos de produção de sentido, tomando-se sempre como situados em contextos sóciohistóricos marcados por atividades de negociação ou por processos de interferências”
(SANTOS, 2003).
Um fato interessante, ocorrido durante a leitura do texto pelo aluno, foi o uso da
estratégia da paráfrase. Um dos alunos, que se dispôs a dramatizá-lo, não o decodificou, mas
o recontou oralmente. Ele memorizou as falas? Por que o aluno usou essa estratégia? Não
seria mais fácil ter decodificado as falas dos personagens?

110

Mediante essa situação, a professora A, questionou:

Professora: Quem foi o colega que não leu o texto?
Aluno(a)s: O Paulo (pseudônimo)
Professora: O que ele fez?
Aluno(a): disse o que entendeu
((após a resposta dos alunos, continuou a fazer questionamentos sobre
o texto))
Professora: Observem a palavra BALCONISTA
Vocês conhecem outro substantivo que serve tanto para homem como
para mulher?
Aluno(a)s: atendente
Professora: atendente... balconista
(a professora continua fazendo algumas observações sobre pontuação,
grau e o número do substantivo, mas não aprofundou nenhum
conhecimento específico)

A professora A ao limitar as práticas de leitura do texto, a mera decodificação do
código linguístico, no qual o papel do “decodificado” aluno(a) é essencialmente passivo, pode
impedi-los de serem leitores proficientes, capazes de apreciarem bons textos, de inferirem
informações implícitas, de estabelecerem relações com outros textos, de interagir com os
textos, entre outros recursos linguísticos. Ao não possibilitar a interação texto-leitor, nega-se a
concepção interacional (dialógica) da língua, “os sujeitos são visto como atores/construtores
sociais, o texto passa a ser considerado o próprio lugar da interação e os interlocutores, como
sujeitos ativos que – dialogicamente – nele se constroem e são construídos” (KOCH, 2002, p.
17).
Em outro evento de aula, a professora A distribuiu, entre o(a)s aluno(a)s, o poema
“meus oito anos” de Casimiro de Abreu, solicitando que o(a)s aluno(a) lessem o texto
silenciosamente. Ao concluírem essa proposta, a professora reler o texto. Posteriormente
questiona:

Professora: quem gostaria de ler o texto?
Só a primeira estrofe
Aluno: “oh! Que saudade que tenho...

111

da aurora da minha vida...
da minha infância querida...
que os anos não trazem mais...
Professora: a segunda estrofe?
[...]
((outro aluno faz a leitura da segunda estrofe, desta vez ela corrige
enfática o desvio da leitura pelo aluno. Desta forma, prossegue
solicitando que outros aluno(a)s lesse os parágrafos do texto que não
tinham sido lidos pelo(a)s aluno(a)s oralmente)).
Professora: esse texto aqui é uma poesia ((referindo-se ao discurso: “meus oito
anos”)) naquela época podia fazer tudo sem preocupação?
Aluno(a)s: poderia::
Professora: Por que?
Aluno 1: porque não fala de sofrimento... fala de saudade
Professora: essa criança é uma criança que morava na cidade?
Aluno(a)s: no interior
Professora: como foi a infância de vocês?

Nessa “situação de leitura”, o texto “meus oito anos” foi usado como o pretexto para a
socialização das histórias de vidas do(a)s aluno(a)s. A professora A, com relação a
materialidade linguística, restringiu-se a solicitar a decodificação fragmentada do texto.
Antunes, nesse sentido, afirma que

no que se refere às atividades de ensino de leitura, entre outras práticas, ainda se
encontra uma atividade de leitura centrada nas habilidades mecânicas de
decodificação da escrita, sem dirigir, contudo a aquisição de tais habilidades para a
dimensão da interação verbal – quase sempre, nessas circunstâncias (2003, p. 27) .

Na proposta de atividade com o texto supracitado, chamou-nos atenção o último
questionamento feito pela professora: “como foi a infância de vocês?”. Considerando
relevante registrar alguns dos depoimentos:

112

A1: na minha infância... eu pedia pra crescer logo... porque eu comecei a trabalhar
logo aos 9 anos... eu queria ter a minha liberdade... eu gosto dos meus pais... ele
devia me tratar mais melhor quando criança... no interior não tinha nada de bom....
quando eu chegava do mar minha mãe dizia “o balde vá buscar aágua”... tinha que
buscar água... quando eu estava brincando lá vinha a “lapada” e “as vezes lá vem teu
pai”... agora... hoje... quando eu chego em casa... meu pai diz... esses meninos não
me atendem mais... minhas irmãs brincam de chimbra e bola... ele vai pra maré
sozinho... naquele tempo ele tinha eu pra ajudar... com quinze anos... fui casar pra
me mudar de vida... hoje eu só trabalho quando quero... meus pais têm 17 filhos...
tinha que parar de ter minino... sinto saudade de tomar banho no rio.

A2 a minha vida foi como a dos meninos... morava no interior... pra mim o melhor
dia era o dia de domingo... quando a gente ia pra feira...

A3 eu vim subindo no ônibus e vi umas crianças que não tinha nada a vê com esse
texto... estava de baixo da lona chuvendo...

Nos extratos supracitados, percebemos que o(a)s aluno(a)s tiveram oportunidade de
emitirem suas opiniões, de expressarem uma forma de interpretação sem respostas prontas e
únicas. Por outro lado, as colocações do(a)s aluno(a)s não foram explorados pela professora.
Assim, a potencialidade que o(a)s aluno(a)s e a professora teriam de aprofundar um diálogo
sobe um tema infância que lhes era familiar, foi desperdiçado. Contrapondo-se a concepção
de Bakhtin, ao afirmar que

na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de
que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui
justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Através da palavra,
defino-me ao outro, isto e, em última análise, em relação à coletividade (2004, p.
111, grifo nosso).

Após a socialização das histórias de vida, a professora fez alguns comentários, sobre o
lado positivo das histórias relembradas. Em seguida, distribuiu outro texto, a música “Utopia”
de Padre Zezinho. O título da música chamou a atenção de uma aluna:

113

Aluna 2: Ave Maria ((diz a aluna ao olhar para o texto))
Professora: O que seria utopia?
Aluno(a)s: só com o dicionário professora
Professora: só com o dicionário?
Aluna 4: utopia é o divórcio?
Aluna 5: professora utopia era o que eles vivia?
Professora: vamos vê!

A professora A deixou em aberto a discussão sobre o significado da palavra “utopia”.
Posteriormente, iniciou o trabalho com o texto, pôs o CD para tocar a música, o(a)s alunos(a)s
a escutaram passivamente. Após a execução, ele(a)s solicitaram mais uma vez a escuta, desta
vez, alguns tentaram acompanhá-la cantando. Dando prosseguimento, a professora questionou
“qual a passagem do texto que vocês consideram mais bonita?”, um aluno respondeu:

Aluno 1: eu acho a passagem mais bonita... quando o pai chega cansado e atende o
pedido dos filhos

As respostas ao questionamento supracitado estabeleciam relação com a compreensão
do texto. É comum o(a)a aluno(a)s, nesses momentos de socialização, indicarem o(s) verso(s)
e, em seguida exporem suas justificativas, no entanto, o(a)s aluno(a) não repetiram os
fragmentos do texto, mas caminharam pela semântica – pelo sentido do texto, ou seja,
apropriaram-se do sentido e expuseram suas visões críticas. Após essa discussão, a
professora A propôs que fosse respondida em casa, a atividade:
1.

Sua família, na época da sua infância, era composta por quantas pessoas? Quem eram
essas pessoas?

114

2.

Sua infância foi feliz? Por quê?

3.

Você sente falta da sua infância? Por quê?

4.

Você gostaria que algo tivesse sido diferente na sua infância? O quê?

5.

O que você acha necessário para que todas as crianças tenham uma infância feliz?

6.

Você é contra ou a favor do divórcio? Por quê?

Nessa proposta de atividade, a professora A utiliza-se novamente dos textos como
pretexto. Não possibilitou, na aula, o estabelecimento de relação quanto a forma e a função
dos gêneros (poema, música); não discutiu os efeitos de sentido produzidos pelos textos, nem
foram apontados os aspectos linguísticos característicos de cada um dos gêneros, além de não
demonstrar o porquê da seleção daqueles dos texto98. Isso demonstra também que as práticas
de leitura, na escola, estão muito distante das funções da leitura. Mesmo assim, Geraldi (2003,
p. 27) postula que “é preciso retirar os textos dos sacrários, dessacralizando-os com nossas
leituras, ainda que venham marcados por pretextos”. Ultrapassar essa artificialidade é
efetivamente o desafio do ensino de LM, na escola, para isso o(a) aluno(a) precisa ser
conduzido a atribuir sentido, concordar ou discordar dos textos, propondo outros significados
não previstos, pois, a leitura é um processo de interlocução entre leitor e autor, é um ato
dialógico.
Na prática da professora B, raramente propunha atividades a partir do trabalho com
gêneros textuais. Durante as aulas observadas, para introduzir alguns conteúdos a professora
restringia-se a trabalhar frases soltas ou questionar alguns aspectos gramaticais através da
escrita de texto de outras disciplinas. O(a)s aluno(a)s, poucas vezes, foram convidados a ler
algum gênero. A professora B, às vezes, questionava “vocês lembram de ordem alfabética?”,
“como ordenamos as palavras alfabeticamente?”, ou “o que é um adjetivo”, “o que é um
substantivo?”. Essa postura demonstra-nos que para a professora, a língua é basicamente um
sistema de regras passíveis à descrição (BAGNO, 2002). O(a)s aluno(a)s foram poucas vezes
convidados a participarem da aula, a relação ensino-aprendizagem pautava-se na relação de
estímulo-resposta. A perspectiva do certo, da norma, foi um aspecto reforçado pela
professora.

9898

A professora confessou-nos que tinha escolhido àqueles dois textos para trabalhar porque uma aluna
estava passando por problemas familiares, mas infelizmente, segundo ela, naquele dia a aluna tinha faltado.

115

A fim de continuarmos nossas reflexões sobre a concepção de linguagem,
focalizaremos uma prática de leitura proposta pela professora B. em um evento de aula, ela
copiou o texto “telegrama” de Carlos Drumond de Andrade no quadro. Em seguida, após
todos os alunos copiarem, solicitou-lhes a oralização do texto. Posteriormente, fez alguns
comentários sobre o texto.

Professora: é importante o telegrama?
Aluno(a)s: ((permaneceram em silêncio))
Aluna 1: eu não tava aqui... num olhe nem pra mim.
Aluna 2: é importante pra levar a notícia da gente pra outra pessoa... é importante
pra mandá notícia
Professora: é:: pra mandar notícia... qual o meio mais em conta de mandar notícia?
Aluno 3: carta
Professora: têm importância os serviços dos correios?
Aluna 1: pra mim não tem importância... só chega cobrança em minhas casa
Aluno(a)s: ((risos))
Professora: pra que vocês acham que serve o telegrama...? a função do telegrama?
Aluno 5: avisar viagem
Aluno 6: avisar morte
Aluno 7: mas as pessoas também recebem notícia
Professora: e você diz aí? ((dirigindo o discurso em direção a um aluno))
Aluno 8: eu nunca mandei telegrama não
Professora: vamos vê o sentido aí... pelo título dá pra saber? Que personagem foi
colocado aqui? O que o Chico Brito fez?
Aluno(a)s: recebeu o telegrama
Professora: ((a professora reler o texto))
que papel dobrado é esse?
o papel é o quê?
Aluna 1: foi colocar telegrama... receber notícia
Professora: “não lê imediatamente... carece de um copo d’água... e de uma cadeira...
pálida crava aos olhos... nas letras mortas... queira aceitar efusivos
cumprimentos passagem data natalícias espero merecer valioso apoio
distrito correligionário minha reeleição federal quinto distrito cordial
abraço. Antonágoras Falcão ((a professora lê esse fragmento e continua
questionando)) que sentido tem letras mortas? O que significa... as letras
mortas?
Aluna 1: palavras ruins... mortais que dão um sentido negativo
Professora: o que será que tá falando ali ((apontando para o fragmento supracitado))

116

vamos lá...no primeiro verso
o que tá falando nesse emaranhado?
Aluno 9: ele tá dizendo que passou
Professora: ele passou o quê?
o que é isso? ((apontando para as aspas))
Aluna 1: a fala do outro...
Professora: GENTE.... VAMOS LÊ MAIS
Aluna 10: professora natalício vem de natal?
Professora: ... natalício vem de aniversário... aniversário... também... parece de
natal... quem mandou e quem recebeu telegrama? Quem era esse cara?
Ele fez o quê? Então ele tá mandando um abraço para o Chico Brito?

Analisando o fragmento de aula supracitado, podemos inferir que o objetivo, da
professora B era conduzir o(a)s aluno a compreensão do texto, pois pra ele(a)s o sentido do
texto não estava explícito. Antunes (2003, p. 67) afirma que nas práticas de leitura, “o leitor,
como um dos sujeitos da interação, atua participativamente, buscando recuperar; buscando
interpretar e compreender o conteúdo e as intenções pretendidas pelo autor”. Nessa prática de
leitura, o texto não foi compreendido como um produto da decodificação de um emissor a ser
decodificado pelo leitor/ouvinte. Mas, a professora tentou ajudá-los a construírem o sentido
do texto, esse sentido só poderia ser construído na interação texto-leitor.
Mesmo percebendo a tentativa da inserção de alguns gêneros textuais diferentes,
durante as aulas de LM, a professora B adota a concepção de linguagem como instrumento
de comunicação. Nessa concepção a língua é um código, conjunto de signos que se combinam
segundo regras (TRAVÁGLIA, 1997). A língua é um instrumento que se encontra a
disposição do indivíduo (KOCH, 2002). E, o texto é visto como simples produto da
codificação de um emissor a ser decodificado pelo leitor/ouvinte, bastando para este o
conhecimentos do código (idem, ibidem). O decodificador é essencialmente passivo. Santos et
al (2004, p. 56), defende que o “professor demonstra estar influenciado pelo uso de textos
sobretudo os de pequena extensão, considerando que os alunos estão em processo de
alfabetização, embora seja pretexto para o estudo dos aspectos gramaticais”.
Diante da postura das professoras, fica evidente a necessidade de aprofundar os
saberes discutidos durante os encontros de formação, ainda é preciso repensar a concepção de
línguas adotada quando se tenta ensinar a LM.
Dado o exposto, as professoras precisam compreender que o sentido de um texto é,
portanto, “construído na inteação texto – sujeito (ou texto – co-enunciadores) e não algo que

117

preexiste a essa interação” (KOCH, 2002, p. 17). Entender também que as relativas
concepções de sujeito, texto e a produção textual numa concepção sóciointeracionista da
linguagem, como foi discutida durante cursos de formação, vista como lugar de “inter-ação”
entre sujeitos sociais, isto é, de sujeitos ativos, empenhados em uma atividade sóciocomunicativa, entre outras perspectivas linguísticas, precisam ser incorporadas as práticas de
ensino de língua na escola.

3.4 Análise linguística: ecos na sala de aula99

Durante os cursos que tematizaram o ensino de LM, apoiados nos pressupostos
epistemológicos, da perspectiva linguística sociointeracionista, “que trata das relações entre
fala e escrita dentro da perspectiva dialógica” (SANTOS, 2003), o(a)s professor(a)s foram
convidados a participarem de práticas de análises de textos. Entre os textos que
fundamentaram essa perspectiva, discutidos nos encontros, o(a)s professor(a)s refletiram que
as perspectiva interacionista preocupa-se com os processos de produção de sentidos, tomando
os textos sempre como situados em contextos sócio-historicamente marcados por atividades
de negociação ou por processos inferenciais. Não toma as categorias linguísticas como dados
a priori, mas como construídos interativamente e sensíveis aos fatos culturais. Tem muita
sensibilidade para fenômenos cognitivos e processos de textualização na oralidade e na
escrita, que permitem a produção de coerência como uma atividade do leitor/ouvinte sobre o
texto recebido (SANTOS, 2003).
As práticas de análise linguística100 objetivam estabelecer a clareza no texto, ao
intervir diretamente na coerência e na coesão textual, bem como o estudo dos aspectos

99

As afirmações defendidas nesse subitem têm por pressupostos as entrevistas e alguns textos trabalhados
durante os cursos.
100
Geraldi (2003, p. 73 – 74) definem algumas considerações de ordem geral sobre este tipo de atividade:
 A análise linguística que se pretende partirá não do texto “bem escritinho”, do bom autor selecionado
pelo “fazedor de livros didáticos”. Ao contrário, o ensino gramatical somente tem sentido para auxiliar
o aluno. por isso partirá do texto dele;

118

gramaticais que constituem as dificuldades mais comuns no uso da modalidade escrita.
Geraldi com relação a definição do uso da expressão ‘práticas de análise linguística’ defende
que

não se deve ao mero gosto por novas terminologias. A análise linguística inclui tanto
o trabalho sobe questões tradicionais da gramática quanto questões amplas a
propósito do texto, ente as quais vale a pena citar: coesão e coerência internas do
texto; adequação do texto aos objetivos pretendidos; análise dos recursos
expressivos utilizados (metáfora, metonímia, paráfrase, citações, discursos direto e
indireto, etc); organização e inclusão de informação, etc. essencialmente, à prática
de análise linguística não poderá limitar-se à higienização do texto do aluno em seus
aspectos gramaticais e ortográficos, limitando-se a ‘correções’. Trata-se de trabalhar
com o aluno o seu texto para que ele atinja seus objetivos aos leitores a que se
destina. (2003, p. 74).

Nas práticas de análises linguística, professor(a)s e aluno(a)s precisam alternarem os
seus papéis mediante um discurso escrito. O(a)s primeiro(a)s devem assumir a “função”de
analistas da língua em uso, intervindo no texto do(a) aluno(a) possibilitando-o(a) o avanço na
competência textual. Os segundos, além de analista do seu discurso e, às vezes, o discurso do
outro, precisam (re)direcionar o seu papel de produtor assumindo a função de revisor do seu
texto e/ou do texto do outro.
Nesse sentido, é aconselhável que o(a) professor(a) estimule a releitura e a refacção do
texto escrito, desenvolvendo, juntamente com o(a) aluno(a), atividade de revisou (KATO,
1986,

CAGLIARI, 1986, MARCUSCHI, 2002). Durante o período de observação, as

professoras só propuseram 1 (uma) atividade de análise de textos. Utilizaram-se de estratégias
semelhantes antes e durante a proposta de análise linguística:







A apresentação das aulas de práticas de análise linguística, o professor deverá selecionar apenas um
problema. De nada adianta querermos enfrentar de uma vez todos os problemas que podem ocorrer
nem texto produzido nosso aluno;
Fundamentalmente, a prática de análise linguística deve e caracterizar pela retomada do texto
produzido na aula de produção (segunda-feira, no horário proposto) para reescrevê-lo no aspecto
tomado como tema da aula de análise;
Material necessário para as aulas de prática de análise linguística: os cadernos de redação; um
caderno para anotação geral; dicionário e gramáticas;
Em geral, as atividades poderão ser em pequenos grupos ou em grande grupo; fundamenta essa
prática o princípio: ‘partir do erro à auto-correção’.

119

a)

A partir de uma temática discutida, pediram para que o(a)s alunos(a)s
produzissem um texto;

b)

Após as produções dos textos, recolheram-nas;

c)

Escolheram um dos textos para realizarem a atividade de análise linguística;

d)

Após alguns dias, trouxeram para a sala uma das produções para ser analisada;

e)

Transcreveram-na em algum suporte (quadro negro, cartolina), de modo que
permitisse a visualização do(a)s aluno(a)s;

f)

Conduziram a análise do texto, restringindo-se a ler alguns sintagmas – verbal
ou nominal –, e/ou palavras com desvios ortográficos;

g)

Questionaram sobre o quê deveria ser reescrito no texto.

No encaminhamento supracitado, percebemos uma articulação considerável de etapas
seguidas pelas professoras durante a proposta de análise de texto. As professoras reconhecem
a necessidade dos conhecimentos prévios do(a)s aluno(a)s sobe um tema abordado
anteriormente. Escolheram uma produção para ser reescrita, pois não daria conta de
reescrever todas as produções. No entanto, demonstram pouco conhecimento sobre a
necessidade de selecionar apenas um problema para ser resolvido em cada proposta de análise
linguística. O(a)s aluno(a)s ainda não têm o domínio da complexidade das relações
estabelecidas na construção de um texto, demonstram dificuldades em interagir durante a
análise. Nesse sentido, as professoras precisam refletir sobre como encaminhar essa proposta
de forma possível. Não podemos negar a realidade posta, na escola, tentam-se propor
atividades de análise linguística, mas as professoras demonstram dificuldades na
problematização do texto.
A professora A participou dos eventos de formação, como já afirmamos; e a
professora B não participou, como explicar a similaridade entre os procedimentos utilizados
em suas práticas de análise linguístico? Elas praticam um tipo de intervenção didática
discutida e problematizada, durante encontros de formação continuada que participaram, ao
longo de suas trajetórias profissionais? Considerando que a professora B não participou do
processo de formação investigado, inferimos que ela pode ter se apropriado dessa
metodologia a partir de observação, socialização de experiências de análise linguística entre
colegas de trabalho e/ou ter assistido aos programas de vídeo, sobre o tema, disponibilizados

120

às Secretarias de Educação pelo MEC101 em diversos programas de formação de
professore(a)s.
Entre as cartas, produzidas pelos aluno(a)s, a professora A selecionou para análise:

Querido pedroso
Estou te escrevendo para tidizer que te amo você é o meu molho tesoro o qual eu não
cero perder nuca.
Isoubi o seu pedido de casamento eu rebodo que sem porque eu temo do fundo meu
coração.
Um ábaco de sua querida e futura esposa.

A professora B selecionou a produção:

Não devemos trata maus oS pobres porque são as pessoas umiude muito trabalhador e
em copertente e desposta o trabalho e teambém sim não fosse os pobres que das pessoas
Ricas sem ele não tinha trabalhado na Rosa para plantação.
E sim não fosse dele que seria de nos para comer porque ele que e planta e colhe de
frutas e sereais
Eles que faz as plantações sim não fosse os pobres a gente não caminha nada disso
por isso devemos tratar bem eles.

Ao selecionar o gênero textual “carta” para encaminhar a atividade de produção de
texto, a professora A entre uma diversidade de gêneros que circulam nas práticas sociais de
leitura e escrita, seleciona o gênero do domínio discursivo interpessoal. Na produção desse
gênero o aluno(a) poderia, dependendo do destinatário, utilizar a linguagem do cotidiano. A
101

Entre os programas poderíamos citar os PCNs em Ação e o Programa de Formação de Professores
Alfabetizadores – PROFA.

121

carta é um gênero que provavelmente o(a)s aluno(a)s têm a possibilidade de fazer uso em suas
práticas sociais.
A proposta de produção de texto encaminhada pela professora B demonstra-nos as
práticas de produção de texto proposta pela escola. A professora, ao encaminhar a produção
de um texto sem definir o gênero explicitamente, encaminha uma redação escolar, desprovida
de função social, na qual o interlocutor é sempre o(a) professor(a). Dificilmente, o(a) aluno(a)
da EJA vai precisar produzir um texto dessa natureza em suas práticas sociais de uso da
escrita. O(a)s evidenciaram um nível de criticidade aguçado sobre as desigualdades sociais.
Essa proposta demonstra a necessidade de redefinir as práticas de produção de texto na escola.
Após o(a)s aluno(a)s responderem uma atividade de língua portuguesa, que consistia
em completar as lacunas de uma carta, essa proposta exigia do(a)s aluno(a)s conhecimentos
sobre os adjetivos indicadores de abundância, eles deveriam responder a carta102do remetente
Pedroso para o destinatário Rosa Barbosa. Tentando possibilitar aos aluno(a)s uma situação
de produção significativa, pois ele(a)s tinham pistas sobre o conteúdo da carta “responder ao
pedido de casamento de Pedroso”. Embora seja uma proposta aceitável, as práticas de
produção de texto escrito, na escola, deveriam privilegiar situações reais de comunicação, na
qual o(a)s aluno(a)s tivessem

outro(a)s interlocutor(a)s além do(a) professor(a). Como

defende um dos textos trabalhadores durante os cursos “a razão de ser da língua é a interação,
o dialogísmo. É na interação social que o ato linguístico se efetiva” (SANTOS, 2002).
Percebemos que, no contexto de produção, a professora A não considerou os
conhecimentos prévios do(a)s aluno(a)s sobre o gênero carta, limitando-se a apresentar um
modelo, sem refletir, com ele(a)s, os elementos linguísticos constituintes desse gênero, além
de sua forma, função e composição.
Na condução da análise linguística, pela professora A, destacaram-se: ortografia,
repetição de palavras, pontuação, e uso de letra maiúscula. Ela conduziu a análise
questionando: “o que o colega queria dizer aqui?”, em seguida lia o fragmento que
apresentava desvio da norma culta. Se o(a)s aluno(a)s respondessem de forma correta, ela
corrigia o desvio presentes no texto escrevendo por cima a resposta adequada. Quando não
respondiam, ela fazia a correção. Nesse contexto, evidenciamos o ensino de língua que se

102

Ver anexo 8.

122

prescinde de toda reflexão para falar de gramática, e que se desconhece absolutamente o uso
da linguagem quando se trata a “gramática” da língua.
Enquanto que a professora B solicitou a(o)s aluno(a)s, a produção de qualquer texto,
não especificou o gênero, nem a função da proposta de produção. Encaminhou a atividade
dizendo: “vocês vão produzir agora um texto que trate do assunto do artigo: “tratar mal aos
pobres é um mau negócio”. Vale salientar que alguns aluno(a)s recusaram-se a produzi-lo,
justificando sua recusa pelo fato de estarem ausentes na aula anterior, segundo ele(a)s não
sabiam qual era o tema do texto, nem o que deveriam escrever.
Após uma semana, a professora B levou o texto selecionado para sala de aula, no
momento da análise, entre outros aspectos, chamou a atenção do(a)s aluno(a)s para: o uso de
letras maiúsculas, a ortografia das palavras, a coerência e a pontuação. Ela procedeu a análise
lendo fragmentos do texto, e questionando como eles deveriam estar escritos. Percebemos
que, em alguns momentos, o(a)s aluno(a)s não responderam aos questionamentos quando
estes relacionavam-se à coerência do texto.
As professoras A e B não delimitaram um aspecto para ser analisado, mas tentaram
chamar a atenção do(a)s aluno(a)s para a complexidade dos vários aspectos que precisavam
ser problematizados no texto. Tanto o(a)s aluno(a)s da professora A

quanto os da

professora B demonstraram dificuldade em reestruturar e/ou corrigir sequências linguísticas.
As professoras demonstraram limitações em refletir com o(a)s aluno(a)s os aspectos
relacionados com a coerência e a coesão do texto, embora os conteúdos coerências e coesão
textual tenham sido objeto de estudo durante os cursos. Nessa ocasião, defendia-se que a
coerência dá origem a textualidade. A coerência era definida como “o que faz sentido para
seus usuários, o que torna necessário a incorporação de elementos cognitivos e pragmáticos
ao estudo da coerência textual. Enquanto a coesão textual diz respeito a todos os processos de
sequenciação de elementos de que ocorrem na superfície textual” (KOCH, 1989 apud
SANTOS, 2002).
Dado o exposto, as professoras não consideraram o pressuposto da linguística textual,
com enfoque sociointeracionista de que “a língua não é uniforme nem estática. Ela admite
variações em vários níveis”. O(a)s aluno(a)s não foram convidado(a)s a refletirem sobre o
continuum entre fala e escrita. Nesse momento, as professoras enfatizaram a gramática
normativa, defendida por Traváglia (1997, p. 30) como àquela que estuda apenas os fatos da

123

língua padrão, da norma culta de uma língua, norma essa que se tornou oficial. Baseia-se em
geral, mais nos fatos da língua escrita e dá pouca importância à variedade oral da norma culta,
que é vista, conscientemente ou não, como idêntica à escrita”.
A inclusão de práticas de análise linguística na escola, com foco no texto, deve
pressupor o domínio de saberes que possibilitem o(o) professor(a) o desenvolvimento de
habilidades de formular e confirmar hipóteses sobre o funcionamento da linguagem,
estabelecer comparações entre textos, ou fragmentos do texto, entre outros saberes.
A condução de uma atividade de análise linguística – reescrita – tal como proposta nos
encontros de formação, está intimamente relacionada à possibilidade do(a) professor(a)
realizar intervenções nas produções de textos do(a)s aluno(a)s. Essa postura exige o domínio
de saberes, além da própria capacidade de (re)escrita de um texto que as professoras devem
possuir.
Nesse sentido, as professora tentaram propor uma atividade de análise linguística, cujo
objeto de estudo era o texto, falharam ao tentar problematizar os desvios das normas
gramaticais, essa realidade demonstra a necessidade de aprofundarmos os pressupostos
teórico-metodológicos mais adequados a prática de análise linguística na escola.

3.5 O lugar dos gêneros textuais nas aulas de LM

Os cursos103 de formação continuada pautaram-se principalmente, em discussões sobre
a linguística textual, delimitando para objeto de reflexão o lugar dos gêneros textuais nas
aulas de LM. Bakhtin (2004, p. 262), postula “que cada enunciado particular é individual, mas
cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados,
os quais denominamos gêneros textuais”. Dessa forma, consideramos relevante, analisar a
inclusão dos gêneros textuais na prática pedagógica da professora A e da professora B.
A metodologia adotada pelas professoras ao ensinar os conteúdos divergiram, e
aproximaram-se em diferentes momentos. Foi possível observarmos que a professora A em

103

Entende-se os cursos que tematizaram o ensino da LM na EJA em Maceió.

124

60% das aulas, antes de introduzir os conteúdos linguísticos, explorava diferentes gêneros
textuais (carta, piadas, músicas, poema, fábula, histórias em quadrinhos). As intervenções que
fazia, restringiram-se, quase sempre, em questionar alguns aspectos notacionais dos textos
(parágrafos, pontuação, emprego de letras maiúscula). Entre as estratégias metodológicas de
trabalho, os gêneros textuais serviram de suporte para produção de outros textos, além de
serem utilizados em práticas de leitura. As estratégias metodológicas adotadas pela
professora B aproximaram-se da prática da professora A, à medida que ambas utilizaram o
texto como pretexto para introduzir e/ou analisarem alguns aspectos gramaticais.
Considerando a semelhança entre os procedimentos metodológicos adotados pelas
professoras, como também não daríamos conta de analisar todos os eventos de aula propostos
por elas, nas quais o gênero foi objeto de estudo, por isso optamos por selecionar alguns
eventos que possibilitassem visualizar o tratamento metodológico direcionado ao trabalho
com gênero nas aulas de LM. As práticas de leitura direcionavam-se apenas a práticas de
oralização do texto, nesse contexto, a professora A preocupava-se sobretudo com a
decodificação do texto.
A professora A, em um evento de aula, após cumprimentar o(a)s aluno(a)s,
comunica-lhes que naquele momento, seria aula de LM. Em seguida, ela distribuiu a fábula
“A galinha dos ovos de ouro104” e solicitou a(o)s aluno(a)s a leitura silenciosa da fábula.
O(a)s aluno(a)s atendem sua solicitação, após alguns minutos ela questionou:

Professora: o que foi que vocês entenderam com esse texto?
Aluno(a)s: (silêncio)
Professora: será que no mundo existe pessoas comoo João impaciente?
Aluno(a)s: existe
Professora: existe? Por que existe?
Aluno(a)s: (silêncio)
Professora: vamos reler o texto
As.: (os alunos releram o texto sileciosamente)
Professora: agora quem gostaria de conta essa história
Aluno(a) 1: eu

104

Ver anexo 9.

125

Professora: conte... prestem atenção
Aluno(a)1: um home achou os ovos da galinha... que era de ouro... não tinha
paciência de esperar um ovo todo o dia... resolveu matá-la para consegui todo o
ouro... quando matou ela... percebeu quer era igual a todas as outras galinha... ficou
pobre
Professora: quem gostaria de dramatizar o texto?
Você vai... (apontando para uma aluna, em seguida dois alunos ofereceram-se para
dramatizá-lo, após essa estratégia... a professora parabeniza-o(a)s, em seguida
propõe uma atividade de produção de texto)
Aluno(a) ...
Professor(a): vocês vão contar essa história na forma de história em quadrinho
(como os alunos não demonstraram muito interesse em realizar a atividade, a
professora simula no quadro, como deveriam produzir o texto) vocês façam os
quadrinhos aqui eu fiz seis (apontando para os quadrinhos) e produzam a história
Aluno(a) 1: não sei não... desenhar não
A2: também não sei desenhar não
P.: tentem... você conseguem ... (os alunos se disponibilizam a realizar a atividade.
A professora alerta-o(a)s ainda que teriam que adaptarem as falas dos personagens
nos balões, mas não poderiam copiá-las)

No fragmento, podemos perceber que a professora A utilizou-se da fábula para propor
a produção de um outro gênero – história em quadrinho. Observamos ainda que ela não
propôs a reflexão sobre as características do gênero trabalhado. Considerou a leitura de um
gênero suficiente para a produção de um outro gênero. Nessa estratégia, o(a)s aluno(a)s teriam
pistas sobe o conteúdo temático do texto e a sequência dos fatos, porém esse encaminhamento
não garante a produção de um gênero textual. As histórias em quadrinhos são textos mistos,
caracterizados pela linguagem verbal e não-verbal, possibilitam o uso da linguagem coloquial
próximo da realidade do(a)s aluno(a)s, pertencem ao domínio discursivo ficcional. No
entanto, o(a)s aluno(a)s demonstram dificuldades, pois além de habilidades discursivas para
produzirem o texto, precisariam ilustrar a sequência textual através de desenhos. A produção
desse gênero, quando desprovido de uma função social, poderá tornar-se uma atividade não
muito prazerosa, já que o trabalho com os gêneros na escola deve considerar que eles “são
fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social” (MARCHSCHI,
2002, p. 19).
A professora B não demonstrou interesse em desenvolver o hábito e o gosto pela
leitura. A prática de leitura era entendida como uma estratégia desprovida de função social,

126

limitava-se a decodificação do texto. Neste sentido, Antunes (2003, p. 77) ao criticar as
práticas de leitura na escola afirma que “a leitura envolve diferentes processos e estratégias de
realização na dependência de diferentes condições do texto lido e das funções pretendidas
com a leitura”.
Em um outro evento de aula, a professora A distribuiu gibis, após distribuí-los,
iniciou a leitura do texto. Posteriormente, solicitou a continuação da leitura pelo(a)s aluno(a)s.
Ao concluírem, encaminhou uma atividade na qual os alunos iriam preencher uma
cruzadinha105. Durante a leitura, vale salientar, a professora fez intervenções sobre o conteúdo
do texto: as práticas de alimentação e as doenças causadas por descuidos alimentares.
Perguntou a(o)s aluno(a)s de quem eram algumas falas dos balões. Como se tratava de uma
história em quadrinhos, cujos personagens eram os do Sítio do Pica Pau Amarelo, ele(a)s não
sentiram dificuldades para respondê-la. Na tentativa de vivenciar essa atividade, o(a)s
aluno(a)s, deparam-se com algumas dificuldades: a história em quadrinhos era relativamente
longo, e os comandos da proposta de atividade, às vezes, acarretavam dificuldades na
compreensão. A exemplo: “é um excelente alimento”, o texto apresentava vários alimentos
considerados excelentes para a saúde. Além disso, o retorno ao texto tornou-se, em alguns
momentos, uma atividade para a saúde. Além disso, o retorno ao texto tornou-se, em alguns
momentos, uma atividade cansativa, já que se tratava de um gibi, e o(a)s aluno(a)s não tinham
muita familiaridade com propostas dessa natureza.
Nessa atividade, a leitura de gibi serviu apenas de suporte para o preenchimento de
uma cruzadinha. A professora A, entre outras características dos gêneros, não considerou que
eles são “realizações linguísticas concretas definidas por propriedades sócio-comunicativas”
(MARCUSCHI, 2003, p. 23). Durante os cursos de LM, a professora A teve a oportunidade
de refletir sobre os elementos que estabelecem a coesão e a coerência do texto, na perspectiva
da linguística textual106. No entanto, em nenhum evento de aula os gêneros foram objetos de

105

Ver anexo 10
Marchuschi (1983, p. 12 – 13) propõe que se veja a Linguística do texto, mesmo que provisoriamente
genericamente, como o estudo das operações linguísticas e cognitivas reguladoras e controladoras da
produção, construção, funcionamento e recepção de textos escritos ou orais. Seu tema abrange a coesão
superficial ao nível dos constituintes linguísticos, a coerência conceitual ao nível semântico e cognitivo e o
sistema de pressuposição e implicação ao nível pragmático da produção de sentido no plano das ações e
intenções. Em suma, a Linguística Textual trata do texto como um ato de comunicação unificado num
complexo universo de ações humanas. Por um lado dever considerar a organização linear que é o tratamento
estritamente linguístico abordado no aspecto da coesão e, por outro, dever considerar a organização reticulada
106

127

análise desses aspectos. Os gêneros serviram de pretexto para identificação superficial de
aspectos gramaticais.
A professora A, em outro dia, inicia a aula distribuindo uma proposta de atividade,107
na qual o(a)s aluno(a)s após a leitura da piada “Histórias de pescador”, responderiam a
questão proposta “leia a conversa entre os dois pescadores. Depois, escreva as falas dos dois
nos balões”. Abaixo do texto tinha o lembrete “Não se esqueça! Nos balões não se usa
travessões”.
O fragmento de aula analisado abaixo é um recorte do estudo do texto. Essa aula foi
proposta na tentativa de vivenciar uma sequência de atividade que abordasse o mesmo gênero
textual história em quadrinhos”.
Ao término da leitura do texto a professora A questionou:

Professora: não entendia português... aí aparece várias exclamações em seguida...
não é isso? Essa partizinha aí a gente não ler entenderam agora isso aqui é o que?
Aluno 1: é uma piada
Professora: é uma piada... uma história de pescador... pescador não tem àquela
mania de inventar muita coisa... aí eles conversando não se esqueça dos balões não
se usa travessão... e esse outro esse moreninho aqui no finalzinho (apontando pra um
personagem na ilustração não é oh! olha esse monte de exclamação ele fica
admirado pelo que o outro falou... olha o gêneo não entendeu porque ele era
estrangeiro não entendia português... aí ele chega se admira... com o que o outro
falou aí vocês vão colocar essa história que você leram aqui dentro dos balões...
vocês podem utilizar o travessão.
Aluno 2: não
Professora: não... porque vocês não podem utilizar o travessão?
Aluno 1: porque é uma história em quadrinho
Professora: é uma história em quadrinho... tem os balões para substituir os
travessões... você tem que observar também a setinha pra dizer quem está falando...
é a setinha quem diz quem está falando... no caso quando a gente vai começar “sabe
Zeca uma vez eu fui pescar de tarrafa” o que é tarrafa minha gente... que eu nem
perguntei?
Aluna 3:é uma rede que joga
Professora: que somente um pescador consegue puxar não é? Uma rede puxada por
apenas um pescador... arrastão é que é puxado por vários não é?

ou tentacular, no linear, portanto dos níveis de sentido e intenções que realizam a coerência no aspecto
semântico e funções pragmáticas”.
107
A referida proposta encontra-se no anexo 11.

128

“sabe Zeca... uma vez eu fui pescar de tarrafa na primeira puxada de rede veio uma
garrafa bonitinha que só vendo” que foi que falou isso?
Aluno 2: esse galeguinho aqui
Professora: a gente sabe que foi o Juca quem falou não é? O Juca que falou para o
Zeca e quem é o Juca aí?
Aluna 3: é esse (apontando para o texto não verbal)
P.: é o de óculos então a primeira parte vocês vão fazer com o de óculos falndo com
o Juca falando que é o de óculos a segunda parte que vai falar é o moreninho e assim
por diante começa com letra maiúscula sim ou não?
As.: sim
P.: vocês só não vão usar o travessão... usem letra maiúscula...
A1.: sempre
P.: não... a letra inicial maiúscula... o restante manuscrita mesmo (enquanto os
alunos produzem o texto a professora circulou pela sala)

A análise do texto, “História de pescador”, restringiu-se ao reconhecimento dos
personagens do texto e ao reconhecimento do emprego dos sinais de pontuação: exclamação e
travessão, de forma superficial. Percebemos que a professora A não problematizou as
características desse gênero, sinalizou apenas um indício de uma tentativa de análise de texto.
Nos fragmentos acima, a linguagem foi entendida como instrumento de comunicação,
desprovida de sua função social, o texto usado como pretexto para observação de aspectos
gramaticais. Os estudo dos gêneros pode trazer consequências positivas na aquisição da
linguagem escrita e no desenvolvimento da linguagem oral. Desta forma o(a)s aluno(a)s
precisam ser convidados ser convidado(a)s a refletirem sobre seu conteúdo composicional, os
seus usos e funções numa situação comunicativa.
A professora B, diferente da professora A, demonstrou preocupação em introduzir
um tópico linguístico a partir da leitura de um texto, embora não tivesse o hábito de analisar
textos. Os gêneros que circularam em aula foram: poema, artigo de revista, texto do livro
didático e receita.
Durante dois dias, seus aluno(a)s ocuparam-se, nas aulas de LM, em copiar um texto
de um livro didático que descrevia a origem e as características dos “selos”. O(a)s aluno(a)s
não demonstraram interesse em realizar essa atividade, mas atenderam a solicitação da
professora. A professora B escrevia o texto no quadro, simultaneamente chamava a atenção
do(a)s aluno(a)s para aspectos do texto, entre eles, pontuação, parágrafo, separação

129

silábica.Nesse sentido, na escola, o estudo dos gêneros textuais pode tornar-se uma pura
forma linguística, cujo objetivo é o seu domínio, são estudados totalmente isolados dos
parâmetros da situação de comunicação.
Observemos um fragmento de um evento de aula encaminhado pelo professor B, após
copiar o texto sobre “selos” no quadro.

Professora: qual o significado desse tracinho? ((o tracinho era o hífen))
Alunos: continuação da palavra
Professora: continuação da palavra? Separar sílaba... é separar o quê? quem sabe?
Aluno 1: SEPARAR A PALAVRA
Professora: é separar as sílabas... quantas sílabas têm essa palavra?
Aluno 2: não tem nenhuma não
Professora: a palavra TE-LE-FO-NE-MA... qual a primeira sílabas?
Aluno 2: /le /
Professora: eita! Qual é a última? /ma/ ((a professora respodeu))
(Após esse diálogo, a professora afirma: “quando a gente for aprender a acentuar as
palavras... a gente precisa aprender a separar... também ajuda a gente a saber
acentuar as palavras”)

O extrato demonstra a superficialidade cm que são tratados os conteúdos na escola, o
exemplo a função do “hífen”, para a professora B, serve apenas para separar palavras. Além
de culturalmente, não aprofundar as discussões sobre os conteúdos que poderiam ser
refletidos para momentos posteriores, muitas vezes, essas discussões não são retomadas.
Dando prosseguimento, a professora B continua copiando o texto “Dia do selo” (1º de
agosto). Um aluno questiona: “eita! Professora... e não vai Pará não é::?” Ela afirma que já
estava concluindo a cópia do texto. Ao terminarem de copiar, a professora disse: “agora é aula
de matemática”. Dessa forma, não foi possível identificarmos qual a intenção da professora
em propor a cópia do texto. Tivemos a impressão de que essa proposta objetivava apenas
ocupar o tempo pedagógico.
O tempo pedagógico disponibilizado para cópia desse texto, e a superficialidade do
encaminhamento da análise demonstraram-nos a insignificância das escolhas de alguns

130

conteúdos trabalhados na escola. Nessa ocasião, tivemos a impressão de que a professora fez
as observações sobre a separação silábica porque estávamos observando sua prática
pedagógica. Nesse sentido, Geraldi (2003) afirma que prefere discordar do pretexto e não do
fato de o texto ter sido pretexto.
Para trabalhar separação silábica, a professora B solicitou, em uma outra aula, que os
aluno(a)s em dupla escolhessem uma notícia de jornal que constasse, em sua formatação,
palavras com sílabas separadas, após localizá-las, deveriam recortá-las e colá-las no caderno.
Mesmo explicando, várias vezes essa proposta, a maioria do(a)s aluno(a)s questionaram-na
sobre o que deveriam fazer, demonstrando-se um pouco estressada com os sucessivos
questionamentos. A professora B escreveu no quadro:

1º LER
2º INTERPRETAR
3º GRIFAR AS PALAVRAS QUE ESTÃO COM SÍLABAS SEPARADAS;
4º PASSAR PARA O CADERNO AS PALAVRAS ENCONTRADAS;
5º RECORTAR E COLAR NO CADERNO.

A professora B afirmou que essa proposta de atividade era para “desenfastiar o(a)s
aluno(a)s” do texto. Segundo ela, a turma sentia muita dificuldade em separar sílabas, essa
proposta era compensatória, pois “deveriam ter trabalhado separação silábica na fase
anterior”. O(a)s aluno(a)s não demonstraram satisfação em realizar a atividade, mesmo assim,
silenciosamente, tentaram realizá-la. A professora B não fez intervenções na escolha do
texto, nem sobre as palavras selecionadas, restringiu-se a circular pela sala observando se a
turma tinha concluído a atividade.
Ao assumir essa postura, mediante a proposta de atividade supracitada, a professora
considera a linguagem como expressão do pensamento, concepção nascida na Grécia Antiga,
sustentava-se na ideia de que a capacidades de expressão humana estaria associada ao
pensamento. Segundo Travaglia (1997, p. 21), nessa concepção, a “enunciação não passa de
um ato monológico, individual e não sofre alterações da situação social em que acontece”.

131

Para Koch (2002, p. 13), nessa concepção, “o sujeito, é sujeito psicológico, individual, dono
de sua vontade e de suas ações”108.
Em todas as propostas de leitura observadas, a professora B solicitava a(o)s aluno(a)s
que lessem silenciosamente o texto, depois convidava-o(a)s a dramatizá-lo. Essa estratégia
metodológica foi proposta várias vezes durante as aulas observadas.
Ao estudar a inclusão dos gêneros textuais na EJA, em Maceió, Santos et al. aponta
que

o tratamento dado aos tópicos de conteúdos veiculados pelos gêneros discursivos era
um misto do que pregam as pedagogias tradicional, nova e tecnicista. De um lado, a
priorização e o excesso das informações, sem tomar em consideração os
conhecimentos e as experiências dos alunos; do outro lado, a falta de planejamento,
a descontinuidade e a falta de sistematização dessas informações e, ainda, a
neutralidade na trato das informações, distanciando-as do contexto sócio-políticocultural de alunos trabalhadores (2004, p. 99).

Dado o exposto, observamos a inserção dos gêneros textuais nas aulas de LM, no
entanto, não se discute sua forma e a função. Para Antunes (2003, p. 118) é importante que
“os alunos, sistematicamente, sejam levados a perceber a multiplicidade de usos e de funções
a que a língua se presta, na variedade de situações em que aconteceu”. A finalidade do ensino
de LM é a ampliação de competências do aluno para falar, ouvir, ler e escrever gêneros
textuais, pois todas as esferas da vida social estão relacionadas ao uso efetivo da linguagem.
Nesse sentido, ampliar os conhecimentos sobe os usos da linguagem requer não só a inclusão
do estudo dos gêneros, na escola, mas, sobretudo, a aprendizagem de como ensinar a língua a
partir da análise e reflexão.

108

Para Koch (2002, p. 13 – 14), trata-se de um sujeito visto como ego que constrói uma representação mental
e deseja que esta seja “captada” pelo interlocutor da maneira como foi mentalizado.

132

3.6 Aulas de LM na EJA: as habilidades linguísticas ensinadas

No período de observação, foi evidenciado o lugar das práticas de leitura, produção de
texto e análise linguística.

TABELA 09109

ASPECTOS LINGUÍSTICOS

TURMA A

TURMA B

Práticas de Leitura

16%

5%

Práticas de produção de texto

30%

15%

Práticas de análise linguística

54%

80%

Total

100%

100%

Fonte: registros de aulas

A tabela 11 demonstra-nos os aspectos linguísticos trabalhados, em situações
didáticas, nas aulas de LM, e o tempo pedagógico destinados a esses aspectos nas práticas das
professora A e B.
Com relação as práticas de leitura, a professora A dedicou 16% do tempo pedagógico
para essa atividade, enquanto a professora B dedicou 5%110. A professora A possibilitou um
maior contato do(a)s aluno(a)s com a diversidade de textos do que a professora B. Se
considerarmos as inúmeras possibilidade que as professoras tiveram de conduzirem práticas
de leitura, ambas destinaram um tempo restrito a essas práticas.

109
110

Os percentuais foram calculados a partir do número de aulas observadas.
A relação dos gêneros trabalhados durante as aulas foram citados no item 3.5.

133

As práticas de leitura objetivavam, principalmente, o uso da estratégia de leitura
enquanto decodificação. Nessas práticas, o(a)s aluno(a)s, poucas vezes, foram convidados a
estabelecerem relações entre o tema abordado, no texto, e o contexto social no qual o(a)s
aluno(a)s estão inseridos; identificarem informações implícitas; a fazerem antecipações; a
verificar e selecionar informações, entre outras estratégias. Desenvolveram, sobretudo, prática
esvaziada de uma leitura crítica. Antunes (2003, p. 27) defende, “ler na escola é uma atividade
incapaz de suscitar no aluno a compreensão das múltiplas funções sociais da leitura (muitas
vezes o que se ler na escola não coincide com o que precisa ler fora dela)”. Na escola,
entretanto, o trabalho com a leitura remete-se ao uso do texto como pretexto para o estudo da
gramática (MATÊNCIO, 2002; GERALDI, 2003).
É desalentador percebermos que, na escola, não se considera que a “leitura do mundo
precede a leitura da palavra” (FREIRE, 1982), e que, a partir das práticas de leitura proposta
na escola, o(as) aluno(a)s jovens e adulto(a)s podem (re)significar esses saberes. Sobre a
prática de leitura crítica, Freire defende que

tanto os estudantes como nós, os professores, temos de ler mesmo; temos de ler
seriamente, mas ler, isto é, temos de nos adentrar nos textos, compreendendo-os na
sua relação dialética com os seus contexto, possibilidade de melhorar ou ampliar a
sua leitura do mundo (1982, p. 4).

Para Freire, tanto o(a)s professor(a)s quanto o(a)s aluno(a)s precisam ser leitores
competentes, capazes de saírem da leitura linerar para inferirem informações implícitas,
recuperadas, entre outros aspectos, pelas pistas linguísticas. Para isso, faz-se necessário
(re)pensar as práticas de leituras percorridas pelo(a)s professor(a)s, para impulsionar a partir
de práticas de formações continuadas momentos de leituras significativas, instigantes, críticas,
divertidas; do(a)s professore(a)s a refletirem os seus procedimentos de leitura individual, para
posteriormente intervir nas práticas de leitura do(a)s aluno(a)s.
De acordo com os documentos analisados, não detectamos informações sobre o
tratamento teórico-metodológico referente ao ensino da leitura, durante os cursos de LM,
embora possam ter sido foco de discussões.

134

Com relação as práticas de produção de texto, constatamos que, na turma a, 30% das
aulas foram destinadas a essas práticas. O(a)s aluno(a)s foram convidados, ou melhor
solicitados a produzirem, durante as aulas: roteiro de entrevista, carta, relato, histórias em
quadrinhos. Entre essas produções, apenas o roteiro de entrevista tinham um propósito social.
Após seleção e análise das “melhores” questões, pela professora, o(a)s aluno(a)s
entrevistariam pessoas na escola. Por fim, as respostas das entrevistas foram socializadas e
discutidas na turma. As demais práticas de produção de texto tiveram a professora A como
única interlocutora. Considerando as ocupações do(a) aluno(a) descritas anteriormente, exceto
a carta, as demais práticas de produção de texto distanciaram-se das necessidades cotidianas
do(a)s aluno(a)s jovens e adultos trabalhadores(a)s. Esse fato, reforça a pressuposição de que
os conteúdos trabalhados, na escola, estão distante das práticas sociais do(a)s aluno(a)s.
Na turma B, o(a)s aluno(a)s foram solicitados a produzirem um texto – essa
materialidade linguística deveria abordar a ideia central de um artigo lido, há alguns dias, em
sala de aula. Chamou-nos a atenção as condições de produção do texto: a professora solicitoulhes a escrita, em um dia, da introdução do texto, essa deveria ser produzida em no máximo 6
(seis) linhas. Após, aproximadamente dois dias,

manda-os retomar a introdução, e dar

continuidade a produção o texto. Essa postura, suscitou um clima tenso na aula, pois o(a)s
aluno(a)s faltoso(a)s, não tinham iniciado essa proposta, recusaram-se a fazê-la, afirmando
desconhecimento do tema do texto. Mesmo assim, a professora tentou mudar suas opiniões,
insistindo na realização da atividade. Para sugerir o inicio do texto, a professora B leu um
fragmento do texto produzido por um aluno do dia anterior. Ao perceber a ineficácia dessa
estratégia, encaminhou a produção em duplas.
Essa proposta de produção não tinha uma função social. Tivemos a impressão de que a
professora encaminhou essa atividade apenas para preencher o tempo pedagógico. Tal
proposta é um exemplo das práticas de produção de texto encaminhada na escola, esvaizadas
de uma função social, distante das práticas de escrita, provavelmente, realizadas pelo(a)s
aluno(a)s em seus contextos sociais.
A tabela 11 revela-nos ainda que a professora A dedicou 54% das aulas de LM para a
prática de análise linguística, enquanto a professora B dedicou 80%. Esses percentuais,
demonstra-nos a necessidade de um aprofundamento teórico-metodológico do(a)s
professores(a)s sobre as práticas de análise linguístico na escola. Segundo Geraldi

135

o objetivo essencial da análise linguística é a reescrita do texto. Isso não exclui,
obviamente, a possibilidade de nessas aulas o professor organizar atividades sobre o
tema escolhido, mostrando com essas atividades os aspectos sistemáticos da língua
portuguesa. Chamo atenção aqui para os aspectos sistemáticos da língua e não para a
terminologia gramatical com que a determinamos. O objetivo não é o aluno dominar
a terminologia (embora possa usá-la), mas compreender o fenômeno linguístico em
estudo (2003, p. 74).

Considerando o pressuposto só ensinamos o que sabemos, não poderíamos cobrar
do(a)s professor(a)s a inclusão dessa postura à prática, se ele(a)s não tiveram acesso a esses
conhecimentos anteriormente na formação inicial. Para se propor situações de análise
linguística, precisa-se conhecer os aspectos linguísticos subjacentes a essa prática, entre eles,
os elementos que estabelecem a coesão e a coerência do texto, além do domínio da gramática
normativa.
A professora A participou das discussões sobre coerência e a coesão do texto, durante
os cursos de formação, mesmo assim, ainda demonstra dificuldades para encaminhar essa
proposta. Essa discussão carece de um maior tempo para aprofundamento, reflexão coletiva e
experimentação na prática.
No que se refere ao lugar das atividades em torno da gramática é, extremamente,
desestimulante. Percebemos que o estudo da gramática na turma A ocupa 54%, isso significa
que mais da metade das aulas de LM ainda é destinada ao ensino de normas e nomenclaturas
gramáticas. Na turma B, por outro lado, esse percentual sobe para 80%. Demonstrando, desta
forma, também o peso da tradição escolar. Castilho (2002, p. 12), nesse sentido afirma que
“os professores e as professoras que têm trinta ou mais anos de idade ‘aprenderam’, na
universidade, a considerar a língua como um fenômeno homogêneo, iniciando-se numa
gramática formal (sobretudo estrutural e tomando a sentença como seu território máximo de
atuação apoiando-se na ideia de que aprender a gramática é primordial para dominar a
língua”. Uma gramática da irrelevância, com primazia em questões sem importância para a
competência comunicativa do falante (ANTUNES, 2003).
Vale salientar que as professoras não discutiram, durante as aulas de LM, o fenômeno
da variação linguística, embora o(a)s aluno(a)s façam uso da variedade linguística informal.
As discussões, na sala de aula, direcionavam-se ao domínio do dialeto padrão. Essa

136

perspectiva foi evidenciada: nas correções das produções escritas dos alunos, nos exercícios
propostos, e nas leituras que realizaram.
Os materiais, produzidos e distribuídos, nas escolas, apontam mudanças na concepção
de ensino de língua (BAKHTIN, 2004; KOCH, 2002; GERALDI, 1986; TRAVAGLIA,
2002). Nesse sentido vêm incentivando, entre outros aspectos, novas discussões sobre a
formação de professor(a)s; redefinição dos currículos de LM; a reformulação dos materiais
didáticos adquiridos pelos professor(a)s em suas práticas pedagógicas cotidianas.
Embora de fundamental importância, a questão da formação em exercício de
professore(a0s da EJA, parece-nos que tem sido mais frequentemente deixada em segundo
plano no Brasil. Contudo, o sucesso de qualquer política de educação para o(a)s aluno(a)s,
jovem ou adulto(a), pressupõe a qualificação profissional docente. Sem formação adequada, o
profissional da educação não poderá educar cidadãos críticos, reflexivos, a partir das
necessidades de aprendizagem dessa modalidade educativa.
É preciso percorrer o caminho inverso, investigar a prática, refletir sobre ela. Buscar
novas metodologias, experimentá-las, paralelamente (re)significando os saberes teóricos, no
sentido de impulsionar mudanças na prática de ensino de língua.
Dado o exposto, percebemos o distanciamento e a tentativa de apropriação entre os
conteúdo problematizados, durante os cursos de LM, e a prática de ensino na escola. É
necessário desmontar o hiato entre o contextos de ensino-aprendizagem escolar e os processos
de formação continuada. Se a escola almeja formar adultos letrados, capazes de fazerem uso
da leitura e da escrita seria dicotômico continuar insistindo no ensino de LM,
descontextualizada das práticas sociais de uso da leitura e escrita.
O(a) aluno(a) jovem ou adulto(a) precisa apropriar-se, na escola, da leitura e da
escrita. Para isso o ensino de LM deve adequar-se as expectativas de aprendizagem desses
sujeitos, marcados por um processo de exclusão social, considerados, por muitos, inferiores,
lentos e incapazes. Nesse sentido, é preciso reconhecer que, na escola, ainda é possível
aprender a ler e escrever, fazendo uso dessas habilidades no seu contexto social, independente
de idade, gênero, cor e posição social. Concomitantemente, a formação continuada do
professor é uma das possibilidades de ressignificar a prática pedagógica, possibilitando, entre
outros aspectos, a garantia desse direito subjetivo.

137

(In) Conclusão

Partindo-se do pressuposto de que a formação em exercício, do professor de EJA, é
fundamental, para impulsionar o ressiginificar da prática pedagógica, a nossa investigação
buscou indícios para avaliar a influência do processo de formação continuada,
especificamente dos cursos de LM, a partir da visão de todos os sujeitos envolvidos e na
prática de professor(a) do Ensino Fundamental da EJA; caracterizar os lócus de formação
continuada do DEJA a partir de sua reestruturação em 1994; avaliar os pressupostos teóricometodológicos, adotados durante os cursos, a partir de diferentes olhares; avaliar as
influências dos cursos de LM na prática pedagógica da professora participante do processo de
formação, estabelecendo relação com a prática de uma professora

não participante.

Acreditamos que ao estabelecermos um diálogo ente os estudos teóricos sobre formação de
professore(a)s, ensino de LM e EJA atingimos aos objetivos propostos nessa investigação.
Para desenvolvermos nossa reflexão sobre as possibilidades do processo de formação
continuada na prática pedagógica, partimos do cenário e dos olhares sobre os processo de
formação implementado pelo DEJA. Com base no histórico desse processo, verificamos, ente
outros aspectos,que predominam alterações de caráter estrutural com foco em melhorias
qualitativas, formação direcionada por profissionais de universidades que desenvolviam
pesquisas na área; e quantitativas, ampliaram-se a oferta de eventos de formação, sua
periodicidade e a carga horária dos cursos.
Evidenciamos, nessa investigação, a tentativa do DEJA em implementar um processo
de formação

continuada que possibilitasse a reflexão sobre as dificuldades teórico-

metodológicas do(a)s professor(a)s. Nesse sentido, desde 1994, esse departamento, oferecia,
esporadicamente, cursos de aprofundamento na diferentes áreas do conhecimento que
mantinham relações com o currículo da EJA. Posteriormente, o grupo gestor do DEJA, ao
refletir sobre o distanciamento entre os princípios teórico-metodológicos discutidos e a prática
pedagógica, propõe, paralelo aos cursos, as zonais, nos quais reuniam-se professores de
localidades próximas para planejarem a prática e aprofundarem as discussões suscitadas
durante os cursos, entre outros aspectos. No entanto, o hiato entre os fundamentos abordados
nesses eventos de formação e a prática pedagógica era evidenciado pelo(a)s professore(a)s.

138

No intuito de superá-lo a partir dos estudos de Costa (2000), o DEJA propôs a implementação
do projeto GAP, que defendia a presença de um coordenador pedagógico na escola. Nesse
contexto, percebemos que havia por parte do DEJA a preocupação com a formação
continuada do(a) professor(a), formação esta que deveria implicar em mudanças na prática.
Dado o exposto, ao caracterizarmos esses locus de formação, a partir de diferentes
olhares, foi possível apontar algumas entraves de diferentes natureza (estrutural, política,
social e econômica, entre outras) que reforçaram a persistência das dificuldades postas
durantes a oferta de cursos que tematizaram o ensino de LM, como também as influências
desses eventos, posteriormente, propulsores de mudanças na prática.
Entre os entraves que interferiram no desenvolvimento dos processo, podemos
destacar: a diversidade de tempo de atuação do(a)s professore(a)s na EJA; a inviabilidade,
para alguns/algumas professore(a)s de comparecerem durante os dias de formação definidos;
o estabelecimento da relação teoria-prática; a resistência ao novo; a excessiva fragilidade da
formação inicial; a rotatividade do(a)s professore(a)s; a carga horária de trabalho. Nesse
sentido, abrir espaços para a reflexão sobre as necessidade de aprendizagem do(a)s
professore(a)s, durante encontros de formação, e possibilitar as condições necessária para o
acesso do(a)s professore(a) aos cursos pode ser um caminho fértil para redirecionar a prática
pedagógica.
Por outro lado, os diferentes olhares, indicaram as influências dos cursos de LM na
prática pedagógica, entre elas: inserção dos gêneros textuais na escola; avanços nas práticas
de leitura e de escrita e na concepção de linguagem; práticas de ensino da gramática a partir
do trabalho com os textos; melhor avaliação das produções escritas do(a)s aluno(a)s;
aceitação da variação linguística usada pelo(a)s aluno(a)s; definição de critérios para
selecionar os gêneros; aplicação de regras gramaticais em textos; identificação dos gêneros
que estavam sendo trabalhados.
Vale salientar que, segundo depoimentos, os cursos influenciaram, numa perspectiva
pessoal e profissional: o acesso do(a) professor(a) a teorias linguísticas não familiar; o
incentivo ao aperfeiçoamento profissional; a releitura do processo de ensino-aprendizagem; e
aprofundamento de alguns aspectos sobre o ensino da LM, entre eles, a coerência e a coesão
textual.

139

As observações, durante as aulas de LM da professora A, participante do processo de
formação, e da professora B, não participante, permitiram-nos visualizar: concepção de
linguagem; as práticas de análise linguística; e o lugar dos gêneros textuais nas aulas de LM.
As professoras demonstraram compreender a linguagem como instrumento de comunicação,
que segundo Geraldi (2003, p. 41) está ligada a teoria da comunicação e vê a língua como
código (conjunto de signos que se combinam segundo regras) capaz de transmitir ao receptor
certa mensagem.
A adoção à concepção de linguagem supracitada justifica o tratamento teóricometodológico direcionado as práticas de análise linguística centrada na aplicação de regras e
nomenclaturas gramaticais. Consequentemente, os gêneros textuais foram utilizados como
pretexto para produção de outros gêneros e/ou serviram de suporte para identificação de
algumas classes de palavras, entre elas: adjetivo e substantivo, além da identificação dos
sinais de pontuação.
Com relação as duas suposições que levantamos antes de iniciarmos a investigação, a
primeira consistiu na premissa de que tendo participado dos cursos de LM, provavelmente,
o(a) professora participante apresentaria mais avanços no tratamento teórico-metodológico de
ensino de LM do que a professora não participante. No entanto, não se confirmou plenamente.
O diferencial entre as práticas consistiu em aspectos pontuais: maior número de gêneros
circulando durante as aulas de LM; e mais ênfase nas práticas de produção de texto. Porém
evidenciamos semelhanças metodológicas no que diz respeito ao tratamento dos conetúdos,
pois os recursos utilizados são pretextos para a abordagem da gramática normativa.
Evidenciamos, em alguns contextos de aula, ecos da perspectiva reducionista do estudo da
palavra e da frase descontextualizadas, principalmente na prática da professora B.
No que se refere a segunda suposição: os cursos de LM, ministrados por uma
formadora, doutora em linguística, pesquisadora na área, fundamentados nos pressupostos
teóricos da linguística textual, possivelmente implicaram mudanças na prática pedagógica,
isso foi confirmado nos depoimentos das professoras. Segundo elas, as mudanças consistiram
em: superar a perspectiva rígida de imposição de conteúdos impostos pela escola tradicional;
conseguiram estabelecer relação entre texto e gramática; aprenderam a valorizar as produções
escritas do(a)s aluno(a)s; passaram a respeitar e/ou aceitar as variações linguísticas;
entenderam como trabalhar os gêneros; aprenderam a propor atividades de reescrita de textos.

140

Embora na prática observada da professora A foram poucos os sinais de mudanças, como
temos ao longo desse texto.
Nossa investigação indicou que não é exatamente a discussão sobre a mudança de
concepções do(a)s professore(a)s, sobre o tratamento teórico-metodológico de ensino de uma
LM, no caso de Maceió, instigada pelo estudo dos pressupostos epistemológicos da
Linguística Textual com enfoque sociointeracionista, que garante a ressiguinificação da
prática, mas a partir de um processo contínuo de experimentação, reflexão na prática e sobre a
prática, além do aprofundamento das teorias linguísticas. Não podemos ensinar o que não
sabemos. O domínio do conteúdo específico é básico para que o conhecimento pedagógico do
conteúdo seja construído pelo professor (SHULMAM, 1986).
A análise mostra-nos que, em Maceió, há ainda a necessidade de investimentos na
formação continuada do(a) professor(a) da EJA. A quantidade e complexidade dos saberes
mobilizados, em aulas de LM, são indicativos de que precisamos (re)pensar a prática. Nessa
perspectivas, requer um investimento permanente, não esquecendo nunca que a formação é
indissociável dos projetos profissionais e organizacionais (NÓVOA, 1995). A partir dessa
realidade é preciso repensar durante o processo de formação continuada do professor da EJA
em Maceió, quais os interlocutores desses professores? Quais as possibilidades de avanço dos
professores quanto ao letramento profissional? Qual o papel da formação inicial?
Durante o período investigado, como mostramos, o locus de formação continuada era
o espaço da SEMED, posteriormente pensou-se na formação do grupo escola, embora não se
tenha conseguido formá-lo em cada unidade de ensino. Nesse sentido, em Maceió, já a
necessidade de implementação do já tacitamente sabido – apontado pelos estudos de Costa
(2000), proposto no projeto GAP, e evidenciado, novamente, essa investigação – o locus de
formação do(a) professor(a) da EJA a ser privilegiado é a própria escola.
Como são “gestores de dilemas práticos”, o(a)s professores(a)s precisam compartilhar,
com

seus

pares:

experiências, problemas

cotidianos,

angústias,

avanços,

opções

metodológicas, entre outros aspectos, além de considerar o Projeto Político Pedagógico da
Escola, para que possam através de tentativas de acertos e erros transformar os conhecimentos
discutidos nos locus de formação em conteúdos didaticamente ensináveis.
As professoras observadas apresentaram inúmeras lacunas teórica-prática sobre o
ensino de língua, desde a escolha dos conteúdos a serem ensinados, até os procedimentos

141

teórico-metodológicos. Na análise realizada, demonstramos ainda, a necessidade de se criar,
em Maceió, uma cultura de formação pautada na reflexão sobre o que se faz na prática quando
se tenta ensinar a língua. Reconhecemos a impossibilidade de qualquer processo de formação
habilitar profissionais prontos e acabados, pela natureza de seres inconclusos, sempre
inacabados que somos (FREIRE, 1997). Shulmam (1986 apud GONÇALVES E
GONÇALVES, 2003, p. 107) postula que se torna necessário que estes profissionais busquem
um aperfeiçoamento constante em sua área de atuação, desenvolvendo-se enquanto
desempenham suas atividades profissionais, pois o conhecimento cresce com o ensino.
Desta forma, a partir das análise sobe o que acontece nas aulas de LM, abrir espaços
para a reflexão sobre as necessidades de aprendizagem do(a)s – professore(a)s, durante os
encontros de formação é um caminho fértil para o (re)pensar à prática. É preciso pensar a
prática para pensar a formação docente (PERRENOUD, 1993).
A realidade posta na sala de aula representa indícios de que se precisa aprofundar,
através de uma política de formação contínua, os estudos sobre o ensino da linguagem na
EJA. A ênfase posta na tentativa de ensino da gramática normativa possivelmente não
garantirá a formação de sujeitos letrados, críticos e conscientes do seu papel social.
Tomando-se por base os elementos levantados, no corpo deste trabalho, sabemos que a
relação entre o processo de formação, especificamente os cursos de LM, e a prática
pedagógica não acontecem de forma simultânea. Antes de provocarem uma possível ruptura
com o usual e de conseguir uma adesão de desconfiança, desequilíbrio e expectativa. Por isso,
é necessário investimento a longo prazo na formação docente; acompanhamento do(a)
professor na prática pedagógica por profissionais mais experientes, que possam ajudá-los a
ressiguinificarem o ensino da LM na escola.
As lacunas na formação – inicial e continuada – são percebidas em diversos contextos
de formação (cursos, encontros, oficinas). O(a)s professore(a)s demonstram dificuldades em
vivenciar práticas de leitura e escrita. Na prática essas dificuldades acentuam-se ao tentarem
ensinar a língua sem dominar os saberes que envolve o ensino e a aprendizagem de uma LM.
No entanto, não nos propomos, nesse discurso, defendermos a implementação de políticas
compensatórias capazes de suprir esse déficit. Mas defendermos a implementação de uma
prática de formação permanente baseada em situações de pesquisa, experimentação e
reflexão. Além do estabelecimento de relação entre os saberes teóricos e os saberes da

142

experiência, subsidiando minimamente, o professor(a), no sentido de compreender quais
aspectos teórico-metodológicos seriam mais adequados ao ensino e aprendizagem de uma
língua em uso. Um dos caminhos propulsores dessa postura consiste na mudança de lugares
do(a)s professore(a)s na dinâmica da aula de LM – sair de uma posição de meros
transmissore(a)s da gramática normativa para assumirem o lugar de analistas da língua em
uso.
Com relação ao professor(a) da EJA em exercício, os órgãos responsáveis pelas
iniciativas de formação continuada precisam reavaliar as contribuições desse processo
impulsionando posteriormente o ressiguinificar da prática. Não se pode acreditar que o(a)
professor(a) resolva sozinho(a) os problemas da prática, consiga adotar novas concepções e
abordagens baseando-se apenas no acesso a teorias linguísticas: formação em exercício é
aprendizagem, (re)ssiguinificação de valores, de concepções e de ideologias. Desta forma, o
caminho deveria ser o inverso, partir da reflexão sobe o que o(a) professor(a) faz na prática,
ao ensinar a LM, e quais as outras possibilidades de ensiná-la.
Nesse contexto também há necessidade de um profissional mais experiente (educador
de apoio, supervisor escolar, coordenador) que assuma o papel de parceiro problematizador
das práticas vivenciadas em sala de aula. Observamos, a tentativa de inclusão de alguns
princípios discutidos nos encontros de formação, mas metodologicamente são tratados ainda
numa perspectivas clássica, mecânica, estímulo resposta, há pouco espaço para discussão e
construção compartilhada.
Ao que tudo indica, o sentido do investimento na competência profissional do(a)s
professore(a)s, por meio de formação contínua, vai além da instrumentalização de saberes
teórico-práticos de diferentes campos do conhecimento pedagógico (planejar, avaliar,
transpor). Ao nosso entender, no processo de formação do(a) professor(a) pra ensinar
LM,entra em jogo questões complexas, que devem caminhar para a mudança não somente dos
fundamentos teóricos, mas sobretudo, o estabelecimento de relações interpessoais e da sua
coletividade, requer, entre outros aspectos: investimento pessoal e profissional; aceitação às
mudanças; reconhecimento das limitações profissionais e pessoas; e experimentação. Esse
processo, atrelado à perseguição de uma prática de formação permanente, ou seja, a formação
concebida como um processo que se estende por toda a vida.

143

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152

ANEXO 1

ROTEIRO DE ENTREVISTA – COORDENADORES

153

1. Há quanto tempo o(a) senhor(a) atua no Departamento de Jovens e Adultos?
2. O(a) senhor(a) já lecionou na EJA?
3. Qual a sua formação acadêmica?
4. Como se desenvolveu o processo de formação continuada implementado pelo DEJA, no
período entre 2000 – 2004? Qual a atuação do(a) senhor(a) nesse processo?
5. Os encontros de formação não seguiam uma base curricular, desta forma como eram
selecionadas as temáticas a serem discutidas nesses encontros?
6. Quais as dificuldades do DEJA para encaminhar o processo de formação?
7. Quais foram as dificuldades apresentadas pelo(a)s professore(a)s durante o processo de
formação?
8. Quais os eventos de formação oferecidos a(o)s professor(a)s (cursos, seminários,
congressos, entre outros)?
9. De que forma o(a)s professore(a)s participavam do processo de formação?
10. Quais os critérios utilizados pela SEMED para direcionar, quando necessário, as
propostas de formação?
11. Como o(a) senhor(a) avalia o processo de formação implementado no período de 2000 –
2004?

ANEXO 2

ROTEIRO DE ENTREVISTA – PROFESSORAS

154

1. Qual a sua formação acadêmica?
2. Há quantos anos o(a) senhor(a) exerce a docência?
3. Há quantos anos o(a) senhor(a) atua na Educação de Jovens e Adultos?
4. Qual a sua idade?
5. Por que o(a) senhor(a) optou por trabalhar com a EJA?
6. O que o(a) senhor(a) entende por formação continuada?
7. Tendo participado da trajetória de formação do DEJA-SEMED, no período entre 2000 –
2004, como o(a) senhor(a) avalia esse processo?
8. De que forma os conteúdos foram trabalhados nos encontros de formação?
9. Os conteúdos trabalhados estabeleciam relação com a prática pedagógica?
10. Os temas trabalhados estabeleciam relações com as necessidades de aprendizagem dos
jovens e adultos? De que forma?
11. Quais os procedimentos metodológicos utilizados nos encontros de formação?
12. De que forma o(a) senhor(a) participou das discussões propostas nos encontros de
formação?
13. Os seus saberes docentes (da prática) foram considerados durante os encontros de
formação? De que forma?
14. Os encontros de formação possibilitaram mudanças em sua prática de ensino de língua
materna? De que forma?
15. Se você fosse convidada a opinar sobre a relevância dos conteúdos trabalhados nos
encontros de formação, como avaliaria?

ANEXO 3

155

ROTEIRO DE ENTREVISTA – PROFESSORA FORMADORA

1. A senhora se lembra do período que ministrou cursos de Língua Materna aos professores
da EJA do DEJA/SEMED? Como era a sistemática desses cursos?
2. Quais temáticas foram discutidas durante esse processo?
3. Quais critérios utilizados para definir as temáticas trabalhadas durante os cursos com os
professores?
4. Como esses cursos eram sequenciados?
5. De que forma a senhora avalia a participação e o desempenho do grupo?
6. Quais foram as maiores dificuldades apresentadas pelo grupo?
7. De que forma a senhora tratava os saberes docentes do grupo?
8. Como a senhora avalia a relação conteúdos trabalhados, saberes docentes e prática
pedagógica?
9. Levando-se em consideração a especificidade do grupo de formação da EJA, como a
senhora sugeria o tratamento metodologia que deveria ser dado aos saberes discutidos
durante os encontros?
10. Em qual período a senhora ficou a frente do processo de formação em língua materna
através do DEJA?

ANEXO 5

156

CRITÉRIOS UTILIZADOS PARA TRANSCRIÇÕES

OCORRÊNCIAS

SINAIS

Pausas

...

Alongamento de vogal ou consoante

:::

Incompreensão de palavras ou seguimentos

( )

Hipótese do que se ouvia

(hipótese)

Comentários descritivos

(( ))

Corte de seguimento de fala

/.../

Supressão de palavras, frases ou períodos

[...]

Superposição

[

Interrogação

?

Entonação enfática
Silabação

Maiúscula
-

157

ANEXO 6

DOCUMENTOS CONSULTADOS111

 Calendário de ações em 2003. Encontros pedagógicos com os professores de 40h e
estagiários nas zonais.
 Calendário de ações em 2003. Encontros pedagógicos com os professores de 20h nas
zonais.
 Calendário de cursos de fundamentos-metodológicos na EJA em 2003.
 DEJA: realizações nos últimos seis anos (DEJA, 2003).
 Ementas de cursos.
 Formação continuada dos professores da EJA no município de Maceió: uma
experiência em processo (DEJA, 1999);
 Lista de frequência curso de Gêneros textuais na EJA – 2002;
 Lista de frequência – coerência e coesão na EJA, 2002.
 Lista de frequência – Linguística textual na EJA, 2002;
 Parecer nº 013/2002 – CEE, aprovado em 05.03.2002 – regulamentação da oferta de
educação de jovens e adultos da Secretaria de Educação de Alagoas.
 Orientações sobre as horas do departamento destinada à formação continuada. Maceió,
1999.
 Plano de trabalho do DEJA para 2004 (DEJA, 2004).
 Programa: Recomeço – Educação de Jovens e Adultos. Plano de trabalho detalhado
(DEJA, 2001).
 Programa Recomeço: supletivo de qualidade: orientações aos secretários de Educação,
equipes coordenadoras, professores e responsáveis pela Educação de jovens e adultos
na rede de ensino. SEF/MEC/COEJA, 2002.
 Programa Recomeço. Educação de jovens e adultos. Plano de trabalho detalhado
(DEJA, 2002).
 Programa: Recomeço – Relatório das ações 2001; 2002.
 Relações dos professores do quadro efetivo do DEJA em 2004.
 Relação dos professores horistas da EJA em 2004.
 Relação dos estagiários da EJA em 2004.
 Relatório de Ações do Programa de apoio a Estados e Municípios para Educação
Fundamental de Jovens e Adultos – Fazendo Escola – 2003/Maceió/jan/2004 (DEJA,
2004).
 Resolução CEC/AL Nº 18/2002 CEE (Ementa regulamenta a Educação de jovens e
adultos no âmbito do Sistema Estadual de Ensino de Alagoas e dá outras
providências).

111

Esses documentos compõem o arquivo do Departamento de Jovens e Adultos – DEJA, foram consultados no
primeiro semestre de 2005.

158

ANEXO 7

PERFIL DAS PROFESSORAS ENTREVISTADAS

Professora

Carga
horária

Idade

Formação

Tempo de
magistério

Atuação
(fase da
EJA)

Tempo
na EJA

P1

40

40

Licenciatura
em História

20

2ª.

7

8

2ª

8

P2

40

37

Licenciatura
em Filosofia e
Educ. Física

P3

40

53

Nutricionista

25

3ª

10

P4

40

35

Licenciatura
em Pedagogia

13

3ª

9

9

1ª

9

P5

40

36

Psicóloga e
Espec. em
Psicopedagogia

P6

40

56

Licenciatura
em História

17

3ª

4

35

Licenciatura
em Serviço
Social /
Cursando
Direito

8

3ª

8

P7

40

ANEXOS

159